Capítulo 290: Caminhos Inseguros
Jack já estava ajoelhado ali, de olhos estreitos, a luneta velha pressionada no sulco debaixo do olho. Porto foi o próximo, rolando pesado ao lado, arfando com um chiado molhado no peito. Trahaus subiu por último, o rosto fino tingido de suor e raiva.
— Pelo menos ser magra aqui deu resultado — Trahaus bateu a mão no chão, sacudindo os dedos para recuperar a circulação. — Se alguém tivesse me dito que era assim, tinha ficado pra cuidar do leme.
— Ser gordo nessas horas deve ser uma tortura — brincou Porto, mais atrás.
Dante quase riu, mas o ar se recusava a sair da garganta. Ele empurrou o corpo até ficar agachado. Havia um gosto de sangue na boca, ferrugem e sal. Olhou ao redor: o platô era estreito, não mais que quatro metros de largura, com rochas quebradas e gramíneas secas que dançavam como fios de cobre no vento.
— Silêncio — sibilou Jack. O velho não tirava os olhos do visor. — Tem cavaleiros no caminho alto.
Dante ergueu um pouco a cabeça. O som veio antes da visão: cascos sobre pedra, duros e ritmados, como martelos no crânio. Depois, silhuetas. Quatro, não — cinco. Cavaleiros montados em bestas magras, cobertas por armaduras de placas enferrujadas. Máscaras de ferro ocultavam os rostos. Cada um carregava uma lança curta nas costas, rifles pendurados nos arneses. Mercenários.
Jack abaixou a luneta devagar, um músculo se contraindo em sua mandíbula.
— Bastardos do Mercado Negro — rosnou. — Usam essa roupa, mas são bem fortes. Já foram um tipo de quadrilha organizada em Singapura. Hoje em dia, são apenas fantasmas aqui fora.
— Estavam passando. Agora viram a gente — disse Porto, voz baixa, olhos fixos nos cavaleiros que desaceleravam, olhando direto para eles.
Um deles ergueu a mão em um gesto seco, e os outros puxaram as rédeas. Os cavalos viraram em sincronia, relinchando como se sentissem o cheiro de sangue.
— Vão vir. — Dante se ergueu, mão no cabo da espada. O corpo gritava para cair, mas ele ignorou. — Jack, a retaguarda. Porto, cobertura lateral. Trahaus, no meio comigo.
Os cavaleiros desceram a encosta com precisão. Desmontaram do cavalo mais rápido do que esperava.
Sem ruído além do couro tenso e do ferro batendo contra ferro. O primeiro deles desmontou antes de chegar, enfiando o sabre no chão e puxando a arma de fogo do coldre. Era um rifle velho, mas com o cano modificado. Feito para perfurar placas.
— Não fiquem parados.
Dante não esperou. Correu na direção dele com um impulso que arrancou um estalo seco das juntas das pernas. O cavaleiro ergueu o rifle — tarde demais.
Dante colidiu com ele com o ombro, um impacto surdo que lançou o homem para trás. A espada foi enfiada para baixo, na direção da sua garganta., abrindo a parte interna da coxa do inimigo, debaixo da proteção de couro.
Sangue jorrou quente e grosso, o homem caiu gritando.
O segundo cavaleiro estava em cima de Trahaus. O brutamonte ergueu a pistola, mas ela atirou primeiro. A adaga acertou de raspão, arrancando um grunhido. Trahaus não parou. Mergulhou para frente e agarrou o cavaleiro pela cintura, puxando-o da sela e subindo com extrema velocidade. Antes do homem conseguir se desprender dela, a Energia Cósmica liberada esfriou completamente os nervos dele.
— Fica frio.
O gelo condensou imediatamente. O homem simplesmente travou com sua pele ganhando uma crosta de gelo. Trahaus o empurrou para o lado, usando a montaria e indo na direção de outro.
Porto disparou do flanco, a espingarda do mercenário disparou contra sua perna, mas o tiro ricocheteou para cima.
O homem ficou sem reação, vendo que o disparo sequer o desacelerou. Usando a machadinha, Porto correu na direção dele, saltando e acertando um golpe bem no centro do rosto do cavalo, que relinchou alto antes de desabar de lado, esmagando a perna de quem montava.
Um grito curto e quebrado, depois silêncio.
— Quarto cavaleiro! — avisou Jack.
