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    Cerberus inclinou a cabeça levemente, como se considerasse a proposta de Dante, mas não respondeu com palavras. Em vez disso, ergueu lentamente a mão direita, e o ar ao seu redor começou a se distorcer. Um brilho esverdeado e pulsante surgiu de seus dedos, como uma serpente feita de pura energia, e o ambiente imediatamente ficou mais pesado. A neve sob seus pés derreteu em um círculo perfeito, expondo o chão congelado por baixo.

    — Duas habilidades, duas chances para você entender seu lugar, — murmurou Cerberus, sua voz ecoando como um trovão distante.

    Ele estendeu a mão direita em direção a Dante, e a serpente de energia se lançou com velocidade alucinante. A criatura feita de luz rugia enquanto cortava o ar, mas Dante não recuou. Ele ergueu uma barreira de Energia Cósmica, uma cúpula translúcida que envolveu seu corpo no momento exato em que a serpente colidiu com ela. O impacto foi ensurdecedor, e a explosão de luz ofuscou a paisagem ao redor.

    Por um instante, parecia que a barreira iria resistir, mas a serpente começou a se contorcer, dividindo-se em dezenas de fragmentos menores que atravessaram a proteção de Dante. Ele saltou para trás, desviando-se com movimentos ágeis, mas um dos fragmentos atingiu seu ombro esquerdo, arrancando um gemido de dor. A energia corroía sua pele como ácido, e ele rapidamente concentrou sua própria força para dissipá-la.

    — Isso foi interessante, — disse Dante, massageando o ombro enquanto um sorriso desafiador se formava em seus lábios. — Tem mais alguma coisa pra me mostrar ou é só isso mesmo?

    Cerberus, no entanto, não parecia impressionado. Ele deu um passo à frente, e sua mão esquerda começou a brilhar com um tom avermelhado, tão intenso que o gelo ao redor começou a estalar e rachar. De repente, o chão tremeu, e pilares de fogo surgiram do solo congelado, cercando Dante. O calor era sufocante, mesmo no meio da tempestade. O mascarado observava em silêncio, seus olhos invisíveis avaliando cada movimento de Dante enquanto o fogo crescia em intensidade.

    — Você acha que pode jogar no meu território? — Dante rugiu, avançando com uma explosão de Energia Cósmica que apagou as chamas ao seu redor. Ele lançou um soco de ar diretamente contra Cerberus, mas o mascarado simplesmente desapareceu, como uma sombra se desfazendo na luz.

    Antes que Dante pudesse reagir, Cerberus reapareceu atrás dele, sua mão direita já pronta para outro ataque. A serpente esverdeada reapareceu, mas desta vez envolveu o corpo de Dante, apertando com força enquanto queimava com sua energia corrosiva.

    Dante gritou, mas não de dor — era um grito de pura determinação. Sua Energia Cósmica explodiu em todas as direções, desintegrando a serpente e forçando Cerberus a recuar mais uma vez.

    — Agora sim, — disse Cerberus, inclinando a cabeça como se estivesse se divertindo. — Vamos ver o quanto você aguenta.

    Os dois se encararam, suas energias colidindo no ar, enquanto o campo de batalha ao redor se transformava em um caos de gelo derretido, chamas e poder bruto. A tempestade parecia diminuir sua intensidade, como se o próprio clima temesse o confronto entre eles.

    E no entanto, Dante usou apenas a mão direita, jogando tudo ao redor como se fosse papel. Cerberus também recuou, impressionado pela força de vontade e física. Poucos homens teriam firmeza para fugir da sua prisão, mas ainda porque seu corpo dizia como ele deveria lutar contra seus adversários.

    A neve continuava caindo, cobrindo o chão em uma camada branca que logo era marcada pelas pegadas dos dois homens. O vento soprava, gelado e cortante, carregando consigo o som distante de árvores rangendo e gelo estalando. A hidrelétrica, imensa e decadente, parecia uma sentinela silenciosa no coração do caos. As pontes enferrujadas e o abismo congelado ao redor eram testemunhas mudas de um confronto que prometia ser tão implacável quanto o próprio inverno.

    Cerberus caminhava de um lado para o outro, a máscara grotesca de sorriso vermelho contrastando com a seriedade de sua voz. O brilho intermitente de sua energia, esverdeada e pulsante, iluminava brevemente a paisagem coberta de gelo.

    — Você é um Impuro — disse ele, sem a menor sombra de desdém, como se estivesse apenas constatando um fato. — Assim como eu. Mas está aqui para me culpar por crimes que acredita que cometi. Como pode julgar um homem que sequer conhece? Como se fosse algum tipo de justiceiro? — Ele parou por um instante, inclinando levemente a cabeça para Dante, como se estivesse analisando cada reação. — E mesmo que eu fosse culpado, quem é você para decidir isso?

