A poeira densa engolia tudo, tornando impossível distinguir formas além de vultos irregulares. No meio do véu sufocante, apenas o som do metal contra metal cortava o silêncio: garras de aço contra lâminas serrilhadas.

    Kaern avançava como um relâmpago, cada passo ecoando como marteladas no chão, mas, por mais veloz que fosse, cada investida terminava no vazio ou contra o braço mecânico de KillSwitch, que bloqueava seus ataques como se já soubesse exatamente onde o lobo tentaria acertar.

    Seus sensores piscavam em tons azulados na escuridão nebulosa, linhas invisíveis de cálculos percorrendo seu crânio metálico. A cada movimento de Kaern, um mapa de probabilidades era traçado em frações de segundo, anulando qualquer surpresa.

    Quando o lobo atacava pelo flanco, KillSwitch já o aguardava com um giro seco; quando vinha de frente, recebia um contra-ataque rápido e preciso, forçando Kaern a recuar.

    Faíscas riscavam a poeira como relâmpagos breves. Kaern rosnava, frustrado: sua ferocidade era inútil diante de um predador que transformava instinto em equação e cada golpe em estatística.

    Porém, uma variável surgia de forma catastrófica, além da capacidade de previsão de KillSwitch. Um intenso brilho avermelhado focalizou-se na direção do Undead tubarão, forçando seus sensores a recalibrar em milissegundos.

    O Caçador de Ossos emergiu, rompendo o véu arenoso com o braço direito reluzindo em fissuras pulsantes, a energia radiotiva vazando em linhas carmesins que rachavam sua própria pele.

    KRAAASH!

    Com um grito sufocado pela máscara óssea, desferiu um soco totalmente carregado. O impacto explodiu como uma bomba compacta: o ar vibrou em ondas circulares, a poeira se espalhou em turbilhões, e o chão sob os dois ruiu, formando uma cratera profunda de múltiplas camadas.

    O golpe não foi fatal. Com a ajuda dos propulsores, KillSwitch se lançou para longe, desviando por um triz. Mesmo assim, a lateral do corpo, do ombro ao abdômen, foi destroçada.

    — Escondendo sua força, hein? — comentou KillSwitch, com frieza inesperada. — Sei bem como é… mas confesso: você me surpreendeu. A maioria não sobrevive depois de se desfazer do Código de Doutrina.

    Uma Marca de Doutrina só podia ser criada por um Amaldiçoado da Igreja, tornando o Núcleo de um Undead extremamente suscetível ao Frenesi, causando aumento surreal de força e habilidades, mas com a terrível perda de liberdade e livre-arbítrio.

    O Caçador de Ossos estava de joelhos, a mão cravada no peito, onde uma rachadura luminosa pulsava. A cada batida, fagulhas amareladas escapavam junto de fiapos de Miasma, que se retorciam como vermes no ar rarefeito.

    Irregulares como o ciclope ósseo, que rompiam essa conexão à força, sofriam falhas graves em seus Núcleos. Qualquer descontrole significava morte.

    — Grraaaahh… — rosnou, puxando o Miasma de volta para si como quem engole veneno em brasa. Seus dentes cerrados ressoavam num ranger gutural, e os músculos vibravam como cordas prestes a se arrebentar.

    Do outro lado da cratera, KillSwitch se erguia com movimentos calculados, indiferente ao próprio estado deplorável. Com um estalo metálico, abriu um compartimento no braço e retirou seu último estoque de Fragmentos de Essência.

    Mas que saco… agora que meus fragmentos acabaram, não tenho dados suficientes para usar a Ocultação de Núcleo… tomara que você se exploda primeiro, Caçador de Ossos.

    Uma a uma, as plaquinhas luminosas se dissolviam em correntes de dados que percorriam o corpo danificado do Undead tubarão. A energia infiltrava-se em suas veias de metal, restaurando placas, realinhando circuitos e fundindo as brechas e um instante ele já estava totalmente recuperado.

    KillSwitch arfava em silêncio, seu corpo metálico rangendo a cada microajuste. Então, num gesto preciso, ele abriu compartimentos ocultos ao redor do peito, revelando o Núcleo Mutante em sobrecarga. O brilho irregular denunciava o excesso de calor acumulado.

    Com um estalo hidráulico, ele ativou o ciclo de refrigeração. Um fluido translúcido e oleoso, produzido de forma natural pelo próprio organismo robótico, começou a circular por tubos internos. Primeiro, foi comprimido violentamente dentro das câmaras do tórax, elevando sua pressão e temperatura até quase vaporizar.

    O líquido então percorreu o condensador embutido nas costas de KillSwitch, onde o calor foi expelido em jatos incandescentes. As colunas de fogo se alinharam com os propulsores dorsais, que rugiram com potência renovada, projetando fagulhas pelo ar.

    Mas não foi apenas impulso que nasceu do processo. O choque térmico criado pelo resfriamento súbito espalhou uma onda de ar gelado em direção ao campo de batalha. O Caçador de Ossos foi atingido pela rajada inesperada, sentindo os músculos contraírem com o frio cortante.

    KillSwitch avançou nesse exato instante, aproveitando o turbilhão de temperaturas extremas como distração. De seus braços, disparou jatos de água ultra pressurizada. No contato com a onda gélida que se espalhava pelo campo, as lâminas líquidas se congelaram instantaneamente, transformando-se em projéteis cristalinos.

    Com precisão cirúrgica, atravessaram os músculos densos do Caçador de Ossos, estilhaçando carne e gelo ao mesmo tempo. Ainda assim, ele permaneceu imóvel, firme como uma estátua, os olhos fixos em KillSwitch, como se a dor fosse apenas mais uma sombra a suportar.

    Em um movimento rápido, KillSwitch cravou duas lâminas curtas nos ombros do colosso. O metal penetrou fundo e, no mesmo instante, o gás pressurizado dentro das facas foi liberado. Um estalo surdo ecoou quando a pressão interna se expandiu violentamente, deslocando fibras e circuitos, destroçando os músculos monstruosos dos trapézios do Caçador.

    Antes que a fera pudesse reagir, KillSwitch impulsionou-se para trás, girando no ar com a ajuda dos propulsores dorsais. No auge da rotação, ele concentrou toda a força em uma única perna e disparou um chute devastador diretamente contra o olho vermelho do ciclope ósseo.

    No instante do impacto, seus propulsores menores, embutidos nos pés, se ativaram com um estrondo, liberando energia comprimida em uma explosão de fogo e pressão.

    O crânio do Caçador foi sacudido para trás pela onda de impacto, o ar ao redor se distorceu com a força da detonação, e estilhaços carmesins de luz e energia se espalharam pelo campo de batalha.

    Da nuvem de fumaça, apenas passos pesados ecoavam. Uma silhueta monstruosa se revelou: o Caçador de Ossos. O corpo dilacerado pela sequência de ataques calculados, músculos rasgados, crânio fissurado, ainda regenerava tecidos em velocidade anormal, ossos e músculos se recompondo como cordas tensionadas.

    KillSwitch soltou um suspiro gélido, sabendo o que vinha a seguir, já exausto, mal conseguia manter-se de pé, seus sistemas sobrecarregados após tanto esforço.

    Com força brutal, o ciclope ósseo agarrou o Undead pela cabeça, erguendo-o do chão como se fosse um peso insignificante.

    Então, com frieza calculada, o Caçador esmagou KillSwitch contra o solo. Pisou sobre a carcaça metálica, fazendo-a ranger e retumbar, o impacto reverberando pelos destroços do templo. KillSwitch se contorcia, tentando se recompor, mas não havia espaço para manobras.

    O ciclope repetiu o gesto, afundando seu peso sobre o inimigo diversas vezes, cada impacto mais devastador que o anterior. Até que, finalmente, ergueu o pé uma última vez e desferiu um golpe direto no rosto.

    O som metálico do choque ecoou como um trovão contido.

    — Argh…. não precisava esculachar desse jeito também meu mano… — murmurou, com o que sobrou da mandíbula metálica esmagada.

    O Undead tubarão finalmente cedeu, suas luzes internas diminuindo até se apagarem, e desabou inerte no chão.

    O Caçador de Ossos permaneceu por um instante, observando a máquina derrotada aos seus pés, respirando com autoridade absoluta. Kaern, que permanecera à espreita o tempo todo, aproximou-se de seu líder após o fim do confronto; sua ajuda não havia sido necessária.

    — Tsk, que tédio… — resmungou, estalando o pescoço de forma relaxada. — Pelo menos agora, com todos mortos, posso finalmente buscar o meu prêmio.

    Virando-se despreocupado, o Caçador estava pronto para retornar ao local onde estivera antes, seus passos ecoando pelas pedras quebradas do templo. Mas algo o fez pausar. À sua frente, parado exatamente como estivera desde o início da sincronização, estava o Vulto Negro.

    Diferente da energia pura e azulada que emanava antes, agora uma aura avermelhada e corrompida se espalhava por seu corpo, penetrando cada fissura e viga do templo como uma infecção insidiosa. A luz sombria percorria o chão, escalava pilares e contornos de paredes, tornando o ar denso e opressivo.

    O Vulto Negro permanecia imóvel, silencioso, mas a presença da energia corrompida era como um aviso silencioso: nada seria como antes dentro do Templo de Narhma.

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