Dante virou a tempo de ver o homem levantar uma arma cuja boca era três vezes maior do que um rifle normal.
De onde ele tinha tirado aqui, Dante não fazia ideia.
Mirando na direção deles, o homem apertou o gatilho. O disparo foi recheado de uma imensa quantidade de Energia Cósmica se formando. E o brilho criou um chamariz para todos que estavam observando.
Dante correu de novo, desviando de Trahaus e pulando sobre o corpo morto do primeiro inimigo. O cavaleiro hesitou vendo que o homem se jogou na frente do disparo. E antes de acertá-lo, os dois braços se ergueram.
O ar foi disparado, mas Dante foi jogado um pouco para trás. Seus dedos foram fechando ao redor da esfera, comprimindo ela até ficar do tamanho de um algodão.
A pressão nos seus dedos era grande, acertando o calejo que possuía. Quando o brilho começou a diminuir, ele puxou a mão para trás e jogou de volta.
A explosão acertou a montaria, a fazendo enviar para trás, num relincho alto e ecoante. O animal caiu, mas seu condutor rolou para fora, antes de ser esmagado.
— Quem são vocês? — Sacou uma adaga e correu na direção dele. Dante puxou sua espada de volta e caminhou em sua direção.
Agarrando a mão armada e desviando o golpe, o joelho do cavaleiro subiu, acertando o vazio. Seus olhos foram para adaga, que tentou girar para o pescoço, mas o velhote desviou sem dificuldade e acertou um soco bem no meio do seu rosto.
A pressão fez com que os ossos de sua face estalassem completamente.
— Não precisa saber disso. — A resposta veio de um segundo golpe no rosto.
O homem cambaleou, e Dante terminou com um soco na garganta, sentindo os dedos esmagarem a traqueia. O cavaleiro caiu de joelhos, arfando, antes de tombar de lado e não se mexer mais.
Jack já cuidava do último. Ele tinha pego uma arma no chão, e viu o mercenário se assustar e tentar dar uma volta para longe.
Ele aproximou a carabina velha do rosto, apoiando no ombro e estabilizando pela adrenalina. Respirou fundo, o deixando passar por uma pedra e apertou o gatilho.
Um tiro seco, mas nada preciso. O homem brandia quando a bala atravessou sua coluna. Ele gritou, o jogando diretamente para o chão. A rédea que o segurava se enroscou em uma das pernas, e a montaria continuou o levando enquanto os braços eram arrastados junto da cabeça.
O silêncio voltou aos poucos, mas agora estava denso, pesado.
Dante recuperou o fôlego bem rápido, já encarando os demais para ver se estava tudo certo. Os mortos usavam a mesma vestimenta esverdeada com elmos negros e botas surradas. Não era diferente do que utilizavam em Kappz, em alguns casos.
— Isso foi barulhento demais — comentou Porto. — Se o intuito era chegar sem fazer barulho, então, a gente não tá muito bem nesse plano.
Jack girava o cartucho do rifle, olhos atentos à trilha para cima.
— Se tiver mais por perto, eles vão vir. Pode ter dado um eco, mas não é incomum que eles façam caçadas assim. Vão reparar só se ninguém voltar, Comandante.
Dante assentiu, olhando ao redor. Esses homens serviram como base para entenderem o que poderia ter na cidade, mas nenhum deles foi
— Peguem as roupas deles. Vamos trocar para chegar lá mais rápido, e deixem os cavalos — ordenou, a voz rouca, mas firme. — Jack, você sabe onde esse carpinteiro vai estar mesmo? Não podemos ficar mais de um dia lá.
— Dentro do Distrito Industrial, ele sempre fica durante a noite trabalhando. — Jack o encarou, ainda suando um pouco. — Sempre fez isso. Ele pode até ser um velho irritante, mas trabalha muito bem.
— Certo. Peguem as roupas e armas, vamos nos mover. — Ele esperou Jack começar a se arrumar. — Consegue nos colocar por algum caminho diferente?
— Não é difícil. Tem muita gente que detesta esses caras. E como pode ver. — Ele puxou o casaco pra cima do ombro, ajustando a gola. — Ainda sou um morador desse fim de mundo.
Dante deu uma risada. O rapaz era casca grossa.
Eles recolheram as armas, os corpos deixados para os abutres e para a cidade que se alimentava de tudo. A trilha subia à frente, estreita como a ponta de uma adaga, levando-os direto para a garganta da cidade.
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