Índice de Capítulo

    O refeitório estava quente, o ar pesado com o cheiro de carne assada e pão fresco. Dante cortou um pedaço de bacon, levando-o à boca com calma, enquanto Pood falava com uma voz contida, quase reverente.

    — Merlin Godsnow é um dos maiores estudiosos dos últimos anos, senhor — disse Pood, os olhos fixos em Dante, como se tentasse medir sua reação. — Ele é um dos maiores, se não o maior cientista que temos vivo.

    Dante ergueu uma sobrancelha, mastigando lentamente.

    — E onde está esse homem de nome estranho hoje?

    Pood abaixou o garfo, seu rosto se fechando em uma expressão sombria.

    — Não faço ideia. Ninguém realmente sabe onde ele está. Dizem que ele se perdeu no meio das caminhadas, mas muitos acreditam que ele queria criar um portal direto para Whalien, um dos continentes mais distantes que conhecemos, ao norte.

    Dante franziu a testa. Whalien. O nome não lhe era familiar, nem mesmo de suas conversas com Talia, anos atrás.

    — Então, ele morreu?

    — Não sei responder essa pergunta, senhor — admitiu Pood, sua voz carregada de incerteza. — Acredito que ninguém saiba de verdade.

    Dante suspirou, espetando um pedaço de carne com o garfo. Merlin Godsnow. Um nome que ecoava como uma lenda, mas cujo paradeiro era um mistério. Um homem que escolhera um caminho solitário, buscando algo maior, algo que talvez nunca encontrasse. Não ajudava em nada a Dante, que precisava de respostas, não de lendas.

    Meses se passaram desde sua chegada, e ainda assim, apenas mistérios se acumulavam à sua volta. Nada resolvido, apenas pequenas escolhas. Escolhas que melhoraram a vida de centenas, e outras que a pioraram. A vida era assim, ele sabia. Um jogo de equilíbrio, onde cada movimento tinha consequências.

    Ele terminou de comer, saboreando os últimos pedaços de bacon e os legumes temperados. Quando se levantaram para devolver as bandejas, as portas do refeitório se abriram de repente, batendo contra as paredes com um estrondo.

    Um soldado entrou, o rosto pálido e o pescoço ensanguentado. Ele ergueu a mão, sua voz ecoando pelo salão silencioso.

    — Invasão no Farol! — anunciou, ofegante. — Repito, houve uma invasão no Farol! Todas as tropas, posicionem-se!

    O refeitório explodiu em movimento. Soldados se levantaram apressadamente, correndo em direção às portas. Outros usaram suas habilidades, desaparecendo no ar ou abrindo buracos nas paredes e no chão. Os cozinheiros, no entanto, permaneceram calmos, como se invasões fossem algo comum.

    Dante ficou parado, observando o caos com uma expressão impassível.

    — O que é uma invasão no Farol? — perguntou, voltando-se para Pood.

    — Pior do que os Felroz — respondeu Pood, seu rosto sério. — São criaturas manchadas, vindas do abismo. Elas tomam o caminho do Farol, e quando chegam… — Ele fez uma pausa, como se relutasse em continuar. — O senhor Kalish deve ter dado a ordem, mas não podemos simplesmente ir para lá. Precisamos encontrar o Comandante Secure para entender a situação.

    — Criaturas do abismo? — repetiu Dante, intrigado. — Que tipo de abismo é esse?

    — Um lugar sombrio, senhor. Um lugar onde coisas antigas e amaldiçoadas residem. E essas criaturas… elas pensam. São mais perigosas do que os Felroz.

    Dante sorriu, um brilho de interesse em seus olhos.

    — Consegue me levar até lá?

    Pood hesitou, sua mão tremendo levemente.

    — Senhor, é perigoso. Elas são numerosas e imprevisíveis.

    — Isso só torna tudo mais interessante — respondeu Dante, sua voz calma, mas firme. — Agora, me leve até lá e encontre Secure. Deixe que eu resolva esse problema.

    Pood relutou por um momento, mas então ergueu a mão. Com um estalar de línguas, um portal se abriu, revelando um brilho avermelhado do lado de fora. Aqueles que ainda estavam no refeitório fitaram o portal, impressionados e curiosos.

    — Sei que vai ser uma idiotice falar isso — disse Pood, encarando Dante com uma mistura de preocupação e respeito. — Mas tome cuidado, senhor.

    Dante deu um passo à frente, entrando no portal sem hesitar. O ar mudou, ficando mais pesado, mais quente. O brilho avermelhado o envolveu, e ele sentiu o cheiro de fumaça e sangue.

