O ar explodiu a primeira linha dos Felroz que avançavam. Rasgados pela pressão esmagadora, todo o gramado foi balançado por uma ventania descomunal. Tommas teve que se equilibrar e jogar o braço na frente do rosto pelo balançar violento, alguns cadetes até mesmo caíram sentados.

    A pressão do soco do velhote foi suficiente para quebrar a primeira camada de inimigos, deixando-os estáticos por um segundo. Os Felroz pararam, como se não tivessem entendido o que tinha os acertado.

    O velho tinha muita força, Tommas ficou perplexo mais uma vez. Antes, ele tinha certeza de que o ápice do ataque foi aquele conjunto de golpes, mas agora, essa certeza tinha caído por terra. Quantos soldados, guardas ou soldados Tommas assistiu? Ele não tinha certeza. Agora, se a força ou habilidade poderia fazer esse tipo de mudança no clima? Duvida.

    Ele era um guerreiro. Dante era um guerreiro.

    E se provou mais ainda quando sua gargalhada ficou maior e ele saltou na direção dos Felroz sem medo de se machucar. Ele não para por nada.

    O giro, o bloqueio rápido de vários braços em posições diferentes. Os giros que ele fazia no chão, os saltos rodando escapando de ataques que perfurariam seu peito. Viu o velhote agarrar o braço de um dos Felroz, e usar um jato no pé para girar a criatura e lançar para cima. Quando Dante voltou ao solo, outro tremor cresceu. O cenário do teste foi balançado.

    Mais uma vez, os cadetes caíram sentados, assistindo um velho batendo nos Felroz. Dentro da Capital, eles conheciam pouco os que chegavam de fora. Isso porque a rotina dos trabalhadores era sempre a mesma. Alguns até mesmo poderiam treinar para se tornar mais forte, receber um controle maior das suas habilidades, no entanto, batalhar daquela forma apenas para as melhores famílias.

    Não era nobres, eram filhos de Comandantes, Generais ou Coronéis. Eles poderiam ter essa capacidade. Mas aquele cara? Era impossível.

    Tommas tinha certeza de que ele não tinha visto esse velhote antes. Se houvesse alguém que lutasse daquela forma entre as linhas de frente, então seria certamente colocado nos Campos do Lagmoratos.

    Ele nem precisava fazer nada, o velho tomava conta do serviço sozinho. O que para ser um teste estava sendo um campo de treino para ele. E isso o assustava.

    Também assustava Dalila que observava do lado de fora.

    Os Oficiais ao seu lado ficaram mais quietos. Chegaram as cadeiras para frente, e assistiam um velho simplesmente entrar em combate. Freto mexia os ombros, parecendo ter um espasmo assistindo os golpes e Crish tinha os dois punhos fechados em cima da perna, batendo com leveza, apoiando o velho.

    Dalia não queria fazer nenhum comentário maldoso sobre o que assistia. No entanto, quando foi que ela viu alguém lutando daquela maneira no campo de teste? O intuito de estarem ali era para serem testados. Suas mentes e corpos colocados a prova enquanto seu inimigo atraía o medo para fora, moldando e revelando que o campo de batalha era um luga cruel e mortal.

    Ele está sorrindo, ela notou muito antes de tudo se desenrolar. Alguém que simplesmente sorria quando aquelas malditas criaturas giravam os braços buscando sua cabeça. Ela negou para si na hora, aquilo estava completamente errado.

    — O que a senhora está pensando, senhora? — Tecno a encarava com a cabeça recostada na cadeira, a fitando por algum tempo.

    Os demais viraram para ouvi-la.

    — Isso não está certo — respondeu com seriedade. — Felroz não deveriam ser nocauteados por apenas uma pessoa. Ele está demonstrando mais do que os cadetes são capazes. Tenho quase certeza de que a habilidade dele está sendo controlada de maneira quase perfeita. Podem ver pelo braço dele, alterna os golpes sabendo exatamente o que vai fazer, e ele recebe muitos ataques ao mesmo tempo. Mesmo um corpo jovem não seria capaz de reagir contra os Felroz se não tivessem visto ele antes.

    — Acha que aquele homem já esteve em batalha alguma vez?

    Dalia não soube responder sinceramente. Dante sorria, dançava, batia e recuava. Os seus inimigos chegavam de todos os cantos, mas ele não se alterava. Não importava quantos eram, não importava de qual ângulo ou qual velocidade, o ataque não encontrava seu alvo.

