10 de março – Colégio

    Os estudantes, em especial os adolescentes, já são naturalmente barulhentos. Nesta manhã, porém, a conversa passou dos limites. Seguindo pelo corredor do térreo, na sala 202, da turma do segundo ano do ensino médio, os alunos não paravam quietos. O burburinho era tanto que mal se compreendia o que era dito. Havia uma comoção muito grande vinda de lá. 

    Praticamente surtando, sentindo o seu sangue subir à cabeça, estava a professora de Biologia. Uma mulher de estatura média que utilizava óculos, com seus cabelos castanhos claros e presos, normalmente tinha muito bom humor, o que não estava acontecendo naquele dia:

    — SILÊNCIO! PRESTEM ATENÇÃO! SENTEM AGORA OU VOU MARCAR PROVA PARA A PRÓXIMA AULA!

    Aquele era o seu último recurso, nada poderia ser mais efetivo do que uma ameaça de fazer prova com pouco tempo para estudar. Os estudantes, principalmente as meninas, voltaram sua atenção à professora, incomodadas.

    — AI PROOOO…. Mas o aluno novo nem se apresentou.

    — A gente tem que conhecer ele néeeeeeeeeee…

    “A audácia”, pensou a professora enquanto arrumava seus óculos, sem poder responder às provocações. Sem ter mais recursos, decidiu que seria melhor ceder para não se incomodar mais do que já estava.

    — Tá, se levante e se apresente, aluno…

    Sentado na carteira de maneira desajeitada e com a cabeça baixa, estava um jovem ruivo, claramente irritado com as garotas de pé à sua volta. Com o comando da professora, ele se levantou e foi até a frente da classe e olhou para a turma, com sua postura reta, porém tensa.

    — Oi, eu sou o Adonis.

    Após se apresentar, voltou para a sua carteira, decepcionando as mais curiosas da sala, que se perguntavam o porquê de ter sido só uma pequena resposta. A professora fez um sinal positivo para ele, agradecida que tudo se resolveu rapidamente.

    — Perfeito! Obrigada e bem-vindo, quem quiser saber mais, entrevista ele no recreio.

    Não desistindo, as meninas continuavam a olhar para ele. Sussurravam comentários diversos, obcecadas com a aparência física de Adonis.

    — Que lindo! 

    — Que gatinho!!! 

    — Um Deus grego! 

    — Pegava! 

    “MAS… QUE PORCARIA DE COMENTÁRIOS SÃO ESSES?”, pensou o ruivo, apavorado.

    Os primeiros três períodos de aula passaram num piscar de olhos. O aluno novo era o maior motivo de comentários na escola. O sinal tocou e as turmas foram para o intervalo.

    Naquela manhã, diferente de todas as outras, Aino estava radiante de tanta felicidade. Ela seguia caminhando pelo pátio da escola como se flutuasse. Ao ver suas colegas, correu em direção a elas e com um grande sorriso, perguntou:

    — MENINAS!!! HOJE NÃO É UM ÓTIMO DIA PARA ESTAR VIVA?

    — SIIIIIIIIIIIIIIM! — respondeu Akiko.

    — Por que? — perguntou Miyu.

    — Não! — responderam Yukino e Naoko, com sarcasmo.

    — Vocês tão ligadas no menino lindoooo. Que entrou hoje no segundo ano? — continuou Aino, sem ter escutado suas amigas.

    — Nenhuma de nós tá no segundo ano… — frisou Naoko.

    — Não tenho interesse em ficar olhando homem. — Yukino franziu as sobrancelhas.

    — Olhem que lindo ele ali, rodeado de suas fiéis adoradoras! — apontou Aino, que nem escutava a resposta das meninas, apenas queria apresentar o garoto por quem tinha se interessado.

    Do outro lado do pátio, estava Adonis, irritadiço, parado, no meio de várias garotas que o rodeavam.

    “Eu só queria comer…”, ele pensava enquanto sentia a raiva crescer dentro dele. Enquanto isso, as estudantes o rodeavam e faziam seu questionário:

    — Solteiro?

    — Vem de onde?

    — Sai comigo?

    As meninas não paravam de fazer perguntas e comentários repetitivos, e ele percebeu que aquilo nunca teria fim.

    De volta ao outro lado do pátio, Aino continuava seu discurso sobre o incrível menino do segundo ano.

    — Sabe como tão chamando ele? De Deus Grego! Porque o nome dele é Adonis.

