Capítulo 314: Noticiário (I)
A vanguarda subiu com rapidez, atiçada pela expectativa, mas Dante permaneceu imóvel. Nem um passo. Miatamo e Guaca trocaram olhares silenciosos, incertos. Até mesmo Trahaus, Thelia e Porto hesitaram, observando o Capitão com atenção, todos esperando um comando, um gesto qualquer. Mas Dante não piscava. Seus olhos estavam cravados no navio de proa em formato de X, analisando com precisão cirúrgica cada movimento da embarcação.
Ele queria ver como eles agiriam. Como tentariam perfurar os cascos dos mercantes e passar para o outro lado. Não demorou muito até que uma vibração anormal cortasse o ar — e então um redemoinho se formou no centro da embarcação inimiga, sugando a água em torno de si como se domasse o próprio oceano. O navio rival parecia ser engolido e ao mesmo tempo elevado por essa espiral líquida, acelerando sua aproximação de maneira aterradora.
Nekop se aproximou do timão, a voz baixa, mas carregada de urgência.
— Dante… preciso alertar que esses não são como Saul. Eles são diferentes. Gostam de embarcações grandes, não para duelar, mas para afundar completamente. O objetivo deles é tomar a carga. Nada sobra.
Dante assentiu, como se já tivesse imaginado aquilo.
— Então o plano é atravessar os cascos com essa força bruta.
— Sim, senhor. É como eles fazem. Atacam debaixo para cima e destroem por completo.
Dante soltou uma risada seca.
— A presunção sempre forja sua própria queda.
Ele ergueu a voz, firme, audível mesmo contra o rugido do mar:
— Atacaremos a embarcação de Duncan. Está na hora. Quero toda a vanguarda naquele navio. Todos, entenderam?
Nekop arregalou os olhos, surpreso pela ordem.
— Todos? — repetiu, buscando confirmação.
— Todos. Vamos embarcar, tomar o que for deles e voltar da mesma forma que fizemos nas últimas vezes. Sem deixar rastros.
Miatamo correu até a escotilha do convés inferior e gritou o chamado. Vozes emergiram. Passos. Em segundos, o convés se encheu com os membros da vanguarda, subindo prontos, ou ao menos tentando parecer prontos.
Eles pararam ao ver Dante ainda ali. O Capitão. Aquele que os enviava, que os guiava, mas que raramente marchava ao lado.
Guaca, Miatamo e Egiss estavam reunidos. Um dos novatos perguntou, a voz embargada:
— Vamos mesmo… entrar em batalha? São aqueles dois navios os inimigos?
— Não. — Guaca cruzou os braços, a expressão dura como pedra. — É o navio com a proa em X. E vamos entrar todos. Grandes ou pequenos, não interessa. O Capitão ordenou. E quando ele fala… a gente obedece. Entenderam?
Os olhares se voltaram para o timão, esperando ver Dante parado lá em cima, como sempre. Mas o som de passos ecoou nas tábuas. E então o Capitão descia, degrau por degrau, se aproximando, até estar frente a frente com todos.
Foi nesse instante que entenderam, sem margem para dúvidas: Dante iria com eles.
— O que foi? — perguntou ele, com uma risada debochada, pousando a mão sobre o pomo da espada. — Estão confusos por me ver aqui?
— O senhor vai… mesmo?
— É claro que vou. Eu adoro batalhas. Vamos nos divertir um pouco.
Ele virou o rosto na direção do timão.
— Nekop, cuide do navio. E avise os Técnicos: qualquer um que tentar subir sem convite, derrubem.
Do outro lado, uma gargalhada explodiu. Rudini estava à ponta do Nokia, braços abertos, expressão impiedosa. Era impossível dizer se estava levando tudo a sério — e justamente por isso todos o respeitavam. Ele era imprevisível. Selvagem. Uma figura à parte.
— Lembram-se bem do que fazer, não lembram? — gritou ele. — Para voltar ao navio, só precisam gritar meu nome! — Abriu os braços como um messias lunático. — Eu vou lançar vocês sobre o inimigo. E vocês vão acabar com tudo!
Guaca soltou um suspiro, quase resignado.
— Rudini continua tão louco quanto sempre.
— É o jeito dele — respondeu Miatamo com um leve sorriso. — Deixar o navio sozinho não me anima muito… mas se o Capitão vai conosco, fico curioso pra ver como os inimigos vão reagir.
Os olhares entre os vanguardistas se tornaram mais sérios. Muitos ali nunca tinham visto Dante em combate. Apenas ouviram histórias — algumas glorificadas demais, outras talvez subestimadas. Mas agora ele estaria com eles, e isso mudava tudo.
Poder. Liderança. Presença. Era isso que sustentava o comando de um navio como o Nokia.
Dante abriu caminho entre seus homens, e Rudini gargalhou ao seu lado. Ambos trocaram um olhar cúmplice e um breve aceno de cabeça, como dois monstros que sabiam exatamente quando seria a hora de rugir.
— Capitão, o senhor parece em ótima forma. Vai ser mais um saque?
— Contra Duncan? Com certeza. Está pronto?
— Quando quiser, senhor! — respondeu Rudini, estendendo o braço como quem já ansiava por mergulhar na loucura da batalha.
O ar parecia denso, como se o próprio oceano tivesse prendido a respiração diante do que estava prestes a acontecer. Rudini caminhou até o centro do convés do Nokia, girando o ombro, e com um assobio alto, sinalizou para os técnicos que já posicionavam nas bases de lançamento.
— Estão prontos? — gritou ele, os olhos faiscando com uma alegria insana. — Hoje vocês vão voar como nunca antes! Quero ver todo mundo cair que nem raio em cima daqueles canalhas!