    Ele era rápido, muito mais do que mostrou ser contra os Piratas.

    — Tecno, vá até Marques agora e mande ele encerrar essa seção. Diga que houve um problema de identidade e que vou averiguar.

    Os outros dois Oficias ficaram chocados e se colocaram de pé. Tecno foi o único que manteve a conduta, se levantou com leveza e fez uma leve reverência.

    — Como ordenar, senhora.

    Assim que ele saiu pela porta do quarto, Dalia cruzou os braços novamente e apertou a própria pele.

    — Mesmo que seja apenas uma coincidência, ele tem a capacidade física de um Sargento. Deve ter aprimorado seus meios para ganhar resistência, e se aliando com a força que tem nos braços, ele ataca como uma máquina. — Ela percebeu que fez o comentário alto demais, mas continuou. — Se o Alto Escalão da Capital ver qualquer ato de Dante, eles vão entender que existe alguém capaz de ganhar em força contra essas criaturas. O Projeto Corrompido voltaria a ser testado.

    Agora, os dois engoliram em seco. Voltaram a assistir Dante com pesar. O velho bloqueava os ataques com a palma aberta, ganhando terreno e empurrando um dos Felroz com explosões de ar em locais pensados, o quebrando pouco a pouco.

    — Não podemos que algo assim aconteça — continuou Dalia. Não queria que aquele homem que mal começou sua carreira militar perdesse a vida. — Quero que ambos vão até Tecno. Diga que mandei apagar todas as gravações do que estão vendo agora. E não mandem para ninguém.

    — Acha que vão aceitar um Campo de Teste ser apagado assim do nada, senhora? — Freto já estava de pé.

    — Não. Vou dar meu jeito. Agora, vão. Rápido.

    Ambos saíram da sala juntos, em passos rápidos. Dalia puxou uma cadeira e sentou-se, cruzando as pernas e colocando o rosto na palma da mão, apoiando o cotovelo na coxa. Dante, um senhor, achado em um vilarejo no meio do nada. Que achado intrigante.

    I

    O campo de batalha era divertido. Dante recuava e avançava como aprendeu durante os anos. Defletiu um golpe para o lado e usou o cotovelo para acertar o rosto sem olhos da criatura. Ela soltou um berro doloroso, e o velho uma gargalhada.

    — Parecem bem quietinhos agora, hein?

    Ele socou mais uma vez, forçando o braço, e seu inimigo voou para longe, rolando e não conseguindo se levantar direito.

    Dante abaixou rapidamente e um braço rasgou o ar, onde sua cabeça estava. O velho tocou o chão e fez uma rotação inteira erguendo o pé. O peito acertado ondulou com o choque, e mais uma saiu voando. Houve uma queda de alguns Felroz por conta dele.

    Não era tão difícil, Dante sentia quando viu mais uma chuvarada de golpes veio por cima. Ele se posicionou como se estivesse em casa. Os Bambus erguidos, descendo para acertá-lo. E um deslize completo entre os mais de dez golpes que perfuravam o solo.

    Com um pequeno reflexo, ele agarrou o braço do último, puxou e colidiu as costas de seu punho. Rachaduras se formaram pelo impacto.

    — Está muito lento.

    Dante avistou a figura de seu pai caminhando entre os Felroz. Parecia vivo, presente. E segurava sua espada de madeira. O rosto duro, a postura perfeita. Até mesmo o encarar sereno. Como?

    — Sua perna não está no lugar correto. Acabou de sair de casa e já está deixando os meus ensinamentos de lado? — A espada entrou em riste. A Energia Cósmica do velho se elevou. Dante engoliu em seco.

    Seu pai lutaria sério.

    — Defenda, moleque.

    Dante piscou e o ataque surgiu no seu peito. Suas mãos reagiram e pressionaram a ponta do braço do Felroz. A criatura o empurrou contra o chão, fazendo seu pé quebrar a grama, aparecendo a terra por baixo.

    O ataque foi empurrando ele até outra criatura desceu o braço. Ele jogou o que segurava para o lado, e pulou para fora do raio. Suspirou fundo ao ver que o chão tinha ficado com um rombo. Dante procurou seu pai novamente, mas ele não estava mais lá.

    — O que foi aquilo?

    Níveis de concentração altos demais. Taxa de conversão em 5%”.

