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    — Sempre estudei o comportamento humano, Sergio. — Glossário observava a luta de Dante e seu grupo do alto, os olhos atentos a cada movimento. — A maioria sempre reage da mesma forma quando uma informação tão desastrosa bate à sua porta. São colocados contra a parede, suas fraquezas expostas. Essa é a verdade das mentes racionais: evoluímos para sermos testados pelas nossas convicções.

    A cabine em que estavam era uma imensa estrutura metálica na parte mais alta da cidade. Dali, dominavam a visão sobre todo o Setor Comercial, enxergando as lojas amontoadas e as ruas movimentadas, uma estrutura erguida às pressas, sustentada por alicerces frágeis e trabalhadores inexperientes. As luzes piscavam em algumas partes, a neblina da noite se misturava à fumaça das fornalhas ainda acesas.

    — O senhor acredita que eles vão responder exatamente como imagina? Isso não é subestimar o inimigo? — Sergio perguntou, os olhos estreitos fixos no combate abaixo.

    — Como posso subestimar vermes quando estou prestes a esmagá-los? — Glossário deu um meio sorriso, apoiando-se na estrutura de ferro ao seu lado. — Eles vão tentar subir de novo, como fizeram do Terceiro Anel. Posicionei nossos melhores defensores, soldados que já pertenceram ao próprio navio, para proteger essas rotas. Vamos forçá-los a ficar em terra e, quando estiverem exaustos, acertaremos o ponto fraco deles.

    Pegando o holofote, ele dirigiu as palavras ao grupo, sua voz fria e calculista reverberando pelos becos e construções. Cada frase era construída para desmoralizá-los, para fazer suas convicções vacilarem. Revelou as fraquezas de cada um, desenhou um cenário cruel de desespero. O golpe final foi a afirmação de que o Nokia havia sido destruído.

    Os olhos de Glossário se estreitaram ao observar a reação deles. Como esperado, os olhares se voltaram para Dante. O Comandante era a âncora deles. Sem ele, a moral ruiria por completo. Era assim que os humanos funcionavam: quando o líder hesita, os seguidores desmoronam.

    — Quando todos ficam desesperados, então, você também…

    Sua voz foi interrompida por um estrondo seco, como se um gigante tivesse socado as entranhas da cidade. A estrutura de metal vibrou, os parafusos rangeram nos encaixes. Não foi apenas ali. O Segundo Anel inteiro tremeu.

    Sergio virou-se bruscamente para os soldados.

    — O que foi isso? Estamos sob ataque?

    O soldado mais próximo negou de imediato.

    — Não recebemos nenhum alerta, senhor. O impacto veio do centro da cidade!

    Glossário franziu a testa e voltou sua atenção para as ruas. Lá embaixo, os soldados que encurralavam Dante e seu grupo começaram a recuar, hesitantes. A hesitação era o primeiro passo para o colapso. Humanos recuam quando sentem desvantagem, mesmo sem provas concretas de que ela existe.

    — Quebramos sua moral, destruímos suas esperanças e os finalizamos. — Glossário murmurou para si mesmo, repetindo um mantra que já havia guiado muitas de suas vitórias. — Para termos sucesso, até mesmo os boatos mais irreais precisam ser transformados em verdades. O mundo inteiro é moldado pela informação.

    Aguardava o momento certo. Ele queria assistir o colapso final daquele grupo que ainda insistia em lutar pela memória do Capitão Bulianto. Uma resistência teimosa, mas insignificante. Eles cairiam ali, e essa marca seria gravada como um troféu. Uma prova incontestável de sua supremacia.

    Sua verdade estava prestes a ser imposta.

    — Senhor. — Sergio chamou por ele, a voz carregada de pragmatismo. — O CIE informou que não pode desfazer a camuflagem do navio enquanto ele estiver no oceano. Mas podemos usar a fuga deles para descobrir a localização exata.

