Capitulo 27: Miragens
Do outro lado do Subsolo, afastado do conflito entre Zath e Mirage contra o Ceifador, o engenheiro da Dama da Ruína, que havia sido deixado para trás, lidava com a horda de robôs criados pelos Coletores.
KillSwitch avançou sem pressa, como se a batalha fosse apenas mais uma tarefa tediosa de manutenção. Um dos robôs, semelhante a um louva-a-deus, saltou contra ele, lâminas energéticas prontas para cortar.
O Desperto apenas ergueu a mão, liberando um jato fino e preciso de água pressurizada que atravessou a carapaça metálica do inimigo, fazendo-o tombar inerte.
Outro se aproximou pela lateral; KillSwitch girou o pulso, criando uma lâmina líquida que cortou o torso do oponente com a mesma facilidade com que se corta papel. Nem olhou para trás para confirmar o acerto.
— Próximo… — murmurou, como se estivesse chamando senha de atendimento.
Um terceiro robô, parecido com um gorila, veio correndo, pesado e barulhento. KillSwitch suspirou, desviou de dois ataques com um movimento mínimo e, com um empurrão d’água, lançou o inimigo contra a parede com força suficiente para deformar o casco.
Ele continuou nesse ritmo metódico: um alvo, um golpe, nenhuma pressa, até que o chão ficou coberto de peças retorcidas e fragmentos de energia dissipando-se no ar. Seus sensores nem chegaram a se elevar acima do nível basal.
— Sério… que perda de tempo — comentou, ajustando os propulsores para seguir em frente.
Antes de sumir da vista dos Coletores, o Undead tubarão os observou remontando os robôs às pressas. Ele havia feito questão de atingir precisamente os Fragmentos de Essência que serviam como núcleo de energia, mas, agora, aqueles meros Bestiais estavam restaurando cada um com técnicas básicas de manipulação de códigos.
Esse tipo de conhecimento não deveria estar nas mãos de Bestiais, pelo menos, não naturalmente… Então, o Ceifador também deve ser versado nessa área. Preciso me precaver.
Abrindo um pequeno compartimento em seu peitoral, KillSwitch retirou várias granadas de espectros que havia guardado por precaução e as deixou cair pela cratera, liberando a fumaça. Logo, os artrópodes Bestiais surgiram, suas inúmeras patas batendo contra o solo numa espécie de continência.
— Façam um pouco de bullying com esses carinhas, mas nada muito pesado, senão o Zath me mata — ordenou, acelerando com seus propulsores na direção do distante templo de Narhma.
Os artrópodes soltaram um berro agudo e distorcido, que fez os Coletores próximos taparem os ouvidos, apenas para receberem cabeçadas poderosas dos espectros, que destruíram suas carapaças com facilidade.
Enquanto isso, KillSwitch engolia um dos Fragmentos de Essência que tinha consigo, colocando seus circuitos internos para trabalhar em seu próprio Núcleo Mutante com os novos dados que entravam. Era perigoso, mas necessário para neutralizar os inimigos com maior eficiência.
Ah… droga, odeio quando tenho que pensar demais, mas meus manos estão esperando, então é hora de aumentar a capacidade.
De volta às escadarias, agora destruídas pelo impacto anterior do Ceifador contra elas, Mirage assumira a linha de frente do combate, não parecendo levar a situação tão a sério quanto o esperado, fazendo caretas estranhas com sua máscara dourada.
— Caramba… mas você não reage a nada, podia ser um pouco mais educado né? — reclamou, girando na ponta dos pés, lentamente aumentando a velocidade até virar um borrão azul.
Ainda em movimento, Mirage lançou diversas de suas cartas explosivas contra Osíris, que respondeu com um corte de energia esverdeada da sua foice, fatiando os projéteis no ar, os quais explodiram, criando uma grande cortina de fumaça púrpura.
Sem perder tempo, Zath disparou uma nova onda de feixes de energia de todos os seus tentáculos contra o Ceifador, utilizando a fumaça como distração para pegá-lo de surpresa, o que se provou ineficiente, pois, à medida que os raios se aproximavam, eram cortados ao meio pelos movimentos circulares de Osíris e sua arma.
Quando enfim a onda de ataques parecia cessar, Mirage surgiu de surpresa ao lado do Undead silencioso, tendo se arrastado furtivamente durante a confusão.