    Dante permaneceu imóvel, seus olhos fixos no mascarado, mas sua postura era de alguém à vontade, como se o frio e o confronto iminente fossem meros detalhes. Então, ele deu um leve sorriso, quase como se apreciasse o diálogo.

    — Perdão. Não me apresentei. Sou Dante, Recruta da Capital. — Ele ergueu a mão lentamente, e o ar ao seu redor pareceu se distorcer, como se estivesse sendo sugado para um vórtice invisível. — E vim porque sabia que havia algo errado aqui. Você é estranho, Cerberus. Estranho por proteger um lugar que claramente não lhe pertence.

    Cerberus riu, um som rouco que parecia ecoar na paisagem desolada. Ele cruzou os braços e inclinou a cabeça para o lado, como se achasse graça na declaração.

    — E de quem pertence, então? — perguntou, sua voz carregada de ironia. — Qualquer um que pareça estranho aos seus olhos é automaticamente culpado? Uma vítima desse seu julgamento míope?

    Dante estreitou os olhos, mas não havia raiva em seu rosto, apenas uma calma fria que refletia o ambiente ao redor.

    — Só quem está protegendo algo que deveria ser de todos. Eu vi as pessoas. Vi como são controladas, forçadas a carregar água para aquela cidade. — Ele deu um passo à frente, a neve rangendo sob suas botas. — Então me diga, Cerberus, por que está ajudando eles? Por que, sendo um Impuro, está do lado de quem escraviza?

    Cerberus parou de andar. Ficou em silêncio por um momento, a máscara voltada diretamente para Dante. O vento assobiava entre eles, mas nenhum dos dois parecia notar o frio ou a tensão crescente.

    — Estou fazendo o que acho ser o correto, — respondeu ele finalmente, sua voz firme. — O que vai garantir a minha sobrevivência. Estou esperando isso por praticamente nove anos, nove malditos anos, falta mais alguns dias e eles vão me aceitar. Eu não posso ficar aqui fora pra sempre…

    — O inferno congelou e você ainda está aqui – disse Dante, estalando os braços e depois os dedos de maneira casual. Ele tirou um charuto de dentro do bolso e acendeu sua ponta num estalo. — Fiquei surpreso, você usou duas habilidades diferentes agora, não foi? Não me lembro de ter visto nada parecido antes.

    — Normalmente, as pessoas se assustam com isso, — começou Cerberus, sua voz grave reverberando pelo ar gelado. — Um poder que muitos considerariam uma bênção, mas para mim sempre foi uma maldição. — Ele observou os dedos em mutação, como se eles fossem algo separado de si mesmo. — Meu corpo observa meu inimigo, seja ele físico ou mental, e me dá as ferramentas para enfrentá-lo, até que a vitória me encontre. Antes de você, Dante da Capital, outros tentaram o mesmo. Todos falharam. — Ele deu um passo à frente, sua presença preenchendo o espaço vazio ao redor. — Esse lugar, essa fábrica que você chama de abandonada, é o único que eu escolhi proteger. Aqui, dentro do que chamo de Aquário Feudal, é onde encontrei a possibilidade de paz. Se você for meu último oponente, que o destino me teste mais uma vez.

    Dante, parado com a postura relaxada, apenas arqueou uma sobrancelha. A ponta do charuto entre seus dedos brilhava em brasa, e seu olhar parecia carregar uma mistura de desprezo e curiosidade.

    — Você sempre fala tanta merda assim de uma vez? — disse ele, soprando uma fina linha de fumaça no ar. — Eu já vi pessoas que perderam pai, mãe, e tudo mais por causa dessas suas promessas de merda. Acha mesmo que aqueles bastardos do Aquário vão te aceitar? Só porque você ficou aqui fora brincando de guarda de uma fábrica que nem serve mais para nada?

    Cerberus suspirou. Quantos outros já haviam dito algo parecido? Quantos vieram antes, cheios de ódio e acusações, apenas para caírem diante de sua habilidade? Ele não respondeu imediatamente, apenas olhou para Dante com a paciência de alguém que já ouviu as mesmas palavras incontáveis vezes.

    — É normal que não entenda, — respondeu finalmente, sua voz carregada de resignação.

    Dante soltou uma risada curta, quase um rosnado, enquanto levava o charuto de volta à boca. Seus olhos brilhavam com uma curiosidade cortante, como se analisasse cada palavra, cada gesto de Cerberus.

    — Então, essa sua habilidade, hein? — disse ele, retirando o charuto novamente e apontando com ele para o mascarado. — Quer dizer que você se adapta a qualquer coisa que eu faça para te ferrar? É isso?

    — Funciona para me proteger. Não que você conseguisse fazer alguma coisa. Ninguém nunca fez.

    — Ah, sempre tem uma primeira vez pra tudo, não é mesmo?

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