Capítulo 260: Antes da Batalha
Dante foi pego de surpresa. A Vanguarda inteira estava em movimento, um frenesi de preparação que parecia quase coreografado. Homens e mulheres vestiam suas roupas de batalha, ajustando armaduras pesadas, dobrando calças e amarrando cadarços com precisão militar. Ele viu Guaca e Egiss trocando palavras em um canto enquanto se preparavam, suas vozes baixas, mas carregadas de urgência.
Miatamo estava mais afastado, ouvindo atentamente três ou quatro pessoas enquanto afiava o fio de sua espada com movimentos meticulosos. Todos os Vanguardistas usavam uma fita vermelha no braço direito, por cima de qualquer peça que vestissem, um símbolo de união e lealdade. Até mesmo um cachorro estava sendo preparado para a batalha, com uma cota de malha leve e um capacete adaptado para suas orelhas.
— Não fique preocupado — disse Porto, aparecendo ao lado de Dante e dando-lhe um tapa no ombro. Ele parecia relaxado, um sorriso largo estampado em seu rosto. — Não é a primeira vez que vamos para uma batalha com nossa frota completa.
Dante olhou para ele, ainda um pouco desorientado.
— Acredito nisso. Enfrentaram alguém forte?
Porto passou por ele, parando com a mão na cintura, observando seus aliados com um olhar de aprovação.
— Ah, o Rei do Oeste é um miserável, se você quer saber a verdade — respondeu Porto, sua voz carregada de desdém. — Normalmente, quando temos um problema com ele, sempre é resolvido com negociações. Mas o Rei Bulianto já deixou claro que não quer um conflito com ele agora.
Dante ficou surpreso.
— Por quê?
— Não sabemos — respondeu Porto, encolhendo os ombros. — Mas eles sempre negociam bastante. E, no final, nós perdemos uma parte da nossa terra. Bom, isso foi até a última vez que estivemos em VilaVelha. Ele nos atacou diretamente, e perdemos bons homens naquele dia.
— E agora, vamos enfrentar esse Bastardo — disse Dante, tentando entender a situação.
Porto franziu o rosto ao ouvir o nome.
— Esse é um caso… peculiar — respondeu ele, sua voz mais baixa agora. — Bastardo já foi um de nós, até se afundar em ganância. Nunca mais foi o mesmo depois que perdeu o pai.
— Existem muitos traumas que nos fazem repensar — disse Dante, suas próprias derrotas ecoando em sua mente. — Com o que ele foi ganancioso?
— Pode ser que você tenha razão, velhote — respondeu Porto, dando uma risada seca antes de se mover na direção de Miatamo. — Mas os gananciosos são os primeiros a morrer. E eu quero aquele desgraçado morto.
Dante observou Porto se aproximar de Miatamo e ser saudado com abraços e apertos de mão. Ele não esperava que Porto fosse tão bem recebido entre a Vanguarda, mas os gestos de respeito e camaradagem eram evidentes. Porto não apenas cumprimentou os outros, mas também sentou para ouvi-los, balançando a cabeça e fazendo perguntas que Dante não conseguia ouvir claramente.
Eles conversavam sobre a última batalha, muitos meses atrás, e como o Rei do Oeste parecia cada vez mais recuperado. Dante percebeu que esse era um mundo novo, com grupos diferentes que se movimentavam no mar sem um lugar fixo para chamar de lar.
De repente, a porta se abriu, e Nekop entrou, seu caderno em mãos. Ele olhou para todos com uma expressão séria.
— Nós vamos nos mover em menos de cinco minutos — anunciou Nekop, sua voz alta e clara, silenciando os Vanguardistas de uma vez só. — O Rei Bulianto disse que os Tecnicos vão fazer o suporte, mas vocês precisam avançar até o Bastardo.
Os homens concordaram com vigor, mas sem exaltações. Era uma aceitação calma, como se já soubessem o que estava por vir.
— Não importa se ele foi um de nós — continuou Nekop, sua voz firme. — Uma bandeira inimiga continua sendo inimiga, mesmo com um dos nossos do outro lado. Nós temos que nos mover para Sinora. Se ele chegar primeiro, está tudo acabado. Perdemos a comunicação com todos. As Frotas foram avisadas, mas precisamos de vocês para comandar caso dê algum tipo de problema. Entenderam?
