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    “Quando os laços da confiança são rompidos, a dor ressoa como um eco perpétuo. A desconfiança se enraíza e transforma o coração em pedra, um escudo contra futuras decepções.” 

    Discursos do Grande Explorador Zandar, Vol. básico.


    À medida que a energia sombria pulsava ao seu redor, Harley ergueu a voz para falar, mas suas palavras foram sufocadas antes mesmo de ganharem forma:

    — Eu… — no entanto, antes que pudesse articular uma única palavra, foi interrompido pela voz imponente da entidade dominante:

    — Quem lhe concedeu permissão para falar? E quem se importa com o que você pensa ou deseja?

    A voz ressoou na escuridão ecoando por todo o ambiente sombrio. Enquanto falava, as sombras ao redor de Harley começaram a se contorcer e se entrelaçar, formando uma rede negra densa e intrincada, aprisionando-o em seu abraço sinistro. 

    Era como se as próprias trevas o estivesse amarrando, mostrando sua força implacável e impossível de ser desafiada.

    Harley sentiu-se mergulhado em ondas profundas lhe arrastando cada vez mais para a escuridão. Ele lançou um olhar em direção a Ivana, uma expressão de preocupação cruzando seu rosto sombrio. 

    Parecia quase tangível, como se pudesse estender a mão e tocar a angústia que emanava dela. Essa conexão estranha tornou a situação ainda mais perigosa, colocando-o em uma posição precária e difícil de escapar.

    Enredado em uma rede de trevas e sombras, Harley refletiu sobre a magnitude desse novo poder. 

    Embora tenha explorado os segredos desse universo sombrio e descoberto algumas de suas potencialidades até aquele momento, lembrando-se do uso que Ivana fez dele no passado, ele sentia como se estivesse apenas arranhando a superfície de um poder vasto e imensurável.

    Observando Ivana e as outras entidades sombrias ao seu redor, ojovem percebeu que o julgamento que se desenrolava não era dirigido a ele, mas sim à própria Ivana. Era ela quem estava sendo avaliada, quem estava diante da sentença sombria que pairava sobre eles.

    Enquanto as sombras continuavam a se contorcer e se mover ao seu redor, Harley compreendeu que seu papel naquele momento era observar com atenção e buscar uma oportunidade para escapar daquela situação. 

    A atmosfera ao redor de Ivana estava impregnada de tensão, como se cada sombra estivesse aguardando ansiosamente suas palavras. A entidade sombria dirigiu-se a sua filha:  

    — O que você tem a dizer?

    Por um instante fugaz, ela foi envolvida pela hesitação, uma sensação de ambiguidade que parecia transmitir-se para Harley, de uma forma estranha e inexplicável. 

    Era como se ele estivesse conectado às sensações e emoções de Ivana, e diante disso, percebeu um contraste gritante com a habitual determinação que essa mulher apresentou anteriormente. 

    Enquanto Harley ponderava sobre a situação, ela lutava para encontrar as palavras certas. Ela se esforçou para articular suas palavras, mas mais uma vez foi abruptamente interrompida.

    — Pai, eu — sua voz vacilou no ar, perdida em meio ao peso da situação.

    Mas as palavras que ela esperava não vieram à sua mente. Em vez disso, uma voz carregada de desapontamento cortou o silêncio, repreendendo-a por sua falta de compreensão.

    — Você deve explicações a eles. A toda a sua raça. Não a mim — o tom áspero revelava a decepção do pai diante das ações da filha.

    A aura que envolvia Ivana parecia permeada pelo medo, pelo menos era essa a sensação que Harley captava, mesmo observando à distância, aprisionado por circunstâncias além de seu controle. Esse aspecto dela era completamente novo, uma faceta raramente vislumbrada. 

    — Pai… — sua voz trêmula foi cortada mais uma vez pela afirmação firme da entidade sombria.

    — Agora, eu não sou seu pai. Nunca mais poderei ser! — a declaração ecoou pelo ambiente, soando como um veredicto final. Em meio ao silêncio pesado que se seguiu, a entidade sombria, resignada, dirigiu-se aos presentes.

    — Também o que há para se dizer? Nada que for dito pode mudar os acontecimentos. Melhor irmos direto às decisões — seu tom indicava uma desistência quanto a qualquer possibilidade de explicação ou redenção.

    Diante da ausência de objeções, ele prosseguiu:

    — Por ela ser uma princesa. Pelo crime de compartilhar nosso poder com alguém fora da nossa raça, peço que considerem a opção de deserção e expulsão em vez de extermínio.

    O ar ficou pesado enquanto cada entidade sombria presente parecia ponderar sobre as palavras ditas.

