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    Dante avançava pela viela, seus passos ecoando como o som de tambores que reverberavam na alma dos soldados. O velho homem não olhava para os lados, apenas para frente, sua marcha implacável. Naquele momento, ele não era um homem; era uma sombra de terror que se aproximava, uma lembrança viva dos horrores que assombravam Kappz.

    Era o monstro que queimara bairros inteiros. O demônio que derrotara Januário, o lendário guerreiro da Cúpula, e esmagara Raver com um único golpe. Nem Felroz, nem os mercenários de Rapier poderiam inspirar tamanho pavor. Para aqueles soldados, não havia inimigo mais terrível que Dante, o Demônio de Kappz.

    O silêncio era tão opressivo quanto o frio, até que um dos comandantes quebrou a tensão. Ele ergueu sua espada, o aço refletindo a luz da tempestade, e bradou com desespero:

    — Atirem no desgraçado! Atirem no Demônio de Kappz!

    Os soldados, hesitantes, apontaram os dois canhões em direção a Dante. As bocas das armas, corroídas pelo tempo, começaram a brilhar em um tom amarelado enquanto se preparavam para disparar. O ar ao redor tremulava com o som agudo da Energia Cósmica, um zumbido que preenchia cada canto da viela.

    Mas antes que os disparos fossem feitos, algo cortou o céu. Um vulto desceu das alturas com a leveza de uma folha ao vento, pousando entre Dante e os soldados. Muitos o reconheceram imediatamente: Heian.

    Ajoelhado, ele tocou o solo com a palma da mão.

    — O Comandante não precisa de insetos atrapalhando.

    Sua voz era baixa, mas carregava o peso de uma tempestade. Seus olhos se ergueram para a muralha, um brilho de fúria dançando em suas pupilas.

    — Por anos, protegi vocês. Lutei para manter os errados a salvo e esqueci daqueles que realmente precisavam de mim.

    Um instante depois, a Energia Cósmica emanou de seu corpo, azul e gelada como o inverno mais cruel. A força se moldou em seus braços, fluindo até as palmas das mãos. Quando ele tocou o chão, o gelo se espalhou como uma praga, subindo pelas muralhas, engolindo as ameias e congelando as torres.

    Os soldados recuaram, gritando, enquanto o frio roubava-lhes o ar. As tochas foram apagadas, e a escuridão engoliu a muralha, iluminada apenas pelo brilho pálido da cidade atrás dela.

    Mesmo assim, a barreira de Energia Cósmica que protegia a muralha não cedeu.

    Heian ergueu a mão. O ar ao redor começou a se comprimir, um vórtice de energia avermelhada se formando em sua palma.

    — Isso é o que vocês merecem pelo que fizeram, miseráveis.

    O gelo se transformou em fogo no mesmo instante, uma chama carmesim que parecia consumir até o próprio ar. O calor condensado explodiu com um som ensurdecedor.

    A muralha foi a primeira a ceder, estilhaçada de dentro para fora. As pedras voaram pelos ares como projéteis, as torres tombando sob o impacto. A torre da direita desabou, colidindo com a outra em um estrondo que sacudiu o chão. Ambas caíram para trás, esmagadas pelos escombros.

    Os gritos do lado de dentro foram sufocados pela poeira e pela fumaça, engolidos pelo estrondo dos escombros. O cheiro de pedra queimada e sangue pairava no ar. Dante seguiu em frente, sem pressa, os olhos fixos no que restava da muralha.

    Acima dele, Heian alçou voo novamente, deixando-o para trás. O velho homem não desviou o olhar, nem ergueu a cabeça. Com um simples gesto de mão, os escombros que bloqueavam seu caminho foram arremessados para dentro da cidade. Rochas quebradas, vigas partidas e corpos feridos voaram como folhas ao vento, espalhando mais gritos e caos.

    A cidade inteira assistia.

    As casas, dispostas ao longo da rua, estavam apinhadas de rostos espiando pelas janelas. Famílias inteiras observavam, algumas petrificadas, outras tremendo. Surpresa. Horror. Medo. Já haviam visto aquilo antes, menos de duas semanas atrás. E agora, novamente, sua cidade era violada.

    Dante parou. Seu olhar varreu a multidão antes de erguer a voz, grave e inexorável:

    — Povo de GreamHachi.

