Capítulo 82 — Uma promessa.
Sentada no sofá da sala, Night ficou em posição fetal e com um peso enorme na consciência. Som de passos foi ouvido, Daniel vinha pelas escadas com um rosto nebuloso.
Ele desceu e se aproximou do sofá enquanto se sentava e encarava o chão. Após um silêncio, o elfo tocou as costas da demônio e disse:
— Mal. Você foi muito mal.
— Desculpa…
O ferreiro tirou sua mão dela e cruzou seus braços. — Não sou eu quem deve se desculpar. Imagina só, a pessoa com quem você passou anos conversando. Dias, semanas, meses. Não tentava te tornar servo, não abusava de você, assediava, fazia coisas que você acredita ser somente para adultos e namorados.
— Eu não… abusei dele.
— Convenhamos, Night. Você com certeza faria isso, se, claro, já não tentou.
Apenas em silêncio ela ficou. Daniel suspirou e não fazia ideia de como explicaria para Astéria. Se Klei soubesse, mataria a garota, mesmo que a sua rainha tentasse matá-lo antes.
O elfo jogou seu corpo para trás e escorou sua cabeça no sofá.
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Enrolado em sua coberta, Kevyn, com seus olhos marejados, não sabia o que pensar, o que fazer. “Eu não fiz nada de errado? Daniel, mas ela… eu não sei, por quê?”.
Dá escuridão, um homem de terno negro surgiu e se aproximou do pequeno garoto. “Ainda somos parecidos, eu vejo”, pensou Klei, que se aproximou e se sentou ao lado de seu filho.
— Garoto, diga-me.
— Eu não sei…
— Então o que sente?
— Não sou o suficiente.
Klei estalou o pescoço e o perguntou: — Ela disse que você é?
— Não… sei…
— Então o que ela disse?
— Ela perguntou se eu não ligo pros sentimentos dela.
O homem olhou para seu filho embrulhado. — Ela disse conseguir ouvir o que você pensa? Ler suas memórias? Suas emoções?
— A-ah… sim. Mas… como você sabe?
— Não se importe com os detalhes. Não se importe com isso. Olha, se quiser uma dica que vai te ajudar, não se importe com isso. Aproveite e cuide dela. Lembre-se do que eu te disse, sua espada é uma extensão de você, então… dê atenção.
— Mas…
— Você é novo, né? Não é um adulto, nem… sabe o que as coisas significam e… tá tudo bem, siga seu coração. Seu pai entende esse sentimento, é o que mais entende, na verdade.
Em silêncio, Kevyn se descobriu com a coberta e encarou seu pai. Os dois fizeram contato visual e Klei puxou-o para perto e o abraçou.
Surpreso, o garoto quieto ficou e apenas aceitou o acolhimento.
— Kevyn, podemos fazer uma promessa?
— Ah… claro.
— Se eu fizer algo horrível, me odeie até o final, ok?
Quieto, o príncipe e seu pai mais uma vez fizeram contato visual. O olhar de dor de seu pai marcou o garoto. Algo que nunca esqueceria, o fez responder: — Eu nunca parei de te odiar.
Klei abriu um enorme sorriso e começou a rir. — Tudo o que eu queria ouvir. A minha última lição, Kevyn, se quiser ficar mais forte, vai precisar abrir mão das pessoas que mais ama. Claro, você provavelmente vai aprender isso com a vida — disse e logo se desmanchou na escuridão.
Kevyn bateu sua cabeça contra o colchão da cama e encarou o teto. Um momento de despersonalização, sua mente em branco ficou e, ele pode se enxergar.
Algo como um reflexo invertido pairou, ele iria ficar em breve, seu corpo estava fraco e seu nariz um pouco entupido. Como um vampiro fica doente? Ele quase não estava bebendo sangue e Night tomou o dele.
Uma leve pulsação o príncipe sentiu, corado e ofegante, ele se contorceu pela cama até se cobrir com a coberta de novo. “Que dor de cabeça”.
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Dado o amanhecer da sexta, Kevyn não levantou da cama pela manhã. Daniel então foi até o quarto e, quando entrou, viu o príncipe literalmente soltando leves chamas pela boca.
Ofegante, o garoto estava queimando em febre. Ao ver seu mestre, ele tentou falar:
— Me… desculpa… nyão consegui ir trabalhar…
Surpreso, o homem se aproximou e colocou sua mão sobre a testa dele. Estava tão quente que a palma queimou. — Aí! Quantos graus você está?! Ah… tudo bem.
Daniel saiu do quarto e foi até o banheiro procurar por um termômetro. Ele achou. “Será que isso vai aguentar?”, pensou e voltou até o quarto de seu aluno.
De olhos fechados, o príncipe cobriu seu corpo com a coberta.
— Você está sentindo frio? — De maneira calma, o elfo perguntou e se aproximou da cama.
— Muito… — Kevyn abriu suas pálpebras para encarar seu mestre.
— Pode se sentar? Preciso que coloque o termômetro debaixo do braço. — Daniel criou uma cadeira através da madeira e se sentou em frente à cama do garoto.
Após olhar para um lado, olhar para o outro… o príncipe se apoiou na cama e tentou se sentar. Na primeira vez, ele falhou e bateu a testa na cabeceira da cama. Na segunda, ele conseguiu, mas sentia como se fosse partir em dois.
Daniel, neutro, esticou a mão e esperou-o pegar o termômetro.
Tonto, o jovem piscou duas vezes e tentou pegar a ferramenta. Ele falhou e acabou passando reto até a mão do elfo, assim, tentou mais uma vez e errou de novo.
“Ele não está bem, definitivamente”, pensou Daniel, que bocejou e viu as diversas tentativas falhas de seu aluno. “Os olhos de energia não vão ajudar, com certeza só vão piorar a situação dele, eu imagino”.
Após tanto falhar, o garoto franziu sua testa e virou a cabeça em descontentamento. O ferreiro sorriu e pôs rapidamente o termômetro debaixo do braço dele.
— É, você está totalmente inútil.
Irritado, Kevyn encarou-o e respondeu: — Ei! Nyão estou inútil! Apenas… um pouco tonto.
Por um momento, Daniel imaginou Astéria doente e tão frágil. Logo ele largou sua imaginação e coçou sua cabeça. “Ah! Isso não é legal. Vou precisar ficar cuidando dele?”, pensou o ferreiro, que suspirou.
Após alguns segundos, o termômetro apitou e, retirando a ferramenta debaixo dos braços do príncipe, o elfo se surpreendeu. “Como assim 37 graus? Isso é tipo… uma temperatura normal, será que é só a testa que está quente? Hmmm”, coçou a cabeça de novo.
— Kevyn, qual é a sua temperatura normal?
— Ahm? Normal? São uns 21 graus…
“21? Como eu nunca reparei nisso? Pera… ELE ESTÁ COM HIPOTERMIA???!!!!”.
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