Capítulo 36.3 – História Paralela 06
O dia amanheceu como se a tempestade de dois dias atrás nunca tivesse ocorrido. O barco estava programado para partir ao meio-dia, mas Chloe mal conseguiu dormir. Não foi apenas por Damien, que parecia estar tentando cumprir os deveres conjugais que não conseguira cumprir durante o tempo em que estiveram separados.
Embora sua vida no Principado não tenha sido longa, tinha muitas lembranças acumuladas aqui e ali. A grande bolsa de bagagem estava repleta de desenhos feitos com Sophie, dos enfeites que a senhora Stella lhe presenteou, das roupas que bordara e dos livros que comprara economizando seu salário.
Damien simplesmente riu enquanto olhava os objetos que surgiam um após o outro na pequena sala e nem mesmo mexeu um dedo. Embora concordasse com a lógica de que não podia mexer nas coisas de sua esposa descuidadamente, Chloe sentiu um pouco de ciúmes quando o viu deitado na cama e relaxando sozinho.
“Não pode deixar a medicação de emergência para trás?” (Damien)
Damien olhou para Chloe, que quase brigava com sua bagagem, e disse isso; ela resmungou, mas negou com a cabeça.
“Posso ficar doente de repente.”
“Também há um médico a bordo do navio.” (Damien)
“O médico pode estar deitado com dor.”
Queria ouvi-la pedir ajuda pelo menos uma vez, mas Chloe, que finalmente conseguiu fechar sua bagagem com chave sozinha, se levantou com uma expressão de alívio. Damien, ao olhar Chloe assim, tinha sentimentos complicados apesar de sua expressão relaxada. Isso porque era como confirmar o fato de que a mulher que não descartou nem uma única nota e a quem ele amava desesperadamente, escapou com as mãos vazias.
“Hmm… acho que vou ter que apostar nisso…” (Damien)
Damien murmurou suavemente e umedeceu os lábios com a língua enquanto observava Chloe colocar o colar diante do espelho. Quando ele se lembrou da viagem de carruagem da vinha, sua tensão aumentou novamente. Como se para provar o que disse quando afirmou que a odiava e que seu toque lhe arrepiava a pele, se arrepiou nos delicados antebraços dela, que pareciam não ser maiores que um punhado.
Era natural que ele estivesse nervoso. Foi um desastre. Ele não era o tipo de pessoa que podia olhar para sua esposa como uma obra de arte. Mesmo quando a conheceu pela primeira vez, sentiu um forte desejo sexual ao mesmo tempo.
Realmente teria acreditado nisso, se naquele momento não tivesse encontrado o pingente na bolsa que caiu. Sua linda mentira de que não o amava. No entanto, Chloe Verdier não era alguém que pudesse levar consigo o rosto de alguém que não gostasse, em nenhuma circunstância.
Damien se aproximou de Chloe e prendeu o fecho do seu colar.
“Por que não coloca isso na sua bolsa?” (Damien)
“… porque poderia se misturar na bagagem e se perder? É natural levar consigo as coisas mais importantes.”
Damien engoliu em seco enquanto olhava para Chloe, que encolheu os ombros como se estivesse perguntando por que ele perguntava algo tão óbvio. Queria repreendê-la por tentar enganá-lo com mentiras. De forma sutil, é claro.
“Tenho que sair.” (Damien)
Foi então que Chloe empurrou seus ombros com as duas mãos enquanto ele inclinava a cabeça para beijá-la.
“Deve ir agora.”
Nesse momento, a voz de Lawrence Taylor se fez ouvir, limpando a garganta atrás da porta. Damien reprimiu um suspiro quando Chloe levantou a voz e disse a ele para não perder a chance de entrar. A rota marítima de volta a Swanton leva cinco dias. Ele queria tê-la só para ele em um lugar onde não houvesse distrações.
“Sua Majestade.” (Lawrence)
Lawrence Taylor desceu as escadas com sua bagagem, verificou os arredores e então o chamou cautelosamente. Lawrence, que encontrou os olhos azuis de Damien, ficou nervoso sem perceber e engoliu em seco com dificuldade.
“O que?”
“Isto é…” (Lawrence)
Lawrence, que hesitou, finalmente abriu a boca.
“Talvez seja minha imaginação, mas sinto como se sempre houvesse alguém me seguindo. Sinto como se tivesse visto o mesmo rosto que vi ontem na estalagem há alguns dias.” (Lawrence)
Damien ficou em silêncio por um momento, olhando para ele. Embora não tenha percebido, Lawrence Taylor não apenas tinha bom senso, mas também muita sorte. Era uma história que faria Weiss franzir a testa, mas havia uma razão intuitiva pela qual o contratou como seu assistente.
“Parece que está muito nervoso porque a viagem foi longa.”
“Sim, mas…” (Lawrence)
“Ainda assim, não é uma má ideia se preparar para uma emergência, então, devemos fazer alguns preparativos?”
