Capítulo 44 - De Um Rei Para o Outro
— Irmãozão! Olha o que eu fiz! — com meus poucos 9 anos, cheguei correndo até meu irmão mais velho, carregando em seus braços uma enorme pilha de papel.
— Kaiser, o que tá fazendo aqui? — minhas memórias estavam embaçadas, não era capaz de lembrar onde estava, nem mesmo pude me lembrar de como era seu rosto.
— Eu fiz pra você! — ergui minhas mãos mostrando para ele uma escultura de ferro, onde em forma de rabiscos, ele segurava minha mão sorrindo.
— Você fez isso? — disse com o rosto inexpressivo — Dá aqui.
Ele pôs a escultura em suas mãos e com um leve sorriso, virou suas costas para mim. Meu semblante caiu decepcionado, até que de repente ele voltou novamente, mostrando uma nova escultura, perfeitamente construída e rica em detalhes, com nós dois rindo um com o outro. Eu fiquei maravilhado, não com sua obra de arte e sim com seu radiante sorriso que sempre me fazia sorrir também.
Em uma bela noite, anos após aquele dia, eu estava sozinho em casa, esperando paciente meu irmão voltar do trabalho enquanto lia um livro.
— BAM! — a porta se abriu agressivamente, seguindo o corpo do meu irmão caindo no chão.
— O que aconteceu? — gritei desesperado.
— Kaiser… você tem que fugir — ele se levantava em meio a uma poça de sangue.
— Por quê? Me fala! O que tá acontecendo?
— Debaixo da minha mesa… pegue tudo e corra.
— Eu não vou pra lugar nenhum sem você!
— Tem que confiar em mim. Não deixe o Rei Welt encontrar aquele lugar. Tudo vai fazer sentido, eu prometo… — sua voz ficava cada vez mais baixa.
— Irmão… não…
— Não consegui vingar nossos pais… me perdoe…
— Não tem que se desculpar, isso nunca foi importante.
— Você cresceu bem, Kaiser, que bom — seus olhos perdiam o brilho, junto ao seu enorme sorriso que caía.
— BANG! — um buraco apareceu na cabeça de meu irmão.
— Rei Welt, achamos ele! — um soldado imperial exclamou, falando com um dispositivo em sua orelha — Sim, foi eliminado — continuou — Tem uma criança aqui.
Meu coração acelerava cada vez mais.
— Achou ele? — um outro soldado gritou
— Sim, mas tem uma criança aqui — apontando para mim.
— Deixa ela aí, o que uma criança pode fazer?
— Criança? Isso deve ter uns 15 anos.
— Continua uma criança — o soldado virou suas costas para mim — e eu não sou pago para matar criança.
Furioso, avancei pra cima dele, agarrando sua cintura.
— Desgraçado! — gritei dando socos em sua costela.
— Me solta, pirralho! — ele me balançava de um lado para o outro, tentando se livrar da minha ira.
— Aí, vai com calma — o outro soldado falou.
— Essa peste não me solta!
Em meio a confusão, imerso na raiva, eu mal escutava e conseguia processar o que eles estavam falando e tudo que me lembro, foi de ter sido arremessado para dentro da minha casa agressivamente. Minha visão estava turva e minha audição abafada, ao fundo escutei os passos corridos dos soldados se afastando e lentamente minha mente se apagou.
Acordei pouco tempo depois, com o som da água caindo em uma poça, olhei para o lado, recobrando os sentidos e memória, e me deparei com uma poça de sangue escorrendo pelo chão. Olhei para frente, um enorme buraco na porta da casa, que se estendia até a parede onde eu estava recostado, com um rastro de destruição no chão. Uma enorme dor atingiu meu braço direito repentinamente, não sei como ainda não havia me dado conta de que a poça de sangue ao meu lado era minha.
— AAAAAAAAAAAAAARGH! — foi minha única reação ao ver meu braço decepado.
