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    Antes que tudo acontecesse, a perspectiva de Marcus…

    A presença da garota parecia carregar todo o peso do momento, e Marcus, incapaz de desviar o olhar, sentia a mente tomada por um caos crescente. Cada batida do relógio parecia amplificar sua inquietação, forçando-o a ponderar:

    “Milenium, a filha do cônsul, destinada a liderar os Exploradores… Envolvida em algo assim? Como permitiram que isso acontecesse? Quem teve a audácia de colocá-la em perigo? Inadmissível!”

    Sua mente voltava ao instante em que, pela primeira vez, sentiu o impacto esmagador da presença da jovem. Não era apenas a filha do líder da Escola. Para ele, tornara-se a personificação de um ideal, algo sublime e inalcançável, mas que já o levara ao sacrifício inúmeras vezes.

    Desde o momento em que a viu, ele soube que jamais conseguiria escapar da força irresistível daquela atração.

    Estava consciente de que seus sentimentos por Milenium eram perigosos, mais do que qualquer outra missão que já havia enfrentado. Representava o que mais desejava, mas que nunca poderia ter. Sabia que sua devoção era, de certa forma, irracional, mas, ao mesmo tempo, não conseguia evitar.

    “Será que isso é fruto do treinamento?” — ele se perguntava — “Ou será que isso é apenas o que sobrou depois de todas as coisas que tentaram enterrar dentro de mim?”

    Em um mundo onde as emoções eram um risco, ele se perguntava qual era a forma dela encontrar um caminho através de seu interior quebrado.

    Tudo o que havia passado deveria ter bloqueado qualquer tipo de conexão, mas com Milenium era diferente. Via-o além da máscara. Cada vez que estava por perto, uma parte adormecida dentro dele despertava. Uma parte que o mago pensou ter perdido para sempre.

    “Por que, em meio a tanto caos, apenas ela consegue iluminar as partes mais sombrias da minha alma?”

    Marcus era um soldado treinado, mais uma ferramenta precisa desenvolvida pelo Mundo Mágico, cuja maior habilidade era desligar-se de qualquer emoção. Ele havia sido moldado para ser insensível ao mundo, frio em suas ações e metódico em cada movimento. 

    Para todos ao seu redor, era impenetrável. Exceto para Milenium. A jovem quebrava sua armadura emocional com um simples olhar.

    A realidade era dura e cruel, e ele sabia disso melhor que ninguém. Marcus fora treinado para trair, para manipular, para matar. Havia se infiltrado nas fileiras da Escola de Magia dos Ossos de Dragão, uma tarefa que lhe exigira um sacrifício emocional devastador. 

    Ele sujara as mãos com o sangue de muitos para garantir que sua missão fosse um sucesso. Espionar era sua especialidade, e não havia lugar para arrependimento em sua vida.

    Mas Milenium… Era diferente. Marcus não podia deixar que soubesse o quanto havia mergulhado na escuridão. Não suportaria vê-la encarando-o com medo. Sabia que jamais compreenderia o que fizera, o que precisara fazer para chegar até ali.

    Havia feito escolhas impensáveis: traiu aqueles que confiavam nele, desfez alianças e mentiu para todos. Justificava suas ações por serem cruciais para preservar o futuro de Milenium, mas não conseguia escapar da pergunta que o assombrava.

    “Se ela descobrir a verdade, será que ainda vou ser digno de sua confiança?”

    A imagem da jovem descobrindo seus segredos, erros e falhas era algo que tentava afastar a todo custo. No entanto, a verdade tinha uma maneira cruel de sempre encontrar o caminho de volta, não importava o quão profundamente estivesse enterrada.

    “Eu nunca deixaria que visse o lado mais sinistro de mim.” — pensava — “Ela nunca saberá a extensão da minha sujeira, das minhas falhas, dos meus atos imperdoáveis.”

    A vergonha por seus atos não era forte o bastante para suprimir seus sentimentos. Ele precisava proteger a futura líder da Escola de Exploradores Interdimensionais a qualquer custo, mas também mantê-la afastada da parte oculta de si próprio.

    Sempre que ela estava por perto, ele se via imaginando coisas que não devia: uma realidade onde não fosse apenas uma arma nas mãos dos outros, mas alguém capaz de viver e sentir de verdade.

    “Mas isso é ilusão.” — Marcus se lembrava constantemente — “Eu não tenho o direito de sonhar.” 

    Sua mente era uma tortura constante, uma luta entre a realidade fria de quem ele era e os desejos impossíveis que Milenium despertava nele.

    Ele se lembrava dos anos de treinamento, quando sua humanidade foi sistematicamente arrancada. Cada dor, cada golpe que o transformava em um instrumento perfeito. 

    Sua própria alma fora apagada, e havia aceitado essa realidade. Mas Milenium… acendera uma chama que pensara estar extinta. A presença dela trazia à tona a parte de si que julgava morta.

    “Eu sou uma arma!” — ele repetia para si mesmo, tentando se convencer — “Uma arma não sente, uma arma não ama.”

    Mas, por mais que tentasse, ele sabia que não podia extinguir o que sentia. Era a única pessoa que o fazia sentir-se vivo, a única que despertava algo nele que valia a pena lutar para proteger.

    Sua admiração por Milenium era tanto uma bênção quanto uma maldição. Sabia que nunca poderia expressar o que sentia, e ela jamais poderia ver o homem que realmente era.

    O desprezo seria inevitável se descobrisse a verdade, e ele não suportaria isso. Seus sentimentos estavam ocultos nas profundezas de sua alma, fora do alcance dela. Preferia mantê-la na ignorância, mesmo que isso o consumisse por dentro.

    De um lado, era o protetor incansável, pronto para sacrificar tudo por Milenium. Do outro, o espião frio e calculista, que eliminava vidas sem hesitar. Sua presença era uma bênção cruel: a luz que o cativava também revelava, implacável, todas as suas falhas.

    Sabia que jamais poderia ser o homem que ela merecia, mas não conseguia se afastar.

    A dor da dualidade o consumia, mas sabia que não poderia escapar. Ele a protegeria a qualquer custo, mesmo que isso significasse continuar vivendo no limbo, se afundando cada vez mais em seus próprios conflitos internos.

    Aceitaria qualquer condenação do cônsul, suportaria qualquer punição, desde que a futura líder da Escola de Exploradores Interdimensionais estivesse a salvo.

    Sentia que seu destino estava irrevogavelmente entrelaçado ao de Milenium. Não importava o que viesse, jamais permitiria sua queda. Mesmo que estivesse condenado, faria qualquer sacrifício para protegê-la.

    Para Marcus, Milenium era mais do que uma idealização. Era a única esperança de redenção em um mundo onde ele havia se tornado a própria encarnação da insensibilidade. 

    Sabia que nunca poderia escapar de quem havia se tornado, mas ao menos podia lutar por algo maior. Algo que valesse a pena proteger.

    E esse algo era Milenium, a razão pela qual ele ainda respirava.

    Enquanto sua mente travava essa batalha, Doravan levantou o braço, dando o sinal que iniciaria o fim.

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