— Surpresa! — exclamou, enquanto desferia um chute circular completo mirando no rosto do Ceifador.
O Ceifador estendeu a mão lentamente, e uma fina camada de névoa espectral esverdeada emanou dela, envolvendo Mirage num brilho fantasmagórico. A névoa pulsava e se enroscava ao redor da garota, paralisando-a completamente, tornando cada movimento impossível.
Com um gesto calmo, Mirage foi empurrada para trás, sem oferecer resistência, enquanto Osíris desviava de mais alguns raios desesperados de Zath. A Undead gelatinosa bateu contra um pilar de pedra, escorrendo como uma gosma após a colisão.
O comandante da Dama da Ruína não tirava os olhos do Ceifador.
Até um leigo como eu consegue perceber o nível de maestria desse cara, tanto com sua energia quanto com a foice… E o pior de tudo: essa telecinese absurdamente poderosa.
Mirage já havia reconstruído boa parte de seu corpo, e sua máscara exibia uma expressão pensativa depois de todo o plano de ataque deles ter sido frustrado. Então, ela teve uma ideia, Zath podia jurar que viu uma lâmpada se acender acima da cabeça dela, mas era só impressão.
Um som grave, quase como um tambor distante, ecoou quando Mirage inclinou levemente a cabeça, deixando seu corpo gelatinóide ondular. As veias luminescentes que percorriam seu torso se acenderam, pulsando num ritmo frenético enquanto a energia liberada por seu Núcleo Mutante se intensificava, criando um turbilhão azulado ao seu redor.
O chão sob seus pés começou a se fragmentar com a pressão da energia acumulada. Mirage inclinou-se para frente.
— Vamos dançar… — sussurrou.
Num único estalo de ar, ela desapareceu.
Osíris reagiu imediatamente, girando a foice em um arco defensivo. O choque veio com força: a ponta do pé de Mirage raspou contra a lâmina, criando uma faísca verde e azul. Em seguida, ela reapareceu atrás dele, lançando um golpe que foi aparado pela parte inferior da arma. O som metálico reverberou, mas logo foi engolido por outro deslocamento de ar.
Zath, parado mais ao fundo, mal conseguia acompanhar. Mesmo com seus inúmeros olhos espalhados pelos tentáculos, tudo que via eram pós-imagens fantasmagóricas, borrões azuis e sombras esverdeadas se chocando e ricocheteando por todo o salão.
O espaço ao redor vibrava, as paredes marcadas por cortes e impactos que surgiam e sumiam antes mesmo que ele conseguisse focar.
Porém, quando ambos se chocaram no centro do local, o silêncio prevaleceu. Mirage permaneceu alguns segundos imóvel, sem reação, como se o tempo tivesse esquecido de passar. Mas tudo mudou quando uma fina linha verde percorreu sua armadura vermelha e, como numa reação em cadeia, várias outras surgiram, revelando-se como resquícios de energia dos cortes efetuados por Osíris em milissegundos.
— Mirage! — berrou Zath, fora de si, tentando forçar seus olhos já sobrecarregados a dispararem mais feixes de energia.
Uma pós-imagem azulada surgiu como um clarão atrás do Desperto pálido, o contorno distorcido de Mirage emergindo em velocidade extrema. Sua perna fez um arco perfeito, atingindo o Ceifador com um impacto seco.
Osíris foi arremessado vários metros para o lado, esvoaçando no ar como uma mancha de sombra viva.
Zath arregalou os olhos, agora, conseguia ver claramente: a Mirage que havia lutado corpo a corpo com o Ceifador até aquele instante… era apenas metade dela. No auge da troca de golpes, ela havia dividido seu corpo em duas massas independentes, cada uma agindo por conta própria.
A Mirage “original” pousou suavemente após o chute, a energia pulsando em seu núcleo como um coração acelerado.
— Nunca lute só contra o que você consegue ver… — disse, a voz abafada pela máscara dourada.
Osíris se ergueu lentamente, a mão apertando o cabo da foice. Pela primeira vez, uma fagulha de surpresa brilhou em seu olhar.
O silêncio seguinte não era mais de tensão, era a calma traiçoeira de quem sabia que a luta estava longe de acabar.
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