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    Estava sempre em estado de alerta. 

    Conforme adentravam o coração da floresta, as trevas densificavam, obscurecendo ainda mais a percepção, era como se escuridão e mana se tornassem uma coisa só. Os inimigos também ficavam mais fortes, a maioria das feras negras não desintegravam mais com um único ataque.

    Kurone se questionava se o caminho tomado pelo outro grupo também era assim. Paltraint Atrex era um homem excêntrico, e estava obstinado a mostrar a força do seu protegido ao mundo — por certo, ganharia uma comissão extra por isso —, não duvidava que ele o tivesse feito tomar o rumo mais perigoso.

    — A-atrás de você! — berrou um dos jovens na retaguarda.

    O menino loiro apenas saltou para evitar o ataque das garras arroxeadas vindas na sua direção. A criatura semelhante a um lobo aterrissou de mau jeito, mas logo tentou investir outra vez contra a sua vítima, rosnando.

    Blehhh!

    Um som doentio ecoou pelo ar: diversos espigões de madeira brotaram do chão e empalaram o monstro, perfurando toda a extensão do seu corpo esguio.

    A responsável pelo ato foi a professora de Botânica. Por algum motivo, Sprout Ruderalis estava muito prestativa após a divisão dos grupos, o que era bom para Kurone, que ainda não queria mostrar suas habilidades.

    Contudo, havia uma diferença entre o menino loiro e os outros estudantes, enquanto os últimos ficavam aliviados por serem protegidos pela mulher, o garoto só conseguiu aumentar ainda mais sua vigilância. 

    Reconheceu a força de Sprout, ela não seria um oponente fácil caso se voltasse contra eles. Ninguém além do jovem loiro sabia sobre a identidade secreta da mulher, ou melhor, da dríade, logo ninguém desconfiaria dela nessa situação.

    — Vamos parar para descansar aqui — anunciou a professora. — É perigoso prosseguir sem um descanso adequado. — Antes de terminar de falar, ela jogou-se no gramado, sem preocupação alguma. — Façam uma fogueira discreta para nos aquecer, meninos.

    Os outros estudantes obedeceram sem questionar, porém Kurone aproximou-se e inquiriu:

    — Qual é a sua, afinal?

    Hmm?

    — Tenho certeza que o Paltraint não tá parado nesse momento, e que ele não ia gostar nada dessa ideia de pausa pra descanso.

    Ruderalis respondeu no seu tom relaxado, que não se parecia nem um pouco com aquele da dríade:

    — Em breve você vai entender.

    A mulher nem tentou disfarçar suas segundas intenções, e Kurone nada podia fazer quanto a isso. Ela disse algumas palavras vagas, que, apesar de suspeitas, não provavam nada.

    [Ela imagina que a dríade está tentando lhe provocar.]

    “Tô sabendo, mas esse tipo de gente não é muito confiável, é melhor esperar o pior.”

    Com o pretexto de buscar lenha reserva para a fogueira, Kurone afastou-se do grupo e caminhou um pouco entre uma parte fechada da floresta. Teve que se orientar se esforçando ao máximo para captar todo o ambiente com os seus sentidos.

    Em seu trajeto, deparou-se com uma bocarra enorme saltando das trevas, pronto para separar a sua cabeça do resto do corpo. Em um instante, a escopeta de canos serrados surgiu na mão esquerda e deu um fim ao perigo se aproximando, explodindo o seu inimigo com um tiro no interior da boca.

    As trevas também abafaram o barulho do rugido da Boito .20, então não precisaria se conter quando estivesse longe dos outros.

    — Sprout Ruderalis pode tentar alguma coisa, ela não é confiável… apesar de você também não ser.

    Após o fim da fala do garoto, uma figura surgiu das trevas, com as costas apoiadas em um tronco e os braços finos cruzados em frente ao peito magro.

    — Vai negar, senhorita Inquisidora? — provocou Kurone.

    — Não tente bancar o engraçado. Sem dúvidas a professora Sprout é suspeita, mas enquanto ela não se mostrar uma pecadora, nada irei fazer.

    “Imagina se você descobrir o que ela fez.”

    Para a Hime, a Heroína Ádvena, ou a “Inquisidora”, ir contra as leis da natureza era o maior de todos os pecados, e isso era o que fazia a dríade no corpo da professora merecer esse título.

    O espirito apossou-se do corpo de Sprout Ruderalis e assumiu a sua identidade, fazendo com que a existência de alguém que não deveria mais existir permanecesse nesse plano.

