Capitulo 12: A dor que nos ergue
Jasper sentiu as vibrações vindas de trás da parede na qual estava escorado. Reunindo o que restava de suas forças, rolou para frente às pressas, desviando por pouco de uma pequena mão que atravessou a rocha onde estivera.
— Kk… kh… kee… — as risadinhas continuaram, vindo de todas as direções.
Da fenda por onde a mão do invasor se debatia, rachando a parede para abrir passagem, Jasper notou um brilho forte e alaranjado vindo em sua direção, como se aquela criatura o estivesse encarando.
Vários outros olhos se acenderam em diferentes pontos, espreitando os três companheiros debilitados, até que as criaturas irromperam pelas paredes rochosas com força surpreendente.
Eram pequenos e esguios, cobertos por carapaças foscas em tons terrosos, perfeitas para camuflagem no ambiente do Deserto de Sonata. Por outro lado, os olhos eram grandes e luminescentes, capazes de detectar os menores traços de energia.
O primeiro alvo foi Kaern, indefeso e exposto. Além disso, o material de sua couraça metálica era do agrado daqueles Bestiais, que puxavam, sem piedade, cada placa da pele do lobo, a qual se rasgava sem oferecer resistência.
— Não! — gritou, mancando na direção dos inimigos, mesmo sem sua espada em mãos.
Jasper acertou uma cotovelada no pescoço de uma fdas criaturas, que estalou com um som nítido de osso quebrado. As outras riram da situação, mudando o foco para o Vulto Negro, e, de forma astuta, uma delas se jogou no chão, apertando a perna quebrada do garoto.
— Arghhh!! — Dessa vez, não conseguiu conter o grito de dor pura, tombando no chão em desespero.
Alguns já haviam pegado o que desejavam e desapareceram pelos buracos que abriram na caverna, enquanto os que ficaram espancavam o garoto caído, coletando cada fragmento da armadura do Vulto Negro, que se partia em pedaços aos poucos.
Jasper sentiu o ódio fervilhar, superando até mesmo a dor que o consumia. Seus olhos se fixaram no Bestial que atacara sua perna machucada. Com a outra perna, ainda funcional, desferiu um chute no queixo da criatura, que foi lançada contra o teto e empalada por uma estalactite.
O elmo curvado da armadura de Jasper se abriu, como se respondesse aos sentimentos do garoto, e fechou-se junto da mandíbula dele ao morder o pescoço de um dos inimigos, completamente fora de si.
Mesmo com a resposta brutal do Vulto Negro, aqueles monstros traiçoeiros não se intimidavam. Cada soco e chute desferido por seus pequenos membros, acostumados a quebrar rochas diariamente, destruía o corpo de Jasper, até que ele não aguentou mais e caiu de joelhos, cuspindo o pouco sangue que ainda restava em seu organismo.
Então é assim que as coisas acabam? Meu objetivo e sonhos terminam aqui?
As esperanças do menino eram extintas pelo medo e pelo desespero. O cordão que segurava sua cruz de prata começava a desaparecer aos poucos, como se estivesse se evaporando, emitindo um fraco brilho prateado.
Todo o mundo congelou na mente perdida de Jasper. No fim, tudo o que ele fez foi fechar os olhos com força. Lágrimas cruas escorreram, numa mistura de tristeza e raiva. Aquele era o fim.
Uma das criaturas estava prestes a remover o elmo do Vulto Negro, interessada em seu formato e material. Mas tudo o que se ouviu foi o som seco de sua barriga sendo atravessada por um braço musculoso e vermelho.
— A brincadeira acabou, seus merdinhas — declarou o Caçador de Ossos, segurando em sua mão o Núcleo Mutante do Bestial: um cristal pequeno e escuro.
Ao abrir os olhos, Jasper deu de cara com aquela cena bizarra. Não havia nada de normal naquilo: o ciclope ósseo havia se libertado da rocha que o esmagava, mas da pior forma possível, puxando seu corpo para o lado até que se rasgasse ao meio, espalhando sangue e circuitos por todos os lados.
O Caçador nem ao menos removeu o braço de dentro do Bestial, que, sem seu Núcleo Mutante, não passava de uma carcaça vazia. Abocanhou o cristal sem hesitar, absorvendo a energia radioativa para acelerar seu processo de cura.
Afinal, mesmo que Undeads Despertos pudessem sobreviver com seus corpos destroçados das piores maneiras possíveis, se seus Núcleos perdessem toda a carga, apodreceriam como qualquer Bestial.
Terminando de mastigar e engolir, o Caçador de Ossos desabou exausto ao lado de Jasper, que também já não se aguentava mais de pé. Ambos haviam chegado ao limite de seus corpos, mas a dor que sentiam era tamanha que os manteve acordados.
Os coletores restantes arrastaram os cadáveres dos companheiros — ainda considerados material utilizável, segundo a visão deles — e fugiram, deslizando pelos corredores e lacunas estreitas da caverna como se estivessem nadando.
— Não, não, não… — sussurrou Jasper, em aflição, ao ver sua armadura ruir por completo, restando apenas o elmo.
— Sério? Vai chorar agora… por causa de meia dúzia de tapas? — zombou, com o sorriso torto mal sustentado no rosto quebrado.
— Só cala a boca… Você nunca entenderia como é estar à mercê de tudo. — murmurou, pressionando os pedaços quebrados contra o corpo, como se esperasse que se fundissem sozinhos.
O Caçador de Ossos soltou uma gargalhada gutural e falhada, prejudicada pela falta de parte da traqueia.
— A verdade dói, não é? Sem essa armadura, você não passa de um garotinho assustado.
— Você fala como se fosse diferente. Sem sua carapaça de ossos, só sobra um monte de carne mole — respondeu, com a raiva ainda enraizada no seu cérebro.
Ele não obteve resposta por um longo tempo e começou a achar que o Caçador de Ossos havia morrido de vez. Isso lhe causou uma estranha tristeza: mesmo com os comentários maldosos, Jasper odiava ainda mais a solidão.
De repente, o Desperto se reergueu de forma abrupta, com seu único olho vermelho brilhando com uma intensidade quase ameaçadora na direção de Jasper. Diferente do exterior repleto de ossos, o interior do corpo do Caçador era formado apenas por um grande amontoado de fibras musculares vermelhas.
— Mesmo sem uma couraça de ossos, eu ainda sou o Caçador de Ossos, fedelho. Agora levante-se: temos um longo caminho pela frente. — As palavras vieram com a firmeza de séculos de experiência vivendo naquele mundo quebrado em várias dimensões.
Aquilo foi o suficiente para fazer Jasper retornar à realidade, com o cordão de sua cruz recuperando sua forma e brilho prateado. Ajustando seu elmo curvado, o Vulto Negro levantou-se mancando até o ponto onde sua espada de ossos estava presa e a puxou.
— Vamos…
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