    Dante levantou e ergueu as duas mãos. Os Felroz travaram antes de conseguir alcançá-lo. Os dedos tremulavam liberando ondas de ar consecutivas. E num tapa seco, uma onda mais forte os jogou para longe.

    Teve que respirar fundo. Foi uma alucinação. Nunca que seu pai estaria presente, nem que o faria treinar no meio de criaturas. Ele estava ali apenas um dia, não era para estar com tanta saudade de casa. Estava com medo? Seu coração batia rápido e forte.

    — Merda. Está tudo bem. Se acalme.

    Era só retomar a estaca zero. Ficar de pé, mudar seu ritmo, e alterar entre os estilos que aprendeu em casa. Era isso que sua mente estava pregando mostrando seu pai ali? Usar os estilos de luta primeiro do que a habilidade?

    Esperou mais uma pouco os Felroz se levantarem, mas não o fizeram. Seus corpos, esticados no chão, nem mesmo deram sinais de vida. Dante chegou perto de um e o chutou com um pouco de força.

    — Ei, acorda.

    O bicho nem se mexeu.

    — Será que matei ele sem querer? Não. A taxa estava baixa demais. Se eu usasse qualquer ataque mais forte, poderia arrastar um pouco do chão. — Fez questão de abrir e fechar a mão. — Vick também não me falou que eu ultrapassei os 10%.

    Ele viu Tommas em um estado de choque. O garoto nem tinha mais a mesma cor de antes. Dante passou por todas as criaturas caídas, e chegou perto dele.

    — Ei, sabe o que aconteceu?

    A boca do rapaz tremia um pouco. Ele demorou a responder e Dante achou que todos estavam paralisados.

    — Você é um monstro.

    — Monstro? — Dante tocou o próprio peito. — Por quê? O que eu fiz?

    Tommas apontou para frente, mas sua voz foi cessada imediatamente pelo céu que se tornou branco. A grama abaixo dos seus pés se desfez, as árvores e arbustos também. O Campo de Teste se desfez por inteiro.

    Uma porta se abriu em uma das paredes. A Oficial Dalia entrou caminhando pesadamente. Seus passos causaram um temor nos cadetes. Eles abaixaram na mesma hora, quase ajoelhando ao ver que uma Oficial estava presente.

    Tommas xingou um palavrão baixo e se ajoelhou também.

    Ela foi até os dois e parou. Dante sentiu que estava sendo julgado, mas ergueu a mão casualmente.

    — Opa, senhora. Eu acho que exagerei um pouco, não é?

    — Bastante. Não sei de onde veio ou o que estava fazendo, mas temos que ir agora. Eu já terminei sua avaliação.

    Tommas ergueu a cabeça e viu Dalia encarando o velhote. Ela não era nada amistosa, como diziam. Os boatos de que ela nunca demonstrava emoções era real. Nunca achou, no entanto, que ela estaria presente para observá-los.

    — Achei que seria mais interessante.

    Tommas viu Dante seguir ela com uma risada e ficou ainda mais indignado. Ele realmente estava saindo do treino com a Oficial Dalia?

    — Interessante ou não, você exagerou — respondeu ela. — Muita gente procura por bons Cadetes. Quando pedi que lutasse, não era nesse sentido. Esperava que pela sua idade, fosse mais razoável.

    Dante deu de ombros.

    — Eles são inimigos. Não foi a coisa mais cruel do mundo. E também são simulações. Não esperava que pudessem reagir já que são frutos de observações do mundo real.

    — Mesmo assim, precisa tomar cuidado.

    Os dois passaram pelos Cadetes caídos, e se colocaram a sair da sala. Do lado de fora, Dante respirou o ar novamente. Nem parecia que estava ali fazia pouco tempo. Mesmo tendo lutado, ainda estava cheio de vigor.

    Freto e Crish apareceram primeiro. Os dois carregavam um cubo azulado, e entregaram.

    — Como foi? — perguntou Dalia.

    — Marques disse que custaria outro favor, senhora — respondeu Crish. — E ele não parecia muito feliz com a sua decisão.

    Dalia bufou de relance e voltou a caminhar com os três.

    — Não quero saber o que ele pensa. Precisamos sair daqui o mais rápido possível. Freto, ache Tecno. Nos encontre no Hospedeiro.

    O Oficial concordou com a cabeça e saiu novamente.

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