    Seu timbre cortou o silêncio, ressoando até os becos mais escuros, até aqueles que se encolhiam nos cantos da cidade.

    — Eu vim porque sua líder tirou algo de mim. Da primeira vez, estive aqui por vocês. Não ergui a mão contra seu povo, não derramei seu sangue. Mas agora… vocês possuem algo que me pertence. Algo que pertence ao meu povo.

    Um estalo de metal respondeu às suas palavras.

    — Ele é um Impuro! Matem-no!

    A ordem foi um rugido de ódio. O primeiro soldado ergueu a espada, e com ele, mais de uma dúzia de guerreiros avançaram. Quinze homens em armaduras desgastadas, botas batendo no chão encharcado, olhos inflamados pelo medo e pela fúria.

    Dante continuou andando.

    Nem uma única vez apressou o passo. Nem uma única vez ergueu os braços para se defender. E então, a sombra surgiu atrás dele.

    O brilho de uma lâmina lisa cortou o ar. Um segundo velho disparou para frente como uma flecha solta do arco. O primeiro golpe veio antes que o soldado pudesse entender.

    Ele parou de correr.

    Sua boca se abriu para gritar, mas não havia dor, apenas confusão. Seu braço… onde estava seu braço? Seus olhos desceram, e ali, sobre o chão enlameado, estava o membro decepado, os dedos ainda crispados no cabo da espada.

    O grito veio um segundo depois.

    Leonardo não parou. Sua lâmina cantava, um aço que se movia como o vento, impiedoso e veloz. Ele cortava de um lado para o outro, desviando golpes, rebatendo espadas, derrubando homens como um ceifador colhendo o trigo.

    Os gritos de dor e os estalos de aço ficaram para trás. Na rua principal, o velho Vulkaris finalizou sua dança mortal. Sua espada mergulhou no peito de um soldado. A lâmina girou.

    E quando foi puxada para fora, trouxe consigo algo mais — um emaranhado de tripas escorrendo, encharcadas de sangue.

    Dante seguiu seu caminho, imperturbável.

    — Ele tem outros assuntos para lidar – disse Leonardo encarando aqueles homens caídos, alguns ainda com vida.

    A voz de Vulkaris era grave, quase indiferente. Ele girou a espada, e o sangue que antes manchava a lâmina foi lançado ao chão em um arco escarlate. Então, com um salto ágil, desapareceu no ar como uma sombra levada pelo vento.

    Os soldados que ainda restavam pelas ruas trocaram olhares nervosos. A coragem que antes sustentava seus passos se desfez, dando lugar ao medo. O medo logo se transformou em desespero.

    Dante avançava.

    O Demônio de Kappz marchava sozinho pelas ruas de GreamHachi, e a cidade parecia se abrir diante dele como uma fera acovardada. O rastro de destruição não vinha apenas de seus passos; os subordinados que o seguiam, invisíveis, espalhavam o caos, derrubando barricadas, incendiando torres, desarmando o que restava da resistência.

    Mas Dante não parecia movido pela fúria ou pelo ódio. Sua face era uma máscara de pedra, dura e impassível. Ele não precisou repetir suas palavras. A rua, repleta de olhos que o observavam, simplesmente se abriu.

    E então, a explosão.

    O som reverberou pelas vielas como o rugido de um trovão. Uma das casas de três andares, erguida com vigas de ferro e paredes de pedra grossa, teve a lateral despedaçada. A poeira subiu como uma nuvem densa, cobrindo os céus acima.

    Gritos ecoaram de dentro.

    Homens, ou o que restava deles, despencavam das alturas, seus corpos destroçados. Alguns ainda se debatiam enquanto caíam, mas poucos atingiram o chão intactos.

    No topo do prédio mais alto, uma figura se movia com precisão.

    A trava da Carabina ISE foi puxada com um estalo. O som seco de uma cápsula ejetada quebrou o silêncio que a explosão deixara. O projétil, amarelo e brilhante, girou no ar antes de cair, e Marcus o pegou com destreza, movendo-se sem pressa.

    Com o cotovelo apoiado no beiral, ele encaixou a nova cápsula na arma.

    — Menos um!

    Sua voz soou como uma sentença.

    E o disparo seguinte, um raio de luz ofuscante, rasgou o céu cinzento e encontrou seu alvo com precisão mortal.

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