Índice de Capítulo

    Somos moldados a partir de nossas experiências. Claro, empatia é necessária para se viver em uma sociedade saudável; mas já se perguntou o custo necessário para negarmos nossas crenças?   

    Verdade seja dita, convencer uma criança de que ela está errada não é difícil, mas convencer alguém que já viveu décadas? Imagine ser tão egocêntrico a ponto de pensar que você é capaz de fazer com que um ser vivo negue uma ideia que acreditou durante toda a sua existência? O quão arrogante é aquele que tenta fazer com que o outro negue a sua própria vida a troco de nada? … Bem, mas na minha humilde opinião, se existe uma força capaz de tornar isso realidade, essa força é o amor.  

    A Sabedoria da Idade ~ O Bibliotecário  

    CRACK  

    — Uma história trágica… você foi muito ingênuo, garoto. — O velho continuava folheando as páginas do livro que estava lendo. — Você não merecia isso…  

    O Assassino de Amarílis   

    Capítulo 2  

    Um garoto chamado Fynn  

    O tempo passou rapidamente, Fynn se acostumou a visitar Lilian e sua mãe todos os dias. Era uma experiência nova para o menino, afinal, antes disso, ele nunca havia tido a experiência de ter uma casa ou uma família para chamar de sua.   

    O garoto nunca fez perguntas, o porquê de a mulher ser forte ao ponto de não ser ferida por sua defesa natural e como ela sabia tanto a ponto de conseguir ensiná-lo a controlar completamente seus dons. Dons. Uma palavra que ele aprendeu com Lilian, uma que ele mesmo nunca aprenderia a usar, tais presentes do universo eram vistos como uma maldição até as conhecer.   

    — Ei, você ouviu falar das boas novas?   

    Enquanto passeava pela cidade, Fynn ouviu sem querer as conversas entre duas senhoras que faziam compras na feira.   

    — Boas novas?  

    — Sim, aparentemente a Igreja de Yan decidiu abrir um novo templo aqui mesmo em Amarílis!   

    — Impossível, sério? — a mulher surpreendeu-se. — Graças a deus, quem diria que eles não se esqueceriam de nós nessa vila isolada.  

    — É sério, uma comitiva preliminar logo deve chegar para fazer o assentamento   

    — Quem sabe eles levem a criança demônio.  

    SHHH, ele está ouvindo.  

    — Não importa, ele não vai fazer nada de qualquer forma — afirmou a velha, rindo e debochando do garoto.  

    Fynn, de fato, ignorou, fazia algum tempo que ele já não reagia a provocações patéticas como aquela. Ele tinha motivos para não criar conflitos, foi o único pedido da mãe de Lilian, não utilizar seus dons para machucar as pessoas, por mais maldosas que elas fossem, eram apenas seres ignorantes a grandiosidade do mundo. Carregando suas compras de frutas em sua sacola, o agora jovem de 16 anos apressou-se para voltar para a floresta, sem perceber que alguns jovens o seguiam.  

    Passando o primeiro riacho, virando dez passos para a direita e vinte para a direção da pedra pontiaguda, seguir reto até encontrar o próximo riacho. Atravessando-o, andar para o norte em linha reta por mais 2 quilômetros. Essas foram as instruções que Fynn sempre seguia para chegar em casa. Ao bater quatro vezes na porta, ele entrava.  

    — Cheguei em casa.  

    — Fynn, você voltou! — Lilian correu em sua direção e o abraçou, tomando de sua mão a sacola com frutas que o jovem trazia. — O que trouxe de bom?  

    — Laruvitas.   

    Pequenas bolinhas laranjas do tamanho de uvas comuns, mas com um sabor intenso de laranja, como pequenos gomos da fruta alaranjada, mas com uma casca fina e comestível.  

    — Ahhhhh, eu amo laruvitas, mas são tão difíceis de cultivar por aqui…  

    — Por isso que sempre as trago para você.   

    COUGH COUGH  

    Lilian se curvou no chão, tossindo.   

    — Lilian, de volta para cama.  

    Sua mãe, cuidadosa como sempre, ouvindo sua filha tossindo, gritou da cozinha da casa.  

    — Sim…  

    — Vamos, eu te levo.  

    Agachando-se, Fynn ofereceu suas costas para a agora moça de 17 anos subir de cavalinho. Apesar de ser um ano mais velha, Lilian, que sempre foi doente, apresentava um corpo frágil e pequeno, mal chegando aos um metro e sessenta de altura. Sem perder tempo, a garota imediatamente subiu em suas costas.  

    — Às vezes tenho a impressão que você sai da cama só para poder subir nas minhas costas.  

    — Ainda bem que você sabe.  

    RENK RENK RENK  

    O chão estalava a cada passo que o homem dava.  

