Índice de Capítulo

    O impacto do homem ao tocar o chão fez o ambiente parecer suspenso no tempo. Tudo ao redor ficou subitamente silencioso, como se o mundo prendesse a repiração diante sua presença. A Energia Cósmica ao seu redor formava uma barreira densa e impenetrável.

    Ele não repelia os ventos, a neve ou a chuva, Leonardo podia observar que qualquer Energia Cósmica ao redor dele era infima e calma pela intensidade que o velho liberava.

    Leonardo e Gerhman observavam com atenção, cada músculo preparado para agir. O desconhecido virou-se para Cerberus, que ainda se recompunha após o arremesso brutal.

    — Eu disse que te levaria à sua cidade preferida — falou o homem, a voz calma, mas carregando uma ameaça vital. Ele estendu os braços como se estivesse apresentando a cena. — E agora que está aqui, o que pretende fazer?

    Antes que Cerberus pudesse responder, dois vultos surgiram no ar. Raver e Trinity chegaram em um movimento sincronizado, saltando das telhas como projéteis. Raver. Com sua postura agressiva, desembainhou uma adaga e despejou um líquido verde sobre a lâmina, que brilhou venenosamente.

    Ao mesmo tempo, Trintiy conjurou uma onda de calor que envolveu os dois, acelerando seus movimentos como uma rajada de vento quente.

    Leonardo manteve os olhos fixos no inimigo, ignorando momentaneamente os aliados. Ele sabia do poder de Raver, conhecido por sua força bruta e sua impetuosidade. Trinity, por outro lado, era estrategista, usando sua habilidade de calor para amplificar o potencial de combate de ambos.

    — Eles vão atacar com tudo — murmurou Leonardo, mais para si. Mas sua preocupação não estava neles. Era no homem. Aquele que não apenas havia lançado Cerberus como um peso até ali, mas também quebrado a barreira do Aquário Feudal como se fosse vidro.

    Ele apertou o punho em torno de sua espada, os olhos avaliando cada detalhe do desconhecido.

    — Gerhman — disse ele em um tom baixo e firme, sem desviar o olhar. — Prepare-se para usar seu Decreto.

    Gerhman assentiu, ainda impressionado, mas confiante na liderança de Leonardo. Se o desconhecido se movesse como bem entendesse, então, seria desastroso.

    — Estou pronto.

    Cerberus respirava com dificuldade, os músculos do corpo tremendo enquanto sua habilidade lutava para reparar os danos. Cada ferida fechada vinha acompanhada de uma dor aguda, como se seu próprio corpo estivesse cobrando um preço pela regeneração. Ele abaixou a cabeça, tentando se levantar, mas suas pernas falharam, e ele caiu de joelhos.

    — Dante… por favor… — sussurrou, as palavras mal audíveis, quase engolidas pelo som do vento. Sua voz carregava uma mistura de súplica e resignação.

    O homem, Dante, não demonstrou piedade. Sua resposta veio como o corte de uma lâmina, afiada e certeira:

    — Eles te fizeram uma promessa — disse, a voz firme e implacável. — Te forçaram a guardar um lugar por tanto tempo. Você fez o que mandaram, obedeceu cegamente. Mas agora está aqui. Eles vão te proteger ou vão te chamar de Impuro, como fizeram com aqueles lá fora?

    Leonardo, que observava de perto, sentiu a tensão em seus ombros diminuir ligeiramente ao ouvir aquelas palavras. Algo no tom de Dante o intrigava. Não parecia o discurso de alguém que queria destruir a cidade. Pelo contrário, havia algo mais profundo.

    Ele está questionando o título…

    Dante deu alguns passos à frente, o olhar varrendo a paisagem da cidade com uma mistura de desdém e reflexão.

    — Aquelas pessoas lá fora passam fome, enfrentam o frio e vivem como sombras do que poderiam ser. Enquanto isso, aqui dentro… — ele gesticulou vagamente para as construções ao redor, as casas sólidas e bem cuidadas. — Aqui, as barrigas estão fartas, os casacos são quentes, e há água limpa para lavar o corpo.

    Ele virou o olhar para Cerberus, o semblante severo.

    — E você, Cerberus? O que recebeu além de uma tarefa impossível? Além de anos de sacrifício e isolamento?

    As palavras ecoaram como uma acusação, carregadas de um peso que fez até mesmo os soldados hesitarem. Foi nesse momento que dois vultos surgiram por entre os escombros, cada um avançando de um lado.

    Leonardo percebeu a distração de Dante e viu sua chance. Sem pensar duas vezes, ele se lançou para cima do homem, espada em punho, determinado a acabar com a ameaça antes que ela pudesse crescer ainda mais.

    Leonardo avançou com determinação, mas o que encontrou o surpreendeu. Dante, com movimentos precisos e fluídos, posicionou-se de forma impecável, quase como se antecipasse cada ação ao seu redor. Por um breve instante, Leonardo, o velho espadachim, sentiu-se admirado.

