Índice de Capítulo

    “Uma cidade mágica não é apenas um lugar de habitação, mas um centro de aprendizado, onde cada rua e edifício conta uma história de progresso e inovação. Nela, as leis da física e da magia se entrelaçam, criando um ambiente onde qualquer coisa é possível e onde cada cidadão é um explorador do desconhecido.”

    Discursos do Grande Explorador Zandar, Vol. sobre Ciência.


    Aurora ainda estava envergonhada, seu rosto corado pela experiência perturbadora das esferas. Ela mal conseguia encarar Harley, mas sua voz, embora fraca, rompeu o silêncio:

    — Me siga, por favor.

    As palavras saíram de maneira semelhante a uma tentativa de escapar da situação, mas logo ela acrescentou, quase sussurrando:

    — Obrigada por me salvar.

    Sem olhar para trás, Aurora começou a caminhar com passos apressados, e Harley a seguiu em silêncio. Seus pensamentos ainda estavam confusos, sua mente processando tudo o que havia acontecido. 

    — Esperem um momento — disse Doravan, interrompendo ambos.

    Ele se aproximou, parando o jovem e a garota com um gesto calmo. Em suas mãos, Doravan segurava um colar simples de cipó trançado, algo que parecia rústico demais para o ambiente tecnológico em que estavam. Ele o entregou.

    — Use isso para disfarçar seu braço — instruiu o professor, sem dar mais detalhes.

    Harley olhou para o colar, inicialmente cético, mas decidiu segui-lo. Ao colocá-lo ao redor do pescoço e remover temporariamente a vestimenta que cobria seu braço esquerdo, algo extraordinário aconteceu: a tonalidade escura e sombria de seu braço, agora feito de energia sombria, mudou para a cor normal da pele humana. 

    Era uma transformação tão súbita que, por um instante, ele quase esqueceu que aquele braço não era natural.

    — Este colar não só altera a aparência, mas também reforça sua proteção contra ameaças — explicou Doravan. 

    Seu tom era mais do que técnico. Era quase paternal, sugerindo que estivesse cuidando de uma maneira mais profunda do que apenas enquanto mestre

    — Obrigado — murmurou Harley, ainda se ajustando à ideia de receber tantos favores.

    Ele nunca havia sido tão bem tratado, especialmente por pessoas que ele mal conhecia. Em seu passado, as interações sempre envolviam trocas. Mesmo as relações mais simples, fosse em seu clã ou no mundo sombrio, sempre traziam uma expectativa implícita de retorno. 

    As pessoas, em geral, esperavam algo em troca: poder, alianças ou vantagens. Harley estava acostumado a essa dinâmica, especialmente no local onde nasceu, onde, apesar do senso de comunidade, todos trabalhavam para benefícios mútuos.

    “O que faria Doravan querer ajudá-lo tanto assim? Não compartilhamos linhagem ou crenças, nem mesmo nos conhecemos?” — o jovem Ginsu pensava enquanto ponderava as intenções de Doravan:

    “Seria sua energia sombria algo tão importante assim?”

    Imerso em suas reflexões, percebeu que Aurora o observava, o que o trouxe de volta à realidade. Seus olhos se encontraram brevemente, e, no mesmo instante, a jovem desviou o olhar, o rubor voltando ao seu rosto. Ela parecia ainda mais envergonhada, quase incapaz de manter o contato visual.

    — Vamos? — perguntou a aprendiz do professor, apressada, tentando disfarçar o embaraço que sentia.

    Antes que o jovem Ginsu pudesse responder, o ambiente ao redor deles começou a mudar novamente. As transformações visuais que já haviam se tornado quase familiares para o jovem voltaram a acontecer, com formas e cores se alterando diante de seus olhos. 

    A sensação de confusão retornou, mas Harley, dessa vez, estava mais preparado. Ele sabia que estava em um mundo onde a realidade era maleável, onde tudo podia ser reestruturado a cada passo.