Todos concordaram com a cabeça, seus rostos sérios e determinados. Dante ficou um pouco afastado, observando a cena. Ele não entendia completamente por que esperavam, mas todos pareciam prontos, mantendo-se de pé, perto da parede, desalinhados, mas firmes.
Ao seu lado, surgiu Trahaus. Ela também estava vestida com uma cota de malha reforçada, que dava liberdade aos braços e pernas. Sua roupa era mais escura, e ela usava um pano para cobrir os cabelos, deixando-os cair apenas nas costas.
— Pronto para pegar alguns meliantes, senhor? — perguntou Trahaus, seu tom de voz respeitoso.
Dante ficou intrigado. Desde quando ela o respeitava a esse ponto?
— Só quero saber primeiro quem vamos enfrentar — respondeu Dante, sua voz calma, mas carregada de curiosidade. — Ninguém aqui parece querer falar sobre isso.
— Não tiro a razão deles — disse Trahaus, cruzando os braços enquanto observava os Vanguardistas se prepararem. — Você ficou pouco tempo no barco do Convidado, mas eles fazem muitos aliados e inimigos no mar. Esse Bastardo é sempre um caso à parte. Pelo que lembro, ele serviu por muito tempo, mas acabou… afogado em ganância.
De novo aquelas palavras. Ser ganancioso era ruim, claro, mas um homem sem ambição era um homem morto. Dante não tinha muitos sonhos, mas seu maior objetivo era voltar para casa. Ele sabia que precisava de um plano, de uma maneira de alcançar seu desejo.
— Falando nisso — disse Dante, virando-se para encará-la. — Conhece alguém chamado… Merlin?
Ele se lembrou de Pood mencionando Merlin algum tempo atrás. Bom, muitos meses atrás, para ser mais preciso.
— Eu já ouvi falar dele — respondeu Trahaus, coçando o rosto, pensativa. — Um tal de Senhor das Portas. Ele navegou com o Convidado no ano passado. Eu estava presente. — Ela fez uma pausa, como se tentasse se lembrar dos detalhes. — Acho que o Convidado deixou ele em uma cidade portuária. Bagamos ou Gabamois, não me lembro bem.
— Ele existe mesmo? — perguntou Dante, arqueando a sobrancelha. Rapidamente se aproximou, falando mais rápido, sua voz carregada de esperança. — É verdade que ele podia abrir portas entre lugares diferentes?
Trahaus ergueu um dos braços, como se quisesse mantê-lo à distância.
— Ei, calma aí. Não precisa ficar se jogando — disse ela, com um tom de advertência. Dante recuou um pouco, envergonhado. — Respira, certo? Merlin realmente tinha um sistema de portas, mas, pelo que me lembro, ele só podia usar uma vez a cada alguns anos.
Dante ficou de boca aberta, um pingo de esperança brilhando em seus olhos. A Promessa que Porto e Thelia haviam mencionado, aquela que era concedida aos que se destacavam no mar, agora parecia mais tangível do que nunca. Se ele pudesse ganhar o prestígio necessário, talvez o Rei Bulianto pudesse ajudá-lo a encontrar Merlin — ou até mesmo conceder-lhe o desejo de voltar para casa.
— Então ele realmente existe — murmurou Dante, mais para si mesmo do que para Trahaus. — E se eu conseguir a Promessa… talvez o Rei possa me ajudar a encontrá-lo.
Trahaus olhou para ele, seus olhos estreitando-se como se estivesse tentando decifrar suas intenções.
— Cuidado com o que deseja, Capital — disse ela, sua voz carregada de um aviso silencioso. — A Promessa não é algo que se ganha facilmente. E, mesmo que você consiga, nem sempre o que você deseja é o que você precisa.
Dante não respondeu imediatamente. Ele sabia que Trahaus tinha razão, mas a esperança de voltar para casa, de ver Clara, Marcus ou Talia novamente, era algo que ele não podia ignorar. Ele precisava tentar.
— Obrigado, Trahaus — disse ele, finalmente, sua voz firme. — Já sei o que preciso fazer.
Trahaus balançou a cabeça, um sorriso leve aparecendo em seus lábios.
— Boa sorte, Capital. Você vai precisar.
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