Capítulo 134 - Caminhos interdimensionais da magia

“Os caminhos interdimensionais são as veias através das quais a magia flui. Atravessar os caminhos interdimensionais é desafiar os limites da existência. A magia que permeia essas passagens é tanto um perigo quanto uma promessa de conhecimento.”

— Misteriosos inscritos no templo da Adaga Arcana. Sem autor identificável.

As luzes ao redor de Harley começaram a piscar e o transporte moveu-se autonomamente. Doravan estava no controle, remotamente enviando comandos precisos para guiá-lo de volta ao Departamento de Ciência e Tecnologia. 

O jovem observava em silêncio, o olhar perdido nas luzes intermitentes, refletindo sobre tudo que havia testemunhado. O aparecimento repentino de Milenium, a destruição da Academia de Combate Tradicional, e o abrupto distanciamento de Aurora. 

O mundo ao seu redor se dissolvia de maneira semelhante a um reflexo na água, e agora, de volta ao território inexplorado, ele sentia o peso de uma solidão mais densa do que nunca.

Ao chegar, Doravan o recebeu sem qualquer formalidade. Como de costume, o velho professor demonstrava uma praticidade rígida, o que condizia com sua personalidade pragmática. 

Nas mãos, Doravan segurava um pequeno objeto quadrado que emitia um brilho peculiar. Ao invés de refletir imagens do ambiente tal qual um espelho, aquele objeto as projetava no ar, criando imagens pequenas que flutuavam à sua frente, com dimensões e profundidade impressionantes.

A clareza das imagens era tal que Harley quase podia tocá-las.

Com um gesto habilidoso, Doravan alterou as imagens. Elas se alinharam, e Harley viu claramente a Guardiã Sombria fugindo da Academia de Combate Tradicional, agora consumida pelas chamas. 

Seu exército de sombras carregava um arsenal de armas roubadas, cada uma mais poderosa que a outra. Quando as sombras se fundiram à Guardiã, Harley viu a figura imponente de um dragão negro materializando-se. 

Ela montava a criatura, que disparou pelo céu, deixando o caos para trás.

Enquanto assistia à cena, Harley se sentiu inquieto. A grandiosidade dos instrumentos que Doravan possuía o deixavam desconcertado. Ele ponderava sobre a extensão do poder daquele homem que, aparentemente, comandava as mais avançadas tecnologias daquele mundo. 

“Será que as pessoas têm ideia de quão poderosas a ciência e a tecnologia realmente são? Se o controle absoluto do mundo mágico está ao alcance de Doravan, por que esse lugar parece tão subestimado pelas outras facções?”

Essas dúvidas ecoavam na mente de Harley, até que as imagens congelaram e a voz grave de Doravan cortou o silêncio:

— Você a conhece? — indagou, os olhos penetrantes do velho fixos em Harley, atentos às suas reações.

Harley não hesitou. As memórias da perseguição voltaram com força.

— Sim, ela estava me perseguindo antes de eu chegar a este mundo.

A curiosidade de Doravan intensificou-se. Ele deu um passo à frente, o olhar mais sério.

— Você também pode manipular sua Energia Sombria como ela? — a pergunta estava impregnada de interesse em descobrir até onde iam os poderes de Harley.

O jovem balançou a cabeça negativamente.

— Não — disse com firmeza.

Ele ainda não havia experimentado completamente o potencial de sua nova habilidade. O braço negro, resultado da transformação de sua antiga energia mágica branca, era um mistério. 

Desde sua chegada ao Mundo Mágico, Harley tinha se mantido discreto, com receio de chamar atenção indesejada. Não era hora de expor seu poder, não sem antes compreendê-lo plenamente.

Por mais que sua energia sombria intrigasse, Harley preferia a discrição. Ele queria um tempo para explorar, descobrir os limites de suas novas habilidades sem que forças externas o forçassem a agir. Contudo, o simples fato de não conseguir acessar aquele poder no momento o deixava frustrado.

A frustração corroía Harley enquanto ele reunia todas as forças para invocar a energia sombria, desejando, desesperadamente, sentir o mesmo domínio que um dia tivera sobre sua Força Mágica Branca. 

