Capítulo 1 – O Começo de Tudo
“Bosta, perdi outra partida.”
A frase ecoou na minha cabeça, uma mistura de frustração e raiva me consumindo. Não era só mais uma derrota; era a quinta seguida, e tudo por causa de um time inútil que parecia se esforçar para me atrapalhar. Me joguei na cadeira, bufando.
“Se não fosse por eles, eu teria ganhado fácil. Já chega desse jogo de merda por hoje.”
Desliguei o computador com um suspiro pesado. O calor da tela ainda era palpável, mas minha paciência já estava esgotada. Talvez fosse uma boa ideia ver um anime, alguma coisa para me distrair. Quem sabe, a nova temporada daquele anime que eu estava esperando há meses já não tinha saído? Com sorte, seria o suficiente para aliviar meu humor.
Peguei o celular e abri o navegador. Assim que a página inicial carregou, um anúncio gigantesco apareceu: “O jogo mais esperado do ano foi lançado!”.
Meus olhos se arregalaram por um instante. Finalmente! Curioso, cliquei no anúncio para ver os detalhes. As imagens eram impressionantes, e as promessas do jogo pareciam ainda melhores. Mas aí veio o choque: R$800,00.
“Que absurdo…”, murmurei para mim mesmo, balançando a cabeça em descrença. “Oito anos de desenvolvimento, mas mesmo assim… É muito caro.”
Olhei para o canto do quarto, onde minha carteira estava jogada em meio ao caos. “Quer saber? Dane-se. Vou comprar. Vou só conferir minha conta primeiro.”
Levantei da cadeira com certa dificuldade, meus joelhos protestando com o movimento repentino. Passei os olhos pelo quarto imundo. Roupas sujas, embalagens de salgadinho e copos descartáveis estavam espalhados pelo chão. O cheiro de comida velha começava a incomodar. “Preciso limpar isso logo… mas não vai ser hoje”, pensei, chutando um saco de lixo para abrir caminho.
Ao pegar a carteira e abrir, a realidade me atingiu: nem dois reais. Suspirei.
“Vou ter que pedir para a minha mãe… Não tem outra opção. Preciso dos R$800, e rápido.”
Olhei ao redor, procurando o celular para ligar para ela, mas o quarto estava em um estado tão deplorável que encontrar algo seria um desafio.
“Deve estar por aqui no meio dessa bagunça. Já faz meses que não limpo esse lugar…”, pensei, dando de ombros.
Sacudi a cabeça, tentando afastar a preguiça. Não ia limpar hoje, de qualquer forma. O melhor era esperar até amanhã, quando minha mãe viesse me trazer comida. Eu podia pedir o dinheiro na hora. Ela sempre cedia.
Mas antes disso, tinha outra necessidade. Meu estômago roncava, e eu estava precisando de algo para beber.
“Vou no mercado comprar um refrigerante e uns salgadinhos. Melhor do que ficar aqui.”
Empurrei mais lixo com o pé para abrir caminho até o guarda-roupa. Uma das portas estava quebrada e rangia horrivelmente quando a abri. Enfiei a mão na prateleira do fundo, revirando entre roupas velhas e amassadas. Depois de um tempo, encontrei algumas notas sujas e amassadas. “Aqui está”, murmurei, contando o dinheiro rapidamente. “Dá pra ir ao mercado.”
Com dificuldade, caminhei até a porta do quarto, chutando mais coisas para o lado. Quando tentei abrir a porta, ela não se mexeu. Estava presa. Empurrei com força, mas nada. O lixo acumulado do outro lado parecia ter trancado a saída.
“Ah, que merda”, resmunguei, antes de puxar a porta com força. Ela cedeu com um estalo alto, quase me derrubando quando desabou sobre a pilha de sacos plásticos no chão. Suspirei de novo. “Hoje está tudo dando errado.”
Finalmente, saí do quarto e segui em direção à rua. A caminhada até o mercado não era longa, mas, para mim, cada passo parecia um desafio. Estava fora de forma, e meu corpo cansado protestava a cada movimento. Parei por um momento na frente de casa para recuperar o fôlego, sentindo meu coração acelerado e as pernas trêmulas.
“Será que vou conseguir chegar no mercado?”, pensei, rindo de mim mesmo. Era só uma caminhada curta, mas para alguém como eu, gordo e sedentário, parecia uma maratona.
