Índice de Capítulo

    Após entregar a profecia, Hoopoe virou as costas e caminhou até o corpo de Phenex.

    Se abaixou e se inclinou sobre ele, para pegá-lo e tirá-lo dali.

    Baalat se aproximou dela.

    — Em respeito a seu luto, eu demonstrei misericórdia dessa vez — disse a Primeira Princesa do Inferno. — Mas se faltar com respeito de novo, se eu sentir o mínimo de insubordinação na sua voz mais uma vez, eu te reduzirei a pedaços e jogarei seus restos no Gehenna para queimar pela eternidade. Entendeu, Hoopoe?

    Sem esperar pela resposta, Baalat se afastou e foi até sua irmã.

    — Leve-os para casa — disse ela, olhando na direção de Silas e Isa. — Cuide das coisas por aqui. Vou ficar ausente por alguns dias.

    — Pra onde vai, irmã?

    — Vou procurar nosso pai. Ele já se deu o luxo da indiferença por tempo demais.

    Baalat abriu as asas e voou para longe.

    Assim que a Primeira Princesa desapareceu além dos túneis, Angélica estufou o peito, orgulhosa e arrogante, mas seus cílios tremiam com tique nervoso.

    — M-muito bem! Agora vocês me devem obediência! Então, fiquem atentos às minhas ordens!

    Todos permaneceram em silêncio, esperando por quais ordens ela daria, mas Angélica não tinha nenhuma em especial. Pensou rápido, e falou a primeira coisa que veio à cabeça.

    — Você, humana! Faça brigadeiros! E todos os outros vão ajudar! Procurem pelos melhores ingredientes!

    Hoopoe abaixou a cabeça, indignada com a indiferença da garota. Pegou o corpo de Phenex em seus braços e também voou para longe.

    As sobrancelhas de Angélica tremeram de raiva.

    — Calma — Belfegor pôs a mão em seu ombro. — Ela só está abalada.

    — Humpf! Abalada ou não, ela deveria ter mais respeito pela realeza!

    — Precisamos ir para casa — disse Isa, se aproximando. — Baalat disse que nos levaria de volta assim que terminassemos por aqui.

    — E acho que já terminamos — disse Silas. — Então não temos mais motivos para continuar aqui nesse lugar…

    — Ãh, err… é…

    — Senhorita — disse Satanakia —, o exército está esperando por orientações. Vamos atacar ou não? O que faremos a seguir?

    — O que faremos? Ãh, bom… 

    — Além do mais — disse Irina —, os ingredientes para os brigadeiros só existem na Terra. Precisamos voltar para pegá-los, não é? E aí vai levar um tempo até eu conseguir juntar tudo o que for necessário.

    Clara sorriu, achando a situação divertida.

    “A pirralha humana está mentindo na cara dura pra Segunda Princesa do Inferno! Ela tem coragem.”

    — Tudo bem! Mas o senhor humano fica!

    — Impossível! — retrucou Irina. — Ele é meu ajudante de confeitaria. Sem ele, os brigadeiros ficariam tão ruins que seria apenas desperdício de chocolate.

    — O quê?!

    — Eu pessoalmente não me importo tanto, mas se você não liga de desperdiçar bons ingredientes produzindo doces ruins…

    — Não! Eu quero aqueles brigadeiros perfeitos!

    — Então o Renato precisa voltar comigo.

    — Parece que não tem jeito mesmo… — Angélica coçou a bochecha, em dúvida sobre o que fazer.

    — Por que não fazemos assim: eu e meu irmão voltamos pra casa, e lá a gente reúne todos os ingredientes necessários, e aí a gente faz os brigadeiros mais incríveis e saborosos de todos, e depois te chamamos para poder ir comer? O que acha?

    — Parece um bom plano…

    — Não precisa me levar! — disse Clara, com arrogância na voz, e abriu as asas. — Eu mesma posso voar para fora usando minha chave! E também posso levar o Renato comigo.

    — Eh, então… — O garoto coçou a bochecha. E nas costas dele, sombras se curvaram e se contorceram, formando um par de asas negras, ondulantes feito névoa.  — Eu acho que posso voar para fora também.