    Ao ouvir as palavras severas de seu pai, Ivana foi invadida por uma onda avassaladora de surpresa e medo. A declaração incisiva dele foi como uma lâmina afiada que penetrou fundo em seu coração, dilacerando as últimas esperanças que ela mantinha. 

    O impacto da rejeição de seu próprio pai reverberou em seu âmago, deixando-a aturdida e desnorteada. Sentiu-se despojada não apenas de sua raça, mas também de sua identidade e de sua conexão com o único lugar que ela chamava de lar. 

    Enquanto isso, Harley, mesmo distante e aprisionado, percebia todas essas mudanças em seu estado emocional, como se estivesse sintonizado com suas emoções.

    Então, num rompante de determinação, Ivana interrompeu o silêncio com um grito desafiador:

    — Até que vocês votem, eu ainda sou uma princesa. E como tal, tenho o direito de falar.

    Seu pai, com um olhar de desaprovação, dirigiu-se a ela:

    — Você ainda quer se envergonhar mais?

    Ivana permaneceu firme diante da sensação de desaprovação emanada por seu pai, ciente da complexidade dos laços que os uniam. Ela sempre soube que a percepção e o compartilhamento desses laços dependiam da vontade de cada indivíduo, uma verdade que carregava desde o nascimento. 

    No entanto, para Harley, que havia entrado nesse mundo recentemente, essa dinâmica era como uma correnteza avassaladora, incapaz de controlar o fluxo incessante de emoções, pensamentos e percepções alheias que o inundavam.

    Antes de iniciar sua explicação, ela respirou fundo, sentindo a urgência e a determinação fluírem através de suas palavras. 

    — Pai, eu sei que minhas ações podem parecer erradas, mas… — sua frase foi abruptamente interrompida:

    — Você precisa entender, Ivana —  ele disse com um tom de advertência — o que você fez vai contra os princípios de nosso povo. Você está ligada para sempre a esse ser inferior — sua expressão era uma mistura de tristeza e resignação.

    Ivana olhou nos olhos de seu pai, sua própria expressão, uma mistura de angústia e desespero.

    — Mas pai, você não entende — tentou argumentar, mas foi novamente cortada.

    — Não há desculpas para o que você fez — disse seu pai, sua voz firme — você escolheu trair sua própria raça. Não há como voltar atrás agora — ele balançou a cabeça com pesar, incapaz de aceitar as ações de sua filha.

    Ivana sentiu um nó se formar em sua garganta, a realidade de suas escolhas pesando sobre ela.

    — Eu sei que errei — admitiu com pesar — mas eu não tive escolha. Foi uma questão de sobrevivência.

    Seu pai a encarou por um longo momento, sua expressão suavizando ligeiramente. 

    — Eu entendo que você possa sentir que não tinha alternativa — disse ele finalmente — mas isso não muda o fato de que suas ações têm consequências.

    As palavras severas de seu pai atingiram Ivana como um golpe direto no peito. Era a primeira vez que ela enfrentaria as consequências de suas ações, e a perspectiva era desconcertante para alguém que nunca havia sido confrontado ou julgado por seus atos antes. 

    Contudo, mesmo para criaturas como eles, havia limites que não podiam ser ultrapassados. O peso dessa realidade se abatia sobre ela como uma sombra sombria, envolvendo-a em uma aura de inquietude e incerteza.

    — Eu estou disposta a enfrentar as consequências — disse ela com determinação.

    Seu pai assentiu, reconhecendo sua coragem. 

    — Muito bem! Agora muito mais parecida com a grande guerreira que treinei — disse ele com seriedade — então, vamos começar!

    Ele se virou para os outros presentes, sua voz ecoando pelo salão: 

    — Pelo crime de trair nossa raça e compartilhar nosso poder com um estranho, Ivana será submetida ao julgamento dos anciãos.

    Embora todos soubessem que o seu pai havia mudado de ideia e decidido dar uma nova oportunidade à sua filha, também compartilhavam a sombria percepção de que essa esperança era vã. 

    No entanto, num acordo silencioso entre eles, optaram por não expressar ou apontar que a decisão havia sido revertida. Como se concordassem tacitamente em fingir que essa mudança de coração nunca ocorreu, mantendo uma fachada de imparcialidade diante dos outros presentes. 

    Assim, uma atmosfera tensa e silenciosa pairou sobre o salão, enquanto os anciãos se preparavam para iniciar o julgamento.

    Ivana sentiu um calafrio percorrer sua espinha enquanto os anciãos se aproximavam, suas expressões sérias e impiedosas. Ela sabia que estava prestes a enfrentar o julgamento mais difícil de sua vida.

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