A vanguarda gritou em resposta. O som de botas batendo no convés, de armas sendo desembainhadas e de armaduras ajustadas ecoou como o prelúdio de uma tormenta.
Rudini se pôs à frente do grupo, braços erguidos.
— Quando eu der o sinal… lembrem-se: deixem o inferno com inveja do que faremos aqui hoje!
Com um gesto enigmático, Rudini fez uma estranha luz pairar sobre a madeira ao seu lado. Ali, estava o mesmo poder que fez com que fossem lançados da última vez. Agora, numa escala maior. E apontando para frete, ele rugiu:
— VAI!
O som agudo de liberação ecoou no convés, seguido por um estalo metálico. Trahaus e Porto foram arremessados como projéteis, cruzando o ar como flechas flamejantes. A força do disparo deixou um rastro brilhante enquanto cortavam o espaço entre os navios.
O impacto foi direto no convés do navio inimigo.
Dois homens que carregavam armas pesadas sequer entenderam o que acontecia antes de Porto os esmagar contra as velas dobradas. Trahaus caiu como um trovão, quebrando o centro de uma formação de vigias — seu adaga girou no ar e perfurou o peito de um dos soldados, arrancando um grito brutal e fazendo os outros recuar com medo.
— Agora — Dante gritou atrás. — Sigam os Comandantes.
Com aquele comando, dezenas de vanguardistas foram disparados em sequência, um após o outro, como um enxame de demônios lançados contra a embarcação de Duncan Reborn. Rudini pulava e gargalhava enquanto apertava uma esfera luminosa em sua mão, lançando cada grupo com precisão mortal.
O impacto era avassalador.
A cada segundo, mais homens do Nokia caíam sobre o inimigo como uma chuva de destruição. As velas eram rasgadas, mastros vibravam com o peso repentino, e os primeiros alarmes soaram — tarde demais.
O navio de Duncan tentou reagir, mas a surpresa era completa. Os tripulantes mal haviam percebido que estavam sob ataque. Um deles correu com uma tocha para acionar um alarme mágico, mas foi interceptado por Egiss, que girou duas espadas em sincronia, fazendo o sangue salpicar no ar antes que qualquer som pudesse ser emitido.
Guaca puxava dois homens pela gola, os arremessando contra os canhões da lateral. Miatamo se movia como uma onda viva, desviando com passos leves e cortando com precisão os que tentavam formar resistência.
O convés do navio inimigo virou um campo de caos.
— DEFENDAM A CARGA! — alguém do outro lado gritou. — A CARGA! AGORA!
Mas era tarde demais.
Dante já estava lá. Desceu com elegância e brutalidade, sua presença engolindo o convés. O primeiro que tentou enfrentá-lo foi jogado contra o mastro com um único golpe da bainha da espada, rangendo a madeira. O segundo foi perfurado antes que sequer soubesse o que o atingira. A lâmina parecendo nem ter saído de sua bainha.
— Sem prisioneiros — ordenou, a voz baixa, mas mais fria que os ventos cortantes do mar. — Só os comandantes.
Os soldados inimigos, muitos deles mercenários comuns, entraram em pânico. Tentaram contra-atacar em pequenos grupos, mas eram varridos com facilidade pela força e disciplina dos vanguardistas. O Nokia havia jogado sua elite. E eles estavam famintos por guerra, pelo combate mortal.
Eles queriam a adrenalina de volta, da derrota que sofreram pelo Bastardo.
Um dos comandantes do navio inimigo tentou reagrupar os homens em uma formação defensiva perto das cargas principais, mas foi interceptado por Thelia, que se lançou como um raio, desarmando-o com um giro duplo e cravando seu machado no ombro dele.
— O que foi, senhores? — Ela puxou o machado e varreu a lâmina para frente, sendo segurado por um deles e o arrastando para longe.
A escotilha deles, arrombada por uma explosão de Miatamo, foi aberta se tornando uma descida direta. Os sons do confronto se espalhavam por cada andar da embarcação, reverberando como um tambor de guerra. O cheiro de pólvora, sangue e madeira úmida preenchia o ar.
E no meio de tudo, Dante avançava. Calmamente, firme. Como se estivesse apenas cumprindo uma rotina — mas cada passo deixava um rastro de destruição.
Era um massacre.
Ao parar na borda do navio X, seus olhos fixaram nos dois navios que eram atacados pelos piratas. Não era Duncan ou Saul, mas Dante não se importava nenhum pouco. Ele só queria ter o suficiente para ir embora.
— Eles acharam uma carga de pedras preciosas e ligas — disse Trahaus chegando perto, atenta ao redor. — Nós levamos também?
— Sim, mas não deixe ninguém vivo.
Trahaus encarou o outro navio. Os piratas cortaram a cabeça de uma mulher sem misericórdia nenhuma, e a jogaram por cima do beiral, fazendo cair em queda livre até tombar na água. Dante fechou o punho, respirando fundo.
— O senhor quer ir até lá?
— Não. — Um dos homens teve uma pequena percepção ao passar os olhos para seu navio. E então, começou a apontar. — Eles já nos viram. Mande eles levarem tudo.
Dante se virou já ouvindo os berros vindo dos outros navios e de uma risada ao se afastar com Trahaus.
— Eles sempre são barulhentos, não acha? — perguntou ela.
— Sempre. Acho que as pessoas reagem assim quando veem suas coisas sendo roubadas bem na frente deles.
— Não me admira que sejam assim. São amadores.
Ela desceu para o convés inferior atrás dos outros, deixando Dante sozinho ali.
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