Capítulo 40: Último de Pé (III)
— Você não tem nada além de um golpe para derrotar seu inimigo. — A voz surgiu na sua cabeça enquanto via o Felroz vindo na sua direção com os três braços do lado direito sendo puxados para trás. — Seu problema, Dante, é que você sempre tenta achar um limite para disputar força contra seu adversário. Por isso está sempre sorrindo.
Os três punhos vieram, mas foram muito mais lentos do que antes. Dentro da água, nenhum deles era rápido. Esticou a mão, seu único braço liberto gerou Energia Cósmica azulada e disparou num soco tão forte que a pressão culminou pra cima.
O choque balançou a água inteira, criando ondas dentro. Dois braços destruídos, mas não era suficiente. Ele estava sendo arrastado cada vez mais pro fundo. Jogou as pernas para frente, contra a superfície e disparou o que podia pela sola.
Se o que estava puxando queria tanto assim ele, então ela teria.
“Dante, níveis críticos de conversão. Limite estipulado, 5%. Atrito causando cerca de 7%. Use a Energia, é um alerta”.
Uma onda de ar mais forte se libertou da sola de seu pé, e o enviou como uma bala para o fundo. Ele mexeu os músculos da cintura e da perna, expelindo rajadas para todos os lados. Os tentáculos afrouxaram ao redor dele, mas Dante não queria mais isso.
O que tinha no fundo daquele tanque para querer tanto levar para si?
— Todas as vezes que erguer seus punhos, você sabe que vai lutar. — Render disse em sua mente. — Por que ainda não tenta me vencer? Por que sempre se defende?
Tenho medo de te machucar, pai. Tenho medo de machucar minha mãe e irmã.
O fundo era escuro, mas os olhos verdes da criatura eram tão esbeltos que clareavam como um pôr do sol. Ele desceu rindo e viu mais seis tentáculos se libertarem ao redor dela, indo na sua direção. Ele desviou de vários deles, se jogando para a lateral, e passando além dela, ficando no meio da escuridão, ainda mais fundo.
A criatura abaixou a cabeça, mas não soube para onde procurar. De repente, Dante surgiu bem na frente dela, e lhe deu um gancho perfeito. A água inteira se remexeu. Um grito de dor foi enviado pra todo canto, mas Dante a segurou e deu uma cabeçada.
Antes dos tentáculos chegarem mais uma vez, ele ergueu o pé e acertou o peito dela, se jogando para longe e voltando a ejetar ar pela sola. Quando tocou a parte borda metálica, parou por um segundo e abriu a boca.
O ar se libertou em um imenso balanço. Tudo dentro e fora do tanque balançava com extrema violência. O Felroz que havia descido junto dele usou os braços sobrando para se lançar. Os tentáculos ao redor foram todos preenchidos com energia elétrica. Raios saíam das escamas, prontas para perfurá-lo e eletrificar.
Cada segundo ali dentro lhe causava mais problemas. O perigo só aumentava.
— Nunca tentou realmente me fazer de inimigo. — Render lhe apontou a espada. — E por isso sempre apanha, sempre volta marcado pra casa. Por que continua fazendo isso, Dante? Gosta de apanhar?
Não, pai.
Dante ergueu as duas mãos e a água pressionava seu músculo com mais densidade do que o ar. Seus dedos eram duas vezes mais pesados ao se mexer. Sua perna não reagia na mesma hora. Os seus dois inimigos chegavam lentamente.
Na verdade, tudo acontecia em uma velocidade impressionante.
Ele se jogou para o lado, todos os golpes da criatura acertaram a parede. O Felroz rugiu e desceu três braços. Dante arrastou a mão na água e um jato lateral foi lançado, golpeando contra sua barriga. O Felroz grunhiu voltando lentamente com sangue escorrendo da ferida.
“Níveis de conversão altos. Chegando aos 10%, Dante.”.
Dante foi pra frente, mas algo agarrou sua perna. Ele viu o tentáculo que tinha perfurado a parede simplesmente atravessou e o segurou. Os outros fizeram o mesmo, pegando sua outra perna. Dez deles o paravam de avançar, mas não saíam do lugar.
A criatura ficou incrédula. Ela estava vendo algum tipo de humanóide simplesmente contrariando sua força dentro da própria água. O quão longe alguém iria para sobreviver? O quão longe…
Algo a acertou no rosto, a mandando nadar até o outro lado e batendo contra parede. Um golpe no vazio, simplesmente cortando a ligação de dois dos seus braços. Mas, não ia ceder. Ela puxou novamente, o fazendo recuar a força.
