Capítulo 62 - Tibir, A Ave Obsidiana
— QUE PORRA FOI ESSA! — Ranga e eu corríamos rapidamente em direção à explosão nos fundos da igreja.
— E EU QUE VOU SABER? — gritou de volta
— QUEM FOI QUE TIROU AQUELA PEDRA DO LUGAR?
— EU DUVIDO MUITO QUE TENHA SIDO ESSA MERDA!
Apressados, enfim chegamos no local da explosão. Uma área coberta por fumaça atrás da igreja, onde parecia haver um porão.
— Não é melhor ir ver seus amigos? — Ranga olhava para o pequeno lago na direção em que Akira e Gwen foram arremessados.
— Tenho certeza que eles vão ficar bem! Agora… — retraindo meu punho lentamente — vamos ver o que está acontecendo aqui!
Com toda a minha força, soquei a fumaça ao nosso redor, a dissipando e revelando uma grande sala abaixo de nós.
— Saki? — Noelle berrou olhando para cima.
— O que foi essa explosão?
— Eles estão aqui! — apontando para um círculo mágico no chão com um fraco brilho laranja o destacando.
Eu saltei para o seu lado, me preparando para a luta.
A nossa frente, enfim, pude ver o rosto dos nossos inimigos. Um deles, com as vestes tipicas de um rei, com seu manto excêntrico se arrastando pelo chão e uma coroa brilhante sobre sua cabeça. O outro, com uma aparência completamente diferente, possuía uma forma animalesca, seu corpo era envolto por penas marrons, por exceção do seu rosto, que era inteiramente coberto por penas amarelas.
— A negociação falhou?
— Nem nos deram a chance!
— Então vamos para o plano B — Ranga desceu em seguida.
Com arrogância no olhar, sempre com seu nariz empenado, o que se vestia como um rei ordenou.
— Tibir, dê um jeito nos outros dois — com sua voz velha e levemente rouca.
— Entendido, Mestre Ylir — rapidamente, em um único bater de asas, decolou para os céus.
— Tem certeza que não vai até eles? — perguntou novamente.
— Já te disse, eles vão ficar bem!
— Você fala como se pudesse nos derrotar, garota — disse alisando sua curta barba — Tibir consegue alcançar a velocidade do som em um simples bater de asas, além é claro, da sua habilidade única…
— É melhor se preocupar consigo mesmo velhote, 3 contra 1 não me parece justo!
— Ah, não se preocupe — uma voz desgostosa e familiar soou — ele não está sozinho.
Diretamente das escadas ao lado de Ylir, com uma densa aura e forte presença, descia um maldito desgraçado, um maldito rei que abandonou sua filha, Dário.
— Está atrasado.
— Tive alguns problemas com a assimilação, ainda estou me acostumando.
— Deve ser difícil para um humano…
— O que está fazendo aqui? — furiosa, Noelle interrompeu o diálogo.
— Isso não lhe diz respeito — respondeu friamente.
— Não me diz respeito? — as marcas azuis começaram a aparecer pelo seu corpo — Você usou a minha mãe como se não fosse nada! — nuvens de raios começaram a se juntar acima de nós — Me prendeu em um quarto escuro por anos! — suas mãos, envolta pelas garras trovejantes, tremiam com ódio — E AINDA POR CIMA DECIDE SE ALIAR A ELES?
— Ó… veja só você — a olhando de cima, com um tom arrogante — nem mesmo consegue usar suas garras naturais… é uma vergonha para o meu sangue…
— Sim… — limpando uma pequena lágrima que escorria pelo seu rosto.
— Lágrimas? Mais uma vez? Não se cansa de chorar como uma criança? — Dário ria, assim como um demônio.
— Eu queria que tivesse sido diferente…
— Já chega das suas lamentações! — impaciente, o rei disparou em direção a Noelle.
“BLAM!” em um piscar de olhos, minha amiga já estava ao lado de Ylir, com raios caindo a sua volta e um grande buraco na parede a sua frente.
— Que velocidade! — Ranga comentou surpreso.
— Pirralha insignificante… — Dário se levantava retirando as pedras que caíram sobre si — fique sabendo que não haverá uma segunda vez.
Ao baixar da poeira, no peito do seu pai, foi revelado dois cortes se cruzando, no mesmo formato de suas garras. Estranhamente, o sangramento parou de repente, deixando apenas uma cicatriz em seu peito. Seus pés eram tomados por sombras com uma aura levemente roxa, que em instantes, o fez arrancar rapidamente, arrastando Noelle com suas mãos.