Passei o resto da noite tentando estancar o sangramento em meio às lágrimas. Arrastei o corpo gélido do meu irmão até seu escritório, uma minúscula casa isolada da cidade, e o enterrei perto dali, sem mais raiva no coração, apenas a tristeza e a aflição. Fiquei parado de frente a porta do escritório por um bom tempo, tomando coragem para entrar. Quando finalmente passei pela porta, a primeira coisa que vi foi uma mesa cheia de papéis e alguns dispositivos que nunca tinha visto antes.
Me aproximei da mesa e comecei a fuçar o que tinha em cima, lembrando das últimas palavras do meu irmão. Em um dos papéis havia algo escrito de forma estranha, as palavras eram soltas e não pareciam encaixar-se umas nas outras
“Fontes, pessoas, magia, abundância, raça, operação, arcanas, armazenamento” tudo isso com marcações, setas e ilustrações.
O desenho que representava a palavra “operação” me chamou a atenção, sendo o mesmo símbolo que estava gravado no uniforme dos soldados Antarianos. Minha mente já estava repleta de perguntas, mas antes de ir atrás das respostas, juntei todas as coisas do meu irmão em uma velha mochila jogada ali. Após ter reunido tudo, vi em destaque na mesa uma escultura de metal, a mesma que havia dado para ele anos atrás. Com um rio de lágrimas no rosto, peguei a escultura pûs onde enterrei seu corpo, como uma lápide.
Desde então, dediquei minha vida a desvendar o mistério e objetivos que ele deixou para mim.
Ponto de Vista de Akira:
Poucos segundos restavam para que a bomba explodisse, meu amigo caído em uma poça do seu próprio sangue, Layla me abraçava com toda sua força para impedir que eu corresse dali, enquanto Welt, aquele que causou tudo isso, ria com sangue em suas mãos.
O contador enfim chegou a zero, a explosão não pôde ser evitada e comigo no meio, uma enorme torre feita de chamas se criou. Os tons vermelhos e laranja do fogo iluminava o céu noturno, a cada segundo que se passava meus pulmões se tornavam incapazes de puxar o oxigênio e o calor evaporava minhas lágrimas. Por um breve momento, senti um leve toque em meu braço e assim que olhei para o lado, avistei um rosto marcado nas chamas, com olhos brancos com uma tiara pouco acima deles.
— AAAAAAAAAAAAAAAAAAAARG! — um grito provido de uma dor ardente em meu peito.
As chamas repentinamente se extinguiram e meu corpo exalava um vapor denso, mas ainda assim eu escutava o som de labaredas ao meu redor. Ofegante, recuperando meu fôlego, olhei para minhas mãos envoltas por chamas azuis. Mal pude assimilar o que estava acontecendo, até escutar a risada sádica do careca desgraçado.
Ponto de Vista de Layla:
Desesperada, eu sugava todo o ar que tinha para meus pulmões, o calor era intenso e desconfortável, por um instante, até mesmo pensei que havia morrido, mas de alguma forma meu corpo estava intacto. A torre de chamas se dissipou de repente, deixando Akira envolto às chamas azuis, com uma tiara de fogo em sua cabeça estendendo-se com duas labaredas para trás. A ponta de suas roupas estavam levemente queimadas, porém, suas feridas estavam inteiramente curadas.
Ele se virou em direção à risada maléfica do rei antariano que se escondia atrás de um escudo de metal revestido pelo tungstênio.
— HAHAHAHAHA! Não tem como você estar vivo depois dessa explosão!
— Maldito… — sem nem olhar no rosto do rei, ele o amaldiçoava.
Akira andou lentamente em direção a Welt, deixando para trás suas pegadas de fogo azul.
— Não pode ser… HAHAHAHAHA! ISSO É IMPOSSÍVEL!
— Você falhou otário! — exclamei pondo a língua para fora.
— CALADA! — apontou sua mão afiada para mim.
— Já chega! — Akira surgiu de repente segurando sua mão.
O metal no pulso do rei começava a derreter e desesperadamente, ele tentou se soltar atravessando sua lâmina no estômago do seu inimigo.
