Índice de Capítulo

    — Dante, você já parou pra pensar que todos os estilos derivam da mesma base? – Render caminhava ao seu lado, observando suas pernas distantes, tensionadas. – Antes das armas virem ao mundo, nós usávamos o corpo como arma. Cada movimento aprimorado, cada centímetro de sua extensão percebida, apenas para dar fim ao inimigo.

    Era um menino, magro e frágil, parado diante do pai. A figura imponente do homem se erguia como uma montanha, inabalável, enquanto ele, com as pernas trêmulas, tentava manter uma base firme. Ao seu redor, o vento agitava os bambus, seus troncos finos e flexíveis dançando em uma harmonia que contrastava cruelmente com a rigidez do momento.

    — Aprender um estilo é simples. Dominar uma base é simples. — A voz de seu pai ecoava, severa e implacável, enquanto ele desferia um golpe certeiro com a espada de bambu contra o braço de Dante. O impacto fazia um estalo seco, mas o menino não ousava se mover, mesmo quando a dor queimava em seus músculos.

    Seu pai era metódico, cada palavra calculada, cada golpe preciso. Ele girava a espada com a mesma naturalidade com que outros respiravam.

    — Aprimorar e entender como utilizar é complexo, Dante. — O homem deu mais um passo à frente, inclinando-se para que os olhos dele ficassem no mesmo nível dos do menino. — O que vai fazer quando alguém puder prever seu movimento? Quando todas as suas habilidades forem expostas dessa maneira?

    O jovem Dante tentou manter a postura, mas o cansaço estava cobrando seu preço. Suas pernas já não aguentavam, e ele recuou um passo, vacilante. Foi o suficiente para que a espada de bambu descesse novamente, desta vez atingindo-o no rosto. O golpe não foi forte o suficiente para feri-lo gravemente, mas a dor o fez cair sentado no chão, as mãos instintivamente indo para a bochecha que começava a latejar.

    — Em nenhum momento eu mandei que parasse. — A voz de seu pai era cortante, fria como o aço de uma lâmina. Ele não era apenas um pai; era um imperador, um juiz implacável que ditava sua sentença sem hesitar. — Levante. Ainda tem mais cinco horas de treino.

    Dante respirava com dificuldade, mas, mesmo assim, forçou seu corpo a obedecer. As mãos trêmulas o ergueram do chão, e ele voltou à posição inicial. A espada de bambu parecia maior e mais ameaçadora a cada golpe, mas ele sabia que não tinha escolha. Seus olhos, cheios de determinação juvenil, encontraram os do pai, que apenas arqueou uma sobrancelha, desafiando-o silenciosamente a continuar.

    Dante encarava Verônica com um sorriso que oscilava entre deboche e determinação. Ele estava acostumado a inimigos que carregavam consigo ideologias grandiosas, sempre buscando algo a qualquer custo. A diferença era que Verônica não era apenas uma adversária, mas um reflexo distorcido de tudo o que ele já havia enfrentado: uma máquina fria, mas com um tom sarcástico e uma personalidade inquietante.

    A palavra que ecoava em sua mente não era justiça, honra ou orgulho. Todas essas poderiam ser virtudes nobres, mas, como seu pai lhe ensinara, poderiam também ser armadilhas fatais. A lição daquele dia ressoava agora mais do que nunca: Demonstração. Era isso que importava. Mostrar, não apenas dizer ou pensar.

    — Velhote! — Marcus o chamou, sua voz carregada de preocupação. — A batalha contra o Felroz… você ainda não se recuperou. Não precisa disso. Vai morrer se continuar assim!

    Morrer? A palavra soou quase estranha nos ouvidos de Dante, como se fosse um conceito alheio a ele. Desde quando seus companheiros haviam começado a duvidar de sua força? Ele sempre fora eficaz, piedoso na medida certa, mas nunca hesitante. O medo em seus olhos não era algo que ele queria ver.

    Verônica interrompeu seus pensamentos com uma risada cheia de escárnio, a voz dela vibrando com uma graça cruel:

    — Para eles, você só pode lutar bem se estiver livre, humano. Mas aqui dentro, confinado, você não passa de um ratinho prestes a ser esmagado. Eu vi suas lutas, todas elas. Sei do que é capaz: um punho envelhecido tentando encontrar o caminho de volta para casa.

    Dante riu, um som grave e carregado de ironia, enquanto balançava a cabeça.

    — Como eu adoro quando dizem isso para mim.

    Os olhos de Verônica se estreitaram, avaliando-o com precisão calculada. De repente, ela disparou. Um braço metálico se projetou em um golpe lateral pela direita, enquanto o corpo dela se movia para a esquerda, criando uma finta perigosa. Seus movimentos eram calculados, quase infalíveis. Ela previa tudo. Ou pelo menos, assim pensava.

    Dante não se moveu de imediato. Em vez disso, ele ajustou a posição da perna, esticando-a um pouco para o lado, de forma sutil, mantendo os punhos firmes e próximos ao corpo.

    Verônica parou por um instante, seus sensores captando a mudança, mas sem conseguir interpretá-la completamente. As sobrancelhas metálicas dela se arquearam, intrigadas.

    — Desistiu de lutar? — perguntou ela, com uma risada constrangedora, como se estivesse diante de uma piada que só ela entendia.

    Dante sorriu, um sorriso tranquilo, quase provocador.

    — Conhece a Arte Antiga: Boxe?

