Índice de Capítulo

    Pouco tempo após o pôr do sol, o som de uma caruagem ecoou pelas remotas terras de Sophiette. 

    Pela janela, avistou o veículo luxuoso responsável por trazer a convidada da noite até ali. Mentiria se dissesse que não estava nervoso, e o motivo da inquietação nem era pela visitante, mas sim pelo fato de Sylford não está ali.

    Minerva Clergyman. A Santa poderia muito bem ter mandado o líder do clã Sophiette para a excursão apenas para aprontar alguma coisa essa noite…

    Não, isso era muita paranoia, uma coisa certamente não tinha a ver com a outra. De qualquer forma, estava em casa, a Santa não se atreveria a fazer algum movimento ousado assim. Mesmo Cynthia sendo jovem, ela ainda era una Sophiette.

    O dever dos descendentes de Karllos era proteger o equilíbrio do mundo, nesse caso era um cargo tão importante quanto o de um Santo, uma luta entre grandes potências assim traria muitos prejuízos à ordem das coisas.

    Sem mais pensar nisso, decidiu ficar apresentável para a hora do jantar. Sua aparência não era das melhores nesse momento, os olhos vermelhos como a lua Jarnsasha revelavam o tempo que passou vidrado nos livros.

    Cabelos desgrenhados e o rosto com manchas de suor completavam o seu look de um cientista maluco.

    Mas água sobre o rosto e roupas novas foram o suficiente para mudar a sua aparência novamente. Seguindo a sua paleta de cor, usava um suéter branco e calças folgadas negras. Botões dourados davam um toque especial ao conjunto.

    Os fios loiros foram arrumados cuidadosamente. Sinceramente, sentia falta da cabeleira negra, apesar de outrora, na época de delinquência, tivesse descolorido o cabelo.

    “Se alguma coisa der errado, vou contar contigo.”

    {Naturalmente.}

     Na cozinha, ambas as garotas conversavam sobre assuntos dos seus interesses.

    Cynthia trajava roupas exuberantes, condizentes com a sua personalidade arrogante, e gesticulava educadamente. Em contrapartida, Minerva usava o tradicional uniforme de Santo — porém estava sem o manto.

    — Boa noite — saudou como mandava a etiqueta e tomou o seu assento um pouco distante delas, embora Cynthia houvesse sinalizado para aproximar-se. — Não, não, vou ficar aqui.

    A Santa olhou intrigada. A essa altura, já devia saber que esse garoto loiro estava passando as férias com os Sophiette.

    — Então você é o protegido de Paltraint Atrex? É um prazer revê-lo.

    — Também é um prazer revê-la, dona Santa.

    — Ué? Você já se conheciam? — Cynthia balançou a cabeça para ambos os lados. — Por que não me contou que era amigo da Santa, querido?

    — Eu não diria que somos amigos — murmurou Kurone. Havia algo errado, a convidada fitava-o com um interesse incomum. — Apenas nos encontramos por acaso na Universidade Mágica.

    — Sim, — continuou Minerva — quase não trocamos palavras. Mas esse ano isso será diferente, afinal serei professora de vocês.

    Ainda havia esse fato. Veria ambas as garotas todos os dias na Universidade Mágica de Andeavor. Esperava que Minerva não desejasse pegar no seu pé, odiava esse tipo de professor.

    — Fiquei contente ao saber que senhorita Cynthia abandonará as aulas pessoais para estudar na Universidade Mágica, tive que vir para conversar com ela pessoalmente. Eu sou uma grande amiga dos irmãos Sophiette.

    Isso ficou bem óbvio na luta no tribunal. Minerva lutou em sincronia ao lado de Sylford, revelando que aquela não era a primeira vez compartilhando o campo de batalha. Naturalmente, pessoas com títulos equivalentes seriam bons amigos.

    — Se tiverem qualquer problema na Universidade, não esqueçam de me consultar — falou a Santa. — E reforçarei o aviso que dei antes, tomem cuidado com as pessoas suspeitas de lá. O maníaco que invadiu o tribunal no ano passado é aluno de lá, embora ainda não tenha sido encontrado.

    — Como estão as buscas? — questionou Cynthia, em um tom preocupado. — Nenhuma outra pista?

    — Bem, com as férias fica mais difícil de encontrá-lo, seria um grande desperdício de energia e também uma situação constrangedora ficar interrompendo as comemorações dos nobres para fazer investigações. É melhor esperar que a retomada das atividades.

    — Mas e se ele não voltar mais? — perguntou Kurone, tentando parecer indiferente, embora uma ponta de nervosismo tivesse elevado a sua temperatura corporal.

    — Ele certamente vai voltar, afinal temos certeza que ele não é um aluno que se formaria no ano passado. E se caso um aluno dos outros alunos decidir sair da Universidade, tomaremos ele como um suspeito.

