Índice de Capítulo

    — Luma – o tom de Clara era preocupado —, o que quer dizer com isso? Como a situação pode ser tão ruim? O que houve?

    — Clarinha, não é que vocês fizeram errado, é longe disso. O que estou dizendo é que todas as ações têm uma consequência. E o que vocês fizeram foi abrir um leque de possibilidades para muitos outros grupos irem atrás do Reservatório.

    — Sim, percebi movimentação – disse Marcus. – Entraram e pegaram várias coisas na semana passada.

    Luma deu um sorriso para Marcus.

    — Sempre tão observador. – Ela levou a xícara à boca e arfou em prazer. – Eu adoro esse clima. Estamos chegando perto do inverno, e os ventos ficam mais frios. Também é no inverno que a temperatura fica muito baixa, a temporada de caça fica menor, e as fazendas não produzem nadinha. É compreensível que todas as pessoas estejam tentando fazer o máximo para estocar recursos, e o Reservatório ficou muito visado ultimamente. Vocês não foram para lá, lembram?

    — Foi uma escolha pessoal, Luma – respondeu Clara. Ela não escondia o rosto infeliz pelos comentários. – Mesmo que levássemos todos pra lá, ia demorar meses para organizarmos tudo. Construir sem recursos é demorado, mas as pessoas irem até lá não é um problema nosso. A cidade não é minha para ordenar quem deve ou não entrar lá.

    Luma esticou o dedo pra ela na hora, balançando a cabeça.

    — Exato. É isso que está acontecendo. Por alguma razão, todo mundo ficou com essa mesma mentalidade. É como enxergar o grupo se desfazendo. Soube do Antton? Ele veio atrás do Clind e dos irmãos Jones. Ele quer a bateria que pegaram a qualquer custo, mas Clind respondeu na hora que não faria nada para atrapalhar seus planos, Clarinha. Ele gosta de você, sabe disso.

    Clara não disse nada. A cara dela nem mesmo mudou. Ela sabia.

    Dante esperava que Marcus a defendesse de algo, mas ele se manteve quieto. Os dois ficaram.

    — Pode me explicar o motivo desse problema inteiro?

    — Ah, claro. – Luma se remexeu na cadeira e fez uma certa pose para começar a falar. – Então, antes do Reservatório ser limpo. Kappz era bem dividida. Tem grupos de coletas, tem grupos de mineradores que tentam achar um jeito de voltar a forjar. Clind fica com a couraça e roupas. O idiota do Antton está na caça. E Clara que fica organizando esse lado da cidade, mas antes, ela não tinha nenhum tipo de função.

    — Eles me inseriram nas reuniões por pressão da Simone – explicou Clara. – Ela sempre disse que eu deveria ficar atenta porque muita gente contava comigo, e eu podia ajudar fazendo algumas expedições com Marcus. Limpar uma parte da cidade, achar algum objeto perdido. Mas, nunca foi minha intenção.

    — Claro que não. – Luma negou com dedos, balançando nervosamente. – Mas, assim que fez aquele lugar parar de ter uma aura tão negativa, os Irmãos Jones viram que existe a possibilidade deles limparem a Prisão de Sharm. Acredita nisso?

    Marcus tossiu ao ouvir. Teve que levar a mão na boca, tossindo mais forte.

    — Sharm? – Quase engasgou ao dizer. – Aquele lugar é um ninho infestado de criaturas estranhas.

    — Sim, isso é verdade. – Luma fez bico. – Mas, ele acha que se tiver a bateria de vocês, podem forjar armas melhores. E ele carrega aquela mensagem que diz que dentro de Sharm tem uma mina de comida. Eles estocaram antes de tudo ser carregado pela energia negativa dos Felroz.

    Dante não sabia se ela falava de ‘energia negativa’ de propósito ou forçando. Era um pouco estranho ouvir que as criaturas que podiam rasgar um humano em segundos tivesse uma característica tão genérica.

    — Os dois Jones disseram que iriam procurar por vocês na semana que vem, e eles querem… ele. – Seu dedo esticado apontava para Dante. – Os dois disseram que Dante era quem deveria estar a frente porque enfrentou e ganhou contra o que estava lá no Reservatório, no tanque.

    Marcus, então, torceu a sobrancelha e fez uma cara curiosa.

    — Como eles sabiam o que tinham lá embaixo? Não tinha sinal de que outra pessoa tinha chegado lá.

    — Eu não sei, meu querido Marcus. – Luma encolheu a cabeça entre os ombros, se fazendo de desentendida. – Mas, os dois sabiam e me contaram. O que estou dizendo é que eles vão querer a bateria e também vão querer Dante. E Antton ficou muito irritado porque ele queria a bateria para outra coisa. Só não sei o que é. Não me contaram.

    Se enfiar dentro de um ninho de Felroz novamente não era a melhor ideia. Na verdade, era a pior de todas. Ele tinha visto que sem preparo, sem um bom plano, a situação poderia sair do seu controle. Se cada pessoa entrasse nesse lugar e morresse, ele carregaria a culpa pra toda vida.

    Como desconhecidos poderiam confiar em sua força apenas ouvindo sobre um boato?

    A confiança deles era tão cega assim?

    — A ideia é péssima. – Clara quem respondeu, com seriedade. – Jones pode achar que conhece Sharm, mas nunca foi mais do que dois andares para baixo. A prisão é subterrânea, completamente abaixo do chão. Se a saída é tapada, todo mundo fica preso. Foi o que aconteceu da última vez, tem que lembrar aqueles dois que foi essa mesma missão que matou a irmã deles.

    Luma recuou o rosto, sentindo a pressão. Marcus também encarou Clara, um pouco surpreso pela expressão usada por ela. Dante gostava de quando ela falava com firmeza, dando sua posição sobre o assunto.

    Estava ali por ela, então era normal que apoiasse suas decisões.

    — A bateria não é um recurso para que se matem – Clara continuou. – Ela foi feita para trazer paz para pessoas que nunca se sentiram seguras no meio da escuridão. A luz é para clarear um pouco o que as pessoas perderam, não vou dar nem ela e nem Dante para esses dois.

    Luma aceitou a resposta dela, sorrindo.

    — Eu entendo, Clarinha. O senhor Dante é um homem na mesma faixa etária que você, não é? Tem gostos comuns de querer ajudar os demais, e também fica sempre juntos. É normal que não queira arriscar alguém que preza tanto…

    — Não é nada disso – Clara falou rapidamente. – De onde tirou essas coisas? Dante é um amigo leal e confiável. Nos ajuda mais do que eu poderia agradecer.

    Dante ficou um pouco envergonhado. Realmente, vendo do jeito que Luma dizia, Clara tinha uma certa estima por ele. Mas, duvidava que fosse além disso. Ele não morava ali realmente, vinha de uma parte do mundo tão afastada que ninguém conhecia, e queria voltar logo.

    Se envolver com uma pessoa como ele seria maluquice, e Dante concordou.

    Mas… por que pensava na possibilidade?

    — Claro, eu sei que ele é seu amigo. – Luma abanou as duas mãos. – Olha, eu sei que vocês são amigos. Mas, os Jones vão querer ir atrás de vocês. Estejam prontos, está bem? E se puderem, gostaria de conversar sobre trazer energia para cá, se tiverem mais daqueles cabos. Nossos campos de arroz e milho seriam muito bem irrigados com energia elétrica, hein.

    Clara tinha negado mais de duas vezes e Luma continuava pedindo por energia. A reunião se encerrou cerca de vinte minutos depois. Clara se levantou e se despediu. Dante apenas acenou. Foi Marcus quem cortejou Luma de todos os jeitos possíveis, e ela gostava daquilo, rindo pra ele e sussurrando.

    Até o jeito do atirador parecia mais relaxado. Ele gostava dela, certa.

    — Ele está nesse jogo com Luma faz anos – disse Clara, dando uma risadinha. – Já disse para ele vir pra cá, mas se recusa.

    — Não duvido de que quando ele some, é pra cá que vem. Entendi porque pediu para eu me arrumar todo.

    Clara deu uma risada e concordou. Ela segurou o vestido branco que usava, longo, com poucos decorativos.

    — Ele pede para eu vir de branco para não tirar a beleza do verde e do amarelo, acredita?

    — Acredito, mas você parece exatamente igual aquela rosa no jardim. Mesmo com todas as cores vibrando em volta, nenhuma delas tirava sua beleza.

    Clara se virou para ele, mas Dante já tinha dado as costas e começado a retornar pela rua. Ela ficou de boca aberta alguns segundos, e depois exprimiu um sorriso tímido, passando o cabelo para trás da orelha.

    Dante, no entanto, tinha prendido a respiração, quase vermelho de tanta vergonha de ter dito aquelas palavras. Poderia infartar ali mesmo. Seria o melhor do que encarar Clara de novo.

    Níveis de tensão muscular: extremo. Solicito que respire, Dante. Não vai morrer por isso.”

    Maldita Vick… Dante respirou como ordenado e se manteve na frente o caminho todo de volta para as ilhas de prédios.

    Apoie-me

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (1 votos)

    Nota