Capítulo 23 - A passagem secreta
“A verdadeira força não reside na adaga que empunhamos, mas no conhecimento que carregamos.”
— O Código do Guerreiro Solitário, Verso 28.
Harley colocou a mochila nas costas, sentiu o peso familiar da adaga negra em sua mão e partiu em direção ao chamado de Silas. Sabia que algo importante estava por vir.
Atravessou a passagem estreita, onde a luz fantasmagórica, filtrada pelas pequenas fendas nas paredes, parecia criar sombras vivas ao longo do corredor de pedra. As inscrições rúnicas cobriam cada centímetro das paredes, criando uma atmosfera mística.
Após o que pareceu uma eternidade caminhando, chegaram a uma imensa porta de pedra, coberta com mais símbolos que cintilavam conforme se aproximavam. Silas, sem hesitar, colocou a mão sobre a superfície da porta e a empurrou, revelando uma vasta câmara.
No centro, um portal gigantesco pulsava com uma energia indescritível. Era uma força quase magnética que prendeu os seus olhos imediatamente.
— Chegamos ao coração do Santuário — disse o velho guardião — Atrás desta porta está o que você precisa saber.
A câmara era diferente de tudo que já havia visto. O portal diante dele era monumental, com bordas de pedra e cristal, e parecia ter vida própria.
Ao contrário dos portais que Harley havia visto criados pela adaga, este era permanente, uma passagem fixa entre mundos.
No entanto, havia algo diferente neste portal em comparação com os outros que o jovem Ginsu havia experimentado. Ele podia sentir a energia emanando da estrutura à sua frente, mas o brilho que ele associava aos portais da adaga estavam ausentes.
Havia algo mais terreno, mais estável, mas ao mesmo tempo… limitado. Silas, percebendo a confusão no olhar de Harley, aproximou-se e, com a voz grave e tranquila, começou a explicar:
— Este portal, apesar de seu tamanho grandioso e da energia que emana, é mais limitado do que os que você já presenciou com a adaga — o velho homem apontou para as inscrições rúnicas ao redor do portal, que brilhavam levemente à medida que ele falava
Harley franziu o cenho, absorvendo a informação. O que ele estava vendo era uma tentativa de replicar o poder da adaga, mas que, no fim das contas, parecia não ter a mesma grandiosidade em termos de alcance.
— Então, este portal… — começou Harley, hesitante — Ele pode me levar para a parte desse mundo além da névoa?
Silas balançou a cabeça lentamente.
— Não.
— O portal do santuário é monumental em tamanho, mas sua função é estritamente contida ao que está dentro da névoa — continuou o guardião gesticulando com a mão, indicando os limites do que estava diante deles — Ele foi projetado para ligar os pontos mais distantes da nossa ilha, ajudando a manter as conexões.
Harley refletiu sobre aquilo, imaginando a utilidade daquele portal em tempos de guerra ou viagens urgentes entre regiões longínquas. Ele compreendia a importância de tal estrutura, mas havia uma parte dele que se sentia decepcionada com os limites impostos.
Silas, percebendo a inquietação do jovem Ginsu, deu um passo à frente e colocou uma mão em seu ombro, transmitindo calma.
— Não subestime seu poder — disse o guardião, com uma voz suave, mas firme — Este portal já foi crucial para salvar nosso clã e permitir o acesso a recursos valiosos no continente. No entanto, eu sei o que você está pensando. Os portais que a Adaga Arcana pode criar são de uma ordem completamente diferente.
Os olhos de Harley se voltaram para a adaga repousando em sua bainha.
— Os portais da adaga não estão limitados ao mundo que conhecemos — continuou Silas, sua voz assumindo um tom mais solene — Eles não apenas conectam pontos dentro do nosso mundo, mas atravessam dimensões. A adaga tem o poder de abrir passagens para outros reinos, mundos distantes e realidades além da nossa compreensão.
— O que você experimentou antes foi apenas um vislumbre do que ela é capaz de fazer — continuou o homem — Por isso, ela é tão perigosa nas mãos erradas. Seu poder transcende os limites da névoa que cerca nosso continente.
Por um instante, Harley se entregou ao silêncio, deixando que o peso das revelações o envolvesse. Suas recordações, inundadas por visões de criaturas e paisagens distantes, surgiam de forma etérea, como se os portais criados pela adaga ainda ecoassem em sua mente.
— E agora… — Silas interrompeu os pensamentos do jovem, voltando-se para ele com um olhar firme — Temos alguns problemas imediatos.
Harley olhou através do portal e viu lampejos de figuras armadas, com formas que ele nunca havia visto antes. Seres com asas, escamas, e chifres ameaçadores marchavam rumo a uma enorme porta de pedra, claramente em uma missão de conquista.
— Quem são eles? — perguntou o jovem Ginsu, a voz cheia de inquietação.
— Esses são membros do Clã do Demônio Sombrio — respondeu Silas, com uma expressão de desgosto — Uma raça híbrida que vive no subterrâneo. Eles tentam invadir o Santuário há séculos, em busca dos segredos que protegemos aqui. Eles desconhecem a Adaga Arcana, mas sabem que este lugar tem conexões poderosas com outros mundos. Para eles, este santuário é a chave para escapar da barreira de névoa que cerca o continente.
As palavras de Silas pairaram no ar como um peso sobre ele. A complexidade da situação se desdobrava de maneiras que ele não poderia ter antecipado.
— E como podemos proteger este lugar? — perguntou Harley, a preocupação clara em sua voz.
Silas suspirou.
— Não se preocupe. Este lugar é intransponível. Mas sem seu pai, sem os guerreiros do clã, e sem um verdadeiro portador da adaga, tudo o que podemos fazer é observar suas tentativas incessantes, impotentes para agir.
O velho guardião fez uma pausa, sua expressão se fechando em uma sombra.
— Eles estavam lá, no massacre do nosso clã. Queimaram tudo até as cinzas. Eles acreditam que este lugar está vazio.
As palavras atingiram Harley como um soco. Mais um cúmplice se revelava, traçando a destruição de tudo que ele amava: seu clã, sua família, seu legado. A raiva fervia em seu peito, crescendo com cada segundo, mas Silas o interrompeu:
— Agora não é hora de vingança. Estamos protegidos aqui. Há uma tarefa mais urgente — disse, virando-se para os portais — Você precisa registrar as localizações de cada portal. Use a adaga para marcá-los antes que seja tarde demais.
Harley, ainda processando tudo, obedeceu. Ele inseriu a adaga em cada portal, e as runas na lâmina brilharam, indicando que as localizações estavam sendo registradas. Foi então que o pior aconteceu.
— KA-BOOM!
Uma explosão ensurdecedora sacudiu o santuário. As rochas ao redor começaram a se partir, e uma nuvem de poeira e destroços tomou o ar. O Clã do Demônio Sombrio havia finalmente conseguido invadir depois de séculos de tentativas. O guardião, com suas últimas forças, empurrou o jovem Ginsu em direção a um dos portais.
— Vá! Encontre as respostas e vingue-nos! — gritou Silas.
Harley foi lançado para dentro do portal, desaparecendo em profundezas desconhecidas.
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