Capítulo 49: O Final da História
Eu caminhava ao lado de Seiji e Rintarou, ouvindo as vozes descontraídas deles enquanto minha mente vagava por pensamentos mais profundos. O peso das desculpas para Kaori, que antes parecia insuportável, tinha se transformado em algo mais leve, tipo um alívio.
Mas havia algo mais na minha mente: o final da história.
— Então, Shin. — A voz de Rintarou interrompeu meus pensamentos. Ele me lançou um olhar de lado, com o típico ar tranquilo. — Deu tudo certo ontem?
Fiz que sim com a cabeça, um sorriso leve surgindo.
— Sim. Eu e Kaori resolvemos tudo.
Seiji parou abruptamente, fingindo um espanto exagerado antes de rir bem alto.
— Tudo resolvido? Então por que ela não apareceu hoje cedo? Será que tá guardando rancor e resolveu zoar você? — Ele me deu um empurrão brincalhão no ombro, a provocação evidente no tom.
Revirei os olhos, suspirando enquanto abria a boca para rebater, mas antes que pudesse falar, uma voz familiar ecoou pelas nossas costas.
— Guardar rancor? Eu? Nem pensar! Só acordei tarde hoje, tá bom? — Kaori surgiu correndo em nossa direção, levemente ofegante, mas com aquele sorriso radiante de sempre. — Sentiram minha falta?
Seiji riu alto, abrindo os braços dramaticamente.
— Kaori, fala sério… como alguém se esqueceria de você!
Ela fez uma careta, meio divertida, meio fingida, antes de se virar para mim. Seu cotovelo cutucou meu braço, e o olhar dela brilhou com a curiosidade que já era quase uma marca registrada.
— E então, Shin? Tá mesmo tudo resolvido?
Eu a encarei por um momento, sentindo o alívio tomar conta. O tom leve dela, o jeito descontraído… tudo parecia ter voltado ao normal.
— Tudo — sorri, sentindo os restos de tensão dos últimos dias finalmente se dissipar por completo.
Kaori retribuiu o sorriso, e, por um momento, aquele pequeno grupo parecia mais sincronizado do que nunca.
Enquanto caminhávamos, a conversa seguia com o ritmo natural de sempre. Seiji e Kaori se engajavam em uma discussão calorosa e completamente sem importância, debatendo com paixão qual loja de conveniência tinha os melhores salgados e relembrando quem havia perdido mais partidas no último torneio de cartas improvisado do grupo.
Coisas triviais… que eu valorizava ainda mais naquele momento.
— Eu não sou o pior nos jogos! — reclamou Seiji, cruzando os braços. — Você que trapaceia, Kaori!
— Trapaceio?! — Ela colocou as mãos na cintura, indignada. — Não é minha culpa se você é horrendo!
Rintarou, que caminhava com as mãos nos bolsos e um sorriso discreto, esperou pacientemente a pausa da discussão. Ele me lançou um olhar tranquilo, mas curioso, e perguntou no momento perfeito.
— Já pensou no final da história?
A pergunta dele atravessou o ar. Os passos pararam por um instante, e até Seiji e Kaori interromperam a disputa. Kaori inclinou-se em minha direção, os olhos brilhando de curiosidade renovada.
— Conta, Shin! Você já decidiu o final?
A expectativa nos rostos deles era incrível. Seiji olhava para mim como se eu fosse revelar algo gigante, enquanto Kaori, impaciente, parecia prestes a sacudir meus ombros para arrancar a resposta… à força.
Senti o peso das atenções sobre mim, mas, em vez de ceder, sorri com um toque de provocação.
— Sim, pensei.
Kaori deu um passo à frente, inclinando-se tanto que quase invadiu meu espaço pessoal, enquanto Seiji se aproximava com um brilho curioso nos olhos.
— E? Qual é? Fala logo! — Kaori insistiu, praticamente em cima de mim.
— É segredo — respondi com um sorriso leve, desviando o olhar deliberadamente para evitar mais perguntas.
— Ah, não, você não vai fugir assim! — Seiji exclamou, levantando as mãos em protesto. — Tem que contar pra gente!
— No clube eu conto. — Minha resposta foi calma, mas carregada de uma satisfação discreta ao ver a frustração deles.
Seiji deu um suspiro dramático, jogando as mãos para o céu.
— Valeu, gênio. Eu não tô no clube de literatura, como fico nessa?
Fingi pensar por um momento, olhando para ele com um ar deliberadamente misterioso.
— Tá bom, vem cá — disse, fazendo sinal para ele se inclinar.
Seiji obedeceu prontamente, colocando a mão no ouvido para ouvir melhor. Eu me aproximei e sussurrei o final da história, baixo o suficiente para que só ele ouvisse.
