Capítulo 17 - Artefato Mágico
“Os segredos do universo não são frutos do acaso, mas destinos escritos pelas mãos do tempo. Cada descoberta, embora envolta em surpresa, é um encontro predestinado com a verdade. Estes encontros traçam o caminho que desbloqueia o futuro.”
— Misteriosos inscritos no templo da Adaga Arcana. Sem autor identificável.
Harley, em seu último e desesperado esforço, finalmente entendeu que a queda era inevitável. O vento frio cortava seu rosto, e, enquanto o abismo o engolia, ele sentiu uma estranha sensação de aceitação.
A sensação de impotência pesava em seus ombros, mas, ao invés de ser dominado pelo desespero, um riso amargo escapou de seus lábios.
Ele sabia, sem sombra de dúvida, que faria tudo de novo. Salvar Thalassa era o que importava. Ele lutaria por ela uma vez mais, mesmo que o preço fosse sua própria vida.
O sacrifício era um preço justo, e, mesmo agora, caindo em direção ao desconhecido, Harley se sentia em paz com sua escolha. Algumas coisas têm valor imensurável, e Thalassa era uma dessas coisas. Não era apenas a única que lhe oferecia um olhar diferente no clã Dragões de Sangue e sua única amiga.
Era o símbolo de algo maior: a lealdade. Lealdade ao que ele acreditava, ao que ele decidiu proteger, mesmo que o custo fosse alto demais para qualquer um compreender.
O abismo se aprofundava, a escuridão ao redor parecia eterna, engolindo tudo à sua volta. Cada metro que caía fazia sua mente divagar, questionando o destino e o que ainda poderia enfrentar.
“Cairei interminavelmente? E se eu morrer antes de chegar ao fundo?” — pensou Harley, lutando para respirar enquanto a pressão ameaçava esmagá-lo antes que pudesse atingir qualquer tipo de solo — ou o fundo do abismo.
A morte não o assustava; ela sempre esteve à espreita nos brutais treinamentos de seu clã. Outras crianças pereceram, e muitas ainda sucumbiriam sob o peso das exigências desumanas.
Para Harley, morrer era apenas mais um erro sem retorno, uma falha fatal. Se seu destino fosse a morte agora, que viesse, mas com a garantia de que ele teria lutado sem arrependimentos. E, se isso não fosse suficiente, seria a prova de que ele não era digno de permanecer neste mundo.
De repente, algo começou a mudar na escuridão que o rodeava. No início, ele pensou que fosse uma alucinação, resultado da exaustão física, mas logo percebeu que aquilo era real.
A escuridão parecia se dissolver ao seu redor, e uma luz azul intensa apareceu ao longe, crescendo e se aproximando rapidamente. A luz se moldava, e, em poucos segundos, tomou a forma de uma adaga negra, com um brilho profundo.
Ao estender a mão para tocá-la, Harley sentiu um impacto imediato. Uma torrente de informações se abriu em sua mente. A adaga não era uma arma comum: era um artefato lendário, capaz de cortar as barreiras entre mundos, de abrir portais para realidades distantes.
Ela era a manifestação tangível do compromisso profundo que Harley tinha com seu Clã Adaga Arcana e o destino que, inevitavelmente, o aguardava.
Com a adaga em mãos, ele sentiu um renovado sentido de propósito. A queda não o derrotaria. Agora, ele tinha o poder de desafiar qualquer barreira, e estava determinado a continuar lutando, mesmo que tivesse que enfrentar a própria morte.
Conforme a queda continuava, algo extraordinário aconteceu. A adaga escapou do alcance de sua mão e começou a flutuar sozinha. Ela cortava o ar ao seu redor, abrindo fendas na escuridão, como rasgos no próprio tecido da realidade. E então surgiram aberturas para outras realidades ou mundos.
Esses portais não eram como os que ele esperava encontrar ao chegar na Névoa. Esses portais apareciam aqui, no meio da queda, longe da Névoa, como se fossem novos caminhos que ele nunca ouvira falar.
Cada portal brilhava com uma luz azulada, revelando mundos completamente diferentes. Mas o mais estranho de tudo era que, assim que um novo portal surgia, o anterior desaparecia. Era como se a adaga impusesse suas próprias regras, permitindo que apenas uma passagem estivesse aberta de cada vez.
Harley viu vislumbres de mundos impossíveis. No primeiro portal, humanos voavam pelos céus, controlando os elementos ao seu redor, travando batalhas grandiosas.
No segundo, torres metálicas perfuravam as nuvens enquanto objetos voadores transportados por pessoas atravessavam os céus com velocidade impressionante. No terceiro portal, ele avistou exércitos marchando, cavaleiros empunhando espadas em meio a uma batalha caótica.
Cada nova passagem revelava realidades mais incríveis do que a anterior, e Harley sentia sua mente se expandir diante dessas revelações.
“Algo não se encaixava. Por que esses portais estavam surgindo aqui, fora da Névoa? Tudo o que ele sabia, tudo o que havia lido nos registros, afirmava que os portais só se abririam depois do último desafio, no coração da Névoa. Então o que era aquilo? Estava diante de novos portais? Uma ilusão? Ou seria um caminho desconhecido, que ninguém jamais havia previsto?” — pensava Harley, sentindo a confusão e o mistério crescerem dentro de si.
A cada novo portal que aparecia, a Névoa parecia mais distante. Harley sentia o peso da escolha — “Devia arriscar atravessar um desses portais e abandonar seu objetivo final? Ou continuar caindo, esperando alcançar a Névoa e os portais que ela guardava?”
A confusão o consumia. O destino de sua jornada parecia mudar diante de seus olhos, e ele não sabia mais o que fazer.
