Índice de Capítulo

    Renato se aproveitou do vacilo de Peste, logo após ser atingido pela espada, e voou para cima do cavaleiro.

    Diminuiu a distância entre eles rapidamente.

    Ainda no meio do caminho, disparou mais uma bola de fogo negro.

    Assim que bateu no peito de Peste, ela liberou uma poderosa onda de choque, e uma pilastra de chamas da cor da noite se ergueu, e o som de explosão reverberou.

    Os Putrefatos, que ainda não viam Renato, se agitaram. Tremulavam as asas e movimentavam suas armas de ossos, enquanto emitiam um som que lembrava um enxame de vespas.

    Assim que alcançou Peste, Renato preparou um soco.

    Nunca em sua vida deu um soco com tamanha vontade.

    Mas algo o impediu.

    Dedos longos e esqueléticos o pegaram em pleno ar, e o toque foi mais gelado do que gelo, e sua visão esmoreceu.

    E Renato foi lançado para alto.

    E enquanto girava no ar, foi atravessado por mais uma flecha.

    Sangue saiu de sua boca.

    Ele girou por um tempo no ar, antes de cair sobre o concreto duro.

    Peste abriu um sorriso asqueroso.

    O arco estava em sua mão.

    — Ah, Renato… é uma pena matá-lo, mas esse foi o caminho que você mesmo escolheu. Que tal…

    Enquanto Peste pensava em qual doença lançaria contra Renato dessa vez, ele se distraiu e não viu a espada voando, pela segunda vez, em sua direção.

    Seus sentidos aguçados até lhe avisaram, e ele tentou desviar.

    A lâmina negra raspou em sua bochecha, abrindo um corte e derrubando várias baratas no chão.

    As moscas que voavam sobre a cabeça de Peste, como uma coroa de podridão, zuniram em protesto.

    E de longe, mesmo caído, sangrando, Renato lhe direcionava um olhar triunfante.

    O garoto sabia que se algo podia ser ferido, também podia ser morto!

    — Arg! — O Cavaleiro gritou de ódio. — Vou quebrar essa coisa!

    Ele voou até a espada, que tinha se cravado numa parede do prédio, e a puxou.

    Não pôde evitar de admirar, mesmo que por alguns segundos, aquela lâmina negra, tão polida que mostrava perfeitamente seu reflexo, como um espelho,  e os vários espinhos que se projetavam do cabo.

    Com as mãos nuas, o cavaleiro quebrou a espada em duas partes.

    E foi como se o aço tinisse em agonia.

    Mais uma vez, Peste curvou os lábios, mostrando aqueles dentes podres.

    — Pronto. Resolvido. Espadas do Pecado não voltam quando são destruídas.

    Confiante de que a luta já tinha terminado, ele posicionou seu arco.

    Mais um tiro e tudo estaria terminado.

    A flecha dourada brilhou entre seus dedos.

    É mais uma vez a espada de Renato o atingiu.

    Teria cravado-se em seu peito, se o cavaleiro não tivesse sido rápido o suficiente para desviar.

    No entanto, a lâmina rasgou o belo terno branco, e um arranhão, com um discreto filete de sangue, pôde ser visto do peito esquerdo até o ombro direito.

    Renato abriu um sorriso e, reunindo toda a força que tinha, se levantou.

    Todo seu corpo doía. Mal havia ar em seus pulmões. Sempre que respirava, ouvia um tenebroso som de ranger.

    As bolhas erupcionadas em sua pele expeliam sangue e pus, e latejavam como o inferno.

    Mas mesmo assim ele riu.

    — Já matei uma boa quantidade de bastardos que se achavam mais fortes do que eu. E todos eles fizeram esse mesmo olhar que você tá fazendo agora. O mais puro choque.

    — Não seja idiota! Só porque tem duas espad…

    — Não. É a mesma.

    Novamente sua lâmina negra surgiu em sua mão, renascida de uma névoa escura e gelada. Os espinhos no cabo arranhavam sua mão. 

    — Isso é impossível. Espadas do Pecado não tem vida infinita.

    — A minha tem.

    Peste riu.

    — Neste estado em que está, mal consegue ficar de pé, garoto. Foi atingido por tantas flechas… tem tantas bactérias, vírus e deformidades em seu corpo agora, que é só questão de tempo até você colapsar. Não importa se vencer a luta. Vai morrer de qualquer jeito.

    Renato assentiu.

    — Talvez seja verdade. Mas mesmo que eu morra, vamos nós dois para o Inferno!

    Peste guardou seu arco nas costas, e ele desapareceu numa névoa cinzenta feito fumaça.