    — Mas Adonis não é um Deus grego, é apenas um personagem mitológico. E ainda foi morto por um javali — Miyu explicou.

    — Ele nem é tudo nisso. Elas estão tão emocionadas porque ele é novo na escola. — Yukino continuava incomodada.

    — Eu tô com pena dele, tá completamente desconfortável. — disse Naoko, inconformada.

    — QUEM? — perguntou Akiko, alheia.

    Aino, que agora já se encontrava impaciente com os comentários de suas amigas, tirou o sorriso do rosto e franziu as sobrancelhas.

    — AI! DEUS GREGO E PERSONAGEM MITOLÓGICO É QUASE TUDO A MESMA COISA! AHHH, DESISTO DE VOCÊS! — disse Aino, cerrando os punhos.

    A jovem virou em sentido oposto ao de suas amigas e seguiu em frente, bufando e resmungando.

    — Eu hein, ela se irritou mesmo. — comentou Naoko.

    Miyu e Yukino apenas observavam aquela cena dramática, e Akiko ficava se perguntando o que havia acontecido.

    O recreio passou e todos voltaram às suas atividades. As aulas continuaram como de costume, após o intervalo havia apenas dois períodos que naquele dia passaram num piscar de olhos. Quando o relógio bateu meio-dia, a música característica do sinal tocou e os alunos saíram animados para poderem finalmente retornar às suas casas.

    Todos saíam com bastante pressa, mas nada como o jovem Adonis, que continuava a ser alvo dos paparicos das colegiais apaixonadas. Ao chegar ao limite de sua paciência, ele saiu correndo para evitar suas colegas.

    — Espera Adonis, deixa a gente te acompanhar — ofereceu gentilmente uma das garotas de sua classe.

    — NÃO DÁ, TÔ COM PRESSA.

    — Ah! É muito lindo né! — sussurrou uma estudante.

    — Tchau Adonis, Deus Grego! — outra estudante cumprimentou.

    O rapaz corria além de sua velocidade normal. Os transeuntes acabaram notando e ficaram preocupados se o rapaz talvez estava envolvido em alguma briga de escola.

    — EU NÃO QUERO VOLTAR NUNCA MAIS! — desabafou Adonis, suado e esbaforido, com o coração super acelerado. Seu pensamento era de não dar mais as caras no colégio, seu primeiro dia havia sido a coisa mais bizarra da vida dele.

    O local em que morava era um prédio próximo à escola, cerca de dez ou quinze minutos a pé, mas que, neste dia, ele havia levado apenas cinco. Era um prédio relativamente antigo, mas bem conservado. A vantagem era que os apartamentos costumavam ser maiores do que os mais modernos. A região era próxima ao centro e perto havia o estádio de futebol. Mesmo assim, a rua de onde morava era calma.

    “O que foi aquilo? Que bando de gente maluca”, pensou o rapaz enquanto tomava um pouco de fôlego e se acalmava. O rapaz tirou o tag do seu bolso, desbloqueou a tranca e entrou no prédio em direção ao elevador.

    — Acabou, hoje acabou, tenho que me preparar mentalmente para amanhã — disse para si mesmo, resmungando, aproveitando que estava sozinho. 

    Depois de passar a raiva inicial, ele começou a aceitar que teria que conviver com a incomodação da escola.

    O ruivo finalmente chegou no seu apartamento no décimo quarto andar. Destrancou a porta, entrou, suspirou mais uma vez, se virou e abriu os olhos.

    — KOA, O QUE CÊ TÁ FAZENDO AQUI!?

    — Também fiquei chocado — respondeu Koa. — Fui designado a acompanhar sua missão.

    Koa era um homem alto, com 1,87m de altura, pele escura, cabelos brancos e curtos. Seu corpo bem definido possuía algumas cicatrizes. Tinha olhos verdes como jade e do lado esquerdo de seu rosto havia uma cicatriz de corte que atravessava do olho até a mandíbula. 

    Sua aparência era imponente, mas tinha a capacidade de ser silencioso e furtivo. Usava argolas e piercings. 

    Suas vestes eram pretas, e usava acessórios de couro e correntes. Sua expressão facial não era a de quem tinha muitos amigos.

    — Mas cara… Não ia ser o Itzel?

    Koa estranhou o linguajar, mas respondeu:

     — Ele já está bem atarefado com as missões dele. Então fui enviado.