    Raver surgiu logo depois, sua máscara metálica ocultando nariz e boca, conectada a um cilindro em suas costas por um tubo fino. Ele girava com agilidade, tentando acertar Dante com golpes ferozes. Sua lâmina cortava o ar, mas Dante bloqueava e desviava com simplicidade impressionante, como se estivesse em um treino. Com um movimento rápido, Dante abaixou para evitar um golpe, usou o pulso direito para bloquear outro ataque e, num instante, desarmou a guarda de Raver, abrindo-o para um contra-ataque.

    Enquanto isso, à direita, Trinity se aproximava como uma flecha. Sua lança de batalha reluzia à luz pálida do ambiente, uma arma carregada de história e usada por antigos generais. Ela investiu com precisão, tentando atingir o peito de Dante com estocadas rápidas e certeiras. Ele, no entanto, recuava com maestria, esquivando-se apenas o necessário. Em um movimento inesperado, Dante puxou Raver e o colocou na linha de ataque de Trinity, empurrando ambos para trás com uma palma firme.

    Leonardo, que ainda corria em direção ao embate, viu o ar ao redor da palma de Dante se deslocar como uma onda invisível, arremessando Raver e Trinity ao chão. A demonstração de força e controle era inquietante.

    — Você enxerga, Cerberus? — disse Dante, sua voz carregada de convicção enquanto observava o homem ajoelhado. — Ninguém aqui se importa com você. Esse lugar nunca aceitará nenhum dos Impuros, nem mesmo que devotem suas vidas a isso. Eles mataram tantas pessoas, destruíram tanto… E eu? Eu protejo apenas aqueles que ainda importam para mim.

    Leonardo entrou na zona de combate, sua espada ganhando uma coloração avermelhada que pulsava levemente, chamando a atenção de Dante. Com sua velocidade amplificada, Leonardo lançou-se em uma troca ofensiva, atacando com uma combinação de golpes rápidos e movimentos evasivos. Ele alternava entre acelerar e desacelerar, buscando uma abertura. A cada golpe desferido, uma certeza crescia dentro dele: Dante não está tentando me matar.

    Finalmente, Leonardo viu uma brecha. Girando o braço livre, ele tentou um golpe direto no pescoço de Dante.

    — Gerhman, agora! — gritou Leonardo, enquanto Dante desviava seu ataque com um movimento rápido e defletia seu braço para frente.

    Gerhman, que aguardava pacientemente, uniu as mãos em um gesto poderoso. Um estalo esbranquiçado ecoou, expandindo uma energia por toda a área. Dante deu uma risada baixa, retirando o charuto da boca e assoprando a fumaça com calma, como se estivesse em total controle da situação.

    Raver e Trinity já estavam de pé, movendo-se para lados opostos, enquanto Leonardo recuava, ajustando sua base defensiva. Ele ergueu a espada, posicionando-a perto do rosto, os olhos atentos. O som de passos pesados fez com que ele notasse a chegada de mais reforços: três soldados desceram de uma torre próxima, carregando carabinas prontas para disparar.

    A área cúbica branca pulsava com a energia do Decreto de Gerhman, mas não conseguia subjugar Dante, cuja presença parecia se sobrepor a todas as regras daquele espaço.

    — Isso está começando a ficar interessante — murmurou Dante, os olhos brilhando com uma mistura de determinação e desdém.

    Dentro do cubo, o poder cósmico de todos aumentava, enquanto Cerberus permanecia ajoelhado, ofegante, sua habilidade de cura lutando para acompanhar o ritmo de sua dor. No entanto, Dante estava imperturbável, como se fosse uma entidade separada daquela realidade.

    — Como você ainda pode se mover? — gritou Raver, com raiva transbordando em cada palavra. — Um Impuro pisando numa cidade sagrada deveria ser reduzido a nada!

    Dante, com um gesto casual, chamou-o com a mão.

    — Ótimo. Venha me matar.

    Raver, Trinity e Harrow avançaram ao mesmo tempo, saltando em sincronia, mas Dante os enfrentava com uma facilidade quase insultante. Ele desviava dos golpes de Raver, movendo-se como se previsse cada ataque. A lança de Trinity zumbia no ar, mas ele se esquivava com passos precisos, enquanto as correntes ferventes de Harrow buscavam envolvê-lo sem sucesso.

    Leonardo observava cada movimento com atenção. A habilidade que herdara de seu pai, o Fio do Destino, pulsava em sua espada, conectando-o à luta como uma extensão de si mesmo. A cada segundo, ele compreendia melhor o padrão de combate de Dante, mas uma coisa o frustrava: não havia brechas.

    — Preciso acertá-lo de algum jeito — comentou para Gerhman. — Mas estou vendo… nada.

    Gerhman estreitou os olhos e ergueu a manga do braço, revelando um símbolo brilhante.