Foi nesse momento que ouvi um grito.
— SOCORRO!
A voz de uma mulher, cheia de desespero, cortou o silêncio da noite. Meu coração disparou. Olhei ao redor, tentando identificar de onde vinha o som. O grito ecoou de novo, mais perto dessa vez.
— ALGUÉM ME AJUDA!
Meus instintos me diziam para correr na direção oposta, mas meus pés começaram a se mover sozinhos. A curiosidade e o medo me puxavam em direção ao beco escuro a poucos metros de distância. Minha respiração se tornou pesada, e o suor escorria pelo meu rosto enquanto eu me aproximava.
A rua estava mal iluminada, os postes piscavam intermitentemente, criando um cenário ainda mais sinistro. O beco parecia um buraco sem fim, envolto em sombras que dançavam com a pouca luz disponível.
E então, os gritos cessaram.
Senti um calafrio percorrer minha espinha. “Será que algo aconteceu com ela?” Pensei em voltar, mas agora já estava perto demais. Tomei fôlego e dei mais alguns passos, até que a cena à minha frente me paralisou.
No chão, uma mulher jazia imóvel, o corpo ensanguentado. Ao lado dela, um homem alto e magro, com a pele pálida e uma faca em mãos, observava sua obra com um olhar frio. Seu rosto estava salpicado de sangue, e o sorriso que ele carregava era algo que eu nunca esqueceria.
Quis gritar, correr, fazer qualquer coisa… mas meu corpo se recusava a reagir. “Corra!”, meu cérebro gritava, mas minhas pernas estavam como cimento. O homem finalmente me notou. Seus olhos se fixaram nos meus, e em um instante ele avançou, a faca brilhando em sua mão.
Tentei me virar, mas tropecei em algo no chão, caindo de cara no asfalto. Antes que pudesse me levantar, senti uma dor aguda nas costas, seguida de outra, e outra. Facadas rápidas, profundas. Meu corpo queimava de dor enquanto o homem me esfaqueava repetidamente.
Minha visão começou a escurecer, e só conseguia pensar em uma coisa: minha mãe. Ela foi a única pessoa que se importou comigo, mesmo quando eu não me importava mais comigo mesmo. “Merda… eu só queria uma segunda chance…”, pensei, enquanto tudo à minha volta desaparecia.
A dor foi sumindo, devagar. Minha respiração, antes pesada e desesperada, se tornou leve, quase inexistente. Não sentia mais meu corpo. O mundo ao meu redor desaparecia, tudo sendo envolvido pela escuridão. Por um momento, pensei que aquilo era o fim. Não havia mais dor, não havia mais medo. Apenas um vazio profundo e interminável.
Mas então, algo aconteceu.
…
Uma luz fraca começou a brilhar no horizonte daquela escuridão infinita. Era pequena, distante, mas aos poucos foi crescendo, até preencher tudo ao meu redor. Abri meus olhos — ou pelo menos senti como se tivesse aberto — e me vi em um lugar estranho. Não era mais o beco. Nem minha casa. Eu estava… em outro lugar.
Tudo ao meu redor era preto, mas no centro de tudo havia um trono gigantesco, feito de um material que não conseguia identificar. Era imponente, majestoso, e o simples fato de olhar para ele me fez sentir pequeno, insignificante.
De repente, uma voz profunda e poderosa ecoou de todas as direções.
— Você será meu campeão.
Tentei me mover, mas não consegui. Meus joelhos se dobraram sozinhos, como se meu corpo estivesse sendo controlado por outra força. A sensação era esmagadora, como se uma presença invisível estivesse me forçando a me ajoelhar diante daquele trono.
A voz continuou, fria e autoritária:
— Você terá apenas uma missão. Não posso revelar qual é agora, mas quando o momento chegar, você saberá. Não falhe.
— Quem está aí? O que está acontecendo? — tentei gritar, mas minha voz não saía. Era como se eu estivesse mudo, minha garganta travada pelo medo e pela confusão. O silêncio foi a única resposta.
Um clarão ofuscante invadiu meus sentidos e, por um momento, uma dor aguda me envolveu, como se estivesse sendo espremido dentro de um espaço apertado. A luz intensa se dissipou, e o desconforto começou a diminuir lentamente. Quando consegui abrir os olhos, o cenário ao meu redor estava começando a se definir.
