Índice de Capítulo

    — Fique longe! Não se aproxime de nós! — berrou Jéssica, empunhando, de forma ameaçadora, a Joia do Arcanjo.

    — Oh, calma aí, Freirinha. — Uma luz azulada, suave, cintilou entre os dedos de Lua, como gelo translúcido refletindo luz.

    — Que merda está acontecendo aqui?! — falou Renato.

    Mical se agarrou nele, buscando proteção e aconchego.

    — Aquela garota… ela é um espírito elemental. E atacou a gente.

    — Você…

    — Não! Espera! Eu… não quero confusão, certo? Só fui meio… mal interpretada por essas duas.

    — Mal interpretada? — Jéssica fez uma careta incrédula. — Você chegou atacando a gente lá no banheiro!

    — Eu só estava provocando vocês um pouco para aplacar meu tédio. Nada muito diferente do que a Clara faz sempre, não é? Pra falar a verdade, eu só estava vigiando vocês, para não atrapalharem, a pedido dela mesma. As coisas só saíram um pouco do controle.

    Lírica surgiu repentinamente, saltando do alto e caindo no parapeito da janela. Entrou no quarto.

    — O que estão fazendo? Agora não era a hora da Clara? — Ela ergueu uma sobrancelha. — Tô ouvindo a barulheira de vocês lá de cima. 

    Renato baixou a cabeça, pensando. Esse era mais um daqueles momentos em que não conseguia entender direito a situação.

    — Você, garota espírito elemental! Fale! O que está acontecendo! Por que está aqui?

    Lua recuou. Não queria dar mais nenhuma explicação. Depois de tudo, estava se perguntando o quão burros eram os humanos. Ainda assim, sair dessa situação não seria tão fácil. Porém…

    — Por que não perguntam para ela? — Olhou na direção da janela.

    E lá estava Clara Lilithu, com suas enormes asas negras e vermelhas abertas atrás de si; um par de chifres se projetando da lateral de sua cabeça. E uma aura negra em volta dela.

    Os estômagos de Jéssica e Mical, que tinham sensibilidade sobrenatural, chegaram a ficar gelados ao olhar para ela, e um arrepio subiu por suas espinhas. Não tinham dúvidas. Ali estava a personificação de uma criatura maligna, poderosa e arrogante.

    — Ora, por que brigam, servos meus? — Ela caminhava tranquilamente, em direção a eles. Seus olhos transmitiam uma tranquilidade ameaçadora. Aquele tipo de calma que te mataria e nem perceberia.

    — Servos? — Jéssica levou a palavra como uma ofensa pessoal. — Essa súcubo acha que manda em alguém? Não é porque lutamos juntas que eu não te exorcizo com o maior prazer, ouviu?

    — Exorcizar? — Clara riu. — Não seja boba! Não poderia me exorcizar agora nem se juntasse todo o Vaticano com você.

    — Então eu te corto na espada! — Jéssica grunhiu, com os dentes cerrados.

    Clara foi até Renato e acariciou seu rosto. Tinha um olhar terno, mas ainda assim dominador; quase como se ele fosse um bichinho de estimação.

    — Ah, Renato… fizemos um pacto agora há pouco, não fizemos?

    O garoto permaneceu em silêncio. Em parte, estava assustado com a nova aparência dela; em parte, maravilhado com a beleza estonteante que, de alguma forma, tinha ficado centenas de vezes maior e mais incrível.

    — Então, por que não manda essas garotas intrometidas saírem do quarto e nos deixarem a sós?

    — Mas… me explica… o que tá rolando?

    A súcubo, confusa, franziu o cenho. Não era o tipo de resposta que ela estava esperando.

    Decidiu reformular a ordem.

    — Mande essas garotas saírem daqui.

    Renato balançou a cabeça.

    É claro que não expulsaria nenhuma delas dali. Ele amava Clara, mas não atenderia seus caprichos egoístas dessa forma.

    — O… quê? Mas como? — A súcubo pareceu chocada.

    Todos se entreolharam. Talvez, buscavam as respostas nos olhares uns dos outros. Mas ela nunca vinha.

    Até que o silêncio foi cortado abruptamente pela gargalhada zombeteira de Lua.

    — Ha ha ha! Não acredito! Nem eu esperava por isso!

    — Por isso o que, piveta gelada?

    — Ah, Clarinha, você não percebeu?

    — Percebeu o quê, caramba?!

