Capítulo 438: A Confissão da Energia (I)
Dante sentia o calor subir não da criatura à sua frente, mas do próprio espaço entre os dois. A cada segundo, algo pulsava, espremendo a atmosfera como um tambor prévio à guerra. Ele já conhecia aquela sensação. Era como quando os oponentes começavam a revelar quem realmente eram. E o Felroz, enfim, começava a mostrar.
O corpo da criatura começou a expandir.
Não apenas inchar, mas crescer com método. A musculatura se redesenhava em tempo real. As fibras se torciam, engrossando como cordas de aço vivas. O sangue que escorria antes da explosão agora evaporava em pequenos vapores azuis, substituído por um brilho interno, como se tivesse magma correndo sob a pele. Os ombros estalaram, os braços ficaram largos demais para a simetria anterior e, então, os chifres começaram a crescer.
Saíram rasgando a própria cabeça como lanças curvas.
Primeiro um, depois o outro.
Longos. Negros. Cobertos de runas vermelhas que tremeluziam com energia primitiva. Como antenas para algo além deste plano.
Dante sorriu.
— O que você está aprontando agora, hein? — murmurou, flexionando os dedos.
O Felroz rugiu, e as asas dispararam um impulso. O monstro foi o primeiro a se lançar, e Dante respondeu no mesmo instante, subindo para o ar como uma flecha viva, o corpo carregado de impulso cinético. Os dois se chocaram a dezenas de metros do chão.
Um baque. O som de pedras rachando. Punho contra punho.
O céu se tornou campo de batalha.
Dante desferia socos com força concentrada, calculada a cada curva do corpo. Cada golpe era lançado para quebrar alguma coisa nele — articulações, equilíbrio, a intenção do outro. Mas o Felroz respondia com a mesma fúria, só que com um peso maior agora, só que dessa vez,ele não estava ficando pra trás.
Estavam acima das correntes normais do vento. Onde tudo era mais rarefeito… e mais brutal.
O Felroz girou no ar e acertou o ombro de Dante com uma das pernas alongadas. O impacto fez seu braço vibrar. Dante rosnou, usando o cotovelo oposto para golpear a costela da criatura. Outra sequência. Outra colisão. Os golpes eram rápidos demais para que olhos comuns vissem.
Num curto recuo dos dois, a voz. Vick. Direta na mente, com a clareza metálica, porém, com certa… preocupação.
Podia ser só impressão. Dante não tinha certeza.
“A Energia dele está aumentando rápido demais. Isso não é um pico… é um novo estado.”
Dante girou no ar, desviando de um soco que cortou o espaço onde sua cabeça estava.
— Eu percebi, Vick. Ele tá se segurando menos agora.
“Não é só isso. As leituras indicam que essa forma está queimando camadas superiores da estrutura energética. Força bruta demais. Você não vai acompanhar.”
— A solução vai ser, então, bater mais nele? — rosnou ele, chutando o joelho do monstro, que sequer se moveu com o impacto.
“Ainda coletando dados. Mas, Dante… se continuar tentando bater de frente com ele assim, você vai perder.”
Dante se afastou com uma pirueta no ar, girando duas vezes no vazio até recuperar equilíbrio. Abaixo deles, as montanhas estavam longe agora, como um palco esquecido. O mundo parecia menor.
E o Felroz o encarava de cima, os chifres vibrando com uma nova tonalidade. O sangue do monstro se tornava mais escuro. Mais espesso. Mais antigo.
Dante cerrou os punhos. Um filete de sangue escorreu de seu lábio. E sentiu um estranho formigamento nos seus punhos.
— Perder, hein? Já estou acostumado com isso, mas dessa vez, eu não quero nem pensar nisso. — Ele afastou os dois braços, soltando o ar. — Vick, pode fazer o ajuste. Tire todas as funções neurais, me deixe sozinho dessa vez.
