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    “Na interseção entre memória e existência, encontramos o verdadeiro eu. As lembranças não são apenas ecos do passado, mas mapas que nos orientam no presente.” 

    Misteriosos inscritos no templo da Adaga Arcana. Sem autor identificável.


    O futuro sempre fora um enigma fragmentado e repleto de incertezas para Sergio Romanov. O jovem líder do Clã Dragões de Sangue sempre fora fascinado por esse tema. Na sua tradição, sempre houveram os sussurros que eram uma espécie de ponte misteriosa que trazia consigo fragmentos do amanhã para o presente.

    E ao longo da extensa história de seu clã, pouquíssimos membros tiveram o privilégio de testemunhar essa dádiva, sendo agraciados com o dom singular da comunicação com o futuro. 

    Essa habilidade manifestava-se de forma unilateral, assemelhando-se a um ruído que rompia a normalidade e clamava por atenção, ainda que muitas vezes fosse ignorada ou subestimada pelos observadores.

    No entanto, todos os membros, incluindo Sérgio, ansiavam por esse contato, esforçando-se para captar os mais sutis dos sussurros. 

    Qualquer mudança, sonho ou ocorrência trivial, tal qual o voo gracioso de uma borboleta ou a fuga rápida de um pequeno animal, era considerada uma possível mensagem do universo, com a finalidade de revelar significado e divulgações do futuro nas entrelinhas.

    Mas a adaga negra concedia ao jovem líder do clã Dragões de Sangue mais do que simples sussurros e sugestões vagas; ela oferecia-lhe todas as palavras, significados e experiências vividas em cada uma de suas escolhas até cinco anos no futuro. Era evidente que lhe era concedida uma nova oportunidade para tomar novas decisões e alterar o seu futuro.


    Sergio Romanov, deixando de lado suas lembranças e pensamentos, agora concentrava-se inteiramente no presente. Ele firmemente segurava o cabo de sua adaga negra, presa em sua cintura, enquanto era envolto pela esfera branca. Esta erguia-se, formando uma barreira invisível, protegendo-o da pressão avassaladora das águas, erguendo-se à semelhança de um escudo contra as forças impiedosas da morte.

    Sob seus pés, uma névoa negra parecia envolvê-lo, e a esfera branca garantia que essa obscuridade não o alcançasse. O ambiente ao seu redor assemelhava-se a um pântano sombrio, formado por essa densa neblina escura. 

    Ao contrário dos mares de sua terra natal, ali não havia cardumes de peixes coloridos, nem plantas aquáticas, tampouco a suave luz do sol filtrada pela água. Era um cenário desprovido de vida, com camadas de densidade líquida, onde a visão se perdia nas profundezas desconhecidas. 

    Sergio observava aquela paisagem, tendo a impressão de que era uma imagem familiar, uma lembrança do passado que, paradoxalmente, não vivenciara nesta linha do tempo.

    No entanto, devido às experiências e escolhas do futuro armazenadas em sua mente, cada detalhe parecia ecoar, concedendo-lhe uma segunda oportunidade para tomar decisões mais lúcidas, munido de um vasto conhecimento sobre as consequências e desdobramentos de cada uma delas.

    E todas essas experiências, absorvidas do futuro no momento em que Sergio Romanov perfurou seu próprio eu, vindo de além-cinco-anos, indicavam-lhe que estar naquele lugar representava uma ligação íntima, uma conexão profunda. 

    Era um sinal claro de que, apesar de eventuais variações nas escolhas, o trajeto permanecia notavelmente similar.

    O jovem líder dos Dragões de Sangue contemplava aquela paisagem com a serenidade de quem reconhece uma imagem familiar gravada em sua mente, uma recordação nítida de algo que já presenciara. 

    Nada daquilo lhe causava surpresa; ao contrário, ele se sentia seguro naquele ambiente, confiante na paciência do líder e seguro de que este aguardaria o momento oportuno. 

    Assim, desprendido de qualquer inquietação em relação à sua presença naquele lugar, Sergio mergulhou novamente em suas lembranças, comparando as experiências já vividas com aquelas que ainda estavam por vir.


    À medida que Sergio Romanov mergulhava em suas recordações, compreendia a importância crucial de comparar as lembranças do que vivenciara até o momento com as experiências que recebera do futuro. 

    Sentia-se conectando os pontos de uma trilha já percorrida, buscando entender os desvios e as convergências entre o que já era conhecido e o que estava por vir.

    Recordava vividamente os dias em que caminhava incansavelmente pelo deserto, sob os três sóis ardentes, sem ter feito qualquer alteração, sem mudar uma única decisão, mantendo-se fiel à trajetória que já lhe fora revelada. 

    Tudo permanecia estático entre o que vivia e o que havia sido revelado a ele a respeito do futuro, enquanto continuava a vagar pelo deserto sob os três sóis, preso em um ciclo predestinado.

    No entanto, ao chegar ao local da entrada onde encontraria o líder demoníaco, uma divergência se delineava entre o que recordava de ter vivido e o que vislumbrara, parte de seu destino.

    Em sua jornada futura, ao chegar à entrada indicada pelo mapa, ele havia decidido não adentrar naquele lugar, uma escolha movida pelo instinto de preservação que ecoava dentro dele, sussurrando que era um risco desnecessário. 