    Ele afastou a perna um pouco mais, ajustando ainda mais sua base. A mudança parecia insignificante, mas os sensores de Verônica captaram algo estranho. De repente, os vultos ao redor de Dante começaram a se multiplicar. Primeiro dois, depois três. Ela hesitou por uma fração de segundo, tentando processar as informações conflitantes.

    Com um corte rápido, Verônica lançou o braço em um movimento reto e decisivo, tentando encerrar o combate antes que a situação saísse de controle. Mas Dante já estava preparado. Ele se abaixou ligeiramente, esquivando-se do golpe com uma economia de movimento quase desconcertante. Seus punhos permaneceram no lugar, imóveis, enquanto ele evitava o ataque.

    Ela não parou, indo adiante. No entanto, cada movimento demonstrava o quanto Dante era escorregadio. Escapava por centímetros, mantendo uma postura fechada, ainda a fitando como se controlasse o campo de batalha.

    Não era esse o tipo de olhar que um inimigo acuado deveria ter. Mesmo que os vultos tivessem crescido três a quatro vezes pelos seus sensores, ela poderia prever, poderia antecipar. Não era nada.

    Verônica atacou de forma feroz e desordenada, liberando um segundo braço metálico das costas. Se Dante conseguia escapar de um, então ela garantiria que ele não escaparia de dois. A investida era caótica, mas estrategicamente pensada para forçá-lo a recuar.

    — Conhece o Karatê? — Dante aparou o movimento do primeiro braço com um golpe preciso, desviando a força do impacto. Ele não resistia com brutalidade, mas com técnica. O segundo braço foi segurado firmemente enquanto Verônica avançava pela frente, sem dar trégua. — Conhece todos os estilos antigos como realmente diz?

    — Todos eles — respondeu Verônica, a voz carregada de veneno. — Ativar Valkíria.

    O ambiente pareceu vibrar com a ativação do comando. A armadura de Verônica começou a se condensar, o branco e o cinza dançando em sincronia ao redor de seu torso. Partes da armadura na cintura se moveram automaticamente, subindo para reforçar os braços da IA. Dante viu os dois braços metálicos que bloqueava serem retraídos no mesmo instante, e em seu lugar, uma nova camada de armadura cobriu o braço principal de Verônica.

    Uma lâmina avermelhada surgiu, pulsando com Energia Cósmica que parecia distorcer o ar ao seu redor.

    — Ei, jovenzinha — Dante riu enquanto desviava com um salto lateral, evitando o golpe cortante da lâmina. — Não consegue sentir?

    Ninguém respondeu, mas Verônica o encarava com intensidade, seus olhos calculando cada movimento. Os vultos ao redor de Dante haviam aumentado para sete, uma ilusão criada pela velocidade e fluidez de seus movimentos. A IA, irritada, continuou pressionando-o. Sua armadura se movia com uma lógica própria, trocando entre os membros, agora reforçando o braço, agora cobrindo a perna, enquanto ela forçava Dante a uma disputa de velocidade.

    Juno e Marcus assistiam em silêncio, a tensão evidente em seus rostos. Juno nunca tinha visto Dante tão encurralado, e cada golpe que ele desviava parecia estar no limite. O instinto de agir crescia dentro dela, e ela deu um passo à frente, mas foi imediatamente interrompida pela voz de Jix, que cortou o silêncio como uma lâmina:

    — Pode ficar parada aí mesmo, garota.

    Juno virou-se para ele, o peito arfando de ansiedade.

    — Se o mestre continuar lá, ele vai acabar morrendo!

    Jix a encarou com uma firmeza inabalável, os olhos duros como pedra, como se uma avalanche não pudesse movê-lo.

    — Desde quando Dante pediu ajuda? Respeite seu mestre, como eu te ensinei. — Sua voz era grave, mas cheia de propósito. Ele fez uma pausa, permitindo que suas palavras se infiltrassem no coração de ambos. — E observem. Ele está lutando para que vocês aprendam.

    Juno e Marcus ficaram em silêncio, os olhos fixos no campo de batalha.

    — Dante não está ferido da outra batalha. Ele não está em uma posição ruim. Vocês estão vendo uma luta entre um humano e uma máquina. Vou dizer mais uma vez, porque parece que não entenderam. Percebam o quão monstro esse velhote dentro da jaula é. Não terão outra chance como essa.

    A declaração de Jix parecia pesar no ar, uma verdade inescapável. Ele sabia o que estava assistindo. Aquilo não era apenas uma luta; era uma demonstração do que Dante era capaz, um espetáculo que raramente se via.

    Jix cruzou os braços, a postura rígida enquanto seus olhos brilhavam com uma intensidade que os outros raramente viam. Ele estava vendo algo que o destino havia lhe prometido há muito tempo, algo que ele acreditava estar perdido. Por décadas, Jix havia vagado por terras áridas, florestas arruinadas e montanhas cobertas de neve. Sempre em busca de algo que reacendesse sua fé na humanidade, mas por anos encontrou apenas desolação e morte.

    Foram mais de trinta anos de caminhada até que ele chegasse a Kappz, um lugar que ele achava que seria apenas mais uma ruína entre tantas outras. Mas, em menos de seis meses, Dante surgiu. Uma mão gentil, porém implacável, que tocou seus calos e suas dores. Aquele homem havia criado uma fagulha no meio do mato seco que eram os sonhos desfeitos de Jix.

    Essa era a estranha posição de um homem de setenta anos tinha. Ele queria aprender com alguém que nem mesmo era um conhecido, não era um amigo – mas que sorria para qualquer que fosse a situação sem ao menos hesitar.

    Até onde treinou para ter essa confiança, garoto?

    Apoie-me

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (2 votos)

    Nota