Capítulo 177 - Milenium

“Cada sombra esconde um sussurro, e cada sussurro é uma verdade à espera de ser desvelada.” 

— Sussurros das Sombras, XXXI, transmissão oral do Clã Adaga Arcana.

O Líder da Escola de Exploradores Interdimensionais assumiu o controle de todos os invólucros de transporte voador.

As naves, gigantescas em suas estruturas metálicas, começaram a descer em formação coordenada. O som dos motores abafava o silêncio desolado do deserto, enquanto as sombras dos invólucros voadores se estendiam pelo solo abaixo. 

O Cônsul permanecia em sua posição, os olhos fixos no visor, analisando cada detalhe com precisão meticulosa. 

Ele sabia que o pouso não passaria despercebido. A proximidade do solo diminuía muito a eficácia do sistema de camuflagem dos invólucros, de modo que aumentaria a chances de algum equipamento de detecção inimigo captar a presença de sua frota. 

Ainda assim, contava com a rapidez e eficiência de suas próximas ações para eliminar qualquer ameaça antes que ela pudesse se materializar. 

Durante a aterrissagem, ele escaneou todos os tripulantes, conferindo suas identidades e verificando qualquer tecnologia ou equipamento que não estivesse dentro do padrão fornecido à sua equipe.

A terra firme tremeu levemente quando o invólucro principal, onde o Cônsul se encontrava, pousou com um baque surdo. As rampas foram baixadas, revelando o ambiente árido e opressivo do deserto. O calor era intenso, mas os trajes estavam preparados para protegê-los das condições extremas.

— Dividam-se segundo o protocolo. Todas as naves serão inspecionadas! — ordenou o Líder da Escola de Exploradores interdimensionais, enquanto ajustava as configurações de seu próprio traje, preparando-se para liderar a operação.

Cada um dos 5 esquadrões foi direcionado inicialmente aos transportes considerados suspeitos. O Cônsul, com seus melhores homens ao lado, junto de Harley, Milenium e Marcus, dirigiu-se ao primeiro invólucro voador que mostrava sinais de anomalia. Um dos painéis da nave piscava em vermelho, um indicativo claro de que algo estava muito errado.

— Aproximem-se com cautela — murmurou ele, ativando uma série de sensores em seu traje. O invólucro de transporte voador parecia tranquilo por fora, mas ele sabia que a verdadeira ameaça estaria bem escondida, talvez esperando o momento exato para se revelar.

Ao atravessar a entrada da nave, todos foram envolvidos pela penumbra de um corredor silencioso, onde apenas as luzes de emergência lançavam um brilho fraco. O ar denso estava impregnado com um cheiro nauseante. 

Seus olhos vasculhavam cada detalhe, em busca de qualquer anomalia. A cena era desoladora: corpos sem vida de seus guerreiros estavam amontoados, testemunhando o massacre. Sem hesitar, o Cônsul ergueu a mão, sinalizando silenciosamente o próximo lugar que seus homens deveriam averiguar.

Ao chegar à sala de controle da nave, a equipe se deparou com um traidor imobilizado em seu traje, que foi rapidamente eliminado. Diante dele, um painel piscava freneticamente, inundado por códigos que saltavam na tela. 

Sem hesitar, ele desativou o sistema, mas não antes de notar um leve tremor sob seus pés, uma indicação clara de que o perigo ainda estava à espreita.

— Eles plantaram explosivos — constatou, o pai de Milenium — Desarmem-nos.

Harley, Milenium e Marcus observavam enquanto os guerreiros, altamente treinados, trabalhavam com eficiência, localizando e neutralizando os dispositivos em questão de minutos. 

Com o perigo imediato eliminado, o Líder da Escola de Exploradores interdimensionais continuou a inspeção. Cada soldado, imobilizado, foi alvo de uma inspeção rigorosa, assim como cada compartimento e cada canto, todos meticulosamente vasculhados.

Depois de garantir que a nave estava segura, o Cônsul e seus homens se moveram para a próxima. A rotina se repetiu: análise, desativação e eliminação. Em cada invólucro voador, encontravam diferentes tipos de sabotagens, desde armadilhas mecânicas até tentativas mais sutis de manipulação dos sistemas de navegação.