    Quando a transição terminou, o jovem se viu em um vasto depósito. O cenário era completamente diferente. Agora, em vez de corredores, havia uma grande área repleta de formas geométricas perfeitas, todas feitas de um material cinza metálico. 

    Triângulos, quadrados, dodecaedros… Todas essas figuras estavam dispostas em grupos, cada uma com aproximadamente um metro de altura e largura.

    Aurora caminhou à frente e, com um simples acionamento de uma alavanca, algo espetacular aconteceu. Um pequeno círculo oculto em cada uma das formas começou a brilhar, e, em um instante, uma força invisível entrou em ação. 

    As formas começaram a se mover, atraindo-se e repelindo-se mutuamente, parecendo obedecer a um comando silencioso.

    Harley ficou fascinado. Ele nunca tinha visto nada parecido. Era como se as formas tivessem vontade própria determinadas a seguir um caminho fixo. As formas se reorganizavam, fundindo-se de maneira fluida, até que todas elas se juntaram em uma única figura.

    — Fascinante, não é? — disse Aurora, sua voz suave rompendo o silêncio de admiração — O professor consegue fazer essas coisas sem usar magia.

    Harley franziu o cenho, confuso.

    — Isso não é magia? — perguntou mais uma vez, surpreso.

    Aurora balançou a cabeça com um sorriso.

    — Na verdade, não. Isso é ciência — ela olhou para as formas recém-fundidas — Esse efeito é criado por um tipo de mecanismo magnético, artificial. Ao contrário da magia verdadeira, que flui naturalmente do portador e não tem fim, isso aqui é um resultado controlado, limitado por tecnologia.

    Harley assentiu lentamente, absorvendo a informação sem realmente entender por completo a explicação. Ciência e magia, dois mundos que ele ainda tentava conciliar em sua mente. 

    Para o jovem Ginsu, parecia que a ciência era uma imitação limitada e enfraquecida da magia, mas, ao mesmo tempo, começava a ver o poder e possibilidades de progresso que a tecnologia poderia dar às pessoas.

    Aurora então virou-se para Harley, seus olhos encontrando os dele mais uma vez. Havia algo mais em seu olhar agora, algo além da curiosidade científica. Talvez fosse gratidão, ou talvez algo mais difícil de definir. Ela sorriu suavemente, quase como se tentasse quebrar a tensão crescente.

    — Estamos transportando maravilhas científicas — exclamou ela, com a voz repleta de um entusiasmo quase infantil — Artefatos que podem armazenar e canalizar diferentes tipos de energias mágicas. Com o tempo, tudo isso vai parecer tão natural para você quanto respirar.

    Harley a observou atentamente. Aurora estava genuinamente entusiasmada com o que estava à sua volta. O brilho em seus olhos e o calor em sua voz eram evidências de que aquilo não era apenas um trabalho para ela. Ela amava aquele mundo, e o jovem começava a perceber isso.

    De repente, algo capturou sua atenção. Um transporte semelhante aos veículos que ele havia visto antes estava estacionado à frente. Não era a carroça rudimentar que havia usado anteriormente para chegar até ali. Era um invólucro circular parecido com os que eles tinham cruzado no caminho até ali. 

    Antes que Harley pudesse expressar sua surpresa, Aurora pegou suavemente sua mão, um gesto inesperado que o pegou desprevenido. O toque era leve, quase com a sensação de que ela estivesse hesitante, mas havia algo de firme em seu gesto, sugerindo que ela quisesse passar confiança

    — Desta vez não vamos de carroça — ela disse com uma risada suave, notando a expressão espantada dele — Eu andaria nesses transportes o tempo todo, se pudesse. É mais rápido, mais seguro. Mas o professor tem suas manias… Ele só viaja em sua carroça de transporte.

    Harley deu um meio sorriso, ainda processando a leveza do momento, o toque inesperado e a mudança abrupta em seu ambiente.

    Juntos, eles embarcaram no invólucro de transporte, e enquanto o veículo acelerava para a próxima etapa de sua jornada, e o jovem se perguntou o que mais esse mundo tinha para revelar.

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