— AKIRA! — gritei preocupada.
Sua expressão de desdenho se manteve inalterada. Ele agarrou o outro braço do rei e o retirou calmamente, e seu corpo, criado por chamas, voltou ao normal.
— Como uma criança conseguiu… — com a pura força dos braços, Akira torceu seus pulsos — ANHG! ARG! DESGRAÇA!
— Você já falou demais! — acertando um soco diretamente em seu rosto.
Seu corpo voou por alguns metros até a ponta do prédio, Akira bufou como um touro enfurecido e mais uma vez andou até o rei. Welt se levantou com uma densa fumaça sobre sua careca, confuso com o que acabara de acontecer.
Desesperadamente, ele tentava acertar Akira com seus golpes revestidos, mas todos foram esquivados facilmente. Meu amigo se movia levemente como o fogo, deixando um rastro flamejante por onde passava, fazendo seu oponente ainda mais confuso e vulnerável.
— Seu pirralho de merda! — gritou enquanto atravessava seu punho no rosto de Akira.
Sem o mínimo esforço, inclinou sua cabeça um pouco para o lado, deixando o braço inteiro do rei passar direto, e com uma expressão enojada, o segurou pelo rosto e o enfiou no chão.
— Angh! — sem mais ter o que fazer, Welt tentava resmungar com sua boca tampada.
— Seu reino de mentiras acabou. Você nunca mais vai tirar a liberdade das pessoas desse jeito, você nunca mais vai fazer uma única vida sofrer. Eu vou acabar com toda essa desgraça.
— E o que vai fazer? — livrou-se por um segundo — me matar?
— …
Após o silêncio assustador, sua garganta começou a queimar. Ele tentou proteger seu pescoço com o aço, mesmo assim, ele se derretia rapidamente.
— Você só pode tá brincando. Não importa se eu morrer aqui! AS PESSOAS VÃO CONTINUAR ACREDITANDO EM MIM!
— Cala a boca — aumentando a intensidade das suas chamas.
— SEUS ESFORÇOS SERÃO EM VÃO E AS COISAS VÃO CONTINUAR COMO ELAS SÃO! TENHO SOLDADOS DE CONFIANÇA AO MEU LADO!
Sem uma única palavra, suas chamas azuis cresceram sobre si. Ele continuava aumentando cada vez mais, forçando seu corpo ao máximo para suportar seu próprio calor.
— NO FIM, PESSOAS COMO VOCÊS CONTINUARÃO SOB MEU COMANDO! HAHAHAHA! VOCÊS NÃO PASSAM DE LIXOS!
— AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH! — As chamas enfim cobriram ambos, Akira gritava com a fúria em seu peito incinerando tudo ao redor.
Uma enorme fogueira cresceu até os céus em meio aos gritos desesperados. Com sua respiração pesada, segurava em seus punhos o corpo queimado do rei. Após o fogo abaixar, ele caiu de joelhos, o bastão pendurado em suas costas esfarelou-se no chão.
Eu não sabia o que fazer, apenas observei de longe suas emoções. O rosto de Akira fez uma expressão de alívio com um sorriso momentâneo que se desfez rapidamente. Seus lábios se entortaram em angústia, suas mãos tremiam enquanto cobriam seus olhos marejados e mais uma vez… Akira esbravejou suas emoções.
Um grito choroso que libertou todos os seus sentimentos guardados. Eu corri para lhe confortar, o envolvendo em meus braços, ele segurou minha mão com força caindo ainda mais em lágrimas.
Ponto de Vista de Saki:
De alguma forma, seu corpo não sofreu nenhum dano. O cabelo laranja do desgraçado continuava imóvel mesmo com todo o vento que nossos ataques geravam. De repente, seus braços e pernas começaram a exalar uma densa fumaça branca.
— O quê? Não agora! — ele gritou — NÃO OUSE FAZER ISSO AGORA, PIRRALHO!
— BLAM! — um estrondo ao meu lado.
