Capítulo 43 – Trunfo Oculto
— Como assim não são sua carta na manga? — disse Kael, franzindo o cenho, com os olhos atentos em cada detalhe de Lillix. — Você ainda tem um trunfo maior do que esses soldados de correntes?
O vento soprava entre as árvores. Lillix sorriu. Um sorriso largo, torto, do tipo que mistura diversão com loucura.
— Ahaha! Tá curioso, velho? Se você morrer… quem sabe eu te conte! Hahaha! — respondeu ela, enquanto dava dois passos à frente. A voz carregava uma crueldade fria, quase brincalhona, como se estivesse contando uma piada infantil antes de desferir um golpe fatal.
Kael manteve a calma, a mão repousando levemente no cabo da espada embainhada.
— Essa proposta está muito ruim… vou ter que recusá-la. — falou, com um tom de voz sereno, mas afiado como aço.
— Hah! Não tem como recusar, já que você vai morrer de qualquer jeito aqui, velho! AHAHAHA! — disse Lillix, gritando, sua risada ecoando entre as árvores como um chamado de morte.
Kael olhou ao redor, os soldados de correntes já se levantavam mais uma vez. Os corpos deformados e metálicos estalavam enquanto se reconstituíam. Correntes tilintavam no ar como serpentes rastejando em busca de carne.
O espadachim suspirou profundamente. Seus ombros se abaixaram num gesto de tédio… ou desdém. Então, ele se virou sem dizer mais nada e correu para longe, em direção à floresta.
— Ei! Já vai fugir? — gritou Lillix, irritada ao ver Kael desaparecer entre as árvores. — Eu ainda nem tive a chance de quebrar seus ossos! Fica mais um pouco, velho!
Mas ele já havia desaparecido. Os soldados começaram a persegui-lo de imediato, movendo-se como um enxame desajeitado de ferro.
Kael, no entanto, não corria em desespero. Ele pulava.
Com maestria, usava as árvores como plataformas. Cada salto era preciso, cada impulso uma explosão de força e técnica. De um tronco ao outro, se movimentava como se estivesse dançando em meio ao caos.
— Dança do Salto Raso — murmurou ele, com os olhos focados, enquanto suas pernas impulsionavam seu corpo numa sequência quase coreografada.
Então, num salto repentino, ele bateu os dois pés contra o tronco de uma árvore mais grossa e a usou como catapulta. O impacto rachou a madeira, e Kael foi lançado como uma flecha.
Girando no ar, ele brandiu a espada em movimentos circulares, cortando em todas as direções. Os soldados de correntes foram destruídos em massa. Correntes se soltavam, eles voavam, faíscas cruzavam o ar.
Mas Kael não estava mirando neles.
Ele atravessou a multidão metálica como um raio prateado, o verdadeiro alvo era Lillix, que estava logo atrás.
Ela mal teve tempo de reagir.
O corte veio num instante.
Um baque seco ecoou na floresta como um trovão abafado. Lillix ficou imóvel, a respiração presa, os olhos arregalados. Atrás dela, Kael pousava no chão com perfeição. Um joelho flexionado, a espada ainda no ar, o corpo sereno como a superfície de um lago antes de uma tempestade.
Com elegância, Kael guardou sua espada na bainha e ergueu os olhos para trás, esperando ver o corpo de Lillix cair.
Mas ela continuava de pé.
— Hahaha… Você quase me matou. — disse ela, com o canto da boca sangrando, e um fio de sangue escorrendo pelo queixo. Se eu não tivesse criado uma pequena barreira de correntes dentro da minha barriga, bem onde você mirou… eu teria me partido ao meio.
Ela deu dois passos cambaleantes, ainda sorrindo, mesmo ferida.
— Mas agora… é minha vez.
Kael tentou saltar para trás, instintivamente. Mas sua perna esquerda não respondeu.
Ele olhou para baixo.
— Tsk… — rosnou.
