Índice de Capítulo

    De luva, Clara segurou o peito de Marcus, o mandando de volta pra cama à força.

    — Eu disse que precisa descansar. Não precisa correr com isso. Nós já temos o suficiente de gente machucada.

    O atirador gemeu sozinho na cama de desgosto. Mesmo ali em cima do prédio, ele queria dar mais atenção para o que realmente conquistaram. Qualquer um gostaria, Clara tinha certeza disso. Mas, a bateria não iria para lugar algum. Literalmente.

    Perceberam o peso dela e ficaram mais chocados ainda ao saber que ela pesava quase cem quilos. E pela forma como Marcus contou para ela, foi Dante quem tinha feito aquele estrago inteiro chutando.

    A força do homem era realmente fora do comum. Quando ouviu o relatório de Marcus sozinha, Clara achou que, em partes, ele exagerava. Queria entender como um homem como aquele que utilizava uma camisa vermelha e botas velhas podia bater contra um Felroz e um Polvo ao mesmo tempo dentro de um tanque de água verde. Na verdade, nem fazendo força, dava para compreender.

    E assim que a bateria foi posta ali em cima, Dante tinha ficado algumas horas ao lado dela enquanto Clara pedia para os moradores das outras ilhas de prédios se afastassem. Ela iria tentar entender como aquela bateria poderia funcionar, mas Dante a avisou.

    — Preciso pegar os painéis ainda.

    E desde então, ele não tinha retornado.

    I

    Corpo ainda não estruturado para receber peso. Se cuidar é essencial. Dano infligido em 67%”.

    Dante sentava em um parapeito no teto do Reservatório. A noite tinha as mais belas estrelas pulsando, e o vento sacudia com leveza seu cabelo. Não queria levantar ou fazer esforço. Ele se colocou para trás e deitou no chão frio.

    Um momento de descanso era necessário. Até gostaria de ficar juntos dos outros, comer em companhia ou ouvir agradecimentos. Mas, o tempo não estava propício pra isso.

    Seu corpo ainda doía, como quando chegou ali na cidade de Kappz. A vitória carregava o cansaço e a dor. E ter enfrentado uma criatura daquelas realmente lhe deixou bem

    Via a placa que deveria levar bem atrás dele, já tirada do suporte. Assim que retornasse, tentaria conversar com Clara sobre o que aconteceu. Ter deixado Marcus se ferir, demorar tanto para cumprir o que prometeu. Dante fechou os olhos por um segundo, e acalmou a mente de todos os pesadelos de que a missão poderia ter dado errado.

    — Não sou nenhum protagonista. Nem quero ser.

    As palavras da sua mãe e de seu pai sempre colidiram quando lhe dava conselhos. Imagino que isso deva lhe deixar confuso, Dante. Depois que acessei a bateria, recebi um novo aspecto de base, algo que me permite entender certas circunstâncias.”

    Dante achou engraçado Vick falar tanto. Era raro.

    — Pode falar, eu gostaria de ouvir o que tem a dizer.

    Certo. Render foi um dos mais habilidosos espadachins que pude registrar, mas ele sempre corria atrás de um sonho indefinido. Quando ele pediu para que seguisse a diante, para que lutasse e voltasse para a casa vivo, também deixou registrado o orgulho que sentia. Sua mãe, no entanto, esperava que nunca se metesse em problemas, mas você ignorou o conselho dela sem pensar duas vezes na primeira chance”.

    Dante deu uma risada e concordou na hora.

    — Fiz mesmo, não foi? Eu queria tanto entender o que podia fazer que me deixei levar pela situação. Os piratas não me deram as respostas que eu queria, eram fracos. Me deram a chance de estar no mesmo esquadrão que a senhora Dalia.

    Sua maior batalha até o momento se concentrou em criaturas que outros não poderiam duelar. Acredito que o treinamento que Render lhe passou justamente era composto de situações de vida ou morte já que ele nunca lhe deixou vencer.”

