Capítulo 111: O ódio não pode expulsar o ódio, somente o amor pode fazer isso.

Dentro daquele mundo manchado de sangue, William repousava no colo de Celine. Ele dormia profundamente. Seu corpo, coração e alma estavam exaustos. O jovem garoto não tinha dormido muito durante os seis meses que passou longe de Lont, e isso cobrou seu preço.

Celine tinha a sensação de que William só queria voltar para Lont antes de se fechar completamente para o mundo. No momento, ela sentia vagamente que o garoto não tinha intenção de acordar de seu sono.

Era como se ele tivesse entrado em um coma autoinduzido, sem saber quando abriria os olhos novamente.

“Será que cometemos um erro?” Celine murmurou enquanto acariciava suavemente o rosto de William. “Nós te pressionamos demais? Isso te machucou tanto assim?”

Ela queria respostas para suas perguntas, mas nenhuma veio. O rosto adormecido de William, que antes parecia tranquilo e atraente, agora estava pálido e rígido. Ela até conseguia ver a leve ruga de preocupação que se formava no canto de seu rosto, e isso a fez se perguntar se o garoto ainda estava sofrendo, mesmo em seu estado de coma.

James suspirou pela enésima vez enquanto estava parado na colina com vista para Lont. Seu olhar estava voltado para o sul, onde ficava a casa de Celine.

Ele já havia recebido uma mensagem de Celine sobre a condição atual de William, e isso o enchia de preocupação.

Já fazia uma semana desde que William entrou em um estado catatônico, e apenas as poções nutritivas de Owen estavam mantendo as funções de seu corpo.

O velho homem se esforçava para encontrar uma solução para o problema, mas todas as ideias que teve chegavam a um beco sem saída. Ele não ousava tentar acordar seu neto à força, pois isso poderia acabar apagando completamente sua consciência.

‘Eu deveria ter esperado até que ele fosse mais velho.’ James se culpava por sua estupidez. ‘Estava tudo indo bem, e eu arruinei tudo.’

Enquanto James se afundava em autopiedade, o som de um sino alcançou seus ouvidos.

O velho levantou a cabeça e viu Ella caminhando em sua direção. Por um breve momento, James achou ter visto uma expressão de desaprovação no rosto da cabra. Quando ela estava a apenas um metro dele, virou-se e… deu-lhe um coice!

James foi completamente pego de surpresa e não teve tempo de se defender. Ele nunca imaginou que a cabra que ele criara desde pequena tentaria chutá-lo justamente quando ele estava se sentindo deprimido.

Ella bufou para o velho tolo caído no chão antes de seguir em direção ao sul. Ela havia acabado de chegar algumas horas antes e descoberto, através de Oliver, a causa do estado atual de William. Sabendo quem era o responsável pelo sofrimento de seu bebê, Ella estava determinada a dar uma bela surra nele.

No entanto, depois de dar um coice com toda sua força, não teve coragem de continuar com mais ataques. Afinal, com um simples olhar, ela percebeu que James também estava sofrendo.

Ao chegar à casa de Celine, Ella conversou com Oliver e pediu que ele ajudasse a mover William adormecido para o curral das cabras. Embora Celine estivesse relutante em tirar seu discípulo da cama, no final, concordou com a condição de Ella.

Ela já havia feito tudo ao seu alcance para tentar acordá-lo, mas todas as tentativas fracassaram. A bela elfa pensou que, talvez, Ella pudesse puxar William de volta de seu sono profundo, já que os dois estiveram juntos por muito tempo.

Com sua ajuda, William ficou confortavelmente deitado sobre uma pilha de feno dentro do curral.

“Vou deixá-lo sob seus cuidados, Ella,” Celine disse depois de se certificar de que o garoto estava bem acomodado.

“Meeeeh.” Ella assentiu em resposta.

Celine lançou um último olhar para seu único discípulo antes de sair do curral junto com Oliver. Embora não demonstrassem em seus rostos, ambos esperavam que Ella fosse capaz de realizar um milagre.

Ella deitou-se ao lado de William e observou seu rosto adormecido com um olhar gentil. Cinco minutos depois, pressionou sua testa contra a dele e fechou os olhos.