    Uma mão se esticou na lateral. E Dante rapidamente abaixou-se. Um soldado havia sido dilacerado, seu corpo cortado ao meio, mas ainda vivo. Dante rapidamente segurou sua cabeça, tentando confortá-lo.

    O sangue escorria como um rio escarlate, manchando o solo sob seus pés. As tripas do homem estavam expostas, um emaranhado de vermelho e rosa pálido, ainda tremeluzindo com os últimos vestígios de vida. Ele estava deitado de costas, os olhos perdidos, sem foco, mas sua mão agarrava a de Dante com uma força surpreendente para alguém tão perto da morte.

    — Senhor… — sussurrou o homem, sua voz fraca, rouca, como o vento que sopra através de folhas secas. — Desculpe… Eu não consegui… conter…

    Seu rosto já não tinha a cor da vida. A palidez da morte se espalhava por sua pele, e seus olhos pendiam para o canto, como se buscassem algo que só ele podia ver. Ainda assim, ali estava um homem que dera tudo para proteger o Farol. Um homem que lutara até o último suspiro. Dante não o deixaria ali, não sem honra.

    — Está tudo bem — disse Dante, ajoelhando-se ao lado do homem. Sua voz era suave, mas firme, como a de um pai consolando um filho. — Você pode descansar, rapaz. Não há mais monstros. Você pode descansar agora.

    O homem fechou os olhos, sua respiração curta e irregular. Ele tentou segurar a vida, mas ela escapava entre seus dedos, como areia fina. Não foi suficiente. A morte o levou, suave e implacável. Nos braços de Dante, ele permaneceu por um momento, como se o próprio tempo hesitasse em levá-lo. Então, com delicadeza, Dante o repousou no chão, suas mãos manchadas de sangue.

    Dante tocou o peito do homem, onde um corte profundo ia do ombro até a cintura. A carne estava aberta, exposta, mas ele não desviou o olhar. Esperou, como se o silêncio pudesse trazer alguma resposta, algum significado para aquela perda.

    — Não o conheço, rapaz — disse Dante, sua voz baixa, quase um sussurro. — Nem sei de onde veio. Mas farei o necessário para vingá-lo.

    Um grito agudo rasgou o céu, vindo de cima. Dante ergueu a cabeça, seus olhos estreitando-se contra a luz do sol. A criatura batia suas asas, cortando o ar com uma agilidade monstruosa. Em sua boca, algo pendia, ensanguentado e dilacerado. Dante não precisava pensar muito para entender. Seus olhos não o enganavam.

    Era a metade do corpo do rapaz que acabara de morrer.

    — Vick — chamou Dante, seus punhos se fechando com força. O maxilar endureceu, e a Energia Cósmica começou a se formar ao seu redor, pulsando como uma aura viva. A pressão era esmagadora, o cheiro da morte pairando no ar, os corpos sem vida espalhados pelo campo, o solo manchado de vermelho. Era quase insuportável. — Não coloque limitações, por favor — ordenou Dante, sua voz fria como o aço.

    Não houve resposta da IA, mas Dante não precisava de uma. Ele ergueu a cabeça, seus olhos fixos na criatura. Ela parecia se divertir, mastigando os restos dos homens que matara. Essa era a natureza das criaturas, a natureza dos monstros. Se fosse qualquer um da Cuba, Dante sentiria a mesma raiva, o mesmo ódio.

    — Eles eram homens corajosos — disse Dante, sua Energia Cósmica pulsando como uma armadura ao redor de seu corpo, crescendo cada vez mais. — Você ri deles, se engasga com o que eles eram. E mesmo assim, não sente nada além de diversão. Como?

    Seus dedos se fecharam com tanta força que as unias começaram a cavar sulcos em suas palmas. Os olhos de Dante não se desviavam da aberração, sua expressão uma mistura de fúria e determinação.

    — Não importa quem eles eram, quais pecados cometeram — continuou Dante, sua voz agora um rugido, ecoando pelo campo de batalha. Ele ergueu o braço, apontando um dedo para o monstro no céu. — Você morre hoje. E todos que vieram com você.

    A Energia Cósmica ao redor de Dante explodiu, envolvendo-o em um manto de poder brilhante. Ele não precisava de palavras para declarar sua intenção. A morte estava no ar, e ela não seria para os homens que caíram, mas para aqueles que os tiraram de seu descanso.

    O jato foi enviado dos seus pés, ele tomou voo.

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