Capítulo 101: Monstro
— Estão sentindo medo? Estão sentindo receio de me enfrentar ou seria um pouco de pena de estarem presentes? — Dante caminhava na direção dos dois com os braços esticados para os lados. — Eu sempre quis lutar contra criaturas, sempre quis mostrar pro meu pai o quanto eu era forte. Eu nunca venci ele, e por isso não posso me dar o luxo de perder para nenhum dos dois. Sabem por quê?
Dante ergueu a cabeça, orgulhoso.
— Porque perder pra vocês é o mesmo que igualar suas capacidades ao único homem que respeito nesse mundo inteiro.
Os Felroz estremeceram com a aura violenta que emanou de Dante. Não somente a presença, era o poder, a capacidade de reagir, os movimentos. Mesmo dentro de suas mentes irracionais, existia o desejo de viver acima de todas as dificuldades.
Criaturas do abismo, destinadas a caçar presas para saciar sua fome eloquente. No meio daqueles que poderiam ser chamados de irmãos e irmãs, os mais fortes comiam, bebiam e descansavam primeiro. Aprender quem poderia matá-los era essencial para continuarem sobrevivendo no inferno da gula infinita.
Por isso, as dezenas de olhos não poderiam se dar ao luxo de deixarem Dante de fora. Ele poderia ser um humano, poderia ser baixo, comum, e até mesmo não ser o mais interessante, como as criaturas já viram. Os dois Felroz Rosa, no entanto, concordavam com um mesmo ponto.
Ele era o mais perigoso.
E quando Dante desapareceu, eles recuaram mais um passo. O punho do velho humano apareceu vindo pela direita, carregada de uma pressão enorme e uma quantidade de Energia Cósmica tão precisa que seus sentidos pulsaram.
Perigo, perigo, perigo.
O Crânio Branco ergueu a mão, expandindo sua carne mais uma vez, provando uma defesa que já havia segurado o movimento dele. Mas, um segundo depois, o golpe não apareceu. Eles giraram juntos, procurando pelo velho por todos os cantos, mas foram lentos.
Dante surgiu pelas costas. Ele saiu de dentro de um buraco criado anteriormente pela batalha, e sua gargalhada expandiu.
— Esse é o soco que meu pai me ensinou quando eu era mais novo, seus desgraçados — sua voz se arrastou tão alto quanto um bombardeio. — ‘Soco Render’.
O Felroz virou para encontrar os ossos de seu punho. O impacto foi sufocante para a cidade de Kappz. A tempestade tornou-se nula, obrigando o ar a se repelir para as direções, e mesmo assim, Dante forçou os braços para frente, soltando seu urro enquanto a Energia Cósmica se reunia.
Assim que ele retornou o braço, o gancho veio.
O Crânio Branco tentou salvar o irmão que tinha sido acertado, mas assim que o gancho encaixou. A pressão do ar enviou ele para longe, batendo contra uma das pilastras da rodovia.
Mesmo machucado, o Felroz ficou de pé. Ele observou seu mais novo irmão ter a parte de trás do crânio trincado. E outro movimento do humano… Com a mão aberta, ele enfiou o braço completamente por dentro do peito, quebrando os ossos, segurando algo que pulsava um brilho amarelado, como um coração.
Crânio Branco sentiu seu peito formigar, o forçando a balançar a cabeça de um lado para o outro, e vendo imagens diferentes. Eram rostos… rostos humanos… apontando para ele… e mandando que fossem para uma jaula.
— Você é o próximo — ouviu o humano na sua frente dizer. — Eu conheço cada ataque, cada golpe que vai dar em cima de mim. Fui feito pra isso.
O Crânio fez todos os seus olhos se moverem para os lados, e então, ergueu a mão. A Energia Cósmica começou a ser puxada na sua direção. Só precisava ver, entender e replicar. Se aquele humano podia evoluir, ele também iria.
Se o humano podia comer, ele também podia. Se ele podia rir, então… mostraria seus dentes para ele.
— Energia Cósmica, hein? — Dante jogou Crânio Cinza para o lado, morto. — Quer mesmo apelar e tentar me matar? Vamos ver, então.
