Capítulo 436: Segundo Contato
A neve tingida de vermelho fedia a morte.
O chão sob os pés de Dante já não era mais branco. Era uma mistura lodosa de sangue coagulado, fragmentos de ossos e as vísceras de mais de uma centena de Felroz. Os corpos se empilhavam ao redor como se formassem uma trincheira natural. Braços arrancados, mandíbulas penduradas, colunas expostas — cada pedaço era a lembrança de uma investida brutal que ele mesmo havia iniciado.
A lâmina em sua mão estava escorregadia, os músculos do braço latejavam de tanto cortar, golpear, empurrar. Mas seus olhos não se desviavam. Não importava a quantidade que ele massacrasse, a verdadeira ameaça ainda estava à frente.
Parado no coração da zona, o Felroz Mutante o observava. Não com os olhos, pois seus olhos estavam imóveis, quase apagados. Mas sua presença… essa o perfurava como uma lança. Era uma massa escura e pulsante, como se o próprio mundo estivesse sendo corrompido ao redor dele. A neve ao seu redor estava enegrecida, estagnada. O ar ali não girava. A vida, em sua forma mais primitiva, era drenada da paisagem.
Aquela coisa não havia se mexido desde o início. Havia esperado. Observado. Calculado.
Dante parou por um momento, ofegando. O vapor quente saindo de sua boca se dispersava contra o ar congelado, e ele se perguntava, em silêncio, se o sangue escorrendo em seu rosto era dos inimigos… ou dele mesmo.
A voz soou em sua mente, fria como o aço.
“O Felroz Mutante está se preparando para enfrentá-lo, Dante.”
Ele estreitou os olhos, cuspindo no chão antes de ajustar a postura. E sorrindo abertamente.
— Ele vai precisar de mais do que só daquela cara feia pra conseguir me colocar pra correr.
Fechou os olhos por um instante e respirou fundo. Seu corpo respondeu de imediato. A Energia Cósmica, pulsante e viva, percorreu-lhe os braços, o peito, as pernas. Gotas de luz azulada brotaram de sua pele, como se a própria alma estivesse tentando escapar. O campo ao redor respondeu. Os fragmentos de neve que flutuavam no ar foram empurrados para longe, e a pressão dele agora contestava a escuridão do Felroz.
Era como se duas realidades estivessem se sobrepondo: uma de destruição fria, outra de força em erupção.
“Nick e Lilo estão prontos, Dante. O que você vai fazer?”
Ele abriu os olhos.
— Vamos em frente.
Então aconteceu.
O Felroz Mutante moveu o pé. Um único passo. O som foi seco e pesado, como uma pedra gigante sendo arrastada por correntes. O impacto reverberou através do solo, e Dante sentiu o leve tremor atingir seus pés e subir pelas pernas até a espinha. Não era ilusão. Era real. O ar ficou mais denso, e por um segundo ele teve que ajustar a respiração.
A pressão aumentou. Não era só mental. Era física.
Era uma habilidade.
Tudo ficou mais lento, mais difícil. Cada músculo parecia resistir à ordem de avançar, e ele sentia que se fizesse qualquer movimento errado, seria praticamente decretar uma sentença.
— É uma pena que não sou como aqueles humanos que enfrentou.
O corpo de Dante estava sujo de sangue, suor e poeira, mas seus olhos brilhavam com uma intensidade quase antinatural. A Energia Verde — densa, viva, pulsante — irrompeu ao redor de seus membros. A neve era enviada de volta ao tentar tocá-lo, expelido.
Num instante, aquela força percorreu cada centímetro do seu corpo. Veias saltaram sob a pele como rios sob pressão. A luz esverdeada envolveu seus ombros, braços e costas, serpenteando em movimentos precisos. Os cortes profundos que haviam rasgado sua lateral, os hematomas em seu rosto, os músculos rompidos em seus antebraços… tudo começou a se regenerar.
Era um processo quase doloroso de se assistir. A carne se costurando sozinha, puxando a pele de volta sobre os ossos, selando os ferimentos com calor e energia. As feridas se fecharam com estalos úmidos. Cicatrizes desapareceram. A rigidez dos tendões cedeu à flexibilidade de um corpo restaurado.
E então ele se endireitou.
Não como alguém que descansou, mas como quem havia se erguido de uma morte temporária — mais forte, mais preciso, mais determinado. Sua postura já não era a de um homem combatendo o limite, mas a de um predador prestes a saltar.
Cada célula respondia àquele chamado. O ar ao redor vibrava com a mesma frequência que o seu coração. Dante inspirou, profundo. O peito inflou, e a pressão que antes pesava sobre ele foi absorvida, convertida, canalizada.
Sua pele estava quente. Seus dedos tremiam com o excesso de poder tentando escapar.
Ele se lembrou das palavras de Jinx, ditas muito tempo atrás, quando ele mal sabia como treinar aquilo que carregava:
— Seu corpo foi feito para apanhar. Você, por outro lado, foi feito pra bater.
Essas palavras voltaram com um peso diferente agora.
Fechou as mãos em punhos. Os nós dos dedos rangeram como metal se torcendo.
Ali, naquele momento, não havia espaço para hesitação.
Ele caminharia até o limite. E sorria pra ele toda vez, porque era assim que foi criado.
— Vick, estou pronto.
“Confirmado. Corpo estruturado para reagir até 3% da verdadeira força. No entanto, com a habilidade generativa, enquanto sofrer danos aparentes, conseguirá equiparar o poder.”
— Oh. — Dante ficou animado. — Então, se eu usar acima do que posso, o presente do Bastado vai continuar me curando. Isso que é um presente, não acha?
“Coincidentemente, o rastro da Energia Cósmica do Bastardo ressoa em perfeita sincroniza com a sua habilidade. Está disposto a arriscar sua própria capacidade para poder chegar em algum lugar? Não recomendado.”
— E que graça teria se eu não fizesse isso? — Ele deixou a pressão sair de uma só vez.
A própria Vick ficou vislumbrada com a infinidade de dados que seus sensores captaram. A Energia Cósmica do corpo dele estava ressoando para fora, tanto a de Dante quanto a de Bastardo. Os dois bombardeavam um ao outro, sincronizando em destruir e se regenerar.
Era praticamente uma dança caótica, disputandoquem realmente deveria estar no controle.
A IA não deixou a chance escapar. Essa seria sua segunda chance para analisar verdadeiramente os dados corporais e internos de Dante. A segunda vez que poderia calcular a essência que tinha perdido de Render.
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