    — Renato. — A voz de Lua saiu adocicada e manhosa. — Por que não dá uma ordem para Clara? Aposto que ela vai curtir.

    — Uma ordem? Mas que tipo de…

    — Sei lá! Qualquer coisa! Manda ela fazer qualquer coisa!

    — Ah, deixa eu pensar…

    — Não seja ridícula! Eu sei que está pensando, mas não faz o menor sentido! Não tem nenhum precedente na história!

    — Clara, dê três pulinhos agora mesmo!

    — Pff! É óbvio que eu não…

    Ela pulou três vezes.

    Lua não conteve as gargalhadas. Precisou até limpar as lágrimas dos olhos.

    — Ai, que divertido! Espera só eu contar para a Soll! Ela vai adorar! Vai, Renato, dê outra ordem a ela!

    — Humm… Clara, vai e faça cafuné na cabeça da Mical.

    — Não seja ridículo! Uma súcubo como eu jamais faria uma coisa dessas! Eu tenho meu orgulho, sabia?

    — Ahem! — Lírica pigarreou e olhou na direção de Mical.

    Clara olhou na mesma direção e finalmente notou que seu braço estava esticado na direção da garotinha, e seus dedos entrelaçados nos cabelos ruivos, faziam carinho suavemente.

    A súcubo se eriçou como um gato acuado e pulou para longe. Ficou com as costas próximas da parede, numa atitude defensiva.

    — Uma maldição! Fui amaldiçoada a fazer cafuné na Mical! Grande Lúcifer, o que está acontecendo?! E vocês, fiquem longe de mim!

    — Ora, Clarinha, não seja tão reativa! — falou Lua. — Tá bem óbvio o que aconteceu aqui.

    — É bem óbvio, de fato.

    Todos olharam na direção da janela, que era de onde vinha essa última voz, e lá estava Belfegor, sobre o peitoril.

    Lírica, ao vê-lo, se afastou, dando um passo para trás de maneira inconsciente.

    O demônio recolheu as asas e pulou para dentro do quarto.

    — Gostou do meu presente, mestre Renato? Não tem vinho melhor do que aquele!

    — Não muda de assunto! — gritou Clara. — Como a gente desfaz isso?

    O demônio riu.

    — Não desfaz. Você deveria saber, mais do que ninguém, que os pactos envolvendo súcubos são para toda a vida. Mas que petulância da sua parte tentar tornar o Condutor seu servo! A natureza simplesmente seguiu em direção ao destino mais lógico.

    — Mas algo assim não pode acontecer! Nunca aconte… — Ela parou a própria frase, refletindo sobre o que estava dizendo.

    — Entendeu, né? Também nunca houve um Condutor antes, então as velhas regras não valem mais. Pra falar a verdade, acho que esse seria o caminho mais lógico. Pensa bem, o que são os Pactos senão entrelaçamentos de almas onde a alma mais forte ganha o controle? Acontece que na maioria das vezes, o demônio é a existência mais forte nos Pactos. Mas não aqui, aparentemente.

    Ele deu de ombros e continuou:

    — Aliás, você criou uma corrente tântrica, não criou? Conectou ele a todas essas garotas logo antes do Pacto ser firmado, então… existe a possibilidade…

    Lua abriu um sorriso.

    — Renato, dê uma ordem para Jéssica. E tem que ser algo que ela se recusaria a fazer, para termos certeza!

    O garoto franziu o cenho. Pensou por alguns instantes.

    — Tudo bem — disse a menina. — Se tiver acontecido, eu quero saber.

    Renato assentiu.

    — Jéssica, fale uma coisa constrangedora sobre você.

    — Eer… é… hum… bom… — Ela hesitou por um instante, mas seus olhos começaram a piscar de um jeito estranho, como tiques, e ela não aguentou mais segurar. — Eu queria ter sido a primeira! Eu falei que só queria proteger a Mical, e queria mesmo, mas eu também fiquei com um pouco de ciúmes! Eu queria ter sido a primeira garota a ter o momento com o Renato! Ah! Que droga! Eu acabei falando isso! Mas que merda! Jesus! Não! Eu não queria…! Droga! — gritou a última palavra.

    — É, acho que tá mais do que provado — disse Lua, achando aquilo tudo muito divertido. — Parabéns, Renato, você tem escravas agora!

    Ele levou as mãos à cabeça.

    — Eita porr…!

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