Capítulo 50: Fluxo Mental
Ao perceber que a estátua na verdade era um espírito guia e o templo parecia ser um lugar bastante habitável, ele fez essa jogada ao conhecer Kallion para assim morar num lugar melhor do na floresta.
Depois das apresentações Kallion mostrou todo o templo e os lugares onde Kenji poderia transitar sem o atrapalhar em seus momentos de meditação.
Também explicou as coisas que Kenji teria que fazer enquanto dormiria lá, entre elas ele iria: limpar, caçar e manter tudo organizado.
No fim do dia, tendo feito tudo isso, ele iria tomar algumas aulas com Kallion, mesmo que não quisesse fazer nada disso, esse foi o combinado, então logo ele se acostumaria.
Kenji estava tentando organizar o quarto que passaria a dormir, ele era pequeno porém acolhedor.
À esquerda, há uma cama simples de madeira, com travesseiro e cobertor aconchegantes, voltada para o centro do cômodo.
Próximo à cama está uma pequena estante com livros e gavetas. Na parede acima, há uma lanterna acesa, que ajuda a iluminar suavemente o espaço.
Era uma luz quente e suave, em tons de rosa, roxo e laranja, criando uma atmosfera calma e introspectiva.
No lado direito fica a porta de madeira e alguns quadros simples pendurados na parede junto a um pequeno espelho com uma frase escrita acima do mesmo.
“Essa é a única pessoa que você pode mudar.”
Mais à frente há uma mesa de madeira rústica, estava cheia de teia e empoeirada, era como se todo aquele quarto não fosse visitado durante meses ou anos.
— Ele só deve ter me aceitado aqui porque eu vou limpar o templo, coisa que ele simplesmente não faz a um bom tempo. — Kenji diz limpando a mesa com um espanador.
Enquanto Kenji limpava toda a mesa e a estante, ele escuta um barulho vindo da porta.
Toc toc.
— Pode entrar! — exclamou Kenji.
Kallion abre a porta, ele estava segurando algumas vestimentas na mão esquerda e na direita um pequeno vaso de barro para plantas.
— Me dei o trabalho de pegar isso pra você, achei que fosse precisar! — ele termina colocando ambas as coisas na mesa.
— Ah, muito obrigado! Nem sei como te agradecer.
— Eu não fiz nada de mais, só o necessário para a ocasião.
— E qual é a ocasião? — pergunta Kenji confuso e intrigado ao mesmo tempo.
Kallion ri.
— A sua chegada não é óbvio! Vou te deixar em paz agora, até depois! — Kallion se retirou fechando a porta, deixando Kenji sozinho novamente.
Depois de um belo banho restaurador, Kenji retira sua roupa velha, que estava suja e rasgada. Em seguida ele põe as roupas novas que recebeu de Kallion.
Era uma roupa preta mais ajustada ao corpo que ele usaria por baixo, por cima uma túnica vermelha de mangas curtas com corte assimétrico.
Ele amarra faixas brancas em seus dois braços, nas regiões onde a túnica não cobria.
Já na parte de baixo uma calça larga de tecido escuro, que lembrava muito uma calça harém. A calça ia ser usada por cima da túnica.
Completando com uma faixa marrom larga de detalhes geométricos para envolver sua cintura como um cinto ornamental.
Ele pega sua roupa velha, encara elas por um momento e não jogou-as fora, guardou na primeira gaveta da estante próxima a cama.
Pegou a semente que recebeu do tronco do sussurro e a colocou sob a mesa próximo ao vaso.
— Depois eu planto isso, ainda preciso de terra e água.
Kenji abre a porta e sai do quarto fechando a mesma atrás dele.
“Preciso agilizar com a organização, quero ter o máximo de descanso possível quando terminar aqui.”
Rapidamente Kenji pega uma vassoura e um espanador, começando assim a limpar o chão e as paredes.