    A capacidade de resiliência do jovem era alta, e agora seu corpo já não se mostrava mais tenso e ele se preparava para almoçar. Mas isso não indicava que o dia não havia sido uma surpresa para Adonis em todos os sentidos. Ele não estava nem um pouco animado para o resto de sua semana.

    Dia seguinte, Colégio.

    Naquela manhã, diferente das outras, a escola estava com novos ares. Durante o intervalo, os estudantes de todas as turmas foram chamados para escutar um importante anúncio. Os novatos não sabiam direito do que se tratava, mas os veteranos pareciam saber o que estava por vir e pareciam muito animados.

    — ALUNOS!! VAMOS NOS REUNIR PARA UMA IMPORTANTE NOTÍCIA!! — disse a professora de biologia, Mira.

    Mira levantou sua mão e apontou em direção ao céu, para fazer seu grande anúncio.

    — ESTÁ ABERTA A TEMPORADA DA GINCANA!!

    A notícia foi bem recebida, os alunos, no geral, estavam muito animados, gritavam, pulavam, demonstrando o quanto estavam esperando por aquele momento durante o ano.

    — SINTO A ANIMAÇÃO DE TODOS! OS LÍDERES DAS EQUIPES SERÃO O 1o, 2o E 3o ANOS! AS DEMAIS TURMAS SERÃO DIVIDIDAS!! VAMOS SORTEAR!! — disse a professora, emocionada.

    — Nossa, já? — Yukino estava boquiaberta, nem um pouco animada com a notícia.

    As regras da gincana eram simples, seriam três equipes. Os líderes seriam as turmas do ensino médio. As turmas do fundamental da quinta até a oitava série eram divididas em cada uma das equipes.

    — Que tipo de provas que tem? — perguntou Miyu.

    Todos participavam das competições e os alunos podiam escolher as categorias que melhor podiam apoiar. Havia competições de artes, esportes, perguntas e respostas. E tinha os que estavam animados e os que consideravam aquilo apenas uma obrigação chata.

    — AEEEE, FESTIVAL! GINCANA! — Akiko vibrou, ela nunca havia participado das gincanas escolares no planeta, mas seu coração lhe dizia que seria muito bom.

    A equipe vencedora recebia 1 ponto na média de todas as matérias no boletim. A que ficava em segundo lugar, 0,75, e a terceira colocada, 0,5. Por essa razão, a disputa era sempre tão acirrada.

    Uma multidão gritava ao fundo em uníssono: “UHH É TERCEIRÃÃO, UHHH É TERCEIRÃÃO”, era o último ano com seu grito de guerra padrão que era o mesmo há mais de vinte anos em boa parte das escolas do país.

    — CÊS TÃO INVOCANDO ALGUMA COISA? — exclamou Naoko, que não conseguia se acostumar com o jeito dos colegas, achou extremamente bizarro aquele comportamento de entoar frases e ficarem em círculos se abraçando e pulando.

    — MAS… O QUE É ISSO? É ALGUM RITUAL? — disse Adonis, se já não bastasse o primeiro dia de aula assustador, agora ele estava experienciando o segundo dia, que estava parecendo ainda mais estranho.

    — HAHAHAHAHA! Você é muito engraçado Adonis. — comentou uma colega, como não sabiam que o jovem vinha de outro planeta, achavam que ele apenas fazia graça das situações da escola.

    O colégio tinha por padrão três cores: vermelho, branco e azul, sendo essas as cores oficiais para todas as atividades. 

    Com o primeiro sorteio feito, agora os grupos já tinham a cor que os representava e que iriam guiar os temas de apresentações, grito de guerra, e, é claro, o nome da equipe. Em adição a isso, tudo deveria estar conectado com o tema geral da gincana, que era sempre escolhido no conselho dos professores e anunciado aos estudantes no dia em que se abria os preparativos para a gincana. 

    A professora então pegou seu microfone mais uma vez.

    — O Primeiro Ano vai ser a Equipe Vermelha! O Segundo Ano vai ser a Equipe Branca. E o Terceirão vai ser a Equipe Azul. — ela fez uma pequena pausa em seu discurso e logo voltou com a última novidade. — O tema deste ano será… O MEIO AMBIENTE!

    O resto da manhã escolar seguiu quase normalmente, as aulas eram constantemente atrapalhadas pelos grupos de alunos que não paravam de discutir sobre quem seria o líder de cada sala, o que cada um faria e como iriam proceder com as provas.

    Apoie-me

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (1 votos)

    Nota