    Engoliu em seco. Isso só estava acontecendo porque esqueceu o seu uniforme da Universidade Mágica no tribunal, se fosse mais esperto, o escopo de busca deles ainda seria maior.

    Reduzir o espaço das investigações assim era perigoso, principalmente agora, que no próximo mês encontraria “Nie” e o seu grupo de “benfeitores”.

    Se fosse pego com eles, seria o fim. O incidente no tribunal teve como resultado a fuga de um dos membros daquele grupo, a Santa e seus subordinados não pensariam duas vezes antes de considerá-lo um espião.

    Por enquanto, agiria com muita cautela.

    — Espero que encontrem logo esse maníaco, só assim me sentirei segura naquele espaço. Mas se ele tentar qualquer gracinha, terei o meu querido Iolite para me proteger.

    Continuava a ser alvo das olhadelas suspeitas da Santa. O que ela devia estar pensando nesse momento? A casa não seria cercada por guardas para prendê-lo, não é mesmo? Seria uma cena bem similar àquelas dos filmes do FBI.

    — Certamente Iolite é forte — Minerva disse de repente. — E muito forte, um menino na sua idade não teria tanto talento mesmo sendo um Gênio, Paltraint fez mesmo uma boa aquisição desta vez.

    Não conseguia ver através de Minerva. Quais poderiam ser os seus objetivos? Só sabia disso: coisa boa não poderia ser. Por enquanto, seria pacífico enquanto ela não fizesse nenhum movimento surpresa, e tentaria não entrar em contato físico para evitar uma cena como aquela da biblioteca da Universidade Mágica.  

    — Estou ansiosa para ensinar a crianças tão geniais como vocês. Eu havia conversado com Sylford sobre a possibilidade dele ser professor de esgrima, mas ele é bem rígido quanto a essas coisas.

    “Sim, é mesmo, e os alunos nem dariam conta de aprender tanto conteúdo.”

    {Ela pensa que o treinamento não seria adequado para os alunos comuns.}

    “Agora que você falou, seria realmente bem problemático.”

    Da próxima garfada até a sobremesa trazida com cuidado pela empregada, não houve grandes problemas. As olhadelas da Santa continuaram por todo o tempo. 

    Kurone chegou a pensar em como seria catastrófica se Cynthia percebesse esses movimentos suspeitos dos olhos da mulher ao seu lado. Ainda não compreendia bem até onde a menina podia ser racional ou emocional.

    Com o fim da refeição, o garoto logo retirou-se, enquanto Minerva seguia a jovem Sophiette para o escritório, a fim de ver alguns papéis importantes.

    Contudo, o destino de Kurone não foi o seu quarto ou a biblioteca. Ele dirigiu-se a um ponto discreto do longo corredor que dava na cozinha e sentou-se de pernas cruzadas. Limpou a garganta e respirou de maneira ordenada.

    Os Olhos que Tudo Veem foram ativados. Estava um pouco hesitante por um dos seus alvos ser alguém com poder sagrado. Para o conforto do seu coração, não notou qualquer mudança no semblante da mulher de cabelos loiros.

    Minerva Clergyman mirava com total atenção a garotinha explicando sobre a relevância de diversos documentos em sua mão. Era uma conversa trivial, mas não queria desviar a sua atenção daquela mulher até a sua partida.

    {Pare de usar a habilidade quando sentir uma interferência, ela não é um alvo comum.}

    Ficaria com isso em mente, seria terrível se fosse alvo de uma cegueira lançada pela Lucy que acompanhava a Santa.

    — Tem certeza? — Um dos subordinados questionou novamente.

    — Sim, não irei mudar de ideia. Encontraremos esse “Kurone Nakano” na data que citei.

    — É perigoso com a “inquisidora” a solta, mas se a senhorita tem certeza, então não iremos mais a incomodar.

    — Ótimo. Amanhã nos deslocaremos cedo, avise aos outros.

    Os homens acenaram com a cabeça e a garota observou suas costas se afastando até desaparecerem nos arbustos.

    Ela, Nie, observou o céu noturno. Quase não conhecia nada sobre a sua própria vida, mas sentia que esse encontro com a pessoa chamada Kurone Nakano finalmente lhe daria um norte. Talvez fosse um velho amigo ou um inimigo, mas isso realmente não importava desde que tivesse mais informações.

    Embora sentisse que tinha alguma ligação com o nome “Nie”, em algum lugar do seu coração sabia que esse não era o seu verdadeiro nome. Consideraria o encontro proveitoso se Kurone Nakano soubesse como ela realmente se chamava.

    — Bem, preciso despistar essa inquisidora e sobreviver até a data…

    Sentiu os ventos mudando. Estava na hora de mudar de esconderijo novamente.

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