Capítulo 156: Herói e Vilão
Harrow e Trinity avançaram com pressa, mas não o suficiente para evitar o impacto. Januário recebeu o golpe como uma montanha que se despedaçava. O ar ao redor tremeu com a explosão silenciosa que seguiu, enterrando sua habilidade, Medo, nas profundezas da terra. Raver permaneceu imóvel, a adaga já em mãos, mas hesitou.
Os guardas nas torres e no solo levantaram suas armas em uníssono. Havia ordem em seus movimentos, mas também uma hesitação. Nenhum deles, nem mesmo Raver, estava perto o suficiente para salvar Januário do golpe seguinte.
— Estalo — a palavra escapou dos lábios de Dante, um sussurro cruel, antes que seu sorriso se alargasse em algo predatório. — Até mais, seu merdinha.
A Energia Cósmica se libertou como um rugido de trovão, revertendo-se em força. Antes que Januário pudesse reagir, o segundo golpe o atingiu. Seu queixo estalou para o lado, sua coluna dobrou como um galho seco, e os braços caíram inertes.
O impacto lançou uma onda de choque que se espalhou pela praça, derrubando todos ao alcance. Soldados foram arremessados como bonecos, tochas foram arrancadas de seus suportes e quebraram contra as paredes.
Em segundos, o fogo tomou conta das casas ao redor, transformando-as em fogueiras vorazes.
Os gritos começaram quase imediatamente. Moradores e lojistas correram em todas as direções, o pânico espalhando-se como as chamas. Harrow e Trinity, atordoados pela força do impacto, se viraram para o clarão, mas o monstro já estava à frente deles.
— Harrow! — gritou Raver, ainda parado, sua voz carregada de urgência. — Não abaixe sua guarda!
Harrow girou o rosto, mas era tarde demais. A mão de Dante apareceu como uma muralha, agarrando seu rosto e prendendo-o com uma força esmagadora. O berro de Harrow foi animalesco, saliva escapando de sua boca enquanto tentava se libertar.
Trinity desviou do primeiro golpe, mas seus olhos encontraram os de Dante. Aquele olhar abissal a paralisou. Ela pensou, por um instante, que ele não usaria Harrow como arma. Estava errada.
Dante ergueu Harrow como um boneco de trapos e o lançou contra Trinity. O impacto foi brutal; o corpo dela atravessou uma das casas, explodindo a parede e saindo pelo outro lado em meio a escombros e fumaça.
Dante ergueu a cabeça. As chamas se alastravam, lambendo os telhados e saltando de uma casa para outra. O caos consumia a cidade. Soldados gritavam ordens para evacuar a praça, mas o controle já havia sido perdido.
— Mirem em Gerhman, agora — ordenou Raver, sua voz cortando o caos. — Se ele quer uma luta até a morte, que seja aqui.
Dante soltou o corpo de Harrow, que caiu como uma marionete sem fios.
— Parece que você ainda não entendeu — disse Dante, virando-se para Raver. Ele notou Januário e mais dois ao lado dele, reunindo forças. — A aposta acabou no momento em que usou sua habilidade. Reviver minhas piores memórias só me lembrou que algumas pessoas não precisam de salvação. Você mesmo disse: eu não sou um herói.
Dante começou a caminhar em direção aos quatro, a pressão de sua presença crescendo como uma tempestade iminente.
— E estava certo. Eu nunca quis ser um herói. Só precisava de um motivo para exercer o que aprendi.
Gerhman e Cerberus permaneceram estáticos, mas as palavras de Dante os fizeram se mover.
— Tirem Leonardo dali — ordenou Dante.
Cerberus obedeceu sem hesitação, avançando em direção ao prisioneiro. Os soldados que seguravam as correntes de Leonardo hesitaram, mas antes que pudessem reagir, Cerberus ergueu a mão.
— Empuxe.
No céu, vinte esferas vermelhas se formaram, flutuando a trinta metros de altura. Os soldados foram puxados para cima, suas armas caindo ao chão. Gritaram e se debateram, mas foram sugados pelas esferas, seus corpos esmagados contra as paredes de energia.
Os gritos se misturavam ao som do fogo e ao caos da cidade.
Raver observava Dante se aproximar, enquanto Cerberus libertava Leonardo com uma precisão assustadora. As correntes caíram no chão, quebradas como vidro. A cidade estava em chamas, seus homens sendo abatidos, e ele não sabia o que fazer.
— Vou matá-lo — disse Januário. Sua voz era firme, mas o corpo tremia, torto pelos golpes que recebera. — Ele será meu sacrifício.
Januário cortou o próprio braço, o sangue escorrendo ao chão. Ele abaixou-se, tocando o líquido.
— Se um homem tem medo, ele não pode sequer se mover. — Januário encarou Dante, o medo ainda apertando seu coração. — Eu o respeito, Dante. Mas você morre agora.