Enquanto Damien acrescentava, Lawrence, que estava ansioso, finalmente soltou um longo suspiro e baixou a cabeça.
“Sim, diga-me, estou à sua disposição.” (Lawrence)
“A única maneira de chegar daqui ao porto é através das florestas remotas a oeste.”
“Sim, é verdade.” (Lawrence)
“Em vez disso, vamos em direção ao leste e pegamos o expresso até Trivani, a capital do Principado, e de lá pegamos outro navio até Swanton.”
Esse era o segundo plano de Damien, antecipando-se a possíveis emergências. Lawrence Taylor engoliu em seco ao perceber por que Damien o havia feito memorizar um mapa de Gwyneth e seus arredores.
“Por favor, deixe comigo…!” (Lawrence)
“E mais uma coisa.” Acrescentou Damien, sorrindo para ele. “Coloque todas as armas na sua bagagem e deixe-as disponíveis para que eu possa usá-las a qualquer momento.”
As vinte malas trazidas de Swanton não estavam apenas cheias de lembranças, mas também de armas capazes de realizar um ataque a uma pequena cidade imediatamente.
Isso significa que pode haver derramamento de sangue? Damien deu uns tapinhas no ombro tenso e rígido.
“No próximo ano, por essas datas, estaremos bebendo e relembrando o que aconteceu hoje. Se algo perigoso acontecer ou não, isso não muda.”
Lawrence percebeu com quem estava falando. Lawrence Taylor cerrava os punhos enquanto observava Damien sorrindo para sua esposa que o chamava.
‘O líder dos líderes, que não pestanejava nem diante do perigo, acreditava em si mesmo. Nunca decepcionarei o homem que me deu a força para não desistir do projeto que eu acarinhava toda a minha vida.’ Sua determinação era evidente em sua firme resolução e ao limpar o nariz com sua mão rechonchuda.
Mesmo depois de os assistentes de Damien suarem profusamente e carregarem a bagagem na carruagem, Sophie não estava à vista.
“Sophie provavelmente não quer dizer adeus. Mestra Claire, por favor, entenda. Na verdade, eu também quero reter Claire e não a deixar ir.” (Stella)
Chloe mordeu o lábio enquanto olhava para Stella, que segurava os bebês gêmeos com ambas as mãos e fazia uma expressão de desculpas.
“Até logo.” (Chloe)
Damien, que já havia se despedido de Ricardo, envolveu os ombros de Chloe com os braços.
“Têm muita bagagem, então já precisamos ir!” (Lawrence)
Claire beijou Stella nas duas bochechas enquanto ouvia Lawrence gritar alto; então ela se despediu dos funcionários um por um e deu um passo para trás com pesar. Eles procuraram por toda a mansão onde Sophie poderia estar, mas não encontraram a menina em lugar nenhum. Claro, Claire não pensou que essa seria a última vez, mas ainda assim queria abraçar a menina e se despedir. Quando Sophie estava prestes a entregar seu ursinho de pelúcia favorito, uns olhos azuis semelhantes aos de Damien brilharam em seus olhos.
“Chloe?” (Damien)
Chloe, que estava caminhando absorta em seus pensamentos, ergueu os olhos quando Damien chamou.
“Eu perguntei se você tem material suficiente para escrever uma carta.” (Damien)
“Ah, sim. Por quê?”
“Pensei que seria uma boa ideia escrever uma carta antecipada para sua família enquanto estamos no navio.” (Damien)
Foi um conselho realista escrever uma carta informando antecipadamente as pessoas que ficariam surpresas devido à situação atual.
“Sim, claro. Não se preocupe. Tenho papel e tinta suficientes. Vou escrever para Sophie mais tarde…”
Quando Chloe soltou essas palavras, Damien parou abruptamente de andar.
“Ela é uma garota adorável.” (Damien)
“Ela é realmente inteligente. Tão inteligente que pode memorizar um livro inteiro.”
“Ouvi dizer que ela tem uma personalidade bastante áspera e sensível.” (Damien)
“Foi só porque ela se sentia magoada, pois seus irmãos mais novos tiravam a atenção de sua mãe. Ela é uma menina que pode abraçar as pessoas com muita ternura.”
Chloe abriu muito os olhos e levantou um pouco a voz. Damien inclinou ligeiramente a cabeça enquanto a observava defender vigorosamente Sophie.
“Parece que você realmente se preocupa com ela como se fosse sua própria filha. Pela garota.” (Damien)
Damien não perdeu Chloe mordendo os lábios e evitando seu olhar com olhos trêmulos. A afirmação de Ricardo de que ele tratava Sophie como sua própria filha provavelmente não era um exagero.
Ele poderia adivinhar como Chloe se sentia agora que ela se foi sem nem poder se despedir de Sophie. Os momentos difíceis que ela passou após perder seu filho e como ela deve ter se sentido ao deixá-la sozinha enquanto sentia a importância mesmo nas coisas pequenas, provavelmente ainda estavam escondidos em algum lugar profundo dela.
