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    “A coragem não é ausência de medo, mas a capacidade de caminhar pelo mesmo labirinto, mesmo sabendo que todas as saídas podem levar ao mesmo ponto.” 

    — Misteriosos inscritos no templo da Adaga Arcana. Sem autor identificável.


    Harley não foi o único a atravessar o portal — ele arrastou consigo Milenium, Cônsul e centenas de guerreiros restantes. Como se fios invisíveis os conectassem, todos foram sugados pela força que ele, sem sequer entender, controlava. De algum modo, naquele Local Proibido, todos estavam irremediavelmente ligados.

    O jovem Ginsu sabia que, desta vez, sua escolha foi arriscada. A urgência e o perigo à sua volta o forçaram a agir rapidamente, sem tempo de examinar os vislumbres oferecidos pelos portais. 

    Ele avançou às cegas, sem os detalhes necessários para tomar uma decisão segura. Sua única orientação foram as tramas do destino, mas, para sua frustração, as duas linhas negras que viu eram idênticas — na forma, no tamanho e na vibração. Naquele momento, elas não o ajudaram. Agora, sentia o peso das consequências — “Teria escolhido o caminho certo?”

    Harley olhou ao redor, tomando consciência da realidade. O grupo que antes contava com mais de mil guerreiros agora era apenas uma sombra do que fora. Ao lado do Cônsul, ele havia ultrapassado inúmeros portais, enfrentado incontáveis desafios, mas o Local Proibido os consumia, um por um. Esse lugar não era apenas brutal — ele devorava vidas sem piedade.

    O grupo respirava com dificuldade, ainda sentindo a pressão do caos que haviam acabado de escapar. O rugido das criaturas gélidas se apagava no horizonte distante, mas o alívio não veio. Todos sabiam que o perigo havia apenas mudado de forma.

    Assim que seus olhos se ajustaram à nova realidade, Harley foi tomado por uma inquietação: “Estavam fora do Local Proibido? Tinham sido expelidos?”

    O cenário que se desenrolava diante deles era perturbadoramente familiar: o vasto deserto, os sóis gêmeos pendendo no horizonte, e as sombras alongadas das naves pousadas em uma formação estranhamente perfeita. 

    No entanto, algo estava definitivamente errado. Os invólucros de transporte, que deveriam estar nos limites de entrada do Local Proibido, agora surgiam na primeira parada forçada que haviam feito no caminho até ali. Aquilo parecia ilógico. 

    “Seriam novas naves de reforço? Ou, pior, alguma força desconhecida teria desviado suas naves e afastado os invólucros voadores do Local Proibido, sem que percebessem?” — a desconfiança crescia em seu peito, e o silêncio ao redor parecia mais denso, como se o próprio ambiente os vigiasse.

    — Isso… já aconteceu antes? — sussurrou Milenium, enquanto um arrepio percorria sua espinha — Mas como pode ser? Essas naves são as mesmas com as quais chegamos, deveriam estar na entrada do Local Proibido. Mas… e esses outros invólucros voadores? Eles foram destruídos, não deveriam mais existir. A única explicação seria… termos voltado no tempo. Mas isso é impossível… ou será que não? Como posso estar certa de algo tão absurdo?

    Harley assentiu, mas a compreensão não trouxe nenhum conforto. Ao contrário, sentiu-se envolvido por uma sensação opressiva de incerteza. Aquela versão distorcida do momento fatídico, em que tudo desmoronou, estava novamente à sua frente. 

    Ele reconhecia o deserto e as naves pousadas, lembranças de uma missão que terminara em desastre: os soldados foram massacrados por explosivos ocultos e traidores infiltrados. O Cônsul, naquela ocasião, havia tomado decisões rápidas, sacrificando vidas sem hesitar para salvar o que restava da frota.

    Mas havia algo profundamente inquietante nessa realidade. Harley podia sentir nos fios do destino, que vibravam ao seu redor, uma familiaridade desconfortável. Era como se estivesse novamente em uma trilha com ramificações que ele já havia percorrido, mas com uma diferença essencial. 