Ele começa limpando o salão principal, onde os mestres e visitantes faziam suas orações. O salão tinha várias luminárias e objetos de ouro em vários lugares, além das estátuas bem posicionadas e cada canto das paredes.
Kenji se perguntou se todas elas eram espíritos guias ou apenas aquela raposa, mas temeu perguntar isso para Kallion.
— Você está indo bem! Parece até que já é de casa. — Kallion diz rindo se aproximando do garoto.
Kenji deu uma risada sem graça e disse:
— O senhor tinha dito que a raposa era um espírito guia, certo? Pode me explicar porque ela quis me guiar exatamente?
— É uma boa pergunta. — Kallion alisa sua barba como de costume e continua. — Espíritos guias normalmente guiam pessoas que estão perdidas, deslocadas, procurando um lugar para pertencer. Eles ajudam essas pessoas a chegarem a lugares onde elas possam se encontrar se estão perdidas, se reconectar se estão desconexos da realidade. Todos nós já pertencemos a algum lugar, as vezes só não queremos enxergar isso.
Kenji não responde e começa a pensar no que Kallion tinha dito.
— Isso responde sua pergunta?
— Sim responde, muito obrigado! Na verdade… — ele faz uma pausa. — Tenho outra pergunta. O senhor disse que era um monge, eu vou precisar cortar meu cabelo?
Kallion abre um sorriso e cai na gargalhada.
— Garoto… — Ele fez algumas pausas pois continuava rindo. — Eu não quero… que você corte cabelo nenhum… eu só quero que você aprenda, isso é muito mais importante… que você raspar sua cabeça.
Kenji fica sem jeito ao ouvir todo aquele gargalhar.
— Err.. a-aprender o que?
— Quando terminar aí me encontre na cachoeira ao leste. — disse Kallion se retirando.
Com o passar das horas Kenji se encontrava exausto, terminou de limpar aquele grande salão e precisa urgente de um descanso.
“Ninguém disse que seria fácil, eu já deveria saber. Ainda tenho que me encontrar com ele numa cachoeira, espero que seja algum descanso!”
Antes de seguir para a cachoeira ele volta ao seu quarto pegando o vaso e a semente sob a mesa.
Saindo do templo pega o primeiro punhado de terra que vê pela frente, põe dentro do vaso, abre um pequeno buraco, coloca a semente e cobre com a terra restante.
“Agora só falta regar.”
Com o vaso em mãos segue a leste do templo em direção a cachoeira que Kallion tinha falado.
Chegando no local indicado por Kallion, Kenji vê uma grande cachoeira que domina a paisagem, com múltiplos níveis por onde a água escorre.
As quedas d’água são largas, espumantes e se dividem em vários fluxos que descem entre rochas e fendas.
A cachoeira está cercada por uma densa vegetação tropical, com árvores verdes que se espalham pelas laterais e ao fundo.
Grandes blocos de pedra escura emergem tanto das laterais quanto da base da cachoeira. Alguns estão cobertos por musgos ou pequenas plantas.
Kallion estava sentado na beira do lago que era formado pelas águas da cachoeira.
— Tudo pronto? — perguntou Kallion.
— S-sim. — respondeu ele.
Kallion se levanta e diz:
— Tire a túnica e essa meia, você não vai querer molhar elas não é?
Antes que Kallion desse mais alguma ordem, com as mãos em concha ele pega um pouco de água e molha a terra que estava com a semente.
Kenji ficou confuso e estranhou o pedido do monge, porém obedeceu mesmo assim ficando apenas com a roupa preta que estava por baixo da túnica e a calça.
— Quero que você suba na pedra próximo a cachoeira, você vai sentar e tentar se concentrar apenas no som da cachoeira. Nesse fundamento você vai aprender sobre foco e concentração, é um ensino mais simples, você deve conseguir.
Kenji sobe a pedra com cuidado por conta do musgo e senta com as pernas cruzadas em borboleta, fecha os olhos e tenta se concentrar no som da cachoeira atrás dele.

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