    Assim, prosseguiu pelo deserto sob os três sóis até que o líder demônio o encontrasse e o conduzisse até onde agora se encontrava. 

    No entanto, nesta realidade presente, havia enfrentado a entrada e descoberto o verdadeiro motivo por trás da aliança proposta: a incapacidade de controlar sozinho a adaga negra, uma suspeita que o assombrava no futuro, mas que agora se tornava uma certeza inegável.

    Mais uma vez, o futuro e o presente alinhavam-se em uma mesma sintonia, fazendo com que as linhas do tempo se entrelaçassem novamente próximo do conhecido padrão. Apesar da nova decisão tomada no presente, o desfecho se assemelhava surpreendentemente à lembrança obtida do futuro. 


    Diante do líder demoníaco, instantaneamente reconhecido como Abaddon, a Serpente do Caos, Sergio Romanov encontrava-se mergulhado novamente em um cenário de desolação. 

    Destroços desconhecidos de naves, torres e embarcações, outrora reluzentes, agora corroídos e envoltos na neblina negra, evocavam uma sensação de abandono e decadência. 

    Para o jovem líder do clã Dragões de Sangue, aquela paisagem apocalíptica, tanto no futuro quanto no presente, transcendia a mera visão submarina; era uma representação vívida de todas as experiências, pessoas e conhecimentos acumulados ao longo da vida, muitos dos quais se tornavam irrelevantes e caíam no esquecimento.

    Para ele, o inferno não era apenas um lugar de tormento, mas sim uma representação metafórica da vida em si, repleta de elementos que se deterioram e se desintegram com o tempo. 

    De todas as experiências do passado e as herdadas do futuro, apenas os contatos com o líder demônio e o uso de seu poder pareciam ter algum valor real, enquanto todo o resto se assemelhava a destroços submersos, fadados a desaparecer na obscuridade.

    Mais uma vez, tanto no passado quanto no futuro, ele se via diante de Abaddon, a Serpente do Caos. No entanto, desta vez, ao contrário do encontro em suas visões do futuro, ele tinha a oportunidade de fazer uma nova escolha e alcançar resultados mais favoráveis.

    — Eu sei o que você vai dizer, e você sabe que eu sei. Então, vamos direto ao assunto. Eu aceito! — Sergio proclamou com uma convicção renovada. 

    — Muahahaha! Realmente, você é um candidato promissor — o líder demoníaco respondeu com uma risada malévola, ecoando pelo ambiente sombrio. 

    Sem uma palavra entre eles, ambos se voltaram na mesma direção, impulsionados por um entendimento silencioso e instintivo. Enquanto avançava, os destroços e objetos corroídos pela névoa negra tornavam-se insignificantes detalhes. 

    Acompanhando Abaddon através do cenário desolador, o jovem líder do clã Dragões de Sangue revivia sua decisão de ingressar no clã dos Demônios Sombrios. Foi uma escolha feita há muito tempo, uma barganha na qual seu clã seria assimilado, mas Sergio permaneceria no controle, embora agora subordinado a Abaddon. 

    Em troca, um artefato seria implantado em seu corpo, concedendo-lhe novas habilidades, uma oferta que se estendia também aos outros membros de seu antigo clã. 

    Sergio Romanov entendia que o clã Dragões de Sangue sempre fora uma ferramenta utilizável, uma escada que ele usurpara e nunca teve muita consideração ou real valor sentimental. Eram recursos, ativos que podiam ser empregados, seja em combate ou em negociações. 

    A cada passo, ele reafirmava para si mesmo que todos os sacrifícios eram justificados em busca de mais poder. Afinal, ele acreditava firmemente que uma pessoa forte podia remodelar o próprio passado e reescrever qualquer história. 

    Mesmo em seu pequeno clã, Sergio tinha consciência de que os relatos eram sempre narrados pelos mais poderosos e sobreviventes. Aos perdedores, restava apenas a tentativa incansável de alcançar a vitória ou enfrentar o esquecimento e a irrelevância.

    Enquanto caminhava ao lado do líder demoníaco, Sergio recordava de sua inocência na infância, quando o Clã Demônios Sombrios era apenas uma organização discreta aos seus olhos. 

    Naquela época, ele via um desperdício de tempo e recursos moldar os guerreiros não só para serem combatentes, mas também para se tornarem futuros generais, diplomatas e estrategistas.

    No entanto, agora ele compreendia que o clã não apenas era relevante nos intrincados jogos de poder e alianças que moldavam o destino do Continente das Terras Esquecidas, mas aparentemente em diversos outros mundos também.

    Enquanto prosseguia ao lado de Abaddon, ele compreendia que seu consentimento não se limitava à mera adesão ao clã dos Demônios Sombrios, algo que já havia decidido em seu futuro. 

    Agora, novas encruzilhadas se apresentavam diante dele: a escolha do artefato que seria inserido em seu corpo e a decisão de aceitar a ajuda de Isabella. 

    Apesar de ciente de que, no futuro, o líder demoníaco a usaria para monitorar e controlar seus passos, Sergio Romanov reconhecia que era imperativo tomar novas direções e fazer escolhas diferentes para moldar um destino distinto. 

    “Como posso aspirar a um novo futuro se continuo repetindo as mesmas ações do passado?” — Sergio ponderou sobre o dilema diante de si.

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