    “Se bem que eu sou tipo um espírito ruim também que pegou esse corpo emprestado…”

    — De qualquer forma, é melhor você voltar antes que ela desconfie. Senti a presença de alguém forte pelas redondezas. Está longe, por isso não consigo identificar, mas…

    Ele gelou. Kurone Nakano, por um momento, sentiu todo o seu corpo tremer. 

    Nessa situação, “alguém forte” só poderia se referir à terrível Azazel van Elsie. Não estava preparado para receber essa notícia, mesmo sabendo que essa possibilidade existia desde o princípio.

    — Eu entendo, vou ficar atento.

    A Inquisidora apenas acenou com a cabeça e desapareceu na escuridão, deixando o garoto assustado sozinho.

    Kurone percebeu isso nas outras vezes, mas não importava o quanto dissesse a si mesmo que mataria a demônia, que ficaria cada vez mais forte, esse medo sempre aparecia quando alguém citava aquele nome.

    Era algo psicológico, reconhecia isso. Podiam citar o nome de todos os membros do Conselho do Inferno, só reagira dessa forma ao de Azazel van Elsie. Sentia um pouco de tristeza e raiva se escutasse os nomes de Asmodeus de Laplace e Mamon von Faucher, mas não eram nada comparado ao pavor que “Azazel” causava.

    Foi apenas após uma leve meditação que ele conseguiu relaxar. Precisava se acalmar ou as trevas invadiriam a sua mente, intensificando ainda mais o medo causado pela presença de Azazel van Elsie.

    No caminho para o local em que o seu grupo se encontrava, Kurone enfrentou algumas criaturas das trevas, as quais foram derrotadas facilmente. Não havia como negar sua evolução, e se esse se medo da demônia era algo apenas coisa da sua cabeça, talvez tivesse alguma chance de vencer se controlasse suas emoções.

    “Sem falar que aqui tem umas pessoas talentosas, se a gente juntar todos…”

    Quase metade do grupo de Paltraint Atrex foi morto.

    O oponente, um ser com a identidade ocultada pelo manto verde, continuava sem um único arranhão.

    — Toda ação leva a uma reação. Eu avisei que não queria brigar, mas se vierem para cima, certamente serão todos mortos se continuarem — disse o inimigo, levantando as mãos com unhas grandes. Apesar da escuridão, podiam notar que a sua mão tinha um tom bronzeado, como a pele das pessoas de Sphynx.

    Cynthia foi proibida de atacar pelo vice-capitão, mas não suportou mais ver seus colegas sendo abatidos um após o outro, então avançou e reduziu sua distância, dando um gosto do seu chute lateral ao inimigo.

    A pessoa que escondia sua identidade com a capa tentou defender com o antebraço, mas, ao sentir os ossos cedendo, chutou o chão e tentou tomar distância, contudo Cynthia não permitiu isso. A menina continuou a desferir chutes enquanto acompanhava o oponente.

    — Que diabos é você?! — berrou a pessoa, após ter o rosto atingido por uma sequência de chutes que o fizeram rolar algumas vezes pelo chão. 

    — É por isso que eu digo que nunca se pode irritar uma mulher — brincou Paltraint, aproximando-se com a sua calma anormal. — Você não parece ser o responsável pelas trevas, mas deve conhecer ele. Que tal fazermos isso da maneira mais fácil?

    — Vão para o inferno! 

    Ekkk!

    — Que coisa deselegante.

    Com o seu berro, o ser misteriosos jogou o seu manto fora, revelando o seu corpo magro… e apenas isso. Ele não usava mais nada além do manto, sem ele a sua pele escurecida e todos os membros estavam visíveis.

    Em outras palavras, ele estava completamente nu.

    As orelhas pontudas entregavam que era um elfo negro misturado com outras raças. Seus dentes afiados lembravam as presas dos lobos negros, e o seu porte físico era semelhante ao dos lobisomens selvagens desnutridos.

    — Senhorita Cynthia, essa cena e perturbadora demais para você, deixe que eu cuido dele…

    Novamente, a garotinha ignorou os avisos e partiu para cima, repetindo a palavra “repugnante” diversas vezes.

    Sem o seu manto, o elfo negro aumentou muito a sua velocidade, apesar de não ser o suficiente para competir com a jovem Sophiette tomada pela fúria. A perna rápida e o braço fino se encontraram diversas vezes antes dos dois corpos tomarem distância novamente.

    — Vejo que não estou enfrentando uma oponente qualquer aqui. Nesse caso, é melhor eu me esforçar um poco mais.

    Assumindo uma posição estranha, que ficava ainda mais esquisita por ele estar pelado, o elfo negro começou mover rapidamente um membro inesperado, que tirou o mais sincero “repugnante” de Cynthia Sophiette.

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