    — Entendi. Ele ainda tem muita Energia Cósmica. Vou reduzir a zero e aumentar a nossa. Meu Decreto vai…

    — Não. — Leonardo o interrompeu, os olhos fixos em Dante. — Não é isso. Ele não perdeu nenhum pingo de energia.

    Gerhman hesitou.

    — Então, o que está acontecendo?

    Leonardo respondeu com uma calma perturbadora:

    — Sua habilidade não funcionou porque ele não se considera um Impuro.

    Nesse momento, Dante fez um movimento rápido, socando Raver no rosto. A máscara metálica de Raver liberou uma fumaça verde tóxica, que começou a se espalhar pelo cubo.

    — Raver, isso pode matar as pessoas ao redor! Não espalhe isso! — gritou Leonardo, irritado.

    Dante agiu imediatamente, dissipando o gás com um gancho poderoso que deslocou o ar. No entanto, quando o ar clareou, Trinity estava diante dele, sua lança brilhando intensamente a centímetros de seu rosto.

    Leonardo prendeu a respiração. Se Dante se movesse, Harrow estava pronto para atacá-lo por trás. Ele seria capturado ou ferido gravemente.

    Mas Dante não recuou. Ele apenas piscou.

    O ar explodiu ao redor dele mais uma vez, derrubando todos ao chão. Raver, Trinity e Harrow caíram, ofegantes. Apenas Gerhman e Leonardo permaneciam de pé, observando o homem diante deles com um misto de fascínio e preocupação.

    — Ele é forte demais — murmurou Gerhman, a voz carregada de incredulidade. — Que tipo de Decreto eu devo usar?

    Leonardo deu um passo à frente, ajustando a lâmina avermelhada de sua espada.

    — Tente um Decreto inatural. Nenhum que inflija títulos vai funcionar. Ele não segue essas regras.

    Dante riu baixinho, tirando outro charuto do bolso e acendendo-o com um estalo dos dedos.

    — Você veio aqui provar algo, não foi? — Leonardo continuou, os olhos fixos nele. — Quer provar que Cerberus ou que a cidade está errada. Mas nós fizemos nossa parte. Mantivemos as pessoas seguras. Ele estava prestes a concluir a promessa que fez comigo e com Raver.

    Dante deu uma tragada profunda no charuto antes de responder:

    — E as pessoas lá fora? Aquelas sendo controladas mentalmente por alguém daqui?

    Leonardo sentiu o sangue gelar. Ele sabia exatamente do que Dante estava falando.

    — O que quer dizer com isso? — perguntou Leonardo, fingindo ignorância. — Não existe ninguém aqui que usaria as pessoas para seus próprios fins.

    Dante apontou para Cerberus, que ainda lutava para se manter de pé.

    — Como ousa dizer isso quando estão usando ele para proteger a hidrelétrica do povo de Kappz? Eu sou de lá. Eu vi vocês explorando o Reservatório. Vi vocês fazendo de tudo para manter este lugar vivo enquanto eu limpava aquela podridão.

    Leonardo ficou sem palavras. Finalmente, ele entendeu quem estava diante dele. Dante era o homem que havia limpado uma das áreas mais importantes da última década. O homem no qual Gerhman havia dito no dia mais cedo.

    — Se quer comprovar suas palavras, então precisa vencer. — Leonardo ergueu sua espada, que brilhou com uma luz avermelhada, pulsando com energia.

    Leonardo estreitou os olhos, analisando Dante com atenção. Ele precisava de respostas. As conexões em sua mente fervilhavam: a barreira do Aquário, Cerberus, Raver e seu grupo, o Reservatório… e Maethe. Tudo parecia levar de volta a esse homem. Mas as perguntas que pulsavam em seu peito não poderiam ser feitas diante de todos.

    — Gerhman, faça a Sala do Silêncio.

    Gerhman assentiu, a expressão tensa, mas obediente. Ele ergueu o braço e traçou uma linha azulada ao longo de seu pulso, que brilhou com uma intensidade etérea. O terreno branco do Decreto da Limpeza começou a se desfazer como areia soprada pelo vento, e um quarto negro surgiu, engolindo Leonardo e Dante em sua vastidão.

    Por fora, os outros podiam vê-los, mas nenhum som escapava. A escuridão ao redor era como um manto absoluto, absorvendo todas as vibrações, tornando aquele espaço um campo perfeito para confidências.

    Leonardo deu um passo à frente, sua espada ainda em punho, mas relaxada.

    — Agora podemos falar sem interferências — disse ele, a voz firme, mas baixa, carregada de cautela.

    Dante riu arrancando o charuto da boca mais uma vez.

    — Conversar? Essa cidade vai perder mais do que apenas o orgulho de se chamarem de Puros.

    — Sim, eu concordo com você. — Leonardo ergueu a espada um pouco mais alto. Os olhos dele em um brilho dourado. — Então vamos conversar com nossas armas.

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