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    — Está com frio? — O tom provocativo de Dante para Juno deixava ainda mais divertido ambos estarem do lado de fora, afastado das Ilhas Prediais. — Hoje está sendo um dia bem tranquilo, nem está ventando tanto.

    Não era verdade. O vento parecia mais cruel do que no dia anterior, chicoteando seus rostos e fazendo os dedos de Juno formigarem de frio, mesmo com as luvas. Ela sabia, no entanto, que não adiantava reclamar. Seus treinos seriam assim até que ela estivesse preparada — e Dante não a deixaria esquecer disso. Foi assim que Render o ensinou, e agora ele replicaria o mesmo método. Cada falha, cada rachadura, cada fresta invisível em sua força e determinação seria descoberta e testada até o limite.

    — Por que estamos aqui? — Os dentes dela batiam e os braços tremiam tanto que Dante quase sentiu pena. Quase. — Como isso é treinamento?

    — Claro que é um treinamento. Esse clima é perfeito para você testar suas próprias habilidades.

    Juno se aproximou e Dante esperou que ela tirasse as luvas. Mesmo no frio, congelado, a presença dela era formidável. Não importava quanto uma pessoa treinasse para ganhar força ou aura, alguns nasciam com ela.

    Dante não foi um desses. Seu pai sempre lhe dizia que aura era algo que nenhum foram abençoados. Observando Juno, ele não podia deixar de pensar no potencial que ela carregava. Se ela tivesse a mesma capacidade de dedicação que ele teve para aprender e dominar sua habilidade, seria incrivelmente forte, talvez até mais do que ele próprio. A diferença estava em sua postura: enquanto Dante encarava o treinamento como um estilo de vida, Juno ainda parecia hesitar, como se tentasse encontrar seu lugar dentro daquele processo rigoroso.

    — Certo, certo. Quero que use sua habilidade para conjurar um raio na minha direção o mais rápido que puder.

    — Mais rápido?

    Ela nem hesitou. Ergueu a mão, tendo feito aquilo pelo menos umas dez mil vezes, e a rajada se libertou quebrando os flocos de neve, criando um som de vidro se partindo. A luz dançava no ar gelado, indo contra tudo o que representava a neve ao redor.

    Mesmo sendo um ataque direto, Dante apenas se esquivou para a lateral. Mais lento do que a espada de meu pai.

    Juno ficou um pouco abobada pela calma desconcertante dele. A ação que Dante teve, em seus olhos, foi como se seu ataque fosse tão simples que nem mesmo chegava perto de contra-atacar ou defender.

    Já tinha visto outros fazendo isso, Capitão Seleri era um que usava sua habilidade para defletir os raios, mas esquivar? Nenhum deles tinha chegado tão longe.

    — Hum, isso é interessante. — Dante tocou o queixo, claramente interessado. O vento frio e cortante sequer parecia incomodá-lo, mesmo que suas sobrancelhas estivessem brancas. — Bom, seu ataque é lento, você é lenta, e não tem uma base para atacar. Acredito que nunca tenha feito nada para colocar força no seu braço ou perna, por isso que depende dos raios. É normal acontecer. Não conheço muita gente, mas a maioria se baseia no que o seu poder tem, não do que seu corpo é capaz.

    Juno não respondeu. Dante não estava pegando pesado, não ainda. — O que vou te propor é um pique-pega. O que acha?

    — Essa… não é uma brincadeira de toque?

    Dante deu uma risada, mas não foi uma risada qualquer. Não era das brincadeiras descontraídas que ele costumava fazer. Era uma risada maldosa, quase desafiadora, como se estivesse esperando que Juno percebesse a implicação que ele estava dizendo.

    — Se eu te encostar, você precisa vir atrás de mim o mais rápido que conseguir e me tocar. Sem limite de tempo. Terminamos só quando você conseguir me tocar… ou quando o seu corpo não aguentar mais.

    A tensão entre eles cresceu instantaneamente. Juno, ainda absorvendo as palavras, sabia que não se tratava de uma simples brincadeira. O olhar de Dante, frio e calculista, indicava que ele estava testando algo mais do que suas habilidades físicas. O que parecia uma brincadeira infantil agora tinha um tom muito mais sério, mais desafiador.

    — E então, vai querer?

    — Claro que sim. — Ela fechou a mão com dificuldade. — Posso usar minha habilidade?

    — Pode fazer o que quiser, mas o toque deve ser feito de maneira específica. — Ele se aproximou e tocou a palma em seu ombro. — Dessa maneira, seus dedos precisam tocar completamente. Por isso, você pode defletir ou até mesmo contrariar os movimentos. Está pronta?

    — Sim, senhor.

    Dante abanou a mão, recuando dois passos.

    — Eu começo, você pode se preparar por dez segundos.

    Aquela era uma brincadeira que demandava velocidade, precisão e agilidade. Ela sabia que tinha a vantagem: seu corpo mais compacto lhe dava agilidade, e a conexão com os raios lhe permitia se mover de maneira imprevisível e rápida, mais do que Dante poderia esperar. Além disso, ela podia atacar de longa distância, o que lhe daria uma chance de manter Dante à distância, forçando-o a se mover de maneira defensiva.

    Isso não vai ser nada difícil, pensou consigo erguendo as mãos de forma instintiva. Os raios se libertaram pelos seus poros, a deixando ainda mais confiante.

    Esse desafio não a intimidava. Na verdade, a provocação de Dante era mais uma oportunidade para testar seus limites. Ela não esboçava arrogância, longe disso. Já tinha perdido uma vez para ele, agora entendia bem as capacidades daquele senhor.

    — Bom, lá se foram os seus dez segundos.

    A confiança de Juno sumiu quando a presença de Dante simplesmente engoliu o terreno inteiro. A pressão esmagadora que surgia ao caminhar, os braços como dois tanques de guerra, e uma imensa aura roxa que surgia ao redor quando a encarava. Era como se aquele brilho fosse a manifestação física de sua força, uma força que fazia o ambiente parecer pequeno, insignificante.

    Até os olhos dele pareciam carregados por essa energia estranha e opressora. A sensação de ser observada por algo além do humano a paralisou por um momento, e a confiança que ela tinha construído desapareceu, substituída por uma sensação de impotência.

    Ela estremeceu, quase que desistindo de se mover.

    — Juno. — Dante lançou sua mão rapidamente contra ela. A garota fechou os olhos, esperando um golpe furioso. E recebeu um tapinha no ombro. — Agora tá com você.

    Ela ficou sem acreditar quando abriu os olhos. A pressão de antes, tudo que Dante construiu de forma esmagadora, simplesmente desapareceu. Nem ao menos parecia ter algum resquício daquela aura, nem da energia, nem da força.

    No final, ele parecia apenas mais um velho dando uma risada.

    — Você quase se cagou de medo, hein — disse Dante, apontando em uma risada. — Isso mostra que ainda está longe de poder me enfrentar. Enquanto não puder demonstrar o que tem dentro da sua Energia Cósmica, não vai ganhar de mim. Agora que eu te mostrei que o seu corpo, mente e espírito são uma merda, pode começar entendendo que se não fizer nada, nada muda. Aliás, está com você. Vem me pegar, garota.

    Dante deu as costas e saiu correndo pela rua. Juno ficou sem reação. Era realmente um pique-pega?

    No meio da neve, no meio daquele vento uivante e do frio que gelava seus ossos, sua boca queria abrir um pequeno sorriso.

    — Está… bem.

    O frio que cortava sua pele não era mais nada comparado àquilo que tinha que enfrentar — e a confiança começava a voltar, mesmo que lentamente.

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