Por um segundo, o rosto de Seiji congelou. Seus olhos se arregalaram de forma exagerada, e ele deu um passo para trás.
Era meio engraçado essa reação exagerada.
— Cara… isso é genial! Emocionante pra caramba! — Ele pareceu me olhar com admiração, junto de um sorriso incrédulo no rosto.
Kaori, é claro, não perdeu tempo. Ela agarrou meu braço, balançando-o levemente.
— Shin, não é justo! Conta pra mim também! Vai, por favor! Não é justo!
Eu apenas balancei a cabeça, mantendo o sorriso.
— Só no clube…
— Você é impossível! — Ela bufou, cruzando os braços e virando o rosto, claramente indignada.
Enquanto Seiji ainda murmurava algo sobre como o final era genial demais para ser segredo, Kaori olhou para mim mais uma vez, mas dessa vez com um sorriso resignado.
— Tá bom, vou esperar. Mas isso não significa que vou te perdoar fácil, tá?
Rimos juntos, e o peso da manhã foi substituído por uma leveza que parecia reaproximar todos nós. Continuamos o caminho, as vozes de Kaori e Seiji retomando outra discussão trivial enquanto a escola surgia à frente, cercada por uma agitação típica do início das aulas.
As aulas começaram com o habitual clima de segunda-feira, aquele misto de preguiça coletiva e conversas baixas que se misturavam ao som das mesas sendo arrastadas.
No entanto, o ambiente ganhou uma energia inesperada quando o professor, batendo duas vezes na mesa para chamar nossa atenção, fez um anúncio que pegou a turma de surpresa.
— Todos aqui já devem saber, mas o Festival Escolar está chegando. Relembrando, cada turma deverá decidir o que vai apresentar este ano. Quero lembrar que essa é uma oportunidade de mostrar o talento de vocês e trazer algo especial para o evento, então caprichem.
O caos de conversas começou imediatamente. Cabeças se inclinaram em direção às mesas vizinhas, vozes baixas e animadas trocando ideias enquanto algumas pessoas anotavam possíveis sugestões.
— Ano passado, a turma 2-B fez aquela sala de terror muito assustadora! Será que eles vão repetir? — comentou alguém à frente.
— Ouvi dizer que a turma 3-C vai fazer um café temático inspirado em histórias de romance. Parece bem interessante! — outra voz sussurrou, vinda do canto da sala.
— Já pensaram em fazer uma peça? Eu ouvi que a turma 1-A está considerando algo inspirado em contos de fantasia! — especulou alguém perto da janela.
A empolgação era palpável, mas o professor, levantando a mão em um gesto firme, rapidamente trouxe a sala de volta à ordem.
— Mas, antes de começarem a planejar grandes ideias para o Festival, vou lembrá-los de algo importante. — Ele fez uma pausa deliberada, seu olhar percorrendo cada canto da sala. — As provas finais estão chegando. O Festival é um evento importante, mas não quero ver ninguém usando isso como desculpa para notas ruins.
O efeito foi imediato. As expressões antes animadas murcharam, e a sala foi tomada por suspiros de desânimo e reclamações abafadas.
Claro, eu estava na mesma situação.
“Quase esqueci sobre as provas finais…”
— Provas? Não podiam deixar isso pra depois? — alguém murmurou, inclinando-se sobre a mesa.
— Sempre arrumando um jeito de estragar a diversão… — outro comentou, batucando na mesa com a ponta da caneta.
Mesmo com a mudança abrupta no humor da turma, minha mente foi para outro lugar. A menção ao Festival despertou minha curiosidade sobre o que faríamos como turma, mas, ao mesmo tempo, uma pequena ansiedade começou a surgir. Não apenas pela ideia de colaborar com todos, mas também pelo que isso significaria para os dias de preparação.
Enquanto a sala voltava aos cochichos e conversas, o professor acrescentou, com um tom ligeiramente mais leve:
— Vou dar tempo para discutirem ideias no fim da semana, mas já podem começar a pensar no que gostariam de fazer. Lembrem-se de que o Festival é uma chance de mostrar a criatividade e a união de vocês. Participem com entusiasmo.
E, com isso, ele voltou ao quadro para começar a aula, mas a animação na sala não desapareceu completamente. Eu conseguia ouvir sussurros ocasionais e risos baixos enquanto alguns colegas trocavam ideias ou faziam comentários irônicos sobre as provas.
No entanto, para mim, minha mente ainda estava em outro lugar. Entre o Festival e o clube onde eu iria mais tarde, os pensamentos se misturavam, e por mais que tentasse, focar na aula parecia… uma tarefa quase impossível.