A queda parecia eterna, mas, de alguma forma, a adaga em suas mãos continuava a guiá-lo, como um farol em meio à escuridão. Seus pensamentos, antes claros, agora estavam cheios de incerteza.
Harley sabia que, independentemente do que o aguardava, ele precisaria decidir rapidamente. O tempo não estava do seu lado, e o Abismo não lhe permitiria ficar indeciso para sempre.
Então, um novo portal se abriu, revelando algo completamente diferente.
Harley foi subitamente imerso em uma dimensão etérea, onde a realidade parecia perder sua substância. A clareza translúcida do ambiente ao redor o envolveu, e o ar brilhava com uma luz prateada suave, como se a própria atmosfera estivesse viva, pulsando levemente a cada segundo.
As paisagens, indistintas, flutuavam ao longe, embaçadas como memórias que se perdem no tempo, quase intangíveis. Havia algo de profundamente inquietante naquele lugar — uma sensação de que o tempo havia parado, que tudo ali estava aprisionado entre realidades, sem jamais se mover ou mudar.
À sua frente, surgiram figuras familiares. Ele as reconheceu de imediato: eram os membros de seu antigo clã, os Dragões de Sangue. Estavam parados, imóveis, como estátuas envoltas por uma névoa luminosa que pulsava suavemente ao redor de seus corpos.
Suas formas estavam nítidas, mas seus olhos… seus olhos vazios e sem vida carregavam um peso perturbador. A luz prateada que banhava o ambiente não trazia calor, nem conforto. Pelo contrário, amplificava a sensação de desolação e abandono.
Harley parou por um momento, confuso. Ele sabia que aqueles homens e mulheres estavam mortos, que haviam sido enterrados há muito tempo. Ele próprio havia lamentado suas perdas em batalhas sangrentas. Então, como estavam ali, naquele reino entre realidades? Uma onda de choque e incerteza percorreu sua espinha.
“Seria este lugar o que os sábios chamavam de mundo após a morte? Um refúgio para as almas perdidas? Ou talvez fosse algo ainda mais aterrador, um eco de existências que nem ele conseguia compreender por completo?”
As figuras não se moviam. Seus rostos eram expressões vazias, congelados em um estado eterno de apatia. O que havia acontecido com eles? A pergunta pulsava na mente de Harley. Ele se aproximou lentamente, seus passos reverberando no silêncio opressor.
Mas a distância entre eles parecia insuperável. Era como se, quanto mais ele andava, mais o espaço se estendia, mantendo-o eternamente afastado daqueles que ele reconhecia, mas não podia alcançar.
“Mas todos morreram…” — pensou Harley, sentindo o peso da verdade cair sobre ele.
“Então, que lugar é este?” — o tom de sua própria voz ecoou em sua mente, sem resposta.
As palavras reverberavam no vazio. Não havia vida ali. A dúvida começou a corroer sua confiança. Aquele mundo etéreo parecia mais uma prisão do que um refúgio, um lugar onde o tempo e a vida haviam sido consumidos, deixando apenas sombras de um passado que não mais existia.
Harley observou atentamente, e quanto mais olhava, mais a sensação de inquietude crescia dentro dele. Aqueles eram, de fato, os membros de seu clã, mas não havia mais nada neles que lembrasse as almas vibrantes e fortes que ele conhecera.
Eles estavam inertes, prisioneiros de um limbo onde o tempo havia parado, e seus olhares vazios eram um lembrete amargo de que a morte não havia trazido paz. A névoa ao redor de seus corpos pulsava lentamente, como se os mantivesse presos àquele estado de existência sem vida, sem movimento, sem propósito.
“Eles estão realmente aqui?” — Harley perguntou a si mesmo — “Ou será que este mundo é apenas uma ilusão, uma sombra distorcida do que foi perdido?”
O peso da realidade etérea começou a pressioná-lo, como se a própria dimensão estivesse tentando arrastá-lo para o silêncio eterno que envolvia seus antigos companheiros.
“Seria esse o destino final que o aguardava, se ele falhasse em sua missão? Ficar eternamente preso em uma existência vazia, observando um mundo que não mais o reconhecia?”
Harley sentiu o frio da solidão penetrar em seus ossos. Aquele mundo etéreo revelava uma verdade amarga.
Mesmo que ele sobrevivesse ao abismo e encontrasse uma saída, poderia acabar como aquelas figuras ao longe, prisioneiro de uma existência sem propósito, sem ação, sem vida. A perspectiva de tal destino o encheu de terror silencioso.
Ele olhou ao redor novamente, sentindo-se cada vez mais distante da realidade que conhecia. As figuras de seu clã continuavam imóveis, inabaláveis, como se a eternidade as tivesse congelado no tempo.
Cada rosto que ele reconhecia trazia uma nova faceta de dor. Eram os rostos de sua infância, de seus treinamentos, de batalhas travadas lado a lado. E agora, estavam vazios, como cascas.
Harley sentiu um nó na garganta. Ele queria gritar, chamá-los de volta à vida, mas sua voz parecia não sair. A presença de sua própria impotência diante daquilo o esmagava.
Ele sabia que a morte era inevitável, mas não havia imaginado que ela pudesse roubar tanto de uma pessoa — não apenas sua vida, mas sua própria essência, sua memória, sua alma.
De repente, um pensamento o atingiu com força:
“E se este fosse o futuro que o aguardava? E se o Abismo o consumisse por completo, como havia feito com eles?”
Harley se viu questionando tudo que sabia. Aquele portal lhe mostrava algo terrível. A queda pelo abismo parecia não ter fim, mas o que ele começou a sentir através daquela fenda na realidade era ainda mais assustador.
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