Ele concentrou-se mais uma vez, uma última vez, de maneira que sua determinação pudesse desafiar o impossível. Repetiu os gestos precisos que antes moldavam constructos e formas extraordinárias, mas o vazio respondeu em seu lugar. 

Nem sequer o braço negro, seu substituto, demonstrou qualquer sinal de uma habilidade mágica singular. No fundo, Harley sabia que a Energia Branca estava perdida para sempre, consumida por um ciclo irreversível. 

Aquele braço negro era mais do que um símbolo de recomeço: era a marca de uma renúncia dolorosa. Quando nada aconteceu, o silêncio que o envolveu foi mais pesado do que qualquer resposta. 

O braço inerte permanecia tal qual um presente carregado de significados, mas também de maneira semelhante a um adeus amargo a algo que jamais retornaria. Parecia um monumento à perda, uma lembrança de que, mesmo restaurado, algo essencial havia partido para sempre.

— Algum problema? — Doravan perguntou, percebendo o esforço falho de Harley.

Desesperado, Harley deu voz à sua angústia:

— Minha energia não responde… não consigo mais manipulá-la!

Doravan manteve a calma, observando atentamente cada movimento de Harley. A mente do professor trabalhava rápido, absorvendo cada detalhe.

— O que mudou? — perguntou Doravan, sua voz grave ecoando pelo laboratório enquanto ele estudava o jovem.

Harley hesitou. Ele não queria se abrir completamente, mas sabia que a expertise de Doravan era crucial. Ele precisava entender o que estava acontecendo consigo. Tomando uma decisão rápida, ele contou:

— Minha Energia Mágica Branca, que eu usava para criar objetos energéticos, foi substituída por essa… Energia Negra. Mas, de alguma forma, ela não responde mais. Antes, eu conseguia usá-la sem problemas, mas agora… parece que ela se transformou nesse braço negro. 

Doravan estreitou os olhos, interessado. Ele ponderou a situação por um momento, deixando o silêncio pairar no ar enquanto organizava seus pensamentos.

— A Energia Sombria não é algo que você simplesmente domina de imediato, Harley. Qualquer tipo de poder demanda não apenas controle, mas um entendimento profundo da sua origem. A transformação que você sofreu não foi completa, ou então, algo em você a está bloqueando.

Harley franziu o cenho, confuso. 

“O que poderia estar bloqueando sua energia?” — Sua mente tentou traçar as possíveis causas, mas ele ainda era um estranho nesse novo mundo, onde forças além da compreensão interferiam constantemente.

Doravan continuou:

— Essa sua nova energia é um elemento complexo. Energia Sombria não é apenas força. É o equilíbrio entre caos e controle. Se você não aprender a dominá-la, ela dominará você.

Harley o encarou, absorvendo as palavras ininteligíveis do professor. Em algum sentido ele sabia que Doravan tinha razão. Desde que sua magia branca havia se transformado, ele não havia conseguido se conectar verdadeiramente com sua nova fonte de poder. 

Harley sentiu o peso da ausência que carregava desde que perdera sua energia mágica branca. Não era apenas o seu antigo poder que lhe faltava, mas também a visão que tinha de si mesmo. 

Antes, ele se enxergava à semelhança de alguém capaz de moldar o impossível, um dominador de possibilidades infinitas. Agora, cada nova possível ação parecia limitada, cada escolha menor. Ele respirou fundo, encarando Doravan, assim buscando não apenas um caminho, mas uma forma de se reencontrar.

— Como faço para dominá-la? — perguntou, sua voz firme, mas carregada de uma dúvida mais profunda do que a simples técnica: 

“Como ser novamente quem eu era?”

Doravan fitou o jovem por um longo tempo antes de responder:

— Primeiro, você deve aceitar essa nova forma de energia, tornando-a parte de você. A energia branca que você perdeu não voltará, e quanto mais se agarrar ao passado, mais distante estará de dominar o presente. Aceitação é o primeiro passo. Depois, precisaremos de um estudo mais aprofundado.