O desespero tomou conta de Hitomi, que olhou para as chamas crescentes que tomavam o perímetro onde estavam. Não havia possibilidade de fugir. Cercadas, a abordagem agressiva e fria de Yesenia deixava claro que não sairiam dali ilesas. 

    O fogo se aproximava cada vez mais de Megumi e Hitomi. As duas já não sabiam mais o que fazer. Foi quando de repente, uma forte enxurrada de água atingiu as labaredas.

    — MEGUMI, TUDO CERTO? — perguntou Naoko.

    — Yey! Apaga tudo! — disse Akiko.

    A rival observou a chegada da nova Potentia, “Mas… que sorte, duas Potentia se reuniram aqui!”, pensou.

    A animação durou pouco, logo as meninas tiveram uma nova surpresa. A água que Naoko havia lançado não havia surtido efeito algum, o fogo continuava alto e se aproximando.

    — QUE FOGO É ESSE QUE NÃO APAGA? — exclamou Naoko.

    — QUEM SÃO VOCÊS? — perguntou Hitomi, olhando para Naoko.

    — Por favor, Hitomi, se acalme, são minhas amigas — interveio Megumi, tentando manter a calma, apesar de toda a tensão.

    — COMO? — perguntou Hitomi, enquanto o contexto ficava mais complexo.

    — DEIXA ISSO PRA DEPOIS, CADÊ A POTENTIA DE FOGO? — Naoko continuou focando no perigo iminente.

    Longe de toda aquela confusão e gritaria, a Potentia de Fogo permanecia serena observando o desespero das garotas. As chamas agora faziam um círculo, contornando as meninas e encurralando-as aos poucos.

    “Ela parece tão tranquila com essa situação!”, pensou Hitomi. “Que droga, Yesenia… esse é o fogo que vi na casa de Esther.”

    Hitomi aproximou-se com cuidado das chamas e esticou os dedos. Ao fazer isso, o fogo se ergueu, atingindo e queimando as pontas.

    — AH! As chamas subiram quando tentei atravessar a mão. Ela deve ter uma maneira de controlar a distância.

    As brasas continuaram a se aproximar, vagarosamente, cada vez mais altas. A apreensão tomava conta das meninas que se viam presas naquele círculo.

    — Ah não, vamos virar churrasco! Moça, eu não devo ter gosto bom. — Akiko  choramingava.

    — Mantenham a atenção! — ordenou Naoko.

    — As chamas estão se aproximando — disse Hitomi, com medo.

    Muito satisfeita, com um sorriso dissimulado no rosto, Yesenia assistia ao nervosismo das garotas, que agora estavam de frente para a morte iminente. “Logo vão ser só os gritos de desespero…”, pensou, sem nenhum arrependimento.

    As labaredas atingiram uma altura que as impossibilitava de qualquer fuga. Agora seria só esperar que elas morressem carbonizadas. 

    Numa tentativa desesperada, dois feixes de luz saíram do meio do fogo e atingiram os olhos de Yesenia. Ela gritou de dor, havia sido pega no susto. Seus olhos ardiam e apresentavam um leve grau de cegueira.

    O golpe fez com que ela instintivamente parasse o uso de seu poder, dando tempo e espaço para que as meninas tentassem se salvar.

    — Apagou! A distração ajudou! — concluiu Naoko, que havia pedido para Megumi utilizar seu poder de luz.

    Depois disso Akiko utilizou sua Potentia. Cristais se formaram à sua volta, e ela os organizou e enviou em direção a Yesenia. Eles se uniram e se fundiram, criando uma espécie de gaiola, prendendo-a em um espaço apertado, não permitindo que ela utilizasse sua Potentia de fogo.

    “Um invólucro de cristal? Droga… Elas se aproveitaram da minha distração!”, pensou quando a cegueira momentânea passou. Ela batia nas paredes, procurando um lugar que fosse mais frágil ou que abrisse. “Estou presa! Isso não quebra!”

    Do lado de fora, Megumi, Hitomi, Naoko e Akiko estavam seguras, porém não tranquilas.

    — Tá! Parece que funcionou! Mas vamos interrogá-la? — perguntou Hitomi.

    — E VOCÊS ACHAM QUE ELA VAI QUERER COOPERAR? — respondeu Naoko.

    — Naoko… aquilo é… — Megumi segurou o braço da amiga, interrompendo a discussão e apontando em direção ao invólucro.

    Por um pequeno espaço da gaiola de cristal, chamas saíam com intensidade. Yesenia, como uma última opção, tentava derreter o cristal com o fogo que gerava.

    — ELA TÁ TENTANDO SE MATAR! — exclamou Akiko. — O QUE EU FAÇO? SOLTO ELA?