Quando encarou o humano, ele agarrava um dos seus braços e quebrava. Partiu dois com a mão nua.
A criatura se assustou na hora. Ele estava vendo um humano ganhando vantagem dentro da água. Eles nem deveriam respirar direito.
Dante se libertou e foi pra frente. O ar estava acabando. Tinha que lutar a sério, pelo menos, para se salvar de algo que nem mesmo seu poderia escapar.
— Dante — ouviu de cima, era Marcus. — Merda, merda. O que faço com a bateria?
Liga ela.
Seu soco foi segurado pelo Felroz de cima. Ele puxou Dante e o socou diretamente no peito. A dor era extrema. Ele tinha recebido um desses antes, mas agora era pesado. Quanto mais tempo ficava ali dentro, pior era para o corpo.
Não sabia até onde poderia aguentar, a conversão do atrito para corporal seria destrutivo. Dante não podia deixar que isso acontecesse por nada.
O Felroz usou um dos tentáculos como locomoção e deu a volta em Dante, lhe dando um soco nas costas. Ele girou algumas vezes, quase perdendo a consciência. Seus olhos ardiam, seu nariz tinha entrado água. Seus sentidos, falhos pelo uso da visão, não funcionavam.
Vick, ajude Marcus.
“Inoperante. Preciso de comandos melhores para me desligar do corpo. Preciso de contato físico com a bateria”.
Dante girou depois de começar a ser bombardeado por golpes atrás de golpes, enviado contra a parede e sendo metralhado por socos.
— Você sempre está rindo quando luta comigo — disse Render, um dia. — Faz isso mesmo nunca tendo ganhado de mim antes. Sempre quis saber porque. Pode me contar, filho?
— Porque eu te considero a pessoa mais forte do mundo, pai. Se eu algum dia te acertar, quer dizer que posso ganhar de qualquer um no mundo.
Render deu uma risada. Raro era vê-lo fazendo aquilo no meio do campo de bambus.
— Você é ingênuo, Dante. Por isso, apanha tanto.
Os três punhos do Felroz lhe tiraram todo o ar que restou do seu pulmão.
— Um dia, você pode morrer por confiar no seu sorriso.
Dentro do tanque, Dante parou de sorrir.
I
Marcus rapidamente apertava os botões da bateria. Nada funcionava. Nem mesmo usando a arma para dar um tiro em um dos buracos. Somente o barulho do motor rugindo, e o silêncio que ecoava ao seu redor. Até mesmo o tanque, com suas águas turbulentas, havia ficado estático.
Se tudo parou e Dante não tinha voltado… Marcus socou a bateria na hora.
— Merda, merda. — Seu punho acertou mais três vezes. — Por que cacete eu não consigo acertar ninguém com essa merda?
E chutou a bateria, sentindo uma dor imensa nos dedos e ficando de joelhos, apoiando o braço na bateria.
— Por que… não consigo salvar ninguém?
Ele tirou a máscara e tapou os olhos, respirando várias vezes fortemente. Quantas vezes precisaram dele e quantas puderam realmente salvá-las? Sempre lento, sempre lerdo. Suas balas não penetravam as defesas de nem mesmo um Felroz como aquele.
Como poderia se chamar de filho dos Lima?
E apertou a bateria, forçando sua Energia Cósmica contra o ferro frio e barulhento. A Energia foi puxada, mas Marcus não sentiu. A raiva e desdenho tapavam sua visão emocional.
Mais dez segundos, e o motor soltou um ronco. E um brilho amarelo foi lançado para fora pelos buracos da bateria. Marcus se levantou assustado, sem saber o que acontecia. Ele encarou a água esverdeada, mas ainda estava calmo.
De repente, um disparo elétrico desceu contra os cabos que ligavam o tanque.
As lâmpadas ao redor se incendiaram, clareando o ambiente inteiro de uma vez só.
Do lado de fora, dos prédios distantes, Clara podia ver a luz amarelada sendo erguida no meio do dia, e mesmo assim, sendo tão forte quanto uma fogueira no meio do breu.
Tudo era luz no Reservatório.
De dentro do tanque, a eletricidade bombardeou tudo.
— Acorde, Dante.
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