Dante sumiu dos olhos dele. A criatura fez seus olhos rodarem para todos os lados, procurando pelo humano, tentando achar um rastro deixado no ar ou no chão. Até mesmo fez seus sentidos se expandirem para que pudessem procurar em cada canto da cidade.
Mas, ele havia sumido.
O chão, então, se abriu bem debaixo dele. A criatura, lenta, foi atravessada pelo punho de Dante também, sendo erguida no ar. Mesmo com a Pedra Lunar retirada de seu peito, ela ainda tentava se mexer.
— Admito que vocês tiveram certa resistência. — Dante chegou bem perto de onde seria o ouvido humano. — Mas, nunca tiveram chance. Existe um ditado que meu pai sempre dizia. “Nunca enfrente um demônio que está disposto a lutar pelo lugar que ama”. Sabe o que quer dizer? Vocês estão na minha casa, estão no meu lar. E eu vou acabar com todos que tentarem destruir o que restou. Todos vocês.
Dante puxou o braço. O Felroz começou a deslizar pelo ar, caindo sem rumo na direção do chão, mas ainda com os olhos fixados no humano que flutuava. O rosto dele, os olhos, sua aparência, a aura… Isso é um humano?
I
— Eu não acho que seria apropriado dizer. — Marcus ergueu-se limpando os joelhos. — O velho é forte, muito mais do que qualquer um que eu já tinha visto antes. E mesmo assim, ele não deixa de sorrir.
Jix era o único que se mantinha na beirada, olhando para baixo. Ver Dante acabar com duas criaturas mutantes não era difícil. Não para ele, não para quem tinha um corpo tão bem treinado.
— Na primeira vez que o vi — disse Jix —, eu esperava que ele tivesse uma falha. Conheci muitos homens que se diziam ser fortes, poderosos, mas quando viam algo no desconhecido, eles recuavam. O corpo, a mente e a alma de Dante são como montanhas, altas demais para serem escaladas, mas coladas umas nas outras, como cordilheiras.
— Bem filosófico — comentou Marcus sem se importar muito. — Foi o que eu disse.
— Não, é diferente. Você diz que ele é forte porque parece ser forte. Sua visão se limita ao externo, em como ele lida com o mundo aqui fora. Estou dizendo o interno. Cada ação dele é tomada em um nível que nem mesmo eu posso entender completamente. Você diz que ele sorri mesmo lutando contra um Felroz, mas ele faz o mesmo com humanos.
Juno admirava seu mestre. Não tinha um dia que acordava entediada para aprender com os dois. Jix claramente era um dos melhores homens que encontrou, tinha inteligência, sábio, centrado. Era o ápice do que uma mente humana racional poderia se tornar.
Dante, por outro lado, era algo que para seus olhos que viram tanta destruição se espelharem. Era na bondade, na força, no sorriso e na dedicação. Ele não usava uma arma, não usava uma armadura, não tinha seus métodos alternados.
Para Juno, Dante era alguém que nunca chegou perto de alcançar.
— Eu… acho que ele nunca colocou ninguém no patamar dele. — Juno ficou em silêncio por um tempo, ainda fitando seu mestre no meio da rua, lá embaixo. — Ele parece… sozinho, na espera de alguém… ou algo.
— Você tem razão — respondeu Jix. — Ele realmente parece esperar algum inimigo poderoso. Talvez, seja por isso que sempre fala do pai. Render, um nome tão diferente, mas que sempre ganhou de Dante.
O velhote deu uma risada.
— O que é engraçado? — perguntou Marcus, sem entender.
— Não acha divertido pensar nisso? — Jix havia parado de sorrir. Os três olhavam para Dante. — Existe um homem que sempre venceu Dante. Esse Dante que derrota as criaturas sorrindo. O quão insano seria a família por ter criado alguém desse jeito? E por quantos infernos um homem caminhou para não se abalar por nada além do gosto amargo da derrota na boca?
Realmente, Marcus achava certa graça.
— Existem monstros até mesmo entre os humanos — concluiu Jix para os dois. — E estamos observando um deles.
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