O rastro de destruição foi deixado por um extenso e retilíneo caminho, cruzando por um grande lago e chegando até a floresta ali perto.
— Não deveríamos ajudar?
— Eu bem que gostaria, mas essa luta não é nossa. Além disso, pode ficar tranquilo, ela dá conta.
— Você bota muita fé nos seus amigos — comentou o único demônio restante.
— Eu já falei isso pra ela…
Por um momento, antes de me preparar para a luta, respirei fundo, apenas me concentrando em mim mesma. Minhas mãos estavam tremendo, eu me perguntava se aquilo era medo, mas não tinha tempo a perder com isso. Naquele momento, tudo que eu podia pensar era em ser mais forte. Eu deveria ser suficiente.
— Da última vez que estive cara a cara com um demônio, foi bem humilhante — comentei ao estalar os dedos — Fiquei os últimos dois anos pensando em como fui insuficiente naquele dia… e acho que agora é a hora de ver o quanto isso mudou! — erguendo meus punhos ansiosos.
— Ainda tem 6 favores… — Ranga lembrou enquanto sacava suas armas de dentro da sua sombra — não os desperdice.
— Relaxa, eu sei o que tô fazendo — meus punhos se envolveram em chamas violeta.
Concentrando a mana em minhas pernas, avancei em um único movimento em direção ao demônio.
— Chama Púrpura! — com um poderoso soco, atingi uma superfície tão dura quanto o aço, certa de que acertei o meu alvo.
O forte impacto do meu ataque fez com que uma intensa ventania circulasse pelo ambiente, jogando tudo pelos ares.
— Interessante… — com o baixar da poeira, senti meu punho sendo apertado — seria fatal para mim…
— O quê? — ouvindo a voz arrogante do demônio, não quis acreditar que o mesmo havia parado o meu golpe.
— Grrr… — um desconhecido soou entre nós.
— Acabe com ela — deu a ordem.
De repente, uma criatura humanoide, verde e musculosa se revelou atrás da cortina de poeira, erguendo o seu punho com uma intenção assassina.
— Saki! Afasta! — Ranga gritou.
Com um cilindro transparente, cheio de um líquido amarelo, acoplado em seu rifle, começou a atirar no monstro. As balas causavam um dano elétrico que corria por todo o corpo do bicho, o deixando levemente atordoado, mas mesmo assim, a criatura não largava o meu punho por nada.
— Nada que faça vai adiantar — o demônio dizia — esse pequeno demônio foi feito para ser tão resistente quando uma pedra de obscorunita, o minério mais resistente do submundo!
— Ah é? — aumentando um pouco mais a minha liberação de mana, comecei a erguer os dedos da criatura, libertando o meu punho.
Meus ombros foram tomados pelas labaredas de fogo da mesma cor vibrante da minha magia, que aos pouco me fazia subjugar o monstro. Rapidamente, com um chute em seu calcanhar, o fiz cair de costas para o chão, com uma grande abertura em seu peito.
Eu sentia uma energia caótica percorrer por cada centímetro do meu corpo, que ao acertar o meu punho em sua caixa torácica, gerou uma enorme onda de choque, transformando o grande corpo verde e musculoso do demônio em uma lama escura e pegajosa.
Limpando meu rosto da sujeira que fiz, olhei no fundo dos olhos arrogantes de Ylir, perguntando.
— É isso? — emanando toda a pressão mágica que possuía.
— Que seja! — era possível ver o suor frio em seu rosto ao saltar para trás — Era de se esperar! Uma cópia continua sendo uma cópia! — com um simples gesto de mão, mais da mesma lama escura foi surgindo do chão, se transformando lentamente em mais demônios dos mais variados tamanhos.
Ponto de Vista de Akira:
Em meio a uma densa floresta, eu abria meus olhos entre a poeira que cobria o meu redor.
— O que foi isso? — Gwen se levantou ao meu lado.
— Alguma coisa explodiu assim que chegamos perto daquele círculo mágico — batendo na sujeira da minha roupa.
— Temos que voltar logo! — ela correu rapidamente na direção oposta do rastro que deixamos no chão.
Acompanhando o seu ritmo, comecei a saltar entre os galhos da árvore, me impulsionando levemente com chamas em meus pés. Saindo da floresta, demos de cara com um vasto lago entre a floresta e a cidade, que em seu centro havia uma pequena ilha.
A Ilha possuía algumas palmeiras e pedras musgosas ao redor, deixando nítida a sua idade.
— Droga… — resmunguei vendo que não conseguiria atravessar o lago tão facilmente
— O que foi? Não consegue voar até lá?