Uma jovem de longos cabelos azul-claros, que desciam até sua cintura, caminhava em direção ao centro do mundo manchado de sangue. De qualquer ângulo, suas proporções eram perfeitas, ainda mais voluptuosas do que as de Celine.

Ela vestia um vestido sem mangas, com um estilo feérico¹), que flutuava suavemente como se uma brisa estivesse passando por seu corpo. As armas espalhadas pelo cenário ao fundo faziam com que parecesse uma Valquíria, vinda para buscar a alma de um bravo guerreiro para levá-lo a Valhalla.

Seus olhos lilás-claro, brilhantes como os de William quando bebê, estavam fixos à distância, onde uma figura flutuava. O sino prateado em seu pescoço tocou suavemente, como se anunciasse sua chegada.

Os dois chifres roxos em sua cabeça brilhavam levemente enquanto ela se aproximava do garoto adormecido, a quem criara desde que ele chegara a Lont.

A jovem, que aparentava ter cerca de dezenove anos, fez um gesto com a mão, e leves ondulações começaram a aparecer sob seus pés.

Se William pudesse ver a dama que invadia seu mundo, havia uma grande chance de que ficasse atordoado, mesmo em seu estado apático, devido à beleza impressionante dela.

Como se estivesse sendo puxado por um fio invisível, o corpo de William lentamente flutuou em direção à jovem de cabelos azul-claros. Quando ele chegou diante dela, a primeira coisa que a jovem fez foi retirar o capuz que cobria sua cabeça.

Ella olhou para William com uma expressão gentil. Sentia-se triste por vê-lo naquele estado e se arrependia de não ter dado outro coice em James mais cedo.

“A escuridão não pode expulsar a escuridão, somente a luz pode fazer isso,” Ella disse suavemente enquanto abraçava William com carinho. “O ódio não pode expulsar o ódio, somente o amor pode fazer isso.”

Um trono celestial apareceu no ar acima dela, cintilando como as estrelas no céu. Ella flutuou no ar, segurando William nos braços, e sentou-se no trono como uma imperatriz.

Com um movimento delicado, ela desfez o fecho de seu vestido feérico, localizado na parte de trás do pescoço. Seu belo corpo superior ficou exposto para o mundo ver; mas, naquele mundo, só existia uma pessoa, e ela estava inconsciente.

Ella ergueu gentilmente a cabeça de William enquanto acariciava o lado de seu rosto. “Você ainda não viveu sua vida ao máximo, então por que está tão ansioso para cruzar para o outro lado?

“Você acha que eu vou deixar você ir? Se quiser deixar uma mensagem para o mundo, que seja algo simples. Tão simples quanto a vida de um pastor!”

Os lábios de William se entreabriram, como haviam feito inúmeras vezes no passado. A bela jovem não precisou fazer nada além de observá-lo com um olhar amoroso enquanto seu bebê se movia por instinto para receber o que era seu por direito.

Uma série de notificações apareceu na interface de William, mas o garoto não podia vê-las porque ainda estava inconsciente. No entanto, essas mensagens desapareceram rapidamente antes que pudessem ser registradas nos logs.

O sistema tomou a decisão arbitrária de deletar todos os registros das ações de Ella. Embora as mensagens tenham sido apagadas, as recompensas e os efeitos curativos permaneceram.

Atualmente, o Sistema estava tentando inventar uma história plausível para explicar de onde vieram os pontos de experiência e os Pontos Divinos adicionais.

Ella, que havia recuperado as memórias da Deusa Amaltheia, conseguiu usar seu poder por um curto período de tempo. No entanto, havia apenas um efeito colateral: ela não se lembraria de nada do que acontecera enquanto estava em sua Forma Celestial.

Mesmo assim, isso não importava para ela. A única coisa que realmente importava naquele momento era trazer William de volta da escuridão, lentamente restaurando a versão animada e cheia de vida dele—o garoto que ela amava com todo o seu coração.

1. (@asimov: seria algo deslumbrante, como uma beleza além, uma maravilha de contos de fantasia, no original estava como uma fada, mas tive a liberdade de deixar mais rico kkkkk[↩]