    — QUE?! NÃO! SE SOLTAR, ELA VAI TENTAR NOS MATAR, DE CERTEZA! — disse Naoko.

    O cristal que prendia a rival começou a perder força e rachar. O fogo não parava, e parecia aumentar mais sua intensidade.

    A gaiola de cristal se tornou fina e, de repente, foi possível ouvir o som agudo dos estilhaços se rompendo.

    Em meio à fumaça e cacos, era possível ver a silhueta de Yesenia se levantando com dificuldade, respirando de maneira ofegante. Caminhou um pouco e se apoiou em uma árvore próxima. Estava com dificuldade de se manter de pé. 

    Parte do lado esquerdo do rosto dela estava com marcas de queimaduras. Seu braço, sua mão e outras partes do corpo apresentavam marcas do fogo. Seu vestido também havia se queimado e agora já não a cobria mais direito, de tão deteriorado que se encontrava.

    “Droga… eu perdi… energia… demais…”, pensou, enquanto aos poucos um portal foi se abrindo e ela desapareceu, sendo tomada pela luz.

    — ELA TÁ SUMINDO! VAI FUGIR! O QUE TÁ HAVENDO? — exclamou Hitomi, cada vez mais confusa. — MAS…

    A modelo se virou, assustada e encarando as demais.

    — VOCÊS VIRAM ISSO TAMBÉM, NÃO VIRAM?

    — Senhorita Hitomi, eu posso tentar explicar — disse Megumi.

    — ACHO BOM QUE POSSA MESMO, E AGORA!

    — Megumi, vamos na frente para falar com Sayuri. — informou Naoko, indo embora junto com Akiko.

    — Certo, Naoko! Vou com Hitomi.

    Hitomi observou as duas indo embora e se virou para o lado contrário, em direção à sua casa.

    — Tá, vamos logo, não é só pra mim que você tem que se explicar — convidou, aparentando estar um pouco mais calma, apesar de ainda visivelmente tensa.

    Hitomi e Megumi seguiram juntas, sem nem trocar uma palavra durante todo o trajeto. As duas chegaram ao edifício, subiram pelo elevador e foram até o apartamento em silêncio. Foi então que Hitomi destrancou e abriu a porta com força, batendo e fazendo barulho com o impacto. A calma era apenas aparente, a modelo continuava fervendo de raiva.

    Dentro do apartamento estava Nami, que havia montado sua área de pintura na sala de estar. Ela pintava com aquarela em um cavalete que segurava o papel especial. Seu rosto já estava manchado de tinta, assim como suas mãos e parte de seus braços. Já acostumada com o temperamento de sua esposa, ela simplesmente olhou para trás e a cumprimentou:

    — Hitomi!! Finalmente! Tá tarde!

    — NAMI, QUE BAGUNÇA É ESSA? VOCÊ TEM QUE PINTAR PELA CASA INTEIRA?

    A reação da veterana indicava que aquela era uma situação comum no dia a dia das duas. Ela colocou seus pensamentos para fora sem ao menos controlar o volume de sua voz.

    Nami, de muito bom humor, foi com seus longos cabelos azuis balançando em direção à Hitomi para abraçá-la.

    — Para de ser chatinha! Depois eu arrumo, você sabe.

    Hitomi precisava ter uma conversa séria e não a abraçou de volta. Ao fundo, Megumi continuava apenas observando a situação sem dizer uma palavra. Foi então que Nami percebeu a presença da terceira pessoa na sala.

    — Ei… que mulher bonita. Quem é?

    Logo os olhares de Nami se voltaram para sua esposa, sua expressão agora era de deboche e seu tom de voz, irônico:

    — Vai me trocar por ela?

    — Vou! Ela não faz bagunça.

    — Ah! Não se preocupe! Somos apenas colegas de trabalho — justificou Megumi.

    Nami achou a reação engraçada e riu de leve. Ela soltou Hitomi e se dirigiu em direção à cozinha.

    — Eu sei, eu sei! Entrem! A cara de vocês está horrível! Você demorou tanto, que Hana não aguentou e foi dormir.

    — Prepara um chá que o babado é longo — ordenou, ignorando tudo o que Nami havia dito.

    Nami foi então até a cozinha para preparar chá de frutas vermelhas. Enquanto isso, Hitomi se sentou em uma poltrona, e Megumi, no sofá ao lado. A decoração da casa era clássica, com mobília feita de materiais do mais alto padrão. O cheiro de móveis novos indicava que foram comprados há pouco tempo. A mesinha de centro era de madeira e seu design era moderno. Havia vasos de plantas e alguns quadros adornando o ambiente.

    — Esta é a minha esposa, Nami, e tenho uma filha de 6 anos que se chama Hana — apresentou Hitomi, apoiando seus cotovelos nos joelhos, aliviando a tensão do momento antes de realmente entrar no assunto.