A inspeção avançava de forma lenta e meticulosa. Cada nave era examinada minuciosamente, com o pai de Milenium liderando seus guerreiros em cada detalhe. Mas o tempo, impiedoso, corria mais velozmente do que eles poderiam desejar.

Milenium fora levada à missão para ganhar experiência, e ao assistir às decisões de seu pai, começou a compreender que a pressa sem a devida cautela era um caminho certo para a ruína. 

A jovem gradualmente percebia que o segredo do sucesso estava em encontrar um delicado equilíbrio entre a velocidade na execução e a precisão nas ações.

Finalmente, após o que pareceram horas de trabalho incessante, Harley, Milenium e Marcus, junto com o Cônsul, adentraram na última nave, onde as luzes brancas cintilavam de forma ininterrupta. 

A atmosfera no último invólucro voador era aparentemente calma, quase acolhedora. Os visores permaneciam sem emitir qualquer sinal de alerta, os soldados estavam completamente paralisados, e não havia o menor indício de anomalia. 

Todos avançavam com extrema cautela, seus sentidos aguçados em alerta máximo. A garota, talvez por uma precaução exacerbada, foi a última a entrar, mantendo-se na retaguarda do pelotão. O ambiente parecia calmo, mas algo no ar a perturbava profundamente. 

Um pressentimento persistente tomava conta de seus pensamentos: 

“Nunca baixe a guarda!” — as palavras de seu pai reverberavam em sua mente. Era uma lição que ele havia incutido nela inúmeras vezes, e Milenium sabia que, naquele momento, essa era a verdade que mais precisava seguir.

Quando chegaram à sala de controle, o Cônsul ergueu a mão, sinalizando para que todos parassem. Ele escaneou a sala, mas não encontrou nada fora do lugar. Ainda assim, uma sensação de desconforto rastejava por sua mente. 

A jovem observava seu pai atentamente, tentando decifrar seus pensamentos. Ela sabia que o Líder da Escola de Exploradores interdimensionais não era do tipo que se deixava enganar pelas aparências, e essa nave silenciosa não o estava convencendo.

— É uma emboscada! — gritou Marcus, sacando sua arma.

A equipe inicial, que incluía cinco guerreiros, além do Cônsul, Harley, Milenium e Marcus, mal teve chance de reagir quando uma das paredes se fechou abruptamente em um movimento rápido, isolando-os completamente do resto da nave.

Vinte traidores emergiram das sombras em uma onda feroz, lançando-se contra eles. De maneira inesperada, haviam desativado a paralisia dos trajes e se libertado de todas as restrições. 

Ao perceber o perigo iminente, o pai de Milenium imediatamente se posicionou diante sua filha, seu traje reforçado absorvendo o impacto inicial de múltiplos ataques.

Enquanto seu pai a empurrava para o chão, Milenium foi invadida por uma enxurrada de pensamentos. Ela sempre soubera que ele era um líder implacável, mas jamais havia sentido essa proteção direta e quase desesperada.

Independente da perplexidade da garota, a batalha ao redor se transformava em um caos desenfreado. O espaço era apertado e os traidores, em grande número, atacando com uma ferocidade quase bestial. 

Os cinco guerreiros do Cônsul revidaram com força, dispersando e dividindo a atenção dos inimigos, enquanto Marcus e Harley estavam completamente imersos em suas próprias lutas.

Milenium, forçada a ficar atrás de seu pai, observava a batalha com uma ponta de medo, finalmente compreendendo a diferença brutal de uma operação real, onde não havia segundas chances e a morte era uma ameaça constante. Ela desejava lutar, provar seu valor, mas seu corpo não respondia.

Quando finalmente conseguiu se mover, o Líder da Escola de Exploradores interdimensionais bloqueou seu avanço e a empurrou de volta ao chão antes que qualquer inimigo pudesse se aproximar.

Com um olhar atento, Harley percebeu a chance que tinha. Se conseguisse chegar ao painel de controle e apertar o botão certo, os vários guerreiros do lado de fora daquela sala de controle entrariam em ação. Eles poderiam encerrar rapidamente a batalha retomando o controle da nave.

Mas assim que ele tocou no painel, uma descarga elétrica o jogou para trás. Milenium viu o jovem  cair, seus membros tremendo com o impacto. Sem pensar duas vezes, ela tentou correr para ajudá-lo, mas o Cônsul a segurou pelo braço.

