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    “A sobrevivência é um teste de vontade e engenhosidade. Cada batalha vencida no silêncio da noite é um passo em direção à verdadeira vitória.”

    O Código do Guerreiro Solitário, Verso 36.


    Após ser arremessado através do portal do Santuário, Harley emergiu do outro lado, caindo abruptamente no solo. O impacto contra o chão de pedra fria foi brutal, mas a dor física parecia pequena em comparação com a avalanche de emoções que o invadiam. 

    A sensação de inadequação, a falta de controle e a impotência diante dos desafios que o cercavam o engolfavam. O jovem sentia-se incapaz de proteger aqueles que mais importavam, de defender seu clã, seu passado. 

    “Quantas vezes mais preciso fugir? Quando encontrarei a força para, finalmente, encarar e me vingar dos meus inimigos?” — esses pensamentos ecoavam sombriamente em sua mente, alimentando uma determinação crescente.

    Levantando-se com dificuldade, Harley sentiu o peso dos ferimentos e danos físicos ainda não totalmente recuperados. A princípio, acreditou que havia sido transportado para um local distante, mas algo na paisagem ao redor parecia desconcertantemente familiar. 

    O ar da noite, denso e úmido, trazia um cheiro que ele conhecia bem, enquanto as sombras das árvores envolviam o ambiente com um desconforto palpável. 

    Harley estava de volta à Floresta de Espinhos, que cercava o Abismo sem Fim — o mesmo lugar onde havia caído durante a prova de Kamikaze, e onde fora forjado desde a infância por um treinamento implacável.

    O choque de reconhecimento foi seguido por um turbilhão de memórias. As lembranças de Julius Ginsu voltaram a sua mente como um golpe inesperado. 

    Desde o desaparecimento de seu pai, Harley havia enterrado qualquer memória positiva dele, alimentando uma raiva que o impediu de enxergar o valor dos ensinamentos que recebera.

    Mas agora, essas memórias começavam a romper o escudo que Harley construiu em torno de seu ódio, revelando que talvez tudo fosse muito mais complicado do que ele imaginara, e ele percebeu que talvez não pudesse julgar seu pai tão severamente quanto antes.

    No entanto, o presente o pressionava. Ele não podia mais fazer nada por seu clã ou por Silas. O Santuário havia caído e a culpa não poderia ser mais reparada. Agora, a única coisa que lhe restava era sobreviver e, no tempo certo, buscar vingança pelos que se foram. 

    Inspirando profundamente, Harley seguiu os ensinamentos de seu pai, vasculhando sua mochila e verificando seus equipamentos. A situação não era boa: sem comida, sem água, e seu compartimento de penas estava completamente vazio.

    Cinco bolas de fogo — artefatos que ele mesmo havia criado, baseados em instruções encontradas na biblioteca do Clã Dragões de Sangue — ainda permaneciam no fundo da mochila. 

    As bolas de fogo eram pequenas esferas que, ao serem ativadas, emitiam luz intensa por alguns segundos, o que poderia servir como distração ou fonte de iluminação. Além disso, ele tinha sua adaga negra, a única arma confiável.

    Apesar da urgência, Harley percebeu que seu corpo ainda não estava completamente recuperado. As feridas do abismo latejavam, e a escuridão que o cercava tornava impossível qualquer tentativa de avaliação precisa do terreno. 

    Decidiu esperar o amanhecer, acreditando que, com a luz do dia, poderia explorar o ambiente com mais clareza. Sua prioridade era clara: sobreviver.

    Subiu em uma árvore próxima, escolhendo um local que oferecia camuflagem e uma visão estratégica do terreno ao redor. Encostado no tronco, o cansaço finalmente tomou conta de seu corpo, e ele se permitiu relaxar, embora de forma cautelosa. 

    O frio da noite era parcialmente amenizado pela presença da adaga negra em sua mão, um toque familiar que o transportou para memórias de seu passado.

    Seus pensamentos retornaram a uma época em que tudo era diferente, quando ainda era uma criança ansiosa por provar seu valor. O teste para Guerreiro Arcano estava próximo, e ele aguardava o momento em que escolheria sua adaga e se tornaria um verdadeiro guerreiro do clã. 

    As lembranças vieram em ondas, trazendo consigo cenas de uma época em que o futuro parecia mais simples, mais definido.

    Ele se lembrou do dia em que, aos 12 anos, foi colocado na gaiola. Duas adagas de aço em mãos, fora desafiado a enfrentar animais famintos, escolhidos para ensinar aos jovens a importância de lutar pela própria vida. 

    Era uma prova de coragem, um ritual que todos os guerreiros do clã precisavam superar. A lembrança ainda era vívida: os olhos selvagens dos predadores fixos nele, o cheiro de sangue e suor, e o medo latente de não sair vivo.

    Mas a memória que mais o marcou foi a segunda vez que entrou na gaiola. Seu pai, sempre severo e exigente, havia decidido que ele deveria enfrentar duas feras ao mesmo tempo. A luta foi brutal, e, no final, Julius foi quem matou a última fera antes que ela pudesse devorar Harley. 

    O sentimento de sobrevivência naquela época se misturava ao medo e ao ressentimento de nunca ser suficiente aos olhos de seu pai. Essa era uma carga emocional que Harley carregava até hoje, um fardo que influenciava todas as suas decisões.

    Enquanto seus pensamentos vagavam entre essas lembranças, algo ao longe o despertou. sussurros distantes, se aproximando cada vez mais. Ele se agachou no galho, oculto pelas sombras, observando a movimentação entre as árvores. 

    Um grupo de homens em uniformes escuros avançava pela floresta. Harley reconheceu imediatamente os trajes e o comportamento tático dos homens: discípulos do Clã Dragões de Sangue. Seu coração acelerou. Eles não estavam ali por acaso, estavam em busca de algo — ou de alguém.

    Cauteloso, Harley observou a formação do grupo. Eram hábeis caçadores, treinados para missões secretas e bem equipados para eliminar qualquer um que se interponha em seu caminho. 

    Não seria fácil escapar deles. Ele sabia que não poderia enfrentá-los diretamente, não com tantos homens ao mesmo tempo. Uma nova estratégia seria necessária.

    Decidiu usar as bolas de fogo. Sabia que os dispositivos poderiam distraí-los tempo suficiente para criar uma vantagem. Com movimentos rápidos e silenciosos, ele ativou uma das bolas e a lançou em uma direção oposta à sua. 

    Após cinco segundos, o clarão iluminou o céu, atraindo a atenção imediata dos homens. Aproveitando a distração, Harley lançou outra bola de fogo em uma direção diferente, dividindo ainda mais o grupo.

    Com a atenção dos homens dividida, ele aproveitou a oportunidade para se aproximar do último homem da formação. Este estava ligeiramente afastado dos outros, oferecendo a brecha que Harley precisava. 

    Com um movimento preciso, ele arremessou a adaga, atingindo o homem diretamente no peito. O golpe foi mortal, e o corpo caiu silenciosamente, sem alertar os companheiros.

    No entanto, a situação ainda era delicada. Havia pelo menos mais vinte homens ao redor, todos bem treinados e armados. Enfrentá-los diretamente seria um erro fatal. 

    Ele sabia que precisava continuar jogando com a vantagem da surpresa e do terreno. Recuperando sua adaga, Harley lançou outra bola de fogo, criando mais um clarão que desviou a atenção dos caçadores.

    Enquanto a confusão aumentava, Harley se movia pelas sombras, aproveitando seu conhecimento da floresta para escapar. Cada passo era calculado, cada movimento silencioso. O território que antes era seu lar agora se tornava seu campo de batalha, e ele precisava usar tudo o que sabia para sobreviver.

    Mas uma pergunta o incomodava: 

    “Por que os Dragões de Sangue estavam atrás dele? O que eles queriam?” — mesmo enquanto corria para salvar sua vida, essas questões pairavam em sua mente. 

    Ele precisava de respostas, e, de alguma forma, sabia que encontrar essas respostas seria crucial para seu futuro e para a vingança que tanto desejava.

    A floresta estava escura e traiçoeira, mas Harley estava determinado. A sobrevivência era o primeiro passo, e ele sabia que, se conseguisse escapar dessa noite, as respostas viriam a seu tempo.

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