    — Que graça! Quem sabe ela e Matsui possam ser amigas. É uma menina de 6 anos, irmã da menina de cabelos lilás — disse Megumi.

    O chá ficou pronto e Nami sentou-se no braço da poltrona onde Hitomi estava e a observou atentamente.

    — Sua roupa está chamuscada. O que houve?

    — Fomos atacadas. Minha aprendiz, Megumi, que vai explicar.

    — Atacadas?

    — Eu, explicar? Mas…— Megumi ficou nervosa, mas logo deu uma pausa e respirou fundo. — Bem… fomos atacadas por algo… diferente do comum… que se chama Potentia…

    Nami se espantou com as palavras da moça, segurou suas emoções, refletiu rapidamente e perguntou:

    — Quer dizer que nossos poderes se chamam Potentia?

    — Nossos? — Megumi se espantou.

    — Eu, Nami e Hana desenvolvemos essa “Potentia” uns meses atrás. Mas não tinha usado contra alguém, até hoje… O que aquela mulher queria?

    — Peço desculpas, mas talvez eu não seja capaz de responder todas as dúvidas. O que posso dizer é que temos recebido ataques depois de termos chegado a este planeta. Não sabemos os motivos, mas este foi o mais violento que ocorreu. — respondeu  Megumi, apreensiva.

    — CHEGAR NESTE PLANETA? COMO ASSIM? VOCÊ É UMA ALIEN? — perguntou Hitomi.

    — Senhora Hitomi, apesar de ser o nome técnico, não acho muito educado… Mas é, viemos de outro mundo — comentou, um pouco sem graça. “Se bem que o nome técnico seria extraterrestre”, pensou.

    — Ela te deu nos dedos, hein! Se acalma um pouco — disse Nami com sarcasmo. — Mas bem, ter poderes já não é algo normal, vir de outro mundo até parece tranquilo.

    — Tranquilo?

    — E já tá tarde, para de gritar!

    — Olha, nós não sabemos o por que de termos vindo pra cá, mas isso com certeza afetou… o funcionamento daqui, e já sabemos que novas usuárias de Potentia vão aparecer… — disse Megumi, tentando deixar as informações um pouco mais claras.

    Hitomi encarou Megumi e, com um tom sério, desabafou.

    — Megumi, eu fui abandonada pela pessoa que amava quando estava grávida. Vi minha carreira ruir e vários amigos sumirem. Nami foi a pessoa que me fez voltar a confiar em alguém. Então, qualquer um que se meter ou tentar machucar minha família, vai ter o troco.

    — Compreendo sua vontade de proteger elas. Para ajudar a compreender melhor, vou convidar vocês para conhecerem as outras Potentia. Acredito que vão se sentir mais confortáveis — explicou e logo olhou para o relógio. — Hitomi, agora eu vou precisar me retirar. Já está tarde.

    — Está mesmo, vou te acompanhar.

    As duas seguiram juntas, Hitomi abriu a porta, mas, antes de liberar a passagem, hesitou:

    — Ah, Megumi…

    — Hm?

    — Espero que não tenha achado estranho eu ser casada com uma mulher.

    Megumi abriu um sorriso carinhoso e respondeu docemente:

    — Hitomi… Não há nada de errado em pessoas que se amam.

    Finalia

    Em uma sala de cores escuras e com decorada com quadros assimétricos, Yesenia estava bastante machucada, passando uma espécie de creme em seus ferimentos. 

    Yesenia se esforçava para conter seus gemidos de dor, mas sua expressão não conseguia disfarçar seu sofrimento. Enquanto ela se concentrava em se curar, uma figura jovem surgiu silenciosamente no vão da entrada.

    A figura se aproximou mais dela, se revelando ser um adolescente de 15 anos, de estatura alta, porte atlético, cabelos alaranjados, na altura do pescoço e olhos azuis. O jovem vestia camisa simples de algodão e uma calça jeans reta. 

    Ele percebeu que algo havia acontecido e olhou para o que ela estava fazendo, quando se deparou com as queimaduras graves, se assustou:

    — CREDO, YESENIA! O QUE VOCÊ ANDOU FAZENDO? COMO QUE SE QUEIMOU?

    Yesenia apenas o encarou com irritação e desprezo.

    — Tá, mal ae. Só me assustei, não precisa me ignorar — disse o rapaz.

    — O que quer Adonis?

    — Diz aí… são fortes mesmo?

    — Não como imaginei, os relatos de Rosália foram exagerados. Mas juntas trabalham bem, e havia poderes não mencionados.

    — Entendi, tenho que me planejar melhor então.

    — Por que a preocupação? Foi chamado?

    — Fui.

    Apoie-me

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (3 votos)

    Nota