Tentei focar nas anotações e acompanhar as explicações do professor, mas as palavras passavam por mim. Era inútil, era como tentar lutar contra o vento. Não tinha como eu focar assim.
Cada minuto parecia se arrastar, mesmo que o relógio indicasse o contrário…
Quando finalmente o sinal tocou, indicando o fim das aulas, senti uma mistura de alívio e antecipação. Recolhi meu material com pressa e saí direto em direção ao clube. O momento que eu vinha esperando desde a manhã finalmente estava prestes a chegar.
Enquanto caminhava pelos corredores em direção ao clube, meus pensamentos ainda giravam em torno do momento que estava por vir. As desculpas que fiz anteriormente me aliviaram, mas havia algo mais que eu precisava fazer: oficializar minha reconciliação com o resto do grupo.
No caminho, avistei Kaori conversando animadamente com algumas amigas perto da entrada do clube. Ela gesticulava enquanto falava, rindo de algo que disseram, e o som de sua risada parecia iluminar o ambiente. Uma sensação de alívio e gratidão tomou conta de mim ao vê-la assim, tão cheia de vida, como sempre.
“Ainda bem.”
Respirei fundo e me aproximei.
— Kaori, você pode esperar aqui por um minuto? Preciso falar com o pessoal antes de você entrar.
Ela piscou, surpresa, mas logo sorriu, inclinando a cabeça com curiosidade.
— Tá bom, mas não demora. Eu tô com fome, e preciso comer logo… — brincou, se encostando na parede enquanto eu seguia para dentro.
O ambiente do clube tinha aquela familiaridade reconfortante: Takumi revisava papéis com a precisão de sempre, Mai rabiscava algo em um bloco de notas, Rintarou lia calmamente, e Taro, como de costume, estava meio deitado sobre a mesa, os olhos semiabertos, no limiar entre a vigília e o sono.
O mesmo de sempre.
Parei no meio da sala, a respiração firme, e fiz uma reverência profunda, interrompendo suas atividades.
— Eu… antes de mais nada, quero pedir desculpas pelo que aconteceu outro dia. Perdi o controle, e vocês não mereciam ver aquilo. Foi um erro meu.
Takumi foi o primeiro a levantar os olhos dos papéis, o semblante tranquilo de sempre.
— Tá tudo bem, Shin. Mas não esqueça que quem mais precisava ouvir isso era a Kaori.
Endireitei a postura e assenti.
— Eu já pedi desculpas pra ela. E… tá tudo bem agora.
Mai ergueu uma sobrancelha, o sorriso dela se ampliando com um toque provocador.
— Já? Que eficiente, hein? — Ela apoiou o queixo nas mãos. — Deixa eu adivinhar… teve algo especial no meio, tipo algum doce?
Ela acertou em cheio, era tão típico dela que todos já imaginavam o mesmo. Mas antes que eu pudesse responder, a porta se abriu, e aquela energia inconfundível entrou na sala.
— Falando de mim? — Kaori entrou com um sorriso radiante, jogando a mochila em uma cadeira próxima. — Pra deixar claro, tá tudo bem entre mim e o Shin. Então podemos voltar ao normal, né?
O alívio foi imediato. Takumi sorriu, Mai soltou uma risada curta, e até Rintarou ergueu os olhos do livro, o canto dos lábios puxando-se em um pequeno sorriso. Taro soltou um grunhido que parecia uma tentativa de assentir antes de voltar a cochilar.
Kaori olhou ao redor, satisfeita com o impacto de sua chegada, mas logo cruzou os braços e apontou para mim com um olhar quase desafiador.
— Agora que tá tudo resolvido, conta logo o final! — exigiu ela, inclinando-se levemente para frente com uma curiosidade quase infantil.
Todos os olhares se voltaram para mim, e senti o peso da expectativa crescer. Meu coração acelerou, e um nó de nervosismo se formou no estômago.
— É… eu pensei em um final, sim — disse, hesitante.
Kaori estreitou os olhos, detectando aquela minha insegurança.
— E? Não vai contar? — Ela insistiu, enquanto Mai, Takumi e Rintarou murmuravam encorajamentos do tipo “vamos, Shin” e “ninguém aqui vai julgar você.”
— Na verdade… não só pensei, como escrevi. Tá aqui. — Tirei alguns papéis da mochila, mas hesitei, segurando-os com firmeza como se pudessem escorregar dos meus dedos. Meus pensamentos logo mudaram, junto do meu tom. — Mas… e se não for bom? E se não combinar com o resto da história? O prazo tá quase acabando, e… e se esse final não for o suficiente? E se… eu não conseguir…?