    — Não. — Glossário observava o grupo recuar mais uma vez, seus golpes mais ferozes se tornando defensivos. Eles estavam encurralados, à beira do desespero. — Eles vão servir de exemplo. Um molde para o que está por vir. O Oceânico Polar I não pode ser entregue a ninguém que não compreende a verdadeira essência da sobrevivência.

    — Mas, senhor…

    — Basta. — Sua voz cortou o ar como uma lâmina, seu punho cerrado golpeando o painel de controle apagado. — Só precisamos esperar. Eles vão nos mostrar suas verdadeiras facetas a qualquer momento.

    Sergio cerrou os dentes, cruzando os braços. Havia um brilho irritadiço em seus olhos.

    — O senhor é chamado de louco por muita gente, mas isso… isso é pura obsessão. — Ele aproximou-se, a frustração evidente. — Se perdermos essa oportunidade, será um desperdício. Com o Nokia em nossas mãos, poderemos finalmente alcançar o Desejo. Não foi para isso que trabalhamos por tanto tempo?

    Glossário riu baixinho, sacudindo a cabeça. O Desejo… uma promessa vazia para aqueles que não entendiam a verdadeira natureza do poder.

    — Eu faço questão de esperar, Sergio. — Ele sorriu, e era um sorriso que Sergio aprendeu a temer. — Só mais um pouco. Quero ver o desespero nos olhos deles. E só depois disso… nós iremos atrás do navio.

    Sergio exalou pesadamente, desviando o olhar. Aquele homem era um enigma. E às vezes, o tipo de enigma que ninguém deveria querer decifrar.

    I

    Elise estreitou os olhos para Dante, os braços cruzados com força contra o peito, como se quisesse segurar algo dentro de si.

    — Belas palavras — sua voz cortou o ar, afiada como uma lâmina. — Mas me diz, vai usar essa mesma voz para nos tirar daqui? Vai nos matar agora ou prefere esperar?

    Dante inclinou levemente a cabeça para o lado, um brilho divertido passando por seu olhar. Então soltou uma risada curta, quase desdenhosa.

    — Por que parece tão desesperada? Está com medo deles?

    Jack, que até então mantinha-se quieto, recuou alguns passos, os olhos varrendo os becos ao redor. A cada instante, mais soldados surgiam das sombras, preenchendo as vielas como um enxame.

    — Não é só ela — murmurou, a tensão evidente em seu tom. — Não parece que temos um plano muito bom para sair daqui. O Setor Comercial tem uma única saída segura, e se tentarmos pelos tetos…

    — Esquece — cortou Elise, a irritação evidente. — Isso não é mais uma opção. Depois que você foi embora, eles selaram tudo. Os dutos têm vigilância constante e, honestamente, não duvido que seu “amigo” lá em cima tenha pensado nisso.

    — Então qual é o plano? — Porto questionou, mantendo uma mão firme no ombro de Carpinteiro, que arfava ligeiramente, ainda recuperando o fôlego.

    Dante estalou o pescoço para os lados, sentindo a tensão correr por seu corpo antes de soltar um suspiro preguiçoso. Um sorriso curvou seus lábios.

    — O plano não mudou.

    Seus olhos brilharam quando a Energia Cósmica pulsou sob sua pele, um fluxo quente e incômodo que fazia o ar ao seu redor vibrar. A sensação era visceral, quase opressora, mas Dante apenas sorriu mais.

    — Porto, cuide do Carpinteiro. Trahaus, segure Elise. Jack, me mostra o caminho.

    Os músculos de seu corpo se retesaram quando ele se moveu um passo à frente, o chão sob seus pés respondendo com um leve tremor. A presença dele parecia dobrar o peso do ar ao redor, fazendo os soldados hesitarem por um momento.

    Ele respirou fundo, o olhar se voltando para cima, na direção da cabine onde o inimigo o observava.

    — Vamos em frente. Nada mudou, não é mesmo… Vick?

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