Capítulo 189: Olhos Brancos
Dante encarou a mulher, não apenas por sua presença imponente, mas pela arrogância que escorria de cada gesto, de cada palavra não dita. Maethe se deleitava com o momento, com o jogo que ela mesma havia arquitetado. Quando as portas enfim foram empurradas para trás, rangendo contra os trilhos metálicos, o rosto que ele tanto procurava se revelou.
Clara.
O alívio de vê-la viva durou menos de um segundo antes de a raiva se instalar em seu peito como brasas em um fole. Ela parecia exausta, os cabelos brancos desalinhados, colados ao rosto sujo. Um dos soldados a segurava pelos fios, forçando sua cabeça para trás como se fosse um animal prestes a ser exibido. Suas roupas haviam sido reduzidas a farrapos, meros trapos atirados sobre seu corpo como se fossem apenas uma obrigação, uma tentativa mínima de esconder sua dignidade despedaçada.
Mas nada o enfureceu mais do que seu olhar.
Havia algo ali. Não medo. Não desespero. Mas um desafio silencioso, uma teimosia que recusava se apagar, mesmo diante da brutalidade. E ninguém, ninguém, olhava para Dante daquele jeito e saía impune.
— Parece o encontro dos sonhos — disse Maethe, uma risada escorrendo de seus lábios como veneno. — O que acontece quando um homem que nunca teve nada perde a mulher que nunca teve tudo?
Dante não desviou os olhos de Clara.
— Por que fazer isso com ela?
A resposta veio em forma de brutalidade.
O soldado puxou Clara pelo cabelo e a jogou no chão, com força. Ela caiu sobre os joelhos, os braços puxados para trás por uma corrente grossa, os pulsos e o pescoço marcados pelo metal apertado demais. A pele estava avermelhada, já ferida pelo atrito constante.
Dante sentiu seu sangue esquentar. A fúria pulsava em sua respiração, em cada músculo de seu corpo, em cada batida ensurdecedora dentro de sua cabeça.
O rosto dela encontrou o mármore frio. Os guardas riram. Um deles pisou em sua omoplata, forçando-a ainda mais contra o chão.
A cada risada, a sentença de morte deles se tornava mais definitiva.
Eu vou matar todos eles.
— Está irritado? Ou está apenas ansiando para nos exterminar, senhor? — Maethe sorriu, um sorriso frágil, rachado como porcelana velha. — Pois saiba que qualquer ato contra minha pessoa resultará na morte de Clara Silver. Você veio até aqui acreditando que teria escolha?
Dante cerrou os punhos.
— E o que você acha que vai acontecer?
Maethe inclinou a cabeça, os olhos azuis brilhando à luz das tochas.
— Uma troca, é claro. — Ela suspirou, como se aquilo fosse um jogo entediante. — Eu conheço sua força. Você derrotou Januário, sobreviveu ao Mundo dos Pesadelos dele, e reduziu Raver a pedaços em um único golpe. Eu já vi muitos homens se acharem fortes. Mas nenhum fez o que você fez.
Dante não respondeu. Clara tentava se erguer, forçando-se a ficar de joelhos, a não ceder à humilhação.
Eu vou matar todos eles.
— Por isso, quando digo que uma troca será feita, tenho absoluta certeza do que estou falando. Quando você invadiu este lugar, eu estava negociando na Zona Cega com os Três Soberanos. Mas você… Você veio para destruir minha reputação.
Dante riu. Uma risada baixa, sombria.
— Reputação? — Ele deu um passo à frente. — Você nunca teve nada para ser destruído.
Maethe ergueu a mão de repente, e ele parou.
Das casas ao redor, sombras emergiram. Soldados. Pelo menos dez, talvez mais. Todos armados com carabinas, mas nenhuma delas apontada para Dante. Todas estavam voltadas para Clara.
— Não se mova, senhor. — A voz de Maethe se tornou fria, meticulosa. — Nossa conversa ainda não acabou. Você não está aqui para resgatar uma mulher que perdeu. Está aqui porque não há nada que possa fazer por ela. O destino dela já foi traçado. Assim como o seu.
Dante inclinou a cabeça, o olhar carregado de algo primitivo.
— Quanto mais você fala, mais fica claro que quem não entendeu nada foi você. — Ele deu mais um passo. Dessa vez, sem se importar com as armas. Sua raiva já dominava cada fibra de seu corpo. — Não importa o que tente negociar. Você não vai sair daqui viva. Nem seus homens.
O sorriso de Maethe desapareceu.
— O poder está com quem manda, senhor. — Sua voz endureceu. — O que você acha que dez armas apontadas para sua amiga representa? Quem está no controle aqui? Certamente não é você.
O desprezo em sua voz era palpável.
— Nenhum Impuro pisa na minha cidade sem ser punido. Vocês caíram. E você… você cederá. Não por escolha própria, mas porque os humanos sempre cedem quando algo importante para eles está em risco.
Dante expirou devagar, sentindo o peso da fúria solidificar-se em aço.
— Espero que alguém esteja te esperando do outro lado. — Sua voz soou baixa, ameaçadora. — Porque você vai precisar de uma alma morta para te receber.
Antes que Maethe pudesse responder, ele se moveu.
Rápido demais.
O espaço entre eles desapareceu num piscar de olhos. Sua mão se ergueu e desceu como um martelo. O impacto deveria tê-la esmagado contra o chão.
Mas no instante em que sua palma tocou o ombro dela, uma barreira roxa se expandiu ao redor do corpo da mulher.
Maethe sorriu.
— Eu avisei, não avisei?
Sua mão se fechou ao redor do pulso de Dante.
— Depois que você matou Januário, eu fiquei sem um carrasco. Sem alguém para aterrorizar os fracos. As pessoas começaram a questionar minha liderança. Falaram em ir embora.
Os olhos de Dante se arregalaram quando um brilho azul preencheu sua visão.
— E agora, sua mente e seu corpo serão meus.
Maethe se virou para Clara, saboreando o momento.
— Deixem que ela veja. Deixem que veja seu salvador ser transformado em um animal preso.
Seus olhos estavam completamente brancos agora, a habilidade ativada. Seu toque era tudo o que precisava.
Ela se aproximou de Clara, abaixando-se para agarrar seus cabelos, forçando-a a encarar Dante.
— Clara Silver… Você pode ter resistido. Mas nem todos são como você.
Clara não conseguiu desviar o olhar. Os olhos de Dante estavam brancos como a neve.
E Maethe se divertia ao vê-lo erguer a mão, sua energia crepitando em um estalo de pura força cósmica.
— Vamos, Dante. — A voz dela era um sussurro cruel. — Sem drama. Acabe com essa vagabunda. Agora.
Clara fechou os olhos, aguardando a sentença.
— Desculpe, Dante.
— Como fez com Januario e Raver — gritou Maethe apontando. — Acabe com isso com um soco. Destrua essa mulher.
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