A sala ficou em silêncio por um momento, mas então Takumi levantou a mão, o gesto calmo, mas firme o suficiente para cortar minha espiral de pensamentos.
— Não é sobre ser perfeito, Shin. O importante é: você acredita nesse final? Se ele te moveu enquanto escrevia, tem algo verdadeiro nele. E algo verdadeiro sempre chega ao leitor.
Kaori inclinou-se para frente, o sorriso encorajador no rosto, mas com um toque de determinação nos olhos.
— Você nunca vai saber se é bom até deixar alguém ler. Então, para de enrolar e entrega logo! — Sua voz tinha aquele tom alegre e provocativo que sempre conseguia aliviar qualquer tensão.
Rintarou, com sua usual tranquilidade, completou:
— Melhor ouvir o que temos a dizer antes de se preocupar tanto. Apenas confie em nós.
Olhei para todos por um instante. A ansiedade ainda estava lá, mas as palavras deles me deram coragem. Respirei fundo e estendi o papel, entregando-o com dedos que ainda tremiam levemente.
O silêncio que se seguiu foi quase sufocante. Cada segundo parecia durar uma eternidade enquanto eles mergulhavam no texto. Meu olhar saltava de um rosto para outro, buscando qualquer sinal de reação.
O que eles iriam sentir?
Iriam gostar?
Odiar?
Rir?
…Chorar?
O que eles iriam falar?
Várias perguntas me consumiram, a ansiedade só aumentava enquanto esperava alguma reação.
Kaori foi a primeira a falar. Ergueu os olhos do papel, e havia algo inesperado neles:
Uma lágrima solitária descia por sua bochecha.
“Hã!?” Por quê…?”
— Esse final… — começou ela, a voz trêmula antes de abrir um sorriso largo. — É incrível.
Meu coração deu um salto, dividido entre surpresa e alívio. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, Takumi se levantou, batendo levemente nas costas da cadeira como se precisasse liberar a energia.
— Eu não mudaria nada. Esse final é perfeito, Shin! Impactante e emocional na medida certa.
Rintarou, com seu tom sempre ponderado, acrescentou:
— Concordo. Ele amarra tudo com muita força. Dá pra sentir o peso e a mensagem que você quis transmitir.
Mai, que ainda segurava o papel com ambas as mãos, olhou para mim com uma expressão de aprovação genuína.
— Shin… esse final tem um impacto que faz o leitor parar e pensar. Ele não só conclui a história; ele deixa uma marca. Dá pra sentir o quanto você colocou de si aqui. É realmente impressionante!
Até Taro, despertado por algum milagre, murmurou:
— Bom final. Muito bom mesmo. Ótimo trabalho, Shin
Fiquei parado, sem saber o que dizer, mas o sorriso nos rostos deles dizia tudo o que eu precisava ouvir. Meu nervosismo se dissolveu, substituído por uma onda de alívio e gratidão.
Eu estava… tão feliz.
Kaori limpou a lágrima do rosto com o dorso da mão e olhou para mim com determinação.
— Com esse final, Shin… você vai vencer. Eu sei disso.
— É bom Ryuuji ter cuidado — brincou Mai, piscando para mim.
Eu ri, balançando a cabeça, ainda meio surpreso pelas suas reações.
— Obrigado, pessoal. De verdade. Eu ainda vou ajustar alguns detalhes, mas… estou muito mais confiante agora.
O ambiente do clube parecia mais brilhante, mais vivo. O peso do final parecia ter desaparecido completamente, substituído por uma determinação renovada.
Enquanto guardava o papel com cuidado, senti algo novo brotar em meu peito: a certeza de que, não importava o resultado, eu tinha conseguido criar algo significativo.
E isso… era o suficiente.
O caminho de volta para casa, junto de meus amigos, parecia diferente, quase como se a rua refletisse o alívio que entrou meu peito. A bela luz do pôr do sol, junto da brisa suave, traziam ambas um momento de paz tão raro quanto necessário.
Depois de tantos dias de incerteza e pressão, havia algo novo em mim.
Não era apenas confiança no final que escrevi, não.
Era mais como uma sensação de que, independentemente do resultado, eu tinha colocado meu coração naquela história.
Olhei para o horizonte, onde o sol lentamente desaparecia, e um sorriso determinado apareceu no meu rosto. O dia seguinte marcaria o início do Concurso de Inverno.
Depois de tudo aquilo, eu sabia que o próximo passo não era só sobre vencer, mas sobre confiar no que escrevi… e, mais importante, confiar em mim mesmo.
Com esse pensamento, continuei meu caminho, pronto para enfrentar o começo do grandioso concurso.
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