“Devemos continuar procurando Sophie e raptá-la para levá-la para Swanton?” (Damien)
Chloe abriu os olhos e o olhou com expressão de espanto. Ela o agarrou pelo antebraço com expressão de medo de que Stella pudesse ouvi-lo.
“Vamos, vamos.”
Damien enfrentou ela em vez de dar passos.
“Chloe.” (Damien)
“Se você vai dizer besteira, não vou ouvir.”
“Não acha que poderia adivinhar onde Sophie poderia estar escondida?” (Damien)
Chloe o olhou e piscou com suspeita. Enquanto ele inclinava a cabeça, ela olhou para seus belos olhos azuis.
“Despeça-se de Sophie e vá.” (Damien)
“… está falando sério?”
Os olhos de Chloe estavam cautelosos enquanto ela verificava suas intenções.
“Sim.” (Damien)
Damien sorriu e falou baixinho.
“Até você ter uma filha, eu sou um frouxo.” (Damien)
Chloe ficou sem palavras ao perceber que ele havia lido sua mente.
Chloe olhou para o esconderijo sob o carvalho no quintal dos fundos, no armário do quarto e até embaixo do sofá da sala de estar, mas Sophie não estava lá. Stella, que inicialmente não pensou que fosse grande coisa, ficou séria e gritou o nome de Sophie em voz alta, soltando um som curto.
“Enviei uma carruagem para limpar a vila de manhã. Talvez ela tenha se escondido lá?” (Stella)
“… isso poderia ser possível.” (Chloe)
O rosto de Chloe se iluminou um pouco quando se lembrou de que uma vez contou à menina a história de uma garota que escapou em uma carroça.
“Se puder me emprestar um cavalo, vou dar uma olhada na vila. Senhora, que tal procurarem na casa de alguma amiga?” (Chloe)
“Sim, posso pedir esse favor a você. Também deveria ir à casa de Marimo, apenas por precaução.” (Stella)
Damien colocou Chloe no cavalo primeiro e depois saltou sobre o cavalo.
“Vou correr um pouco rápido.”
Damien olhou para Chloe sentada atrás dele e soltou um suspiro. Se ele quisesse correr mais rápido, era melhor que ela viajasse atrás. Sentindo a força na mão que segurava suas costas, Damien chutou com força o ventre do cavalo.
Chloe ofegou, sentindo o vento atrás dela, enquanto montavam rapidamente o cavalo. Na verdade, dada sua personalidade, ele poderia ter fingido não perceber e simplesmente ido embora, mas não o fez. Em vez de descartar isso como um simples adeus, ele reconheceu seu coração inabalável.
Assim que chegaram à vila, Chloe olhou para dentro. Assim como Stella disse que haviam enviado alguém para limpá-la, o interior estava limpo e arrumado. Até mesmo poucos pertences de Damien estavam faltando.
“Não acredito que esteja no primeiro andar.” (Damien)
“Tá.”
Depois de amarrar o cavalo na parte de trás da vila em vez da frente, Damien voltou. Damien olhou lentamente ao redor e, por algum motivo, até verificou a porta da vila. Chloe se virou para o segundo andar e o observou verificar as fechaduras das janelas.
“…” (Chloe)
O que pareceu estranho foi encontrar um par de sapatos vermelhos jogados no topo das escadas do segundo andar. No momento em que Chloe ergueu os sapatos de Sophie em suas mãos, ela ficou imóvel.
Um homem segurava a mão sobre a boca de Sophie, enquanto lágrimas corriam por seu rosto. A boca de Sophie estava fechada e seus olhos estavam úmidos. Poderia ser um ladrão? Foi sorte que a menina, que foi pega pelo homem armado, não perdeu os sentidos.
Chloe sentiu que, se fizesse um movimento errado nesta situação, Sophie estaria em perigo. Mas ela não sabia o que fazer. Suas pernas tremiam, e era difícil até mesmo ficar em pé. O homem perguntou a Chloe em voz baixa.
“Então Thisse está aqui?” (Desconhecido)
As sobrancelhas de Chloe se franziram entre os olhos. Se o homem fosse apenas um ladrão, não haveria como ele saber a identidade de Damien.
“Chloe!” (Damien)
Chloe, que não conseguia falar, ouviu a voz de Damien chamando ela lá embaixo. O homem sorriu significativamente e fez um gesto com o queixo para Chloe.
“Responda.” (Desconhecido)
Enquanto Chloe mordia os lábios após ouvir as palavras do homem, ele apontou a arma para a cabeça da menina. Chloe apertou os punhos e elevou a voz.
“Sim! Adele está aqui!”
Depois de gritar outro nome em vez de Sophie, Chloe continuou falando com a voz trêmula.
“Acho que ela estava triste porque tivemos que partir tão repentinamente…!”
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