    Irina ficou tonta. Era coisa demais para a cabeça dela processar.

    — Ótimo — disse Lírica. — Eu, como sou a noiva do Renato, vou ser carregada para fora do Inferno nos braços dele. Essa menina — apontou para Irina — pode ir junto de Clara.

    — Ei! Eu não concordo com isso, não! Eu sou a irmã dele! Então quem vai com ele sou eu, obviamente! Você vai com a demônia!

    — Eu que sou a noiva. Então, claramente tenho prioridade.

    — Sua lógica não faz sentido! A prioridade é claramente do familiar consanguíneo.

    — Você nem tem o mesmo sangue que ele! É irmã adotiva!

    — E você é uma prostituta adotiva!

    No fim, Renato teve que carregar as duas.


    Hoopoe sobrevoava o Inferno, atravessando as nuvens tóxicas e mal cheirosas de Cloro e Dióxido de Enxofre.

    Sua aparência era a do pássaro feito de ossos e pele em putrefação. Nas garras, carregava o cadáver de Phenex, como uma harpia carregando um camundongo.

    Do bico pontiaguda e curvado, saía um grasnado lamentoso, agudo, do tipo que irrita os ouvidos.

    Porém, algo interrompeu seu voo.

    Uma bola de energia, na cor amarelo-limão, cruzou o céu, caindo de cima para baixo, e bateu contra o dorso do pássaro cadavérico.

    Com o impacto, Hoopoe deixou Phenex escapar de suas garras, e ele caiu em direção ao chão.

    Hoopoe se desequilibrou e girou no ar.

    Um segundo ataque a atingiu no franco direito.

    Ela despencou, feito uma estrela cadente, e abriu uma cratera no chão quando caiu.

    Se levantou. Não era mais o pássaro de ossos, mas uma garota dos olhos muito negros. Um filete de sangue escorria de um arranhão no rosto. A poeira se levantou, se misturando à névoa densa. Era difícil enxergar um palmo diante do nariz.

    Farejou, puxando para os pulmões aquele ar poeirento, tentando identificar a origem dos ataques.

    Ouviu um som agudo e de pouquíssimos decibéis. Um tinido suave de lâmina cortando o ar.

    Ela se moveu rapidamente, para trás, tentando evitar ser atingida. Posicionou os braços diante de si, numa posição defensiva.

    E a lâmina cintilou diante de seus olhos.

    Uma dor aguda atravessou seus braços.

    Tinha sido apenas um arranhão, mas ele queimava como se estivesse cheio de ácido sulfúrico, e a ferida estava tomando um tom negro, e aumentava de tamanho.

    Hoopoe sabia quem era o demônio que poderia causar um ferimento daqueles.

    Pousou a mão sobre a ferida e a curou.

    Pensou rapidamente nas estratégias que poderia tomar. Era impossível para ela vencer Syrach, aquele que liderava a Legião de Atormentadores.

    Decidiu o que deveria fazer, mas…

    — Nem adianta fugir — Syrach surgiu em meio à névoa, caminhando tranquilamente. Usava uma armadura negra tão polida que poderia ser usada como espelho, e as asas em suas costas eram da cor amarelo limão. Segurava uma espada longa nas mãos.

    — Syrach! O que significa isso?! O que está fazendo?

    O demônio deu de ombros.

    — Eu tenho um recado de Lúcifer pra você, Hoopoe. O Portador da Luz não tolera insubordinação.

    — Insubordinação?!

    — Acha mesmo que Ele deixaria a Primeira Princesa no comando, mas não vigiaria tudo de longe? Os olhos de Lúcifer veem tudo! Ele sabe de tudo, Hoopoe. Inclusive do tom insolente que você usou mais cedo.

    A garota analisou o ambiente em sua volta. Teria de ser rápida. E se moveu numa velocidade que seria impossível para olhos humanos acompanharem.

    Mas para o General dos Atormentadores não foi problema.

    Ele a alcançou e mergulhou a lâmina na barriga dela, e com um golpe violento, a afundou no chão.

    Então sussurrou em seu ouvido:

    — Você vai tirar umas férias nas Prisões Subterrâneas de Enxofre. Será catártico!

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