Correntes finas, quase invisíveis, haviam se enrolado em sua perna enquanto ele passava por Lillix. Tinham se agarrado como serpentes sorrateiras, presas firmemente ao tornozelo. Ele puxou a espada num estalo para cortá-las, mas.
— Rápido, Kurogami! — gritou Lillix, virando-se para o alto das árvores.
A floresta tremeu.
Galhos se partiram, pássaros voaram em debandada. Um vulto monstruoso emergiu de entre as árvores como um pesadelo vindo das raízes da terra.
Era ele.
Kurogami.
Um ser colossal, com quase quatro metros de altura. Seu corpo era uma muralha viva de músculos marcados por tatuagens negras, que pareciam pulsar como veias vivas. O rosto estava completamente oculto por uma máscara feita de ossos e ferro escurecido, com olhos que brilhavam em vermelho como brasas prestes a explodir.
Em suas mãos, ele segurava um machado gigantesco, sua lâmina com mais de dois metros, marcada com símbolos rúnicos e manchas antigas de sangue seco.
Kurogami correu.
Cada passo era um tremor no chão. Cada respiração era um rugido abafado. Em segundos, ele alcançou Kael, que ainda lutava contra as correntes em sua perna.
O machado desceu com uma força absurda.
Kael tentou bloquear, mas era tarde demais.
O impacto o arremessou como um boneco de pano. Ele voou por trinta metros, atravessando troncos, quebrando árvores, girando no ar até colidir com uma árvore grossa, que se despedaçou sob o impacto.
Kael caiu no chão, desacordado. O corpo sujo de sangue, a espada longe, os olhos fechados.
Lillix caminhou lentamente até a beira da clareira, ofegante, segurando o corte profundo na barriga.
— E você achou que eu estava blefando… — murmurou, com um sorriso cansado, mas vitorioso. — nTolo.
Atrás dela, Kurogami permanecia parado, como uma estátua viva, o machado apoiado no ombro. O silêncio da floresta era quebrado apenas pelo som metálico das correntes tilintando ao redor do campo de batalha.
A batalha estava longe de acabar.
Mas pela primeira vez… Kael estava fora do jogo.
— Agora só falta a pirralha maldita que está ali em cima… — disse Lillix, com a voz carregada de ódio e cansaço, apontando com o dedo ensanguentado na minha direção, seus olhos ainda estreitos pela dor do ferimento deixado por Kael. Seu corpo tremia levemente, mas o sorriso cruel permanecia em seus lábios. Ela parecia saborear cada momento de poder.
Mas, de repente, seu semblante mudou. Uma expressão de leve surpresa surgiu em seu rosto quando notou algo errado.
— Lillix, não tem ninguém ali. — disse Kurogami, com sua voz profunda, firme como uma rocha, encarando a copa das árvores com seus olhos vermelhos brilhando por detrás da máscara macabra. Seu tom era neutro, quase entediado, mas ele parecia atento.
— Eu percebi, saco de músculos! — retrucou Lillix com raiva, girando o rosto na direção oposta com os olhos arregalados, tentando localizar meu movimento. — Vamos! Ela está fugindo, ali, olha! — gritou apontando com força, os olhos vidrados, agora fixos em mim — que já descia rapidamente entre os galhos da floresta, saltando de árvore em árvore com desespero.
Meu corpo tremia enquanto pulava. Cada salto era um desafio contra o tempo, contra o medo e contra a morte. As árvores se passavam ao meu redor como borrões verdes e cinzentos. Os galhos rangiam sob meus pés, e o vento batia no meu rosto como tapas gelados, me lembrando da urgência da situação.
Eu tenho que ir rápido… se não eu vou morrer.
O peso da verdade batia como um martelo dentro da minha mente. Cada respiração ardia na garganta. Cada segundo importava. Meus olhos não se desviavam do chão que se aproximava. Eu não podia hesitar. Não agora.
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