    As linhas agora pareciam convergir de maneira assustadora, como se tivessem levado a um ponto de retorno. Um início de possibilidades que ele já conhecia, mas que não conseguia prever completamente.

    — Estamos de volta ao início, — disse Harley, seus olhos fixos nas naves imponentes no deserto. Porém, as palavras saíram com uma incerteza que ele não esperava — Mas desta vez… algo pode ser diferente.

    Milenium o observou, sua confusão refletida em suas palavras:

    — Diferente? Como? Já passamos por isso, já vivemos tudo isso.

    Harley hesitou. Os fios do destino brilhavam ao seu redor, porém algo estava errado. Ele sempre tivera um senso claro de para onde as ramificações o levavam, mas agora, as possibilidades pareciam entrelaçadas, repetitivas. 

    Era como estar preso em um loop, onde cada escolha se conectava a outra que ele já havia feito, mas com pequenas variações que o deixavam incerto.

    — Sim, mas… agora, — sua voz falhou brevemente.

    “Não estamos limitados ao que aconteceu antes. Será que estamos?” — pensou, questionando suas próprias palavras enquanto avançava, sentindo a crescente pressão da responsabilidade apertar ainda mais seus ombros.

    — Desta vez — disse Harley com mais convicção — Sabemos quem são os traidores. Sabemos onde estão os explosivos. Podemos ser mais rápidos, salvar mais vidas… e talvez mudar o futuro.

    Por que ele se sentia tão incerto? As tramas ao seu redor costumavam ser claras, mas agora pareciam tremeluzir com a mesma configuração repetida. Era como se cada decisão estivesse prestes a levá-los a um mesmo destino, um lugar do qual não poderiam escapar.

    O Cônsul se aproximou, preocupado. Ele percebia a tensão, mas tinha sua própria missão a cumprir. 

    — Tomara que esteja certo — disse o Cônsul, sua voz carregada de incerteza, ecoando o que Harley sentia — Com o número reduzido de soldados, podemos ter que abandonar a missão de qualquer jeito.

    O ar ao redor parecia vibrar, mas Harley não sabia se era um reflexo da tensão crescente ou algo mais. As linhas que ele via agora estavam embaralhadas, quase indistinguíveis umas das outras. Uma trama caótica de escolhas que já haviam sido feitas, mas que, por algum motivo, pareciam retornar ao mesmo ponto.

    “Estaria realmente alterando o curso dos acontecimentos? Ou apenas repetindo uma sequência inevitável?” — Essas dúvidas o corroíam enquanto o tempo corria contra eles.

    Ao se aproximarem da nave de comando, a nave em que tinham chegado, Harley sentiu um frio na espinha. Algo estava diferente desde que atravessaram o portal, e aquele pressentimento só aumentava. Quando a rampa da nave desceu lentamente, o silêncio que os envolveu foi perturbador. Não havia nenhum som de atividades, nenhum sinal de vida.

    — Onde está a tripulação? — perguntou Milenium, franzindo a testa enquanto olhava ao redor. A nave, que normalmente estaria fervilhando de atividade, estava completamente vazia.

    O Cônsul adiantou-se, o rosto carregado de uma determinação fria. Ao ativar os painéis de controle da nave, seus dedos correram pelos comandos com eficiência. Ele precisava de respostas.

    — Nada — Sua voz, baixa, ecoava pelo ambiente — Nenhum sinal de duplicatas, nem aqui, nem nas outras naves.

    Harley se aproximou do painel, observando as leituras com atenção. As naves dos soldados que estavam com eles também estavam vazias. Isso confirmava o que ele suspeitava.

    — Então não há duplicatas de nós mesmos nesta realidade — concluiu Harley, com um misto de alívio e inquietação — Isso facilita as coisas.

    O Cônsul assentiu, ajustando as configurações da nave — Sem duplicatas, temos a vantagem. O foco será apenas nos traidores e nas armadilhas. Isso tornaria a missão mais simples, mas Harley não conseguia afastar a sensação de que a aparente facilidade escondia um novo tipo de perigo.

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