O sangue começou a se espalhar, e sombras tomaram forma, ergueram-se como monstros gigantescos. Mas do outro lado da praça, uma voz ecoou:
— Eu Decreto: nenhum medo deve tomar forma enquanto houver quem se oponha.
Gerhman, com as mãos erguidas, enviou seu Decreto para todos os lados. As sombras brancas engoliram as escuras, dissipando-as como fumaça ao vento.
A face de Raver se contorceu em descrença.
— Não tenho mais motivos para confiar em nenhum de vocês — disse Gerhman.
Enquanto isso, Leonardo era levado por Cerberus para um lugar seguro, enquanto a cidade inteira queimava. O caos era absoluto, mas no olhar de Dante, apenas um propósito cruel permanecia.
Num passo rápido, Dante surgiu na frente de Januario. Ele não deixou o rosto assustado e desesperado do homem desaparecer, então, usou o pé contra o braço bom. O osso estalou, e seu membro foi partido em dois.
Mais um grito no meio da praça misturado com o caos. Dante passou por ele, continuando na direção de Raver.
Os dois guardiões investiram. A água se formou através de um deles. Ele pulou em cima dela e começou a surfar até a sua direção. Dante encarou os dois, e abriu a mão, mostrando sua palma.
A espada e a lança cortaram o ar – o velho se abaixou e espalmou para trás, na direção de suas costas. A pressão do ar os enviou voando contra as casas. Engolidos por chamas, os dois correram para fora, usando a água para apagar o fogo em seus próprios corpos.
Cada batimento do coração de Raver era um tambor de guerra. Ele podia sentir o sangue correr por suas veias, quente e pesado, enquanto observava Dante se aproximar com passos curtos e deliberados. Cada movimento do homem parecia carregar um peso insuportável, como se o próprio ar se dobrasse ao seu redor.
Dante não tinha pressa. Não precisava. A lentidão de sua aproximação era um espetáculo em si, um aviso silencioso de sua soberania. Ele podia acabar com tudo ali, em um instante, e todos sabiam disso. Raver sentia o peso dessa verdade como uma lâmina em sua garganta.
Este era o preço da humilhação. Dante, com seu sorriso quase preguiçoso, não precisava de ordens, leis ou qualquer autoridade além da sua própria. Ele era um homem fora do alcance das regras que governavam os outros.
Sem perceber, Raver recuou. Um passo, depois outro.
— Vou pagar uma dívida a um amigo tirando sua vida, Raver — disse Dante, sua voz firme, quase casual, mas carregada de algo que fazia a espinha de Raver se arrepiar. O punho de Dante se fechou, e a ameaça em sua postura tornou-se tangível. — Para você, eu sou o vilão dessa história. Mas, para todos lá fora, eu posso ser um herói e tanto.
A Energia Cósmica de Dante se expandiu novamente, um rugido silencioso que fez o ar vibrar. Era como uma tempestade que se formava em torno dele, indomável e imparável.
— Meu pai me ensinou uma lição que nunca vou esquecer enquanto estiver vivo.
Dante girou o corpo, reunindo o poder que ainda restava em sua conversão. Não havia simetria naquele momento. Sua calma contrastava com a fúria descomunal de sua Energia Cósmica, enquanto o desespero de Raver era mascarado por sua expressão vazia, seus olhos fixos e sem vida.
Ali estavam dois homens que não eram o que pareciam.
— Eu prefiro ser temido do que respeitado.
As palavras saíram de Dante como um decreto, e ele pronunciou o nome de sua habilidade:
— Soco Reto.
A conversão ganhou forma, alimentada por memórias antigas, lições esquecidas e uma fúria que parecia transcender o presente. Na mente de Dante, o passado se entrelaçava com o presente: os treinos, as palavras de seu pai, as promessas não cumpridas e os medos que o moldaram.
Um corpo forte precisa de uma mente forte. Ele ouvira isso tantas vezes que as palavras haviam se gravado em sua alma.
E então, o golpe caiu.
O impacto foi como o rugido se libertando de todos aqueles que perderam suas vidas para Raver. Quando o punho de Dante encontrou Raver, não foi apenas o corpo do homem que se dobrou sob a força. A cidade de GreamHachi pareceu estalar junto com ele.
As paredes tremeram, o chão rachou, e por um instante, o mundo ao redor ficou em silêncio.
Raver foi lançado para trás como um boneco de pano, seu corpo colidindo contra as casas, arrastado ao ponto de não parar por absolutamente nada. E quando a muralha da cidade surgiu, Raver travou nela, apenas por ter sido parado por tudo antes. O poder do golpe ecoava, não apenas no físico, mas na alma de todos que assistiam.
E Dante permaneceu de pé, uma tempestade humana pela natureza, seu olhar fixo no que restava de seu inimigo e no rastro de destruição deixado. No caos ao seu redor, havia apenas uma certeza: ele era tanto o vilão quanto o herói dessa história. E ele decidiu ali, que as lições ditavam exatamente o rumo que ele decidiria tomar.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.