    — O gosto da derrota na boca por mais de vinte anos. —Dante não saboreava a vitória com doçura. A derrota ainda viva em sua mente por tantos anos não lhe fazia tirar o pé do chão. Pelo contrário, o mantinha firme ali. —E pensar que demoraria tanto para eu ter uma vitória completa contra um Felroz.

    Mesmo que diga que lutou de maneira para proteger seu aliado, o atirador, ainda também está ciente de que exerceu mais do que deveria, e isso custa caro para o corpo. Cada limite ultrapassado lhe dá resquícios destrutivos espalhados. Fui programada para atribuir esses limites e não deixar ultrapassar.”

    O vento soprava com mais força para o norte.

    — Sei disso, Vick. Só não quero pensar que todas as vezes que eu for lutar, sempre vai ter uma prisão no meu pulso. É a sensação de derrota ainda nas minhas costas.

    Precisa retornar a treinar o corpo para aguentar a pressão da conversão, Dante. Se não o fizer, nunca chegará onde seu pai tocou os pés. Render sempre foi incrível com sua habilidade, mas teve seu limite traçado aos 20%.”

    Dante sabia que seu pai tinha tocado os 20%, mas nunca parou ali por motivos pessoais. Sempre imaginou que foi por ter tido uma família que ele deixou de treinar. Mas, nunca teve certeza disso.

    Um homem como Render priorizava demais os filhos ao invés de uma luta.

    Mas se ele, sendo forte do jeito que era, nunca se tornou um Baloeiro, que era seu sonho, então o que ele se tornou?

    Vinte anos treinando e só posso chegar aos 5% do que sou.

    O restante da conversão é levada aos músculos, pele e órgãos, danificando a medida do desgaste. Não tinha motivo para acreditar que não ultrapassaria seu pai, mas quanto tempo demoraria para chegar aos 10%?

    Anos, de novo? Não queria acreditar nisso mais. Já tinha feito tanto pra chegar até ali.

    E não teve eficiência contra o Polvo, a qual nomeou a criatura. Por ajuda de Marcus, o atirador, você foi vitorioso. Uma vitória perfeita reside no quanto pode empenhar sozinho. Render lhe ensinou isso”.

    — Mas, meu pai perdeu, não foi?

    Vick não respondeu de cara.

    — Ele perdeu para a idade. E me deixou tomando conta do seu sonho. Enquanto eu estiver vivo, vou carregar seu legado, isso é certo. Mas, não vou fazer nada enquanto não precisar. As lutas que eu travar são escolhas minhas, Vick.

    Aceitável. E o que escolherá?”

    — Vamos viver um dia de cada vez para voltarmos para casa. Nem que leve mais tempo do que eu imagino. — Abriu a cabeça e encarou para onde Marcus e Clara estavam dormindo. — Um dia de cada vez para podermos ter chance de ajudar quem realmente precisa. Um dia de cada vez para trazer fé a quem nunca teve nada. Fui abençoado pelos ensinamentos, e pela força, e por ter tido uma vida decente. Enquanto eu não souber como voltar, farei o necessário para que as pessoas que confiam em mim tenham isso.

    Vick soou meio baixo.

    As pessoas são fardos demais para um único homem carregar. Seu pai diria isso. No entanto, Dante, sabendo como cresceu, não acredito que você tenha alternativa”.

    Essas palavras foram bondosas vindo de Vick. A carga da bateria realmente fez bem para ela. Uma IA como ela era difícil de encontrar até mesmo na Capital. Ali em Kappz, Dante usaria seus recursos para auxiliar nesse meio.

    — O que acha que eu deveria fazer primeiro, Vick?

    Antes que eu comece, precisarei listar todos os segmentos de construção para que a bateria seja isolada de maneira correta. Tempo de explicação… 3 horas, vinte e seis minutos. Gostaria de ouvir?”

    — Claro que sim. — Esses planos seriam dados a Clara. Era a única pessoa que entendia da cidade e dos moradores que habitavam lá. — Pode começar…

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