“Está fora de sua lucidez? Um Felroz Mutante irá se regenerar mais rápido do que você é capaz de acertá-lo sem minha ajuda. Sem os sensores… ficará exposto.”
— Eu vou achar o caminho. Aguarde meu pedido. — A Energia Cósmica rotacionando em seu peito se tornou lenta, praticamente como um riacho lento, sem ondulações. — Ele é um monstro, como todos os outros que enfrentei, mas eu não sou o mesmo que enfrentou todos eles, lembra? Estou cansado de toda vez ficar desacordado, de depender de alguém pra me salvar. Até hoje, até agora, a única coisa que fiz foi ter medo de mim mesmo, de ter medo do que eu poderia fazer. Mas, o fragmento da Energia Cósmica no Mundo Espelhado estava certo.
Você vai ser testado, de novo e de novo.
“Não cometa o mesmo erro de seu pai, Dante.” — Vick fez uma pausa. “Ele desacreditava em algo além do poder.”
Dante ainda fitava aquele monstro rejuvenescendo e se melhorando, com camadas mais grossas de pele, se fortificando para lutar de verdade. Essa era a chance dele de testar seu limite, logo, Dante precisava ir até o fim.
O Lagmorato era um campo de batalha.
— Esse lugar não pode ter dois reis — gritou para o Felroz, ainda rindo. — Você quer lutar até a morte, não é? Ótimo.
Respirou fundo e deixou o peso deslizar para o ar. E a Energia Cósmica revolveu seus ferimentos mais uma vez. Podia odiar o Bastardo com todas as suas forças, mas sua habilidade era fundamental para lutas.
Em poucos segundos, já estava reconstruído em perfeito estado.
— Meus inimigos não costumam durar muito — disse ajeitando o pulso. — Acredito que os seus também. É um pouco irritante quando somos fortes demais, não acha? A adrenalina sobe a cabeça, nós queremos nos matar mais rápido. Eu sempre pensei nisso.
Dante o fitou. O Felroz parecia entender, só parecia.
— Sempre pensei que morreria lutando dando tudo de mim. Acho que podemos ajudar um ao outro hoje. Meu pai dizia que o limite que eu precisava manter deveria ser abaixo, e minha IA continua forçando que eu tenho que me preservar. Mas, Humanos são fracos por natureza, não temos a força que vocês tem desde sempre. Só temos as habilidades, e nos jogamos para limpar esse mundo que foi criado para o mais forte. Não podemos usar a cabeça contra vocês, não podemos usar a inteligência porque não é necessária. Vocês matam e nós também fazemos isso. — Ele mostrou um sorriso de canto, um pouco debochado. — Só que vocês não tem razão pra isso. Sempre precisei ter.
Dentro da mente de Dante, Vick apenas escutava. Ele não fazia ideia do que estava pra acontecer, mas a razão de Dante estar esperando tanto tempo para atacar indicava que ele tinha um plano em mente.
Talvez… um ataque furtivo. Algo que pegasse o monstro desprevenido.
— Volte pra casa vivo. — Dante balançou a cabeça. — Eu queria poder ouvir ela de novo falando isso. Seria bom. Naquele dia, quando cai no Abismo, eu vi que tinha mais coisas do que eu um dia pensei ou imaginei serem capazes de me matar. Hoje, parece que deixei aquilo de lado. Vou ser justo, monstro… — Dante levantou a cabeça, sorrindo brevemente. — Toda raiva que acumulei nesses últimos meses, vou te fazer pagar por ela. Não me leve a mal. Não é pessoal.
A Energia Cósmica rapidamente explodiu em seu corpo. A onda roxa tomou o verde, conflitando e engolindo o verde na mesma hora, implodindo tudo para dentro de seu corpo de uma só vez. E a voz de alerta de Vick soou na mesma velocidade que Dante voltava a sorrir com ganância.
“Alerta de Conversão Cinética… Dante, você está prestes a utilizar cerca de… 45%…”
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