    — Você gosta de andar de cavalinho?   

    — Hm… sim… — respondeu, docilmente.  

    — O que foi?   

    — O que foi o quê?  

    — Esse ‘hm…’   

    — É que gosto de andar de cavalinho, mas se não fosse você me carregando, não gostaria, você balança muito — Lilian respondeu com uma voz suave e repousou gentilmente a cabeça em suas costas. — Mas acho que gosto de estar nas suas costas e não de andar de cavalinho.  

    — Me desculpe por balançar tanto, não consigo ser muito delicado, mas sempre que quiser, pode me pedir — disse o garoto, colocando-a calmamente na cama. — Eu também gosto de te carregar.   

    — Mesmo que você seja ruim nisso?   

    — Sim, mesmo que eu seja ruim nisso.   

    — Vai continuar me levando mesmo quando eu melhorar?  

    — Claro! — falou, confiante. — Sempre que quiser.  

    — Fynn, pode pegar umas verduras para mim na horta? — a mãe de Lilian gritou da cozinha.  

    — Sim, senhora! — respondeu. — Já volto, me dê um segundo.  

    Correndo até a horta, Fynn começou a colher as verduras já prontas para serem colhidas. Ao redor da casa, arvores frutíferas, hortas de verduras e plantas medicinais eram cultivadas em camadas. As que davam frutos eram as mais distantes no círculo, para que grandes animais sempre estivessem por perto, mantendo a região da casa em segurança de qualquer morador da vila. Já ervas medicinais eram plantadas no círculo do meio; seu odor forte afastava os mesmos grandes animais de entrar na casa, criando assim uma barreira contra o perigo silvestre. Por fim as verduras eram mantidas no mais próximo, para fácil colheita.  

    Era uma vida simples e boa.  

    CRACK  

    Alguns dias se passaram e a comitiva da igreja finalmente chegou. Apesar de ser um vilarejo, o chefe da vila promoveu uma grande festança para recebê-los; a maior que Amarílis já teve. Mesmo não se importando muito com a igreja, Fynn se interessou no grupo de vinte pessoas vestidas de capuzes brancos que haviam vindo. Eram pessoas novas, uma coisa que não se via frequentemente ali.   

    — Vejam, a criança demônio veio!   

    — Talvez eles o levem…  

    Os vilões comentavam menos sobre o garoto, mas ainda estavam curiosos sobre o que iria acontecer.   

    — Hm? — subitamente um dos encapuzados virou-se na direção de Fynn e a passos largos andou até ele.   

    — É agora!  

    — Finalmente vão sumir com ele!  

    No entanto, a postura da pessoa diferiu do esperado. Parando a frente do jovem, o homem colou a mão em seu ombro.  

    — Incrível! — Exclamou com uma voz grave. — Yan é realmente perfeito, nos mandar aqui tem que ter sido obra do divino! Encontrar um jovem tão talentoso numa vila pacata!   

    Fynn permaneceu calado, encarando o homem branco de cabelos loiros e olhos verde-esmeralda.  

    — O que acha de vir conosco? — Perguntou. — Lhe daremos treinamento e instalações, você não terá mais nenhuma dificuldade em sua vida!  

    Estático, o jovem não respondeu.  

    — Se não é o suficiente, construiremos uma filial da Igreja aqui mesmo em Amarílis, isso em pouco tempo transformara essa vila em uma grandiosa cidade, o que você acha?   

    — Realmente uma joia da nossa Amarílis! — gritou o velho chefe da vila. — Sempre soube que esse garoto era especial!  

    — Enfim, nossa vila irá se tornar grandiosa!  

    — Quem imaginaria que em minha vida veria tal coisa!   

    — Senhor, qual o seu nome? — perguntou Fynn, interrompendo os aldeões que comemoravam.  

    — Pode me chamar de Sir Ronald, garoto.  

    — Então, Sir Ronald… — O jovem se curvou levemente. — Agradeço o convite, mas gosto da vida que possuo.   

    — O que está dizendo!? — O velho chefe da vila exclamou. — Você não tem esse direito, tem ideia do que essa oportunidade pode fazer por você? Por nós?   

    O homem encapuzado levantou a mão, gesticulando para o velho parar de falar.  

    — Tem certeza? É uma oportunidade que jamais aparecera a sua frente novamente. Só estou te oferecendo por que enxergo o potencial que existe em você.  

    — Sim.  

    — Se é assim que você se sente, não insistirei mais.   

    — Obrigado, Sir Ronald — finalizou, curvando-se novamente.  

    E simples assim, Fynn se virou e foi embora para sua casa.  

    CRACK  

    Mas, infelizmente, essa história nunca foi um conto de fadas. O conto do Assassino de Amarílis é uma tragédia.  

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