Eu me distraí por um segundo e olhei para o lado, vendo uma pequena nuvem de poeira abaixando que revelou o corpo cansado de uma criatura quadrúpede tentando se levantar. Sua cabeça sangrava e seus membros também exalavam a mesma fumaça.
— Isso não vai ficar assim… — resmungou — você vai ver…
— Foi um golpe e tanto… mas não vai acontecer de novo — uma voz grossa disse do outro lado.
O túnica negra estava com metade da sua cabeça arrancada, nem mesmo sabia como ainda estava vivo. Em segundos, seu corpo desapareceu em meio a fumaça branca.
— GAROTA! — o garoto de cabelo laranja me chamou — VAMOS, ME DIGA SEU NOME!
— Não vou repetir, então é melhor que se lembre! — respondi com um sorriso arrogante — É Saki! Saki Nakamura.
— QUE FIQUE CLARO! NOSSA LUTA AINDA NÃO ACABOU, SAKI! — ele gritava enquanto seu corpo desaparecia — ENTÃO TREINE E FIQUE MAIS FORTE PARA ME MATAR! NÃO OUSE MORRER ANTES DISSO!
— Tsc! Não há a menor chance disso acontecer!
— HÁ! Bom saber — deu um sorriso assustador logo antes de sumir completamente.
O silêncio berrou no ambiente, a poeira baixava lentamente, enquanto a fadiga me atingiu no mesmo instante em que relaxei. Meus joelhos fraquejaram cansados e então fui ao chão, ofegante e com o suor pingando escorrendo no meu rosto.
— GAAH! — De repente, um grunhido dolorido.
— Shosuke? — Noelle correu até ele com o pouco de energia que lhe restava.
Suas marcas azuis desapareceram e seu olho esquerdo havia voltado ao normal. Juntei um pouco de força em minhas pernas e me levantei para ajudá-lo. Chegando mais perto, Noelle e eu vimos o corpo de Shosuke envolto por alguns tentáculos negros, ele parecia sofrer tentando conter sua consciência, mas não pedia por ajuda.
Noelle deu o primeiro passo para socorrê-lo, mas assim que o fez, ele interviu.
— Não venha! — exclamou.
O espadachim segurava sua espada com firmeza, concentrando suas forças nas mãos e fazendo os tentáculos regredirem à sua origem.
— Tsc… — deitando seus joelhos no chão — tá… tudo bem.
Minha preocupação se transformou em alívio instantaneamente, fazendo meus ombros caírem relaxados. Noelle, também com um suspiro aliviado, caiu.
— Isso foi cansativo… — disse após uma longa espreguiçada.
— É, deu pra aquecer o corpo — respondi — falando em aquecer… não devemos ir ajudar o Akira?
— Não… temos que ficar… e proteger a senhorita Layla — recuperando seu fôlego.
Mais uma vez, o silêncio ecoou.
— CADÊ A LAYLA? — gritamos juntas ao nos levantar rapidamente.
Nós corremos até o tanque de guerra que estava… completamente destruído.
— LAAAAAAAAAAAYLAAAA! — gritei desesperada.
A procuramos por todo o lugar, até mesmo debaixo do tanque, mas não a achamos de jeito nenhum.
— Tá legal, vamo pensar com calma. Morta ela não deve tá! — tentei ser otimista.
— Mas se ela tiver sido levada junta com os túnicas negras? Não consigo sentir a magia dela por perto.
— É uma garota de cabelo azul? — Shosuke perguntou com toda a sua serenidade.
— SIM!
— Ela e o Akira estavam no topo do prédio.
— Você os viu?
— Sim, mas não acho que tenham me visto.
Ambas olhamos para cima, vendo o grande buraco que ele havia feito no teto.
— Ele não é tão idiota ao ponto de não notar isso… — Noelle comentou.
— Não o subestime…
Subimos as escadas às pressas para chegar ao térreo, lá, Akira e Layla cercavam o corpo caído do seu companheiro, pouco distantes de uma pilha de ossos e cinzas.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.