    Em seguida, o cavaleiro mostrou suas unhas. Longas e afiadas. Eram como perfeitas extensões daqueles dedos esqueléticos.

    — Então vem brincar!

    Renato avançou sobre ele. Moveu a espada lateralmente, almejando partir aquele corpo pútrido ao meio. Um corte perfeito, dividindo o tórax em dois.

    Mas as unhas de Peste interceptaram sua lâmina. Foi como atingir aço. A energia do impacto fez o punho de Renato vibrar.

    E o contra-ataque do cavaleiro não demorou.

    Com a outra mão, ele direcionou aquelas unhas. Os dedos, unidos, formavam um tipo de ponta, que se projetava em direção ao abdome de Renato.

    Mas o garoto também era ágil, e bloqueou o golpe com a parte mais larga da espada. E então, saltou, e do alto mandou mais uma bola de fogo negro.

    Peste a segurou usando as duas mãos. Dessa vez, não conseguiu disfarçar a dor e deixou um gemido escapar por entre os lábios.

    A pele da mão queimou, e as baratas corriam pelo braço dele, tentando se afastar daquela bola negra.

    Os ratos em sua sombra guincharam e também se agitaram. Era como se as pragas que o acompanhavam também sentisse a dor do golpe.

    Renato, sem perder tempo, ainda do alto, moveu a espada, visando atingir a cabeça do cavaleiro.

    Peste esmagou a bola de fogo negro em seus dedos e girou o corpo para o lado, evitando ser atingido.

    Pensou ter tido sucesso, mas…

    — Mais uma gotinha de sangue? Pretende me matar, arranhão por arranhão? — disse Peste, ainda mantendo o ar de superioridade.

    Renato deu de ombros.

    — Uma hora, consigo arrancar sua cabeça.

    — Não seja ridículo! Anjos e demônios já tentaram. Você é só um ser humano.

    — Mentiras… numa hora dessa?

    — Não é mentira. Olha só pra você! Dá até pena de olhar. Seu corpo vai sucumbir antes do meu, Renato. Sabe disso.

    Renato esboçou um sorriso.

    — Vocês me queriam no seu grupo por um motivo. Nenhum de vocês teve força para abrir caminho pelo Gehenna, mas eu tive. Você sabe que eu posso ser tão forte quanto vocês… talvez até mais. Então nem adianta vir com essa sua hipocrisia.

    — Tão forte quanto eu? — Peste curvou os lábios. Os ratos em sua sombra estavam mais agitados do que nunca, e as baratas em seu rosto pareciam enlouquecidas. — Mas eu nem comecei a aquecer ainda.

    O vento pareceu soprar diferente. O cheiro de azedo e podridão ficou ainda mais intenso. Era como um miasma, do tipo que carrega doenças mortais.

    Renato segurou firme em sua espada e fechou a guarda, se preparando. Mas nem ele poderia imaginar a natureza do ataque que se aproximava.

    — Dos pântanos e esgotos — disse Peste —, aquela que traz a morte, que sucede a guerra e provoca a fome. O verdadeiro juiz do caráter dos homens… Que a imundice recaia sobre você!

    E das sombras do cavaleiro, os ratos saíram, como uma horda terrível de pestilência. E as baratas os seguiram, centenas, talvez milhares de insetos.

    E os mosquitos e moscas os acompanharam.

    E todos esses animais fluíram em onda em direção a Renato.

    O garoto, um tanto atônito, deu alguns passos para trás.

    Chutou os primeiros ratos que chegaram até ele, e pisou em algumas baratas.

    Mas eram muitos. E não paravam de chegar.

    Baratas começaram a subir pelas suas pernas, e os mosquitos e moscas zuniam em volta de sua cabeça.

    E logo recebeu a primeira mordida de rato, próximo ao calcanhar.

    Enquanto tentava se desvencilhar, chutando, pisoteando, Peste aproveitou para preparar mais uma flecha.

    — O mal do século 21. — Ele abriu um sorriso. — Depressão.

    A flecha acertou em cheio a testa do garoto.

    E tudo o que Renato sentiu foi um choque no fundo do cérebro.

    E então ele caiu no chão.

    E os ratos e baratas lhe cobriram completamente, como um cobertor negro feito de centenas de milhares de patinhas úmidas e pegajosas, e as criaturas rastejantes caminhavam sobre ele. Não havia centímetro quadrado de pele que pudesse ser vista.

    Moscas entraram em seu nariz; baratas passavam por sua boca; ratos mordiscavam seus dedos.

    Em meio a tanta nojeira, ficou difícil respirar. A sensação de sufocamento era angustiante.

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