…
À minha frente, um homem muito velho se destacava. Seu rosto era coberto por manchas escuras e rugas profundas. O sorriso que ele oferecia era desdentado e, em vez de cabelos, seu couro cabeludo careca era adornado por orelhas pontudas. Havia algo de inquietante em sua aparência.
— Olhem, ele é um menino bem saudável — disse o velho com um tom de voz que tentava ser reconfortante. — Não há motivo para preocupação.
A sensação de estar nos braços de uma mulher me envolveu com um caloroso alívio. Seus braços eram suaves e reconfortantes, e quando levantei os olhos, vi que ela tinha a pele clara, olhos azulados que brilhavam com ternura e um cabelo loiro que caía em ondas delicadas. A expressão no rosto dela era uma mistura de alegria e lágrimas, que escorriam com um brilho de felicidade.
Ao olhar para o lado, vi um homem com uma presença imponente. Seu cabelo negro estava bem aparado e sua barba cuidadosamente alinhada. Seus olhos eram tão escuros que pareciam absorver a luz ao redor, criando uma aura de mistério e profundidade. Sua expressão era séria, mas havia um toque de determinação que era quase palpável.
— Meu filho Lucas — ele prometeu com uma voz firme e resoluta —, juro que protegeremos você e sua mãe com minha própria vida, se necessário. Nada acontecerá com vocês.
Essas palavras carregavam um peso imenso, e uma emoção profunda fez com que uma lágrima escorresse pelo meu rosto. O que eu estava começando a compreender era que, de alguma forma, eu havia reencarnado no corpo de um bebê. O ambiente ao meu redor parecia um espaço carregado de simbolismo, com velas e símbolos estranhos decorando as paredes. A atmosfera era opressiva, como se estivesse envolto por uma aura de rituais antigos.
A sensação de fadiga tomou conta de mim, e o desejo de dormir era quase irresistível.
…
Quando acordei, estava em uma sala que combinava o aspecto medieval com um conforto surpreendente. O berço de madeira ao meu redor era simples, mas de qualidade superior. A decoração do quarto era encantadora, com detalhes em madeira e uma grande janela que oferecia uma visão deslumbrante do exterior.
Decidi que o melhor seria tentar chamar a atenção. Comecei a chorar, e, após alguns minutos, uma mulher entrou na sala. Ela tinha a pele clara, cabelo liso e um sorriso acolhedor. Seus olhos transmitiam uma mistura de cuidado e curiosidade, e suas sobrancelhas finas estavam perfeitamente moldadas.
— O que aconteceu, meu sobrinho? — Ela perguntou com um tom de voz gentil e reconfortante. — Você quer comer? Vou te levar para sua mãe.
Enquanto ela me erguia, a suavidade de sua pele era inegavelmente agradável. À medida que ela caminhava pelo corredor, eu pude observar o ambiente ao redor: a casa era imensa, com corredores longos e muitas portas e janelas. Cada detalhe parecia ter sido pensado com esmero.
Chegamos à cozinha, que era enorme e repleta de utensílios antigos e funcionais. Um grande fogão a lenha dominava o espaço, e prateleiras e armários estavam cheios de itens variados. O ambiente parecia acolhedor e cheio de vida.
A mulher entregou-me à minha mãe, que estava esperando com uma expressão de amor e preocupação.
— Oi, Luiza. Trouxe seu filho. Ele estava chorando, deve estar com fome — informou a mulher.
Minha mãe sorriu e respondeu:
— Obrigada, Ayesha.
Enquanto mamava, percebi a riqueza do sabor do leite materno. Era uma experiência muito mais satisfatória e saborosa do que qualquer leite industrializado que já conhecera. O conforto e a segurança que senti enquanto me alimentava eram incomparáveis.
O ambiente ao redor era esplêndido, e eu me vi rodeado por um mundo que, embora fosse novo e desconhecido, prometia um futuro cheio de possibilidades. Com tudo isso ao meu redor, não pude deixar de pensar na adaptação a este novo mundo.
A sensação de sonolência voltou a me envolver, e, apesar de minha vontade de explorar, o cansaço do corpo de um recém-nascido me forçou a fechar os olhos novamente.
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