— O problema é que voar até o outro lado com as chamas exige muita força e mana. Eu chegaria completamente esgotado.
— Hum…
— E se você…
— Nem pensar! — me interrompeu antes mesmo de começar a falar — Você é muito pesado pra carregar por tanto tempo.
Por um breve momento, em silêncio, ambos pensávamos em uma forma de chegarmos ao outro lado.
— Não tem como congelar a água do lago? Você consegue manipular a temperatura não é?
— Pelo mesmo motivo que você não pode simplesmente voar até lá. Congelar todo o lago custaria muita energia.
— Mas não precisa ser todo o lago, apenas a superfície!
— Já sei! — era possível ver uma lâmpada se acendendo sobre sua cabeça — Me segue!
Assim, quando menos percebi, estávamos caminhando sobre a água, em um pequeno caminho estreito que Gwen criava a sua frente com uma fina camada de gelo. Após alguns minutos, finalmente, um pouco ofegantes, chegamos a ilha do centro do lago.
— Deu certo! Agora só falta a outra metade! — a vampira exclamou olhando para a igreja já visível do outro lado.
— Espera aí, tem alguma coisa vindo! — observando um estranho borrão subindo aos céus, formando uma silhueta contra o sol.
— O quê? Aonde?
— Ali em cima!
De repente, uma onda de choque se formou entre as nuvens, a silhueta também desapareceu rapidamente, pouco antes de colidir com a ilha, levantando a poeira. Em seguida, um forte bater de asas dissipou toda a fumaça suja em torno da criatura, revelando sua aparência.
— Um homem pássaro? — perguntei ao ver seu corpo humanoide
— Eu acho que tá mais pra um pássaro homem.
— Qual é a diferença?
— Ele tem mais parte de pássaro do que parte de humano…
— É, faz sentido.
— ROAAAAAAAR! — um grito estridente destruía nossos ouvidos — Entreguem o Etheris… e provavelmente pouparei suas vidas…
— Tsc — balançando minha orelha, ainda com um zumbido em minha mente, contestei — Deu azar, sua ratazana de asa!
Avançando rapidamente para cima da ave, saquei o meu bastão das costas, o imbuindo em chamas. Com um movimento simples e direto, desferi uma estocada flamejante em seu peito.
O golpe gerou uma enorme labareda, levantando e misturando a poeira com a brasa da ponta do bastão. No breve instante que acreditei ter o derrotado facilmente, uma pressão avassaladora caiu sobre mim, como se centenas de elefantes estivessem empurrando meu ombro para baixo. Quando a poeira enfim abaixou, a criatura estava de pé ao meu lado, com uma pequena queimadura na região do peito.
— Tá falando sério? — com um sorriso nervoso, indo contra todo o peso que empurrava o meu corpo, comecei a liberar minha mana gradativamente, me adaptando a pressão mágica que ele exercia.
Girando habilmente minha arma levemente queimada, tentei atacá-lo com golpes incendiários repetidas vezes, mas o mesmo se esquivava de todos os golpes com facilidade. Por um curto momento, no qual baixei a minha guarda após um ataque, o demônio levantou uma de suas asas, descolando de si penas afiadas.
Seu movimento foi mais veloz do que pude raciocinar, meu corpo não conseguiria se mexer rápido o suficiente para desviar, porém, de forma ágil e bruta, Gwen atirou uma imensa pedra de gelo em sua asa, fazendo com que os estilhaços de seu ataque me dessem a chance de fugir.
— Ele é rápido demais! — reclamei ao notar as cinzas deixadas pelas extremidades do bastão inteiramente queimadas.
— É, mas acho que sei como…
Inesperadamente, um intenso vulto passou por nós em alta velocidade, sem nem ao menos conseguir entender o que estava acontecendo.
— O que foi aquilo? — a vampira perguntou chocada.
— Melhor não se distrair com isso! — vendo a ave prestes a atacar novamente — Ele tá vindo!
Na mesma velocidade que chegou, ele se atirou contra nós, com suas asas abertas e cortando o vento no caminho. Conseguimos evitar o corte no último segundo, mas antes mesmo de nos dar a chance de respirar, disparou suas penas afiadas em nós.
Mais uma vez, estilhaços de gelo voaram a nossa volta, impedindo que as penas nos perfurassem. Rapidamente, tomamos distância do nosso inimigo, tentando imaginar o que viria a seguir.
— Eu tive uma ideia… — ambos sussurram ao mesmo tempo.
— Você primeiro — guardando minha ideia para um momento posterior.
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