— Não! — ele disse, puxando-a para trás de novo — Fique aqui.

— Pai, eu preciso ajudar! — a garota protestou, mas a determinação fria nos olhos de seu pai silenciou qualquer argumento.

— Sua vida é mais importante do que essa luta — o Cônsul afirmou, sua voz firme.

A batalha ao redor continuava intensa. Marcus, que lutava ferozmente ao lado de Harley, foi atingido por uma lâmina inimiga que rasgou seu flanco. 

Ele soltou um grito de dor, mas continuou lutando, recusando-se a ceder ao ferimento. Milenium, vendo seu amigo ferido, sentiu a raiva borbulhar dentro de si, mas ainda assim, não conseguia se libertar da proteção de seu pai.

Finalmente, o exército que aguardava do lado de fora conseguiu romper as defesas, permitindo que a maré da batalha se voltasse a favor do Líder da Escola de Exploradores interdimensionais e sua equipe. 

O combate se transformou em uma luta brutal: socos, tiros, pancadas e golpes improvisados preencheram o ambiente, deixando rastros de sangue, hematomas e membros dilacerados. 

O resto dos traidores caíram um a um, até que o último deles tombou. O silêncio tomou conta da sala de controle, onde antes o caos reinava, quebrado apenas pelas respirações ofegantes e o som dos passos sobre os corpos dos mortos.

Milenium observou ao redor, os corpos dos traidores e guerreiros espalhados como sombras de uma batalha violenta.

“Fui poupada da luta… mas a que preço?” — pensou, sentindo a dor da escolha que seu pai havia feito. Ele a protegeu, sim, mas agora uma sensação esmagadora de impotência tomava conta dela.

— Levem os feridos para a nave principal — ordenou o Cônsul, ainda em posição protetora — Agora precisamos partir.

Milenium e Harley ajudaram a carregar Marcus, que estava pálido e suando, mas consciente. O sangue escorria de seu ferimento, deixando um rastro vermelho pelo chão enquanto se moviam em direção à saída. 

A equipe, exausta e ferida, retornou a nave  principal, carregando a vitória, mas também as marcas da batalha. Os feridos foram rapidamente transferidos para outro invólucro voador, destinado a retornar à Escola de Exploradores Interdimensionais para tratamento médico. 

Enquanto isso, os motores foram reativados, e o som dos propulsores ecoou no ar. As naves restantes se ergueram do solo, ascendendo acima do deserto translúcido, deixando para trás os vestígios da batalha.

Com os olhos fixos na janela enquanto os invólucros voadores se elevavam, Milenium sentiu um alívio amargo pelas várias perdas.

“Vencemos… mas qual foi o verdadeiro custo?” — pensamentos turbulentos preenchiam sua mente, refletindo as duras lições do dia.

“Nunca baixe a guarda” — ela repetia a si mesma, mas agora, compreendendo que: “Que toda proteção não deixava de ser uma forma de prisão!” 

— Aproximando-se da ‘Zona Inicial da Esquerda’, senhor — anunciou um dos comandantes, trazendo a garota de volta à realidade.

O Cônsul acenou, olhando para o horizonte onde as sombras das naves se alongavam sob os três sóis. A ‘Zona Inicial da Esquerda’ era o próximo destino, um local envolto em mistério, mas também a chave para o futuro do Mundo Mágico.

Milenium observou o solo abaixo enquanto os invólucros voadores começavam a descer novamente. Ela sabia que a batalha estava longe de acabar, mas também sabia que, enquanto mantivessem o foco e a determinação, não importava o que enfrentassem, estariam prontos.

Com um rugido mecânico, 61% da sua força militar restante tocaram o solo, e as portas de desembarque se abriram, revelando a misteriosa ‘Zona Inicial da Esquerda’. 

Enquanto isso, as naves avariadas e destruídas, junto com os corpos dos guerreiros caídos, serviam como um sombrio testemunho das adversidades superadas até ali.

O Cônsul avançou com passos firmes e o olhar fixo no novo horizonte à sua frente. Atrás dele, Milenium, Harley e os guerreiros sobreviventes das naves ajustavam suas armas e mentes, prontos para o próximo desafio.

ANEXO: