Capítulo 466: Luz
— Eu achei que tinha te perdido… — a voz de Dante quebrou quando ele a puxou para si, incapaz de resistir. O abraço foi apertado, desesperado, forte o suficiente para fazer a cama ranger sob o peso dos dois. Uma das pernas dele bambeou e, sem equilíbrio, caiu meio de lado sobre o colchão, quase derrubando os dois. — Eu pensei… que você tinha… me deixado de vez.
Clara soltou um riso trêmulo em meio às lágrimas que insistiam em encher seus olhos. Agarrou-o pelo pescoço, puxando-o ainda mais para perto, como se fosse possível fundir os dois em um só corpo. Seu rosto se esfregou contra o peito dele, sentindo o calor, o cheiro, a realidade que confirmava que não era mais um sonho.
— Por que está falando as minhas frases? — ela devolveu, engasgada pela emoção. — Merda, Dante… por que você sempre faz entradas triunfais? Não tinha como simplesmente voltar andando, como qualquer pessoa normal?
Ele se afastou um pouco só para olhar o rosto dela, e riu baixinho, riso cansado, mas cheio de vida.
— Se eu fizesse isso… não seria eu.
As mãos dela subiram devagar, primeiro segurando seu queixo, depois percorrendo suas bochechas com a ponta dos dedos, como se quisesse decorar cada traço, cada cicatriz, cada detalhe que confirmava: era realmente ele. Os olhos dela brilhavam como nunca, refletindo tanto alívio quanto amor.
Dante, por sua vez, deixou-se ser tocado, sem recuar, sem defesas. Sentia o coração apertar ao reconhecer que, por trás de toda aquela força que sempre fingira ter, existiam fissuras que Clara, apenas sorrindo, já tinha preenchido desde o início.
— Finalmente, você voltou… — ela sussurrou, mas logo sua expressão mudou.
Com energia surpreendente para alguém que tinha acabado de acordar de um sono tão longo, Clara se levantou da cama num salto e, ficando de pé diante dele, apontou o dedo diretamente em seu rosto. Seus olhos, vivos como faíscas, ardiam de determinação.
— Eu quero saber o que aconteceu naquele dia, entendeu? — disse firme, sem tremer a voz. — Não ouse deixar passar nenhum detalhe. Quero ouvir sobre cada dia que passou, cada inimigo que enfrentou, cada lugar em que esteve. — A intensidade de seus olhos fez Dante prender o fôlego. — Fale, para eu decidir se vou te perdoar ou não.
Ele piscou algumas vezes, surpreso, e depois soltou uma gargalhada curta, rouca, como se não acreditasse na audácia dela. Levantou o dedo na direção dela, num gesto espelhado.
— Ei, calma aí! Eu quem enfrentei um mundo inteiro lá fora, quase morri umas dez vezes, e você vai me tratar desse jeito? — o sorriso dele se abriu num deboche cruel, mas cheio de carinho. — E os pedidos de casamento que você recebeu enquanto eu não estava, hein, mocinha? Vai me contar ou prefere que eu descubra sozinho?
A tensão se desfez por um instante. Entre lágrimas, riso e um coração que parecia bater descompassado, Clara percebeu: Dante não tinha mudado. Continuava sendo aquele homem impossível, irritante, mas que carregava o peso do mundo só para que ela pudesse sorrir de novo.
E por mais que o mundo inteiro fosse estranhamento cruel com eles, aquele homem fazia tudo aquilo parecer absolutamente… nada.
— Quero um acordo, então – disse ela. – Me conte as histórias, e eu te conto as minhas. Digamos que… — ela mexeu no cabelo, fingindo. – Eu tenha mais pretendes do que eu gostaria, mas que neguei todos eles por capricho do destino.
— Ah, um bando de velhos safados vieram aqui para pedir sua mão sem que eu estivesse presente? – Dante fechou a mão, batendo na outra palma. – Quero nomes e posição. Farei uma visita a eles agora mesmo.
Clara não se conteve e soltou uma gargalhada, clara e cheia de vida. Dante riu junto, deixando o quarto se encher com aquele som que parecia dissipar a tensão acumulada. Estavam prestes a mergulhar em suas histórias, trocando provocações e segredos, quando a porta se abriu abruptamente.
Marcus entrou com a pistola em punho, o olhar frio varrendo o quarto como se estivesse pronto para enfrentar qualquer coisa. Mas, ao ver os dois sentados, frente a frente, em plena intimidade, seus olhos endureceram ainda mais. Respirou fundo, a garganta se fechando, e lentamente devolveu a arma ao coldre.
— Peço desculpas por atrapalhar… não era minha intenção — murmurou, desviando os olhos, incapaz de encarar diretamente. — Ouvi a voz de Clara e… pensei que pudesse acontecer algo ruim.
— Marcus… — Clara chamou suavemente, a voz carregada de carinho. — Não vá embora. Eu acabei de acordar. Fica, por favor.
Ele a olhou, mas logo fixou os olhos em Dante, hesitante, buscando uma permissão que não ousava pedir abertamente.
— Fico, senhor?
— Senhor? — Dante arregalou um pouco os olhos, surpreso, antes de virar o rosto em direção a Clara. — Desde quando ele me trata com tanto respeito?
— Você salvou todos nós muitas vezes. É natural que ele sinta um pouco de respeito. — Clara sorriu, tentando quebrar a rigidez da situação, e apontou para a poltrona do outro lado. — Além disso, você ia começar a contar suas histórias lá de fora agora. Marcus, quer escutar?
A mudança em Marcus foi instantânea. A postura fechada e tensa relaxou de imediato. Sem hesitar, atravessou o quarto em passos decididos e sentou-se na poltrona, ansioso como um garoto diante de uma fogueira de acampamento.
— Ah, claro que quero. — a voz dele se firmou, mas não escondeu a curiosidade genuína. — E pode começar falando daquela criatura no Farol. O que aconteceu lá?
Dante abriu a boca para responder, mas antes que qualquer palavra escapasse, a porta rangeu de novo.
Ali, parada na soleira, estava Juno. As mãos dela estavam escondidas atrás das costas, os olhos marejados, as bochechas queimando de vergonha. Havia tristeza em cada detalhe, e o esforço visível em manter-se ereta, digna, sem desmoronar ali mesmo. Quando abaixou a cabeça, parecia lutar contra a própria vontade de chorar.
— Permissão… para… entrar — disse em voz baixa, embargada.
Ninguém respondeu de imediato. O silêncio se estendeu por segundos pesados, até que ela sentiu um movimento próximo demais. Antes que pudesse reagir, algo a envolveu gentilmente.
Juno ficou imóvel, o coração acelerado, respirando fundo. O cheiro, o calor, a firmeza… tudo a envolveu de forma arrebatadora.
— Achei que você não viria me ver — a voz de Dante soou baixa. Nenhum dos dois conseguia segurar as emoções. – Claro que pode entrar, garota. Vem, vamos conversar também.
— E a gente?
Eles encararam o lado de fora. Magrot, Arsena, Leonardo, Heian, Gerhman. Simone e Clerk. Meliah e Degol. O próprio Rupestre havia respeitado o despertar de Clara. Todos estavam presentes para escutar a história, esperando o retorno de Clara.
Mas, Dante nunca imaginou que vê-los todos juntos, depois de ter chegado ao final do que parecia ter sido sua vida de batalhas, traria a